sábado, 25 de junho de 2022

A prisão cautelar e o favorecimento pessoal no caso de Milton Ribeiro

Já me posicionei academicamente contra a execução provisória e entendo que a prisão cautelar deve ser reservada aos últimos casos. De todo modo, as prisões em flagrante e a preventiva são previstas no Código de Processo Penal (respectivamente, arts. 301-310; e arts. 311-316).

Durante a Operação Lava Jato, era corrente a condução coertiva, ao arrepio do Código de Processo Penal, como medida substitutiva à prisão. Nos temos do art. 260 do CPP a condução coercitiva do acusado só poderá ocorrer depois que ele deixar de atender à intimação. Todavia, no âmbito da Operação Lava Jato, sem intimar o acusado, expedia-se mandado para condução coertiva, sob o argumento de que assim se evitaria a fraude processual (Código Penal, art. 347) e que seria mais fácil cumprir a busca e a apreensão determinada para coleta de provas.

A prisão temporária, prevista na Lei n. 7.960, de 21 de dezembro de 1989, é altamente questionável porque está fundamentada em um utilitarismo exagerado, uma vez que largamente determinada para facilitar a investigação criminal, embora inexista qualquer fundamento da prisão preventiva - os fundamentos da prisão preventiva estão no art. 312 do CPP.

Recentemente foi determinada a prisão preventiva do ex-Ministro Milton Ribeiro, em face de supostas corrupções passivas (Código Penal, art. 317), havidas enquanto ele era o titular da Pasta. No entanto, ao que consta, preocupado com o que a Polícia Federal poderia encontrar, ou o que o preso pudesse declarar, o Presidente da República telefonou para o investigado (sem saber ao certo se era prisão ou busca e apreensão) para alertá-lo.

Ricardo Noblat tem sido extremamente cético ao Presidente da República, mas é correto ele afirmar que Flávio Bolsonaro acertou ao afirmar:

- Tá cheirando sacanagem, além de crime, é claro. [aqui]

Sim. Mesmo que o Presidente da República não tenha concorrido para a corrupção que é investigada, em tese praticou o crime de favorecimento pessoal (Código Penal: "Art. 348 - Auxiliar a subtrair-se à ação de autoridade pública autor de crime a que é cominada pena de reclusão: Pena - detenção, de um a seis meses, e multa. § 1º - Se ao crime não é cominada pena de reclusão: Pena - detenção, de quinze dias a três meses, e multa").

Como o crime do art. 317 do Código Penal é punido com reclusão, o favorecimento pessoal seria o qualificado do art. 348, § 1º, do CP. Também, em tese, há o crime de violação de sigilo funcional qualificado, assim descrito no Código Penal:

"Art. 325 - Revelar fato de que tem ciência em razão do cargo e que deva permanecer em segredo, ou facilitar-lhe a revelação:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa, se o fato não constitui crime mais grave.

§ 1o  Omissis.

§ 2o Se da ação ou omissão resulta dano à Administração Pública ou a outrem:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa."

O artigo mencionado, de Noblat, replica o vazamento de uma gravação ilegal pelo então Sérgio Moro. Aquilo foi um crime previsto na Lei n. 9.296, de 24.7.1996, a saber:

Art. 10.  Constitui crime realizar interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática, promover escuta ambiental ou quebrar segredo da Justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei:

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.

Parágrafo único.  Incorre na mesma pena a autoridade judicial que determina a execução de conduta prevista no caput deste artigo com objetivo não autorizado em lei.

Talvez esse crime tenha se repetido. No entanto, entendo que, ao exemplo da situação anterior, o novo vazamento de interceptação telefônica não deve gerar responsabilidade jurídico-criminal, até porque no primeiro caso foi muito pior, eis que a escuta foi feita depois de terminado o prazo da autorização judicial, ou seja, no primeiro caso a divulgação ilegal decorreu de uma interceptação também delituosa.

Nenhum comentário: