quarta-feira, 19 de abril de 2023

Em tese, Moro não praticou calúnia contra Gilmar Mendes

 1. DELIMITANDO O ESTUDO

Tratarei de uma notícia que vem repercutindo muito em todo território, a qual é até surpreendente pela velocidade da iniciativa ministerial, visto que um pequeno vídeo viralizou nas redes sociais no final de semana (dias 15 e 16.4.2023) e na segunda-feira (dia 17.4.2023) já se noticiava que o Ministério Público Federal ofereceu denúncia contra o Senador da República Sérgio Fernando Moro (nascido em 1.8.1972).[2]

Não tenho a neutralidade como orientadora das minhas pesquisas, estando bem acompanhado nesse aspecto, eis que Max Weber afirmou: "Nossa vida social e econômica euro-americana encontra-se 'racionalizada' de um modo e num sentido específico".[3] Com isso, sempre que iniciamos o estudo de um objeto, temos um problema e hipóteses possíveis, tentando demonstrar uma delas. Assim, a neutralidade inexiste.

De todo modo, podemos ser imparciais. Mesmo que eu não goste do Partido dos Trabalhadores (fundado em 10.2.1980), nem dos principais ícones da Operação Lava Jato[4] e dos nomes da suposta "extrema direita" (que de conservadora nada tem[5]), buscarei ficar adstrito ao vídeo e à denúncia.

2. O VÍDEO E A DENÚNCIA

O vídeo,[6] segundo o acusado, foi editado. O que podemos apreender dele é que se deu em uma festa junina, gravado de 2016 a 2022, quando ele diz, ante a brincadeira da cadeia, a fiança "seria para comprar um habeas corpus do Ministro Gilmar Mendes".[7]

A denúncia, assim como a maioria, é sucinta.[8] Veja-se que se pede para que, caso a pena aplicada seja superior a 4 anos, superior a 4 anos, haja a perda do cargo eletivo. É muito difícil pensar em tal hipótese, visto que não há qualquer indicativo de que foi o acusado quem gravou o vídeo ou que o tenha disponibilizado nas redes sociais, bem como concorrido dolosamente para tal.

Não tratarei aqui ada aplicação da pena por é um tema denso e que enseja longas discussões,[9] distanciando-se do objetivo do presente artigo, o qual é demonstrar a impossibilidade de se falar em crime de calúnia ou difamação no caso vertente, restando, em tese, a possibilidade do crime de injúria.

3. ANÁLISE DOS CRIMES CONTRA A HONRA

A transcrição que farei dos crimes contra a honra terá os dispositivos legais mencionados na denúncia grifados (em itálico).

3.1 Previsão legal

Vejamos o Título I (Dos crimes contra a pessoa) da Parte Especial do Código Penal, especialmente seu Capítulo V (Dos crimes contra a honra):

Calúnia

Art. 138 - Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa.

§ 1º - Na mesma pena incorre quem, sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga.

§ 2º - É punível a calúnia contra os mortos.

Exceção da verdade

§ 3º - Admite-se a prova da verdade, salvo:

I - se, constituindo o fato imputado crime de ação privada, o ofendido não foi condenado por sentença irrecorrível;

II - se o fato é imputado a qualquer das pessoas indicadas no n. I do art. 141;

III - se do crime imputado, embora de ação pública, o ofendido foi absolvido por sentença irrecorrível.

Difamação

Art. 139 - Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação:

Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.

Exceção da verdade

Parágrafo único - A exceção da verdade somente se admite se o ofendido é funcionário público e a ofensa é relativa ao exercício de suas funções.

Injúria

Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro:

Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.

§ 1º - O juiz pode deixar de aplicar a pena:

I - quando o ofendido, de forma reprovável, provocou diretamente a injúria;

II - no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria.

§ 2º - Se a injúria consiste em violência ou vias de fato, que, por sua natureza ou pelo meio empregado, se considerem aviltantes:

Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa, além da pena correspondente à violência.

§ 3º Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a religião ou à condição de pessoa idosa ou com deficiência:

Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.

Disposições comuns

Art. 141 - As penas cominadas neste Capítulo aumentam-se de um terço, se qualquer dos crimes é cometido:

I - contra o Presidente da República, ou contra chefe de governo estrangeiro;

II - contra funcionário público, em razão de suas funções, ou contra os Presidentes do Senado Federal, da Câmara dos Deputados ou do Supremo Tribunal Federal;

III - na presença de várias pessoas, ou por meio que facilite a divulgação da calúnia, da difamação ou da injúria.

IV - contra criança, adolescente, pessoa maior de 60 (sessenta) anos ou pessoa com deficiência, exceto na hipótese prevista no § 3º do art. 140 deste Código.

§ 1º - Se o crime é cometido mediante paga ou promessa de recompensa, aplica-se a pena em dobro.

§ 2º Se o crime é cometido ou divulgado em quaisquer modalidades das redes sociais da rede mundial de computadores, aplica-se em triplo a pena.

Exclusão do crime

Art. 142 - Não constituem injúria ou difamação punível:

I - a ofensa irrogada em juízo, na discussão da causa, pela parte ou por seu procurador;

II - a opinião desfavorável da crítica literária, artística ou científica, salvo quando inequívoca a intenção de injuriar ou difamar;

III - o conceito desfavorável emitido por funcionário público, em apreciação ou informação que preste no cumprimento de dever do ofício.

Parágrafo único - Nos casos dos ns. I e III, responde pela injúria ou pela difamação quem lhe dá publicidade.

Retratação

Art. 143 - O querelado que, antes da sentença, se retrata cabalmente da calúnia ou da difamação, fica isento de pena.

Parágrafo único. Nos casos em que o querelado tenha praticado a calúnia ou a difamação utilizando-se de meios de comunicação, a retratação dar-se-á, se assim desejar o ofendido, pelos mesmos meios em que se praticou a ofensa.

Art. 144 - Se, de referências, alusões ou frases, se infere calúnia, difamação ou injúria, quem se julga ofendido pode pedir explicações em juízo. Aquele que se recusa a dá-las ou, a critério do juiz, não as dá satisfatórias, responde pela ofensa.

Art. 145 - Nos crimes previstos neste Capítulo somente se procede mediante queixa, salvo quando, no caso do art. 140, § 2º, da violência resulta lesão corporal.

Parágrafo único. Procede-se mediante requisição do Ministro da Justiça, no caso do inciso I do caput do art. 141 deste Código, e mediante representação do ofendido, no caso do inciso II do mesmo artigo, bem como no caso do § 3o do art. 140 deste Código.

O art. 92, inc. I, alínea "b", do Código Penal prevê um efeito civil da condenação não automático, ou seja, que precisa ser declarado na sentença condenatória (parágrafo único do mencionado art. 92), que é a perda do cargo ou mandato eletivo quando a pena privativa de liberdade for superior a 4 anos.

No caso vertente, não se sabe quando as declarações foram feitas e o vídeo gravado, o que se sabe é que o vídeo "viralizou" nos dias 15 e 16.4.2023, ocasião em que chegou ao conhecimento da vítima, o qual representou criminalmente contra o Senador da República.

3.2 Calúnia, difamação e injúria

A calúnia está prevista no art. 138 do CP. Trata-se de crime que só pode ser praticado, no meu entender, contra pessoa física, porque somente ela pode praticar crime. Como a calúnia exige a imputação falsa de crime à vítima, é necessário que esta seja capaz de, em tese, ser sujeito ativo do crime imputado.

Conforme ensinava Nelson Hungria, somente a pessoa física pode ser o sujeito passivo de crime contra a honra, sendo inaceitável, sob o ponto de vista jurídico-criminal, a tese de que também a pessoa jurídica pode ser ofendida em sua honra.[10]

Como a jurisprudência tem admitido a prática de crime de difamação contra a pessoa jurídica – do que discordo -, em tese, a pessoa jurídica pode ser vítima de crime contra o meio ambiente, uma vez que a Lei n. 9.605, de 12.2.1998 – a pretexto de regular o art. 225, § 3º da Constituição Federal -, traz a responsabilidade criminal da pessoa jurídica.[11]

O crime de calúnia é um dos que mais gera discussões, mormente porque ele tem por objeto jurídico a honra objetiva – assim como a difamação – mas é o único que exige a imputação falsa de fato criminoso e, ainda, tem outras previsões específicas a ele.

Falar em tipo objetivo significa considerar a conduta legalmente prevista, enquanto o tipo subjetivo leva em consideração o elemento anímico do agente. A calúnia e a difamação exigem a prática de fato, enquanto a injúria exige a imputação de u qualidade negativa à vítima.

Os artigos 138, 139 e 140 do CP, não fazem qualquer referência à negligência, portanto, só há crime contra a honra doloso. Assim, a tais condutas negligentes não há previsão do CP.

Não pode existir calúnia contra morto porque somente pessoas podem ter honra, mas a lei prevê a calúnia contra mortos. Ora, a lei acaba reunindo crime contra o sentimento religioso que se tem em relação aos mortos com crime contra a honra.

Caluniar decorre do latim calumnia, que significa chicana, fazer imputação falsa. Nos termos da lei, a calunia importa em imputar falsamente a outrem a prática de crime. Tem-se que o objeto jurídico é a honra objetiva, ou seja, a ofensa da reputação da pessoa no meio social.

Quem não é capaz de praticar, crime não pode ser vítima do art. 138 do CP porque se exige que a vítima tenha sido acusada de praticar crime e, só quem é maior e capaz pode praticar crime.[12]

A calúnia exige que o agente trate de fato determinado, assim como a difamação. A diferença é que na calúnia o fato é crime, enquanto na difamação o fato não é definido como crime.

Entendemos, com Nelson Hungria, que os inimputáveis podem ser vítimas do crime de difamação porque têm honra objetiva. Quanto ao crime de injúria, por sua vez, deve ser observado caso a caso quanto à capacidade de perceberem a ofensa.[13]

O crime de injúria tem por objeto jurídico a honra subjetiva, ou seja, o valor que a pessoa tem de si mesmo. Essa honra pode ser decoro, que é o valor que a vítima acredita ter em relação às outras pessoas, ou ser dignidade, o valor que tem de si mesma.

A calúnia e a difamação serão consumadas quando chegarem ao conhecimento de pessoas diversas da vítima. Por outro lado, a injúria se consuma quando chega ao conhecimento da vítima.

Diversamente dos crimes de calúnia e difamação, que admitem a prova da verdade (a difamação a admite apenas quando a ofensa é feita contra funcionário público propter officium), a injúria não a admite.

O CP trata de exceção da verdade, que é um incidente processual em que o acusado de crime procura demonstrar que não o praticou. Ao contrário, falou a verdade em prol da sociedade. Já na injúria, a prova da verdade constituiria nova injúria contra a vítima, razão de não ser admitida.

4. QUESTÕES PROCESSUAIS RELEVANTES

No vídeo, Moro falou genericamente, sem indicar fato (isso consta da denúncia). Um fato criminoso seria calúnia e um fato não criminoso difamação, mas não indicou fato. Assim, não pode haver qualquer dos dois crimes.

Os crimes contra a honra podem se concretizar de forma implícita. Assim, o que fica evidente é a possibilidade de ter se concretizado o crime de injúria por acusar um Ministro do Supremo Tribunal Federal, o seu decano, de ser corrupto.

Tem-se que não se pode acusar por injúria quando se tratar de difamação ou calúnia, visto que isso poderá minimizar os constitucionais princípios do contraditório e da ampla defesa. Os crimes de calúnia e difamação, também, admitem a exceção de notoriedade (Código de Processo Penal, art. 523). Ocorre que as notícias falsas veiculadas em redes sociais, as campanhas contra o STF e os Poderes constitucionalmente estabelecidos, não podem caracterizar a notoriedade necessária para tal exceção.

Fatos notórios não precisam ser provados, eis que são do domínio público. Mas, imputar vagamente a corrupção ao decano do STF não pode constituir calúnia ou difamação, mas injúria.[14]

O acusado não poderá fazer a prova da verdade de um fato ou provar a sua notoriedade porque a denúncia não o descreve. Assim, poderíamos falar em denúncia inepta?

A inépcia não se aplica ao caso porque ela descreve um crime e o juízo não se vincula à capitulação legal feita na denúncia, mas aos fatos nela descritos. Assim, até mesmo no momento do recebimento da denúncia o STF poderá ajustar a capitulação legal para o crime de injúria, afastando o incabível – na espécie – crime de calúnia.

Moro não poderá alegar que é o caso de calúnia para poder exercer o contraditório e a ampla defesa, salvo se provar que o vídeo efetivamente provar que o vídeo foi editado, conforme vem alegando, e conseguir provar que se referiu a um fato, do qual tem elementos para a exceção da verdade. Mas, julgar procedente a exceção da verdade não implicará necessariamente a sua absolvição, desde que seja provado que ele deliberadamente quis ofender a honra do Ministro Gilmar Mendes.

O vídeo parece evidenciar o animus jocandi (de fazer glosa a terceiro) não o animus injuriandi vel difamandi, essencial aos crimes de calúnia e de difamação.[15] De todo modo, pode subsistir o animus injuriandi, próprio do crime de injúria, a ser demonstrado durante a persecução criminal.

O recebimento da denúncia fará nascer a ação criminal contra o Senador da República Sérgio Moro, sendo que o STF poderá, após ouvi-lo, até mesmo o absolver. De todo modo, em tese, a aparente brincadeira, em tese, constitui crime capitulado no Código Penal.

5. PARA NÃO CONCLUIR

Tratando de crimes contra a honra, em tese, Sérgio Fernando Moro não praticou, em tese, crimes de calúnia e difamação, mas os fatos descritos na denúncia caracterizam injúria.

No curso do processo criminal, será necessário provar o animus injuriandi ou, caso o acusado pretenda a exceção da verdade, deverá provar que o vídeo foi editado e que se referiu a um fato criminoso o desabonador não criminoso propter officium específico.

Por fim, o dolo deve ser provado, razão de que o STF poderá rejeitar a denúncia, adequar a capitulação legal, absolver sumariamente o acusado ou receber a denúncia, prosseguindo em sua instrução até a decisão final.

Como o caso é recente e a propositura da ação se fetivou, há muito a ser feito.

REFERÊNCIAS

BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Direito penal. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. v. 1.

BRANDÃO, Cláudio. Teoria jurídica do crime. Rio de Janeiro: Forense, 2001.

BUSATO, Paulo César, HUAPAYA, Sandro Montes. Introdução ao direito penal. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2003.

COSTA, Álvaro Mayrink da. Direito penal: parte especial. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001.

DELMANTO, Celso et al. Código penal comentado. 6. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.

HEFENDEHL, Roland. Corporate criminal liability: model penal code section 2.07 and the development in western legal systems. Disponível em: <https://heinonline.org/HOL/LandingPage?handle=hein.journals/bufcr4&div=12&id=&page=>. Acesso em: 2.10.2003, às 2h05.HUNGRIA, Nelson. Comentários ao código penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1959. v. 6.

JOVEM PAN NATAL. Vídeo de Sérgio Moro viraliza nas redes #shorts. 17.4.2023. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=hF9b4oped3E>. Acesso em: 18.4.2023, às 18h40.

LEAL, João José. Direito penal geral. São Paulo: Atlas, 1999. p. 169.

MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Execução criminal. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2014.

RICHTER, André. PGR denuncia Moro ao Supremo por calúnia contra Gilmar Mendes: denúncia alega que ex-Juiz acusou Ministro de negociar decisão. ECB: AgênciaBrasil, 17.4.2023, às 20h12. Disponível em: <https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2023-04/pgr-denuncia-moro-ao-supremo-por-calunia-contra-gilmar-mendes>. Acesso em: 18.4.2023, às 18h05.

WEBER, Max. Sobre a teoria das ciências sociais. São Paulo: Moraes, 1991.



[1] Procurador Federal; Concluiu o Curso de Formação de Oficiais (APMG) e Graduou-se em Direito (UniCEUB); Especialista em Direito Penal e Criminologia (UniCEUB); e em Metodologia do Ensino Superior (UniCEUB); Mestre (UFPE) e Doutor em Direito (UNZL); Professor, Procurador Federal e Advogado; Autor dos livros "Prescrição Penal", "Execução Criminal: Teoria e Prática" e "Comentários à Lei Antidrogas: Lei n. 11.343, de 23.8.2006" (Editora Atlas); e de vários artigos jurídicos.

[2] RICHTER, André. PGR denuncia Moro ao Supremo por calúnia contra Gilmar Mendes: denúncia alega que ex-Juiz acusou Ministro de negociar decisão. ECB: AgênciaBrasil, 17.4.2023, às 20h12. Disponível em: <https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2023-04/pgr-denuncia-moro-ao-supremo-por-calunia-contra-gilmar-mendes>. Acesso em: 18.4.2023, às 18h05.

[3] WEBER, Max. Sobre a teoria das ciências sociais. São Paulo: Moraes, 1991. p. 115.

[4] Sérgio Fernando Moro, ex-Juiz Federal em Curitiba-PR; Marcelo da Costa Bretas, ex-Juiz da 7ª Vara Federal da Seção Judiciária do Rio de Janeiro; e Deltan Martinazzo Dallagnol (nascido em 15.1.1980).

[5] Professar uma religião, autoproclamar-se pessoa conservadora, sem se comportar como tal, é uma fraude. Nesse sentido está a Bíblia, em Tiago:

14 Meus irmãos, que interessa se alguém disser que tem fé em Deus e não fizer prova disso através de obras? Esse tipo de fé não salva ninguém.

15 Se um irmão ou irmã sofrer por falta de vestuário, ou por passar fome,

16 e lhe disserem: “Procura viver pacificamente e vai-te aquecendo e comendo como puderes”, e não lhe derem aquilo de que precisa para viver, uma tal resposta fará algum bem?

17 Assim também a fé, se não se traduzir em obras, é morta em si mesma.

18 Poderão até dizer: “Tu tens a fé, mas eu tenho as obras. Mostra-me então a tua fé sem as obras. Porque eu dou-te a prova da minha fé através das minhas boas obras!”

19 Crês que há um só Deus? Estás muito certo. Mas lembra-te que os demónios também creem e tremem!

20 És uma pessoa bem insensata se não conseguires compreender que a fé sem obras não vale de nada.

21 Não mostrou o nosso pai Abraão que era justo através dos seus atos, ao oferecer a Deus o seu filho, Isaque, sobre um altar?

22 Como vês, na sua vida a fé e as obras atuaram conjuntamente. A fé completou-se através das obras.

23 Por isso, as Escrituras dizem: “Abraão creu em Deus e este declarou-o como justo.” E foi chamado o amigo de Deus.

24 Estão a ver então que a pessoa é considerada justa aos olhos de Deus pelo que faz e não só por crer.

[6] Disponível em: <https://www.youtube.com/shorts/_WziLuWiViU>. Acesso em: 18.4.2022, às 20h.

[7] JOVEM PAN NATAL. Vídeo de Sérgio Moro viraliza nas redes #shorts. 17.4.2023. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=hF9b4oped3E>. Acesso em: 18.4.2023, às 18h40.

[8] Disponível em: <https://www.conjur.com.br/dl/pgr-denuncia-sergio-moro-calunia-gilmar.pdf>. Acesso em: 18.4.2023, às 20h10. Para não deturpar o exposto, transcrevo a sua integralidade:

EXCELENTÍSSIMA SENHORA MINISTRA PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

PGR-MANIFESTAÇÃO-352752/2023

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pela Vice-Procuradora-Geral da República signatária, no exercício das atribuições conferidas pelo artigo 24, caput, do Código de Processo Penal, pelo artigo 129, inciso I, da Constituição Federal e pelo artigo 6°, inciso V, da Lei Complementar n. 75/1993, promove ação penal mediante o oferecimento de

DENÚNCIA

em desfavor de:

SERGIO FERNANDO MORO, Senador da República pelo Estado do Paraná¹, brasileiro, casado, natural de Maringá-PR, nascido em 1º de agosto de 1972, filho de Odete Starke Moro e Dalton Aureo Moro, portador da Cédula de Identidade n. 36.748.567, expedida pela Secretaria de Segurança Pública do Estado do Paraná, inscrito no Cadastro de Pessoa Física sob o n. 863.270.629-20, com endereço funcional no Senado Federal, Anexo 2, Ala Affonso Arinos, Gabinete 4, Brasília/DF, CEP: 70.165-900, pelo fato adiante narrado.

Em data, hora e local incertos, o denunciado SERGIO FERNANDO MORO, com livre vontade e consciência, caluniou o Ministro do Supremo Tribunal Federal GILMAR FERREIRA MENDES, imputando-lhe falsamente o crime de corrupção passiva, previsto no artigo 317 do Código Penal, ao afirmar que a vítima solicita ou recebe, em razão de sua função pública, vantagem indevida para conceder habeas corpus, ou aceita promessa de tal vantagem.

Segundo restou apurado, durante um evento realizado em dia, hora e local não sabidos, diante de um grupo de diversas pessoas, SERGIO FERNANDO MORO, ciente da inveracidade de suas palavras, afirmou que: “Não, isso é fiança, instituto… pra comprar um habeas corpus do Gilmar Mendes”, acusando falsamente a vítima de, em razão de sua função jurisdicional, negociar a compra e a venda de decisão judicial para a concessão de habeas corpus.

A manifestação caluniosa proferida por SERGIO FERNANDO MORO foi dirigida a agente público maior de 60 (sessenta) anos de idade.

O denunciado SERGIO FERNANDO MORO emitiu a declaração em público, na presença de várias pessoas, com o conhecimento de que estava sendo gravado por terceiro, o que facilitou a divulgação da afirmação caluniosa, que tornou-se pública em 14 de abril de 2023, ganhando ampla repercussão na imprensa nacional e nas redes sociais da rede mundial de computadores².

Ao atribuir falsamente a prática do crime de corrupção passiva ao Ministro do Supremo Tribunal Federal GILMAR FERREIRA MENDES, o denunciando SERGIO FERNANDO MORO agiu com a nítida intenção de macular a imagem e a honra objetiva do ofendido, tentando descredibilizar a sua atuação como magistrado da mais alta Corte do País.

Comprovadas a materialidade e a autoria em suporte probatório consistente, à míngua de causas excludentes da tipicidade, da antijuridicidade e da culpabilidade ou extintiva da punibilidade, o denunciado SERGIO FERNANDO MORO incorreu na prática do crime de calúnia (artigo 138, caput c/c artigo 141, incisos II, III e IV e § 2º, todos do Código Penal), razão pela qual o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL oferece a presente denúncia e requer:

a) a notificação do denunciado para apresentar resposta preliminar à acusação, no prazo de quinze dias, ao teor do disposto no artigo 4º da Lei n. 8.038/1990;

b) o recebimento da denúncia e a consequente instauração da ação penal, com a citação do acusado para oferecer defesa prévia aos termos da imputação, no prazo cinco dias, conforme estabelecido no art. 8º da Lei n. 8.038/1990;

c) a deflagração da instrução criminal e, ao final, a total procedência da pretensão punitiva para a condenação do denunciado às sanções cominadas ao delito descrito nesta denúncia;

d) com a condenação, a decretação da perda do mandato eletivo de Senador da República pelo Estado do Paraná, caso aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a 4 (quatro) anos, conforme estabelecido no art. 92, inciso I, alínea “b”, do Código Penal;

e) a fixação de valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração penal, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido, nos termos do art. 91, inciso I, do Código Penal e do art. 387, inciso IV, do Código de Processo Penal. Brasília, data da assinatura digital.

LINDÔRA MARIA ARAUJO

VICE-PROCURADORA-GERAL DA REPÚBLICA

VÍTIMA: GILMAR FERREIRA MENDES, brasileiro, Ministro do Supremo Tribunal Federal, com endereço funcional no edifício-sede da Suprema Corte.

________

Notas de rodapé da denúncia:

¹ O denunciando foi eleito para exercer o mandato de Senador da República pelo Estado do Paraná durante as 57ª e 58ª legislaturas (2023-2031). Informação disponível em: <https://www25.senado.leg.br/web/senadores/senador/-/perfil/6331>. Acesso em: 16.4.2023.

² À guisa de ilustração, confira-se: <https://veja.abril.com.br/coluna/radar/em-video-sergio-moro-falaem-compra-de-habeas-corpus-de-gilmar-mendes/>; <https://www.instagram.com/reel/CrBKDFdr6hd/? utm_source=ig_embed&utm_campaign=loading>. Acesso em: 16.4.2023.

[9] Acerca da aplicação da pena privativa de liberdade discorremos alhures, em: MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Execução criminal. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2014. p. 293-353.

[10] HUNGRIA, Nelson. Comentários ao código penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1959. v. 6, p. 44.

[11] Desde o momento em que o causalismo puro restou superado, isso no início do século passado (década de 1930), o elemento vontade não pode ser afastado do conceito de conduta. A pessoa jurídica, portanto, não pode praticar conduta jurídico-criminal. Ela, também, não pratica crime porque não há como verificar o elo subjetivo que liga o autor ao fato em uma pessoa jurídica.

A pessoa jurídica é uma ficção, não sendo detentora de vontade. Ela sequer pode comparecer em Juízo sozinha, devendo ser representada porque incapaz de exprimir sua própria vontade (CPC, art. 12, inciso VI).

Personificamos determinados entes públicos (pessoas jurídicas de direito público) e privados (pessoas jurídicas de direito privado), a fim de tornar possível certas relações na sociedade. Tais pessoas podem ser de Direito interno ou externo (CC, art. 40).

Imagine-se o absurdo que seria a ação criminal movida contra a União por crime. Seria uma posição estapafúrdia em que os entes estatais visariam à imposição de penas a eles próprios, em uma verdadeira confusão. Na hipótese, poder-se-ia até dizer não impossível a criminalização da conduta porque a autolesão é impunível. Em sentido contrário, alguém poderia até sustentar que o ius puniendi é do Estado, pessoa de Direito público que não se confunde com a União. Tal argumento não nos seduz porque quem legisla privativamente em matéria criminal é a União, ou seja, há efetiva confusão entre quem cria crimes e comina penas e a pessoa sujeita à norma criminal, caso se entenda ser a União passível de responsabilidade jurídico-criminal.

O mau agente público, aquele que se vale da máquina estatal para provocar danos sérios à sociedade, poderá ser responsabilizado civil e criminalmente, restando a responsabilidade da pessoa jurídica adstrita à reparação do dano civil. Aliás, a responsabilidade civil das pessoas jurídicas prestadoras de serviços públicos está prevista expressamente prevista no art. 37 da CF, in verbis:

§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Não obstante o exposto, com o advento da CF/1988, passou-se a entender ser possível a responsabilização criminal da pessoa jurídica em matéria ambiental, eis que seu art. 225, § 3º dispõe:

As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas e jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

Assim como João José Leal, entendemos que o dispositivo merece interpretação restritiva. A responsabilidade da pessoa jurídica será administrativa e civil, ficando a responsabilidade criminal adstrita às pessoas físicas.¹

A conduta jurídico-criminal relevante da pessoa jurídica é inexplicável na teoria do crime, bem como sua culpabilidade. Porém, em decorrência do direito anglo-saxão, especialmente da América do Norte, emergiu corrente favorável à criminalização da conduta da pessoa jurídica, o que deu ensejo à criação da Lei n. 9.605/1998.

Entendemos ser necessário respeitar o princípio societas delinquere non potest. Isso decorre do princípio da culpabilidade, agasalhado em nossa CF, por ele nullum crimem sine culpa. Esta, por sua vez, deve ser demonstrada em um devido processo legal. Corroborando, há o preceito do art. 18 do CP, que entende só ser possível a responsabilização pela conduta dolosa, admitindo a responsabilização pela negligência apenas excepcionalmente. Também, o art. 19 entende que a responsabilização por qualquer resultado que especialmente agrava a pena só poderá se dar se ele foi causado, no mínimo, negligentemente.

Os princípios constitucionais norteiam todas as normas infraconstitucionais. Também, as regras gerais do CP devem ser aplicadas à legislação especial, quando não é incompatível com elas (CP, art. 12). Ora, se é necessário respeitar ao princípio da culpabilidade, em face dos preceitos mencionados, não há como pretender ver vontade em uma ficção do Direito. Ainda que entendamos que a pessoa jurídica é uma realidade, é uma realidade jurídica, ou seja, uma ficção do Direito.

Em sentido contrário à nossa posição, Flávio Augusto M. de Barros sustenta:

De acordo com a teoria da ficção jurídica, a pessoa jurídica não tem existência real, não tem vontade própria. Apenas o homem possui aptidão de ser sujeito de direitos. Ora, essa teoria não pode prevalecer, porque, se a pessoa jurídica é uma ficção, o Direito o é, porque emanado de uma pessoa jurídica, isto é, do Estado. Trata-se de uma teoria contraditória, pois, ao mesmo tempo em que nega a vontade à pessoa jurídica, admite que ela adquira direitos.²

O texto transcrito traduz o pensamento do autor acerca da pessoa jurídica no plano criminal. Ele entende que em outros ramos do Direito não há inconveniente porque prevalece a realidade, pela qual a pessoa jurídica é capaz para adquirir direitos.³ Data venia, o autor confunde capacidade de aquisição de direitos com capacidade de exercício.

A pessoa jurídica, assim como o doente mental, não pode ser sujeito ativo de crime. Falta-lhe condição para exprimir sua própria vontade. A realidade, não apreendida por pessoas que pretendem conceber conhecimentos simplistas, vulgares, demonstra que a pessoa jurídica sequer chega ao plano da pessoa física incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se segundo referido entendimento.

Nos planos civil, empresarial, econômico, do consumidor e tributário, criamos mecanismos para atingir terceiros que se valem da pessoa jurídica como instrumento de ilícitos prejudiciais à sociedade (desconsideração da personalidade da pessoa jurídica). Aliás, o CP é claro no sentido de que aquele que se vale de outrem como instrumento de seu delito, responde pelo fato como seu. Com outras palavras, desconsidera-se a personalidade da pessoa jurídica para imprimir a responsabilidade a quem dela se valeu como instrumento de crime.

O princípio de culpabilidade traduz a ideia de que ninguém pode ser punido sem dolo ou negligência. Um doente mental, embora sua capacidade de exprimir a vontade seja limitada, às vezes impossibilitando o conhecimento da ilicitude do fato ou a condução segundo o direito, a tem, ou seja, determina-se visando a um fim. A pessoa jurídica, por sua vez, não tem vontade própria, sempre emanando de outrem.

O Estado, pessoa jurídica de Direito externo, não detém vontade própria. Do mesmo modo, não a detém os entes federados, nem o município (Flávio Augusto propõe a irresponsabilidade criminal dos entes públicos⁵). Ora, criar distinções entre pessoas jurídicas, a fim de que umas não sejam atingidas pela norma criminal, importará negar responsabilidade a algumas, assumindo a ausência de vontade autônoma de cada uma delas. Isso demonstra a insuficiência da construção de referido autor.

Cláudio Brandão piora a perspectiva, uma vez que passa a entender que não somente a ordem ambiental está no âmbito do direito criminal, isso quanto à responsabilidade da pessoa jurídica. Sua posição estende a abrangência ao Direito Econômico uma vez que faz referência ao art. 173, § 5º, da CF.⁶

Mesmo que ampliados os alcances dos preceitos constitucionais mencionados (art. 225, § 3º, e 173, § 5º, ambos da CF), não é possível verificar a possibilidade de culpabilidade da pessoa jurídica. Ela é personificada, mas como ficção, para ser titular de direitos e obrigações, embora o sistema normativo lhe negue capacidade para exprimir sua vontade. Aliás, essa incapacidade é visível em vários momentos, tanto é que se a pessoa jurídica é instrumento de ilícito que cause danos a terceiros, possível é a desconsideração da sua personalidade, alcançando-se seus titulares.

A ação da pessoa jurídica ação da instituição ou ação institucional. Defendendo a responsabilidade criminal da pessoa jurídica, Cláudio Brandão afirma que se fazer uma dupla imputação para o juízo de censurabilidade da ação (que é a culpabilidade). Ao ser humano imputar-se-á uma culpa individual, e à uma pessoa jurídica imputar-se-á uma culpa coletiva, com base na ação institucional.⁷

Lendo Roland Hefendehl, chegamos a conclusão parecida com a de Cláudio Brandão, como se ela traduzisse a ideia de Bernd Schünemann. Ocorre que ao mesmo tempo que, citando Schünemann, Roland Hefendehl procura explicar a responsabilidade criminal de pessoa jurídica, reconhece: “A atribuição de ato de outrem à empresa não é sinônimo de um ato da empresa, nem é a atribuição da culpabilidade de outrem à empresa sinônima da determinação de uma culpabilidade da empresa”.⁸

Para que não haja responsabilidade criminal da empresa, Schünemann apud Hefendehl, estabelece os seguintes critérios de exclusão: 1) ser possível punir o crime com multa; 2) crimes que, pela própria natureza, não podem ser praticados pela empresa, v.g., estupro.⁹

Data venia, se é requisito que o crime seja ser punível com multa, não é necessária a intervenção do Direito Criminal. Administrativamente tal sanção pode ser imposta sem maiores problemas, o que demonstra ser vazia de conteúdo a proposta de se responsabilizar criminalmente a empresa. Ademais, ainda citando Schünemann, referido autor reconhece que é necessário verificar se o ato é da empresa ou de algum dirigente em si, sendo importante verificar níveis administrativos para se poder detectar o que seria ato individual e o que seria ato coletivo (este é o da empresa), o que não está claro ainda, exigindo um aprofundamento que demandará “longo tempo”.¹⁰

Segundo Hefendehl, Schünemann propõe a total quebra dos princípios relativos à culpabilidade nos casos de responsabilidade criminal da pessoa jurídica, invocando a teoria do risco para justificar a responsabilidade pela criação do risco proíbido.¹¹ Essa posição funcionalista é complementada com a ideia, também funcionalista, de que a empresa constitui sistema autopoiético, com objetivos diversos dos objetivos de seus empregados.

A doutrina norte-americana não consegue explicar claramente a culpabilidade da empresa, socorrendo-se da tese do respondeat superior que "permite ao patrão responder", uma explicação doutrinária de influência no Direito, que possibilita que um principal (empregador) ser responsável por ações de seus/suas agentes (empregados) no "curso do emprego". Assim, um agente firma um contrato de compra satisfatório para seu empregador, em nome do empregador, pode criar uma obrigação contratual entre o vendedor e o empregador. Por exemplo: se um motorista de caminhão de distribuição negligentemente atropela uma criança na estrada, a companhia para qual o motorista trabalha será responsável pelo dano.¹²

Essa tese é salutar no âmbito civil. No entanto, ante o princípio da culpabilidade e o princípio da personalidade, em matéria criminal é impossível transferir para o empregador (pessoa jurídica) a responsabilidade pelos atos de seus empregados. É, desse modo, insustentável juridicamente a tese da responsabilidade criminal da pessoa jurídica.

O ato ilícito da pessoa jurídica, no plano criminal, deve ser visto como erro, responsabilizando-se o terceiro que a induziu a erro pelo referido ato, eis que aquela não é capaz de culpabilidade, sendo defeituosa qualquer proposta de adoção do princípio societas delinquere potest. Esse princípio surgiu em substituição ao princípio societas delinquere non potest sob o argumento de há maior pragmatismo em sua adoção, isso em face da evolução da economia. Ocorre que a pessoa jurídica é mero instrumento de pessoas e são estas que devem sofrer a drástica intervenção jurídico-criminal.

Sendo subsidiário, o Direito Criminal deve se afastar daqueles lugares em que as sanções dos outros ramos do Direito representarem coercibilidade suficiente para evitar a prática de ilícitos. Observe-se as penas passíveis de aplicação às pessoas jurídicas, constantes da Lei n. 9.605, de 12.2.1998, em seu art. 21: multa, restrição de direito, prestação de serviços à comunidade (esse é um erro jurídico, uma vez que se trata da pena de prestação pecuniária). Todas essas penas podem ser aplicadas administrativamente, o que afasta a necessidade da responsabilidade criminal da pessoa jurídica.

Alguém poderia dizer que a empresa é partícipe do crime de seus empregados ou dirigentes, o que seria, também, inadmissível, uma vez que ela não teria como aderir à vontade delituosa de seus empregados, esvaziando qualquer tentativa de se falar em concurso de pessoas envolvendo a empresa.

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Citações do texto desta nota de rodapé:

¹ LEAL, João José. Direito penal geral. São Paulo: Atlas, 1999. p. 169.

² BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Direito penal. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. v. 1, p. 111.

³ Ibidem.

⁴ BUSATO, Paulo César, HUAPAYA, Sandro Montes. Introdução ao direito penal. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2003. p. 170-181.

⁵ BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Direito penal. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. v. 1, p. 113.

⁶ BRANDÃO, Cláudio. Teoria jurídica do crime. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 60-61.

Ibidem. p. 62.

⁸ HEFENDEHL, Roland. Corporate criminal liability: model penal code section 2.07 and the development in western legal systems. Disponível em: <https://heinonline.org/HOL/LandingPage?handle=hein.journals/bufcr4&div=12&id=&page=>. Acesso em: 2.10.2003, às 2h05.

⁹ Ibidem.

¹⁰ Ibidem.

¹¹ Ibidem.

¹² Definição disponível em: <https://dictionary.law.com/default.aspx?selected=1827>. Acesso em: 20.11.2003, às 10h10.

[12] HUNGRIA, Nelson. Comentários ao código penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1959. v. 6, p. 48-50.

[13] Ibidem.

[14] DELMANTO, Celso et al. Código penal comentado. 6. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 298, 301 e 305.

[15] COSTA, Álvaro Mayrink da. Direito penal: parte especial. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 391.