quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Vítima de homicídio e executor do crime se apaixonam

Ontem me disseram alguma coisa sobre esse caso. Hoje, ao acessar a rede mundial de computadores, o vi em http://noticias.uol.com.br/cotidiano/2011/09/22/mulher-que-teve-morte-simulada-com-ketchup-na-bahia-recebeu-r-240-pela-encenacao.jhtm (acesso em 22.9.2011, às 8h35), disponibilizando-o a todos:

Mulher que teve morte simulada com ketchup na Bahia recebeu R$ 240 pela encenação

Luiz Francisco
Especial para o UOL Notícias
Em Salvador

  • Rasguei minha camisola, coloquei a faca do lado do braço, ele me amarrou e jogou ketchup em mim, diz vítima de simulação de crime na Bahia "Rasguei minha camisola, coloquei a faca do lado do braço, ele me amarrou e jogou ketchup em mim", diz "vítima" de simulação de crime na Bahia
Um dia depois de a polícia de Pindobaçu, cidade distante 400 km de Salvador (BA), localizada no centro-norte do Estado, desvendar a simulação de um crime que chamou a atenção de toda a cidade, a dona de casa Eronildes Aguiar Araújo disse nesta quarta-feira (21) que recebeu R$ 240 para forjar a própria morte. "Ele [o ex-presidiário Carlos Roberto de Jesus] me contou o caso e teve a ideia de simular. Rasguei minha camisola, coloquei a faca do lado do braço, ele me amarrou e jogou ketchup em mim. Depois, tirou a foto e levou para Nilza [Maria Nilza Simões, a suposta mandante do crime]”, disse Eronildes, em depoimento ao delegado Marconi Lima, responsável pela investigação do caso.

Depois de receber o dinheiro pela simulação, Eronildes ainda brincou com o homem que foi contratado para assassiná-la. "Até debochei dele dizendo que a minha vida era muito barata, só valia R$ 240!", acrescentou. Ainda em seu depoimento, Eronildes contou que Maria Nilza é muito ciumenta. "Ela tinha um ciúme danado de mim e chegou a fazer a proposta para vários rapazes. Ela queria ficar com ele a todo custo", afirmou.

O caso que chamou a atenção da pequena Pindobaçu, cidade com cerca de 20 mil habitantes localizada no centro-norte da Bahia aconteceu em julho, mas foi divulgado somente nesta terça-feira (20), depois que a polícia concluiu a investigação.

Carlos Roberto de Jesus aceitou receber R$ 1.000 para matar Eronildes, mas acabou se apaixonando pela vítima e simulou o crime. Após levar a “vítima” para um matagal, amarrou-a, encharcou o seu corpo de ketchup - utilizou três frascos do produto - e amordaçou a sua boca. Em seguida, fotografou o “cadáver” e mostrou a imagem para Maria Nilza, como prova do crime.

Três dias depois, quando comprava frutas e verduras em uma feira, Maria Nilza encontrou a “vítima e o assassino se beijando”, conforme seu depoimento ao delegado. Surpresa e revoltada por ter sido enganada, Maria Nilza foi à delegacia e acusou o ex-presidiário de roubo. “Aqui [na delegacia], Carlos Roberto abriu o jogo e contou com detalhes tudo o que aconteceu”, disse o delegado.

Como não houve flagrante, os três envolvidos respondem a processos na Justiça em liberdade. Ainda de acordo com o delegado, Maria Nilza está respondendo por ter encomendado o crime; o ex-presidiário, por extorsão, e a “vítima”, por coparticipação.

O caso é sui generis e a solução jurídica apresentada também chama a atenção porque Maria Nilza não responderia por nenhum crime, visto que ela seria apenas partícipe e o Código Penal dispõe: "Art. 31 - O ajuste, a determinação ou instigação e o auxílio, salvo disposição expressa em contrário, não são puníveis, se o crime não chega, pelo menos, a ser tentado".

Com sua conduta, Maria Nilza teria instigado a prática de um delito que sequer chegou à sua fase de execução, o que faz incidir o art. 31 transcrito. Assim, ela não poderá ser punida pelo homicídio outrora objetivado.

Carlos Roberto e Eronildes Aguiar seriam cúmplices, no máximo, de um estelionato, previsto no Código Penal da seguinte maneira: "Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento: Pena - reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa".

A extorsão seria incabível na espécie porque teria que haver violência ou grave ameaça contra Maria Nilsa, o que evidentemente não houve. Veja-se o que o Código Penal prevê sobre a extorsão: "Art. 158 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, e com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar que se faça ou deixar fazer alguma coisa: Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 10 (dez) anos, e multa. § 1º - Se o crime é cometido por duas ou mais pessoas, ou com emprego de arma, aumenta-se a pena de um terço até metade".

Seria absurda a concretização de uma pena majorada por eventual extorsão perpetrada pelo casal. E, embora seja atípico esse tipo de surgimento de relacionamento, só resta desejar felicidades ao casal.

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Lei n. 12.486/2011: confusão entre Direito e religião

Passo a reproduzir o inteiro teor da Lei n. 12.486, de 12.9.2011, a qual tem por ementa: “Inclui o nome do cidadão Pedro Aleixo na galeria dos que foram ungidos pela Nação Brasileira para a Suprema Magistratura”.
A PRESIDENTA DA REPÚBLICA
Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º O cidadão Pedro Aleixo, Vice-Presidente da República impedido de exercer a Presidência em 1969 em desrespeito à Constituição Federal então em vigor, figurará na galeria dos que foram ungidos pela Nação Brasileira para a Suprema Magistratura, para todos os efeitos legais.
Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 12 de setembro de 2011; 190º da Independência e 123º da República.
DILMA ROUSSEFF
Luís Inácio Lucena Adams
A homenagem dá a Pedro Aleixo o status de Membro do STF (nesse sentido, observe-se a elucidativa tramitação legislativa - Disponível em: <http://www6.senado.gov.br/sicon/ListaReferencias.action?codigoBase=4&codigoDocumento=93354>. Acesso em: 13.9.2011, às 21h), criando uma situação em que o eventual chefe de governo (nos impedimentos do Presidente da República) reuniria em si a figura de julgador máximo.

Lamentavelmente, a cada dia se verifica mais e mais o acerto de Fustel de Coulanges. Embora a sua "Cidade Antiga" tenha sido muito criticada, existem elementos históricos suficientes que permitem dizer que o Direito surgiu da religião. A dominação não nasce com o Direito, mas ele é um instrumento para a dominação religiosa.
Ungir com óleo tem profundo significado teológico. Transformar o argumento teológico em norma jurídica é apenas mais uma construção como a do Código Penal, em que a maioria dos preceitos podem ser encontrados no pentateuco (os hebreus eram mais humanos do que nós somos, eis que suas penas eram mais brandas).
A "suprema magistratura" é divina, lembrando Rousseau, que dizia que legisladores e julgadores perfeitos só seriam possíveis se fossem deuses. Aliás, na antiguidade, para ser rei deveria representar um Deus, daí os reis gregos serem filhos de um deus com uma ninfa e entre os hebreus os primeiros reis representarem uma escolha de Deus. Os romanos não foram muito diferentes, eis que, mais tarde, consagraram muito dessa mentalidade do rei augustus e dos diversos deuses gregos. Essa mentalidade atinge até mesmo o cristianismo, em que o único Deus cede lugar à visão de três (divina trindade) e um politeísmo atenuado, pois os santos passaram a ter poderes divinos.
Embora o Advogado-Geral da União tenha assinado a Lei n. 12.486/2011 juntamente com a Presidente Dilma (o feminismo exagerado leva a falar em presidenta, gerenta, clienta etc.), ela pode ser declarada inconstitucional porque contraria o estabelecimento de um Estado laico, embora o preâmbulo da Constituição Federal enuncie que temos um deus. Ter um deus não significa que as normas jurídicas possam se confundir com a religião.
O nível do conhecimento estabelecido como científico não pode permitir confusões absurdas como a concretizada pela nova lei, a qual mistura ciência com o conhecimento teológico.