sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Habermas, Sua “Crítica da Razão Funcionalista” e a Dificuldade Para, sob a Ótica Criminal, Fazer a Proteção de Direitos Fundamentais no Âmbito da União Europeia

1. INTRODUÇÃO
O presente estudo terá por referencial teórico o Cap. V da obra intitulada Teoria da Ação Comunicativa,[1][2] visando a dizer quais são as implicações naturais do consenso que se forma a partir bases religiosas, isso no cenário da União Europeia, mormente diante da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia de 13.12.2007, publicada no Jornal Oficial da União Europeia, edição de 14.12.2007.
A pesquisa será bibliográfica, mas sem prescindir de estudos e notícias publicadas na rede mundial de computadores, até porque o assunto é atual, exigindo uma exposição que vá além dos livros, isso no tocante à dinâmica social e política da sociedade complexa.
É um trabalho jurídico e jusfilosófico a ser apresentado à Universidade Nacional de Lomas de Zamora, um requisito parcial para conclusão da oficina de Direito da Integração, sendo que a bibliografia sucinta se dá unicamente visando a evidenciar a complexidade dos problemas criminais, mormente a partir da experiência vivida no município do Rio de Janeiro, a fim de investigar a única hipótese possível, tendente à responder à seguinte pergunta:
– O consenso decorrente do pensamento religioso terá lugar na legislação criminal da União Europeia de hoje?
Iniciaremos tratando de uma guerra doméstica travada no município do Rio de Janeiro, contextualizando o processo de favelização dos morros cariocas. Depois, será evidenciado o estado de guerra civil que há na cidade, com forte represália estatal à atuação dos “traficantes”, sem deixar de enfrentar a incoerência de verificar uma pacificação que é feita por uma polícia que tem por símbolo uma faca cravada na cabeça de uma caveira.
Da guerra interna do Brasil, a análise se deslocará para a abordagem de grupos terroristas europeus (E.T.A. e I.R.A.), tratando das dificuldades que a falta de identidade nacional ou religiosa podem apresentar.
Será necessário associar o estudo ao pensamento habermasiano, o qual é complexo. Todavia, a opção foi pelo Cap. V do seu livro intitulado Teoria da Ação Comunicativa.
A análise do referido Cap. V será detalhada procurando evidenciar a interpretação que é feita por Habermas às teorias funcionalistas de Mead e de Durkheim. Daí iniciarmos pela introdução exposta por Habermas acerca da mudança de paradigma em Mead e Durkheim. Nessa introdução serão inseridas algumas considerações sobre a globalização e os riscos que ela apresenta.
Será exposto o que Habermas entende por socialização convencional, a partir de Mead, pensador que desenvolveu sua teoria funcionalista a partir de aspectos linguísticos, com especiação preocupação havida na comunicação havida entre o I e o Me.
Não poderá ser afastada a larga incursão que Habermas faz no pensamento de Durkheim, enfocando o ponto central da proposta funcionalista deste, que é um consenso normativo, feito a partir das práticas religiosas. Nesse ponto, Habermas vê um ponto comum entre Durkheim e Mead.
Em face da importância, haverá uma rápida incursão sobre forças ilocucionárias que as distintas línguas, culturas ou desastres históricos determinam, isso sem afetar as pretensões de validade estabelecidas linguísticamente.
A tradução opta por uma linguagem própria da Psicologia clínica, fazendo referência ao ego, ao superego e ao id, o que será objeto de críticas porque a proposta de Freud distanciava-se da perspectiva clínica.[3]
As “aura de deslumbramento e espanto que o sacro irradia, a força fascinante do santo se sublima ao se tornar cotidiano e converter-se na força vinculante de pretensões de validade suscetíveis de críticas” serão explicadas em cinco frentes: (I) evolução histórica e transformação do Direito, a partir da mudança da forma de integração social, tudo com fundamento em Durkheim; (II) Ainda baseado em Durkheim, busca-se esclarecer a lógica da transformação na forma de integração social; (III) Tentativa de ilustrar o pensamento de Durkheim, a partir das considerações de Mead sobre a ética do discurso; (IV) O diagnóstico de Mead sobre o progresso da individualização, impossível de ser contido, oferece um bom ponto de apoio para o discurso sobre a identidade e identificação; (V) Algumas reservas de Habermas contra as tendências idealistas e formalistas da teoria da sociedade de Mead.
A Carta de Direitos Humanos da União Europeia, de 13.12.2007, será objeto de análise. Porém, previamente, será desenvolvida uma seção sobre direitos fundamentais, terrorismo e Direito penal do inimigo, visando a contextualizar o assunto.
Serão comentados os direitos humanos constantes da Carta, a partir da dignidade do ser humano, objeto do seu Título I. Cada artigo que versa sobre a dignidade será comentado, havendo a transcrição de cada um dos cinco primeiros artigos da Carta.
No tocante às liberdades, será feita uma sucinta introdução e a transcrição do Título II da Carta. Depois, mediante sucinto comentário a cada um dos artigos considerar-se-á encerrada a matéria.
O Título III da Carta versa sobre a igualdade, razão de ser oportuna a inserção de algumas considerações garantistas sobre a igualdade. Será transcrito todo Título III apenas como notícia do seu conteudo, visto que o cerne do presente trabalho será a matéria diretamente ligada ao assunto criminal.
Menor será a preocupação com os Títulos IV e V da Carta, os quais versam sobre solidariedade e cidadania. Destarte, seus inteiros teores serão transcritos, apenas para permitir conhecer seus conteudos.
O Título VI terá especial estudo porque enuncia direitos fundamentais adstritos às matérias criminal e processual. Daí ser enfrentada a questão sobre a ação e ao tribunal imparcial.
O estudo do referido capítulo não ensejará a transcrição de todos artigos, mas eles serão estudados separadamente, razão de destacar a presunção de inocência e o direito de defesa, bem como legalidade e proporcionalidade. A seguir será apreciado o non bis in idem.
Serão feitas breves considerações sobres as disposições gerais, as quais disciplinam a interpretação e aplicação da Carta. Também como notícia do conteúdo, o Título VII será transcrito.
Finalmente, será elaborada uma conclusão em que se fará um fechamento final do texto, visando a tornar possível entender o porquê da escolha de determinados temas para discutir as dificuldades encontradas para, sob a ótica criminal, efetivar a defesa dos direitos humanos na União Europeia.
2. UMA GUERRA DOMÉSTICA
2.1 Processo de favelização
Desde os gregos e romanos antigos que se construiu a idéia de que as construções nas encostas dos morros é coisa da plebe. O culto era detido pela família, sendo que cada uma delas tinha um Deus, o qual era objeto de sucessão mortis causa em favor do primogênito.[4]
O Brasil foi colonizado por Portugal, sendo que a família real, no ano de 1.808, fugindo de invasão francesa, instalou-se na cidade do Rio de Janeiro (naquele momento, o município tinha 60.000 habitantes). Ela trouxe consigo 15.000 pessoas e, em um gesto arbitrário, foi determinada a inscrição “P.R.” (Príncipe Regente) nas portas de casas que deveriam ser desocupadas. Daí o povo carioca de então brincar dizendo que as iniciais significavam “ponha-se na rua” ou “prédio roubado”.
Os moradores das casas esbulhadas pela comitiva da família real, com vidas estabelecidas nas proximidades das suas residências, foram para bairros distantes ou ocuparam as encostas dos morros próximos. Tal processo de favelização, com a total ausência do Estado, foi intensificado ao longo dos anos. Hoje, o Rio de Janeiro tem favelas muito populosas em que a criminalidade violenta é elevada, o que já foi objeto de vários estudos sociológicos.[5]
2.2 Guerra civil no município do Rio de Janeiro
No dia 28.11.2010, a polícia invadiu o Complexo do Alemão, formado por 14 favelas. Os fatos são amplamente divulgados na imprensa nacional e estrangeira, visto que o Rio de Janeiro vive verdadeiro estado de guerra civil. Isso tem autorizado os mais diversos arbítrios do Estado, facilmente perceptíveis pelas imagens que a “polícia pacificadora”, por meio da Rede Globo de Televisão, divulga ao povo brasileiro, ovacionando a ação de segurança, a qual conta com tanques de combate da Marinha do Brasil e do Exército Brasileiro, além dos carros blindados da Polícia Militar, apelidados de “caveirões”.
As palavras “bandido” e “traficante”, nos meios de comunicação de massa do Brasil, passaram a ser sinônimas e, contraditoriamente, a “polícia pacificadora” tem por símbolo a “faca na caveira”, contradição que foi criticada até pelo ator estadunidense Silvester Stalone.[6]
Pessoas que portam alguns litros de produtos inflamáveis (álcool, gasolina etc.) são presas porque uma das condutas próprias dos “bandidos” (ou “traficantes”) é queimar veículos. Também, quem é procurado por ter mandado de prisão contra si, ainda que seja provisória, e for preso durante as operações, caso a imprensa o classifique como líder, “segurança do chefe” etc. será transferido para presídios federais distantes.
Muitos presos (ainda que provisórios) são transferidos para Rondônia, um Estado que fica a mais de 4.000 km do município do Rio de Janeiro. A mídia, por sua vez, critica o Juiz Federal que não autorizou a gravação de conversas dos presos com seus advogados, elogiando o de outro Estado, Paraná, por ter autorizado tal medida ilegal.[7] Isso evidencia um desejo popular, em favor do Direito penal do inimigo (este por merecer crítica mais aprofundada, será objeto de análise adiante).
3. CONFLITOS NA UNIÃO EUROPEIA
3.1 Importância da identidade nacional
O ideal é que os Estados sejam constituidos por povos que manifestem vontades nacionais únicas. No entanto, são poucos os se formam a partir de uma única nação e, portanto, são raros aqueles que não manifestam vontades completamente divergentes e que não unem vários pensamentos contraditórios.
O wilkipedia, formado a partir de postagens de pessoas que se interessam em contribuir para o seu desenvolvimento, fez uma feliz postagem do significado da palavra “nação”, in verbis:
Nação, do latim natio, de natus (nascido), é a reunião de pessoas, geralmente do mesmo grupo étnico, falando o mesmo idioma e tendo os mesmos costumes, formando, assim, um povo, cujos elementos componentes trazem consigo as mesmas características étnicas e se mantêm unidos pelos hábitos, tradições, religião, língua e consciência nacional.
Mas, a rigor, os elementos território, língua, religião, costumes e tradição, por si sós, não constituem o caráter da nação. São requisitos secundários, que se integram na sua formação. O elemento dominante, que se mostra condição subjetiva para a evidência de uma nação assenta no vínculo que une estes indivíduos, determinando entre eles a convicção de um querer viver coletivo. É, assim, a consciência de sua nacionalidade, em virtude da qual se sentem constituindo um organismo ou um agrupamento, distinto de qualquer outro, com vida própria, interesses especiais e necessidades peculiares.[8]
No início, a definição transcrita peca por inserir palavras com sentidos jurídicos diversos (exemplo disso é a confusão implícita entre povo e nação), mas corrige seu equívoco ao evidenciar, no segundo parágrafo, o fundamental da ideia de nação. Isso significa dizer que o importante é a identidade formada entre pessoas, mormente a partir da etinia e de costumes, criando expectativas comuns.
Os Estados da África e do Oriente Médio, a partir da orientação e Churchill, tiveram seus territórios organizados de uma maneira que levou à separação de efetivas nações e à reunião de nações inimigas no mesmo território.[9] Isso é causa de conflitos potenciais, os quais são intensificados por divergências religiosas, fazendo eclodir ataques terroristas e até mesmo guerras estas em nome da paz.
3.2 O E.T.A. e o I.R.A.
O ETA (Euzkadi Ta Azkatasuna = Pátria basca e liberdade), iniciado em 1959, busca a autonomia do povo basco perante a Espanha.[10] Aí se pode verificar certa proximidade com o problema brasileiro, no que respeita ao fato de afetar assuntos internos, mas com repercussões internacionais. É um grupo armado que já fez vários ataques terroristas, podendo ser destacados:
1968
7 de junho: O ETA comete o primeiro assassinato desde sua criação, há nove anos. A vítima é Meliton Manzanas, chefe de polícia na cidade basca de San Sebastian.
1973
20 de dezembro: ETA mata o primeiro-ministro, o almirante Luis Carrero Blanco, com um ataque a bomba em Madri.
1974
12 de setembro: Em seu primeiro ataque de grandes proporções, o ETA mata 12 pessoas com uma bomba em uma cafeteria de Madri.
1980
No ano mais violento desde sua criação, o ETA mata ao menos 91 pessoas em diversos ataques apesar do retorno da democracia no país. Cerca de metade das vítimas são civis.
1985
Setembro: Ataque a bomba em Madri mata um turista americano e deixa 16 agentes da Guarda Civil feridos.
1986
Julho: Doze membros da Guarda Civil são mortos em Madri e outros 50 ficam feridos. Em 2000, Juan Manuel Soares, membro do grupo separatista, é condenado a 1.401 anos de cadeia pelos assassinatos.
1987
19 de junho: O ataque mais violento do ETA deixa 21 mortos e 45 feridos. O grupo colocou um carro-bomba em um estacionamento da loja de departamento Hipercor. Mais tarde, o ETA pediu desculpas pelo ataque.
1995
19 de abril: Um atentado com carro-bomba contra o líder da oposição conservadora e futuro premiê, Jose Maria Aznar, fracassa.
1997
Julho: ETA sequestra o político Miguel Angel Blanco e exige a libertação de prisioneiros do grupo de prisões bascas. O assassinato de Blanco incita violentos distúrbios por toda Espanha.
2000
21 de novembro: O ex-ministro da Saúde socialista Ernest Lluch é morto a tiros em Barcelona.
2004
11 de março: Atentados contra trens em Madri deixam 191 mortos em um ataque atribuído inicialmente ao ETA, mas assumido posteriormente por grupos islâmicos radicais.
2006
30 de dezembro: ETA rompe trégua declarada meses antes com um atentado com carro-bomba no aeroporto Barajas, em Madri. O ataque deixou dois equatorianos mortos.
2007
1º de dezembro: Ataque atribuído ao ETA deixa dois policiais da Guarda Civil espanhola mortos. Eles trabalhavam disfarçados na França.
2008
7 de março: Isaias Carrasco, ex-conselheiro do Partido Socialista, é morto em Mondragon dois dias antes da eleição nacional. ETA assume responsabilidade.
14 de maio: ETA mata um agente da Guarda Civil em um atentado a bomba na cidade basca de Legutiano.
30 de outubro: Um carro-bomba explode na Universidade de Navarra, no norte da Espanha, ferindo 17 pessoas. o ETA ligou antes para avisar da explosão.
5 de novembro: ETA assume responsabilidade por 10 explosões e diz que pressionará ainda mais as autoridades pelos direitos dos bascos.
3 de dezembro: Ignacio Uria, dono da companhia de construção Altuna e Uria, que construía um trem de alta velocidade, é morto a tiros em Azpeitia. Em 21 de janeiro de 2009, o grupo assume a responsabilidade pelo assassinato e ameaça outros que trabalham no projeto.
2009
19 de junho: ETA mata Eduardo Puelles, policial que investigou a organização.[11]
O E.T.A. é objeto da preocupação mundial porque uma sociedade economicamente globalizada é interdependente e, também, a aldeia global que se forma a partir da comunicação traz a rapidez de informações, aumenta o simbolismo e, portanto, os efeitos desastrosos dos ataques terroristas.
Por sua vez, o I.R.A. (decorrente de Irish Republican Army = Exército Republicano Irlandês) foi um dos mais ativos grupos terroristas do Século XX, sendo responsável por mais de 35.000 mortes. Embora o I.R.A. tenha declarado, em 2.005, a cessação de operações armadas, ataques posteriores suscitam a dúvida e afirma-se que tal declaração provocou um racha na facção em três.[12]
O I.R.A. encontra fundamentação religiosa, o qual encontrou um discurso político para a amparar seu desejo de impor o domínio cristão protestante à minoria católica da Irlanda do Norte. Daí o grupo buscar a libertação da Irlanda do Norte e fugir do domínio da Inglaterra.
4. ASSOCIANDO O ESTUDO AO PENSAMENTO HABERMASIANO
4.1 Generalidades
O pensamento habermasiano é complexo, esta é uma consideração unânime de que faz referência ao autor.[13] Ele parte da relação havida entre os diversos (sub)sistemas da sociedade complexa para concluir que Direito é comunicação e esta só é possível na sociedade.
A produção científica de Jürgen Habermas é vasta, sendo que a base do seu pensamento está na obra intitulada Teoria do Agir Comunicativo, a qual foi desenvolvida em dois tomos, os quais foram reunidos em um único volume que servirá de base ao presente texto.[14]
Os quatros primeiros capítulos são objeto do primeiro tomo do livro, sendo que a minha opção por abordar o Cap. V decorre da minha preocupação maior no momento, que é a elaboração da minha tese de doutorado, a qual tem como cerne os direitos e garantias individuais perante o funcionalismo.
É complicado falar do Direito de Integração à luz da posição habermasiana porque ele parte de um consenso pressuposto. É certo que os blocos econômicos partem de um ideal de consenso para fortalecimento de uma determinada área, mas em conflitos potenciais variados.
Neste texto, buscar-se-á fazer a análise da proposta de consenso com fundamento nas proposições de Habermas, a partir de Mead e de Durkheim. Com isso, objetivar-se-á esclarecer o que dificulta a defesa de direitos fundamentais no Direito da integração.
O Direito de integração (ou comunitário) foge do tradicional Direito internacional, não sendo apenas público ou privado, mas os dois. Suas normas primárias são as decisões supranacionais, como as do Parlamento Europeu, podendo derivar normas secundárias, estas expedidas pelos Estados participantes do bloco.
As normas supranacionais do Direito comunitário são autoaplicáveis aos Estados partes do bloco econômico, não dependendo de ratificação como ocorre com os tratados do Direito internacional.
4.2 A mudança de paradigma em Mead e Durkheim
4.2.1 Introdução exposta por Habermas e globalização
A análise não pode ser feita satisfatoriamente valendo-se dos meios conceituais da filosofia da consciência. Interessa inicialmente George Herbert Mead (1863-1931) e Emile Durkheim (1858-1917). Estes, igualmente a Max Weber (1864-1920), são os pais fundadores da Sociologia moderna, liberando-a das aporias da filosofia da consciência (Mead em termos da teoria da comunicação e Durkheim com a teoria da solidariedade social).[15]
Habermas afirma que Adorno quedou-se prisioneiro do pensamento de Hegel, limitando-se a circunscrever em termos de dialética negativa, razão de recorrer a Mead, o que projeta uma comunidade ideal de comunicação. A reprodução da sociedade em seu conjunto não pode elucidar-se suficientemente a partir das condições da racionalidade comunicativa, mas isso não é óbice para estudar essas condições de reprodução simbólica da vida dos grupos sociais, a partir de sua própria perspectiva interna.[16]
Do ponto de vista deste trabalho, não se pode pretender perspectiva interna global porque a globalização é preocupante, uma vez que pode levar a um novo processo de colonização. Nesse sentido, expusemos alhures:
Introduzir o Brasil na ALCA, o bloco econômico que instituiria um mercado livre em todas as Américas, seria o caos. O tiro fatal que retiraria a nossa soberania e o pouco que resta de nossa dignidade, tendo em vista que não exportaríamos nada e importaríamos tudo que é economicamente lucrativo para as economias mais poderosas do bloco que, no caso, não somos nós. Aumentaríamos nossa dívida externa, não teríamos controle sobre nossas necessidades básicas, enfim, estaríamos fadados à escravidão.
Em decorrência das razões expostas, temos nos manifestado, inclusive no CADE, contra a crença absurda de que um País, para se desenvolver, necessita aderir integralmente à globalização. Ela é um fato inevitável, mas que deve ser admitida com o devido controle.[17]
A sociedade, mesmo se considerada só a de um país, não pode ter uma única perspectiva interna. O exemplo que trata da guerra civil do Brasil demonstra que um mesmo país tem culturas diversas. Isso se intensifica com a situação da Espanha, que enfrenta o E.T.A. Caminha para algo de maior amplitude territorial, na Grã Betanha, com o I.R.A.
Um processo de globalização encerra a reunião de muitos Estados, reunindo culturas diferentes, com potenciais econômicos diversos. Daí a oportunidade para a seguinte crítica:
Parece-me que a globalização, como vem sendo proposta, nega a cidadania e os direitos humanos, desrespeita os direitos dos povos, é uma forma moderna de colonialismo, desserve a solidariedade internacional e a paz.[18]
Tais aspectos levam a duvidar da possibilidade de se verificar o consenso proposto por Habermas, acerca dos diversos grupos sociais, a partir das suas perspectivas internas.
4.2.2 Socialização convencional
O modelo sujeito-objeto da filosofia da consciência foi atacada por princípios da filosofia analítica da linguagem e por parte da Psicologia do Comportamento. Ambas renunciam um acesso direto aos fenômenos da consciência e o saber-se intuitivo, a reflexão e a introspecção, por procedimentos que não apela à intuição.
Impõe-se voltar à teoria de Mead porque o ponto de intersecções das duas tradições de críticas à filosofia da consciência. E, acerca da linguagem, cita Mead: “En el hombre la diferenciación funcional a través del lenguaje da lugar a un princípio de organización completamente diferente que produce no solamente un tipo distinto de individuos, sino también una sociedad distinta”.[19]
Mead denominou sua teoria de “behavorismo social”. Ele rechaça o individualismo metodológico e o objetivismo da teoria do comportamento.[20] Em Mead só interessam os signos linguísticos e signos logomórficos  enquanto elementos mediadores das interações, das formas de comportamento e das ações de uma pluralidade de pessoas.
A mudança de paradigma que se põe em marcha na psicologia social de Mead é de interesse porque põe em perspectiva um conceito comunicativo de racionalidade.
Mead analisa as características estruturais da interação mediata simbólica, a qual decorre de desenvolvimento cíclico (elíptico).[21] Os signos linguísticos podem ser substituidos por sinais logomórficos, mas não linguísticos, por símbolos fabricados (como o toque de tambor), assim como gestos podem importar ações significantes. Podendo-se verificar comunicações por gestos, ainda que não estejam previamente convencionados.[22]
Mead verifica, geneticamente, o que denominou de significado objetivo ou natural, o que se verifica complexos funcionalismos dos animais. Então, o autor persegue as diversas e sucessivas modificações que tangenciam os entornos específicos de cada classe.[23]
A comunicação se inicia por gestos, decorrendo convenções e sinais linguísticos mediatos. Daí Habermas mencionar Piaget, a quem atribui um processo de interiorização de signos, e Freud, o qual propõe a internacionalização de relações com com um objeto social, com uma pessoa de referência (abandonada). Porém, Mead não adota postura reflexiva porque o sujeito se converte objeto de si, em que reconhece como válido o objeto externo.[24]
Habermas diz que Mead adota modelo já preconizado por Santo Agostinho em que o pensamento se apresenta como diálogo levado ao interior. Cita Mead para afirmar que é possível ver que a relação intersubjetiva entre participantes na interação, que adotam uma atitude de uns frente aos outros e tomam postura reciprocamente frente às suas respectivas emissões, se reproduz na estrutura da relação de cada um consigo mesmo.[25] Mas, informa que a “ideia básica de Mead é simples” e que este está convencido de que pode explicar a gênese dos significados que sejam idênticos ao menos para os participantes da interação.[26]
Ainda discorrendo sobre Mead, Habermas faz referência a Wittgenstein para dizer que entre a identidade e a validade da regra há uma conexão sistemática, na medida que uma pessoa não poderá estar segura de estar cumprindo uma regra se o seu comportamento não for exposto à crítica de terceira pessoa.[27] Tal exposição é utilizada para dizer que Mead descreve vagamente o lugar evolutivo em que aparecem as interações mediadas simbolicamente.[28]
Mead não prestou atenção à estrutura sugestiva da linguagem, mas a analisou sob o ponto de vista da psicologia da percepção a estrutura cognitiva da experiência, subjacente à formação da proposição. Ele segue a teoria pragmática de que os esquemas de percepção de objetos permanentes se formam na interação de olhos e mãos para realização de nossos propósitos, ante os impedimentos para o trato com objetos físicos. Mas, acima de tudo, Mead insiste no caráter social da percepção.[29]
A partir de Mead, Habermas discorre sobre a construção social da criança, tratando de padrões de comportamentos que a leva à formação de uma identidade, decorrente de um processo de socialização.[30] Outrossim, informa que Mead faz relação entre a comunicação de humanos e a de insetos, bem como a daqueles com vertebrados, concluindo invariavelmente que a linguagem de sinais resulta sempre em um novo tipo de socialização.[31]
Habermas afirma que Mead adota a idéia do “outro generalizado”, concebido segundo padrões morais determinantes de condutas, mas critica tal posição para dizer que não há uma sanção imposta pelo “outro generalizado”, mas um consenso determinante de novo padrão de comportamento. Nesse ponto, faz incursão no pensamento de Durkheim, mas dizendo ser insuficiente sua análise sobre o nexo da comunicação.[32]
A incursão que Habermas faz no pensamento de Durkheim é larga, enfocando o ponto central da proposta funcionalista deste, que é um consenso normativo, mas o faz a partir das práticas religiosas.[33] No entanto, o que se verifica é que Habermas utiliza a linguagem para, adotando os fundamentos de Mead, discordar dele e criar um postulado de consenso.
Habermas se olvidou de importantes pensadores e livros do Século XIX ao afirmar que a evolução do Direito se deu com a obra de Durkheim intitulada Da Divisão do Trabalho Social. Com Rousseau se inaugurou a preocupação moderna do Direito com os aspectos sociais. A investigação passou por Augusto Comte e não pode, evidentemente, ter iniciado em Durkheim.
A opção por discutir a posição Durkheim não pode ser objeto de críticas, mas as conclusões de Habermas merecem análise. Nesse ponto, a complexidade do pensamento habermasiano se perde nele mesmo. Não há ponto referencial ou de observação em sua análise, a qual se limita a criticar a limitação de Mead e de Durkheim.
Fazendo a correlação com o pensamento de Durkheim, Habermas informa que a identidade coletiva, em Mead, é espiritual, a qual é mantida pelo ritual. E, embora os símbolos linguísticos não possam evidenciar a realidade e possam manipulá-la, o desenvolvimento de tais símbolos faz com que as funções de dominação e adaptação dos símbolos religiosos se transmutem para outras funções, não mais inatas, mas dinâmicos e em constante desenvolvimento.[34]
Habermas propõe que a consciência coletiva é consenso. Nesse ponto, afirma que Durkheim diz que todas as grandes instituições tem origem no espírito da religião, o que, para Habermas, só pode significar a fundamentação moral sacra.[35]
É a dificuldade que Durkheim encontra para fazer a relação entre a identidade do grupo e a identidade dos seus membros que faz com que Habermas retorne sua análise à Mead, a partir da sua relação entre o I e o Me, dizendo que o núcleo da consciência coletiva constitui um consenso normativo que se produz e regenera nas práticas rituais de fé.[36]
Durkheim diz que há uma validade normativa das instituições a partir do consenso normativo básico ligado aos símbolos religiosos e uma identidade pessoal dos membros do grupo, a partir da identidade coletiva expressada por tais símbolos. Para Habermas, uma análise mais detalhada leva a ver função mediadora na comunicação linguística.
Para Habermas, “el concepto de verdad sólo puede tomar del concepto de validez normativa la nota de un carácter impersonal sustraído al tiempo, de un acuerdo idealizado, de una intersubjetividad referida a una comunidad ideal de comunicación”.[37]
Devemos ter em conta que a diferenciação da validade normativa ou validade da norma (Normgeltung) se produz na medida que a autoridade moral se desliga dos fundamentos sacros e se e se dividem em, por um lado, validade social das normas faticamente reconhecidas e, por outro, validade ideal das normas que mereceriam ser reconhecidas. No curso deste processo, os aspectos formais da validade deontológica, os aspectos formais da validade deontológica ou validade ideal das normas que mereceriam ser reconhecidas (Solgeltung) se separam dos aspectos materiais dos valores culturais incorporados nas distintas formas de vida.[38]
As margens de variação na formação de forças ilocucionárias, que as distintas línguas, culturas ou desastres históricos determinam, não afetam o fato fundamental de que com o nível de interação que representa a comunicação linguística diferenciada com que os participantes da interação cobram a liberdade de responder com um “sim” ou com um “não” às pretensões de validade.
Não é rara a referência às forças ilocucionárias. Daí ser oportuno esclarecer um pouco esse tema, apresentando esclarecedora explicação sobre determinados termos:
Austin denominou de “Performativo” as expressões que não são declarações ou descrições já que ao se emitir o proferimento está-se realizando uma ação.
A distinção entre constatativos e performativos foi sendo desmontada à medida que Austin propõe que todos os enunciados possuem qualidades que podem ser vistas como características de constatativos e performativos. Austin argumenta que ambos envolvem julgamento de verdade e falsidade e são felizes ou infelizes em relação às condições em que ocorrem. De modo geral, não podem ser encontradas condições de enunciação que suportem a distinção.
Austin propõe a distinção de três atos que ocorrem ao mesmo tempo num proferimento: o “ato locucionário” que é o ato de dizer certas palavras pertencentes a uma determinada língua; “ato ilocucionário”, a força que é agregada ao ato locucionário. Os performativos são exemplos de atos ilocucionários na medida em que a força ilocucionária depende da existência de uma convenção aceita que estipula que proferir tais palavras em tais circunstâncias, por tais pessoas, tem força de tal ou tal ato. E o ato perlocucionário, ato que consiste na obtenção de um determinado efeito no interlocutor.
Assim, o significado locucionário é essencialmente lingüístico em sua função de significar e referir; o ato ilocucionário, o ato propriamente dito de intencionalidade e o efeito perlocucionário o ato produzido sobre o outro. Uma vez que o foco de análise não é a sentença, mas o ato de emitir um proferimento numa situação lingüística, é fácil ver que declarar é realizar um ato.[39]
No geral, o alter se vê movido a ajustar suas ações às do ego por uma complicada mescla de motivos racionais e motivos empíricos.[40] No entanto, falar em alterego é confundir os verdadeiros termos da Psicologia freudiana, frequentemente invocada por Habermas. Essa é uma crítica que não pode deixar de ser feita ao autor.
O outro em mim (alter) é analisado diante do eu (ego), sendo que Habermas afirma que o diálogo interior, apresentado por Mead, é feito em termos bastante inespecíficos, afirmando que o ego pode , conforme o modelo da autocrítica, colocar-se em relação consigo mesmo como sujeito epistêmico, estabelecendo uma relação cognitivo-intrumental, em face do saber adquirido, que faz com que ele se coloque, em relação consigo mesmo, como um sujeito prático. Este adquire um caráter, um superego, que o coloca como sujeito páthico, apaixonado e passional, que se há destacado frente ao mundo dos fatos e das normas no âmbito particular da subjetividade, ao qual tem acesso privilegiado e que lhe é intuitivamente presente. Porém, para Habermas, falar em três sujeitos pode induzir ao erro.[41]
Habermas entende que colocar-se perante si mesmo, sob a perspectiva da autocrítica, o ego o faz naturalmente sob os três aspectos, não sendo necessário estabelecer uma identificação a posteriori entre essas três relações consigo mesmo. A relação reflexiva consigo mesmo fundamenta a capacidade que tem o autor de responder aos seus atos. O autor responsável por seus atos se comporta criticamente frente a si mesmo em suas ações diretamente moralizáveis e em suas manifestações cognitivas expressivas.[42]
A preocupação em explicar a “aura de deslumbramento e espanto que o sacro irradia, a força fascinante do santo se sublima ao se tornar cotidiano e converter-se na força vinculante de pretensões de validade suscetíveis de críticas”. Para tanto, ele faz uma abordagem em cinco pontos, os quais ele entende estarem devidamente conectados para sustentar sua proposta, a saber:[43]
(I) evolução histórica e transformação do Direito, a partir da mudança da forma de integração social, tudo com fundamento em Durkheim. Afirma que, ao exigir a repressão do delito, não somos nós que queremos nos vingar, mas algo sagrado que sentimos de forma confusa, fora e acima de nós. E, continua apresentando a perspectiva de Durkheim, transferindo para o âmbito privado, dizendo que as oferendas rituais são impostos que se pagam primeiro aos deuses, depois aos sacerdotes e, finalmente, às autoridades do Estado, sendo que os Direitos privados decorrem de concepção religiosa.
O denominado direito de acepção decorre da idéia de que a propriedade é contagiosa. A coisa religiosa que é tocada por outras se apropria destas. Também, as formalidades do contrato decorrem dos ritos sagrados. Assim, a interiorização da moral é acompanhada de uma complementária metamorfose do Direito em um poder imposto de fora, baseado na autoridade do Estado e respaldado pelas sanções do aparato estatal.[44]
A obediência dos membros de uma comunidade jurídica moderna, segundo Durkheim, depende de um núcleo moral porque o sistema jurídico é parte de uma ordem político, com o que iria a pique se esta não pudesse reclamar legitimidade.[45]
Acerca da força do contrato, Durkheim responde à questão sobre o porquê de prevalecer as suas resoluções sobre o fato pactuado, valendo-se do contrato de trabalho, pois este tem caráter obrigatório em virtude da legitimidade das regulações legais a que se subsumem e estas só podem ser consideradas legítimas na medida em que sejam expressão de um interesse geral.[46]
Durkheim não exige justiça material para o Direito formal. Para ele, o caráter obrigatório dos contratos não pode ser deduzido da voluntariedade das partes. A força vinculante de um acordo moral de base sacra somente só pode ser substituida por um acordo moral que expresse racionalmente aquilo a que o simbolismo do santo se apontava sempre: a universalidade do interesse subjacente.[47]
Nas sociedades diferenciadas, a consciência coletiva se encarna no Estado, o qual deve cuidar da legitimidade do poder que monopoliza. O Estado é o órgão especial encarregado de elaborar representações válidas para a coletividade, as quais se distinguem de outras representações coletivas por seu mais alto grau de consciência e reflexão.[48]
Nesse campo de sociedades plurais, a democracia é o caráter que cada dia as sociedades assumem com mais força. A superioridade moral do princípio democrático no estabelecimento de uma formação discursiva da vontade coletiva. A democracia é um regime de reflexão, permitindo aos cidadãos aceitarem as leis do seu país com mais inteligência e menos passividade.[49]
A evolução do Direito, segundo Habermas, é apresentada por Durkheim em conexão com a modificação da forma de integração social, que inclui toda sociedade. Porém, a explicação se desenvolve a partir de abstrações religiosas. E, segundo Habermas, Durkheim não conseguiu escapar das traições da filosofia da história, afirmando que este está muito longe de ter claras as condições metodológicas que irão satisfazer a apreensão descritiva de um processo evolutivo, entendido como um processo de racionalização. Seu moralismo “é um irônico eco do seu positivismo”.[50]
Após discorrer um pouco mais sobre a conexão da evolução do pensamento jurídico com o religioso, isso em Durkheim, Habermas afirma:
La construcción que propongo se apoya, por un lado, en los valores-limites que Durkheim supone para una sociedad totalmente integrada, y, por otro, en los efectos desintegradores que, en virtud de la estructura que hemos analizado, forzosamente tienen los actos de habla, tan pronto como la reproducción simbólica del mundo de la vida queda conectada con la acción comunicativa.[51]
(II) Ainda baseado em Durkheim, busca-se esclarecer a lógica da transformação na forma de integração social. Habermas propõe algo impossível, que é imaginar uma sociedade totalmente integrada. Nela, a religião se esgota em interpretar em conceitos sacros a prática ritual vigente, a qual, por carecer de conteudos cognitivos em sentido estrito, não tem o caráter de uma imagem do mundo.[52]
Em uma sociedade integrada sem fissura alguma, o culto é como uma instituição total que até tal ponto compreende e integra normativamente todas as ações, tanto no seio familiar como no âmbito do trabalho social, que qualquer transgressão das normas se considera sacrilégio.[53]
As estruturas da comunicação linguística comportam virtualmente diferenciação, mas esta só tem lugar para as funções de entendimento, de integração social e de formação da personalidade, dissolvendo o contato simbiótico em que se encontra a religião e a sociedade. A integração social não se realiza diretamente por meio de valores institucionalizados, mas por um reconhecimento intersubjetivo das pretensões de validade que os atos da fala comportam e, da circunstância de que os atos da fala cobrem uma circunstância ilocucionária autônoma, independente dos contextos normativos, se seguem notáveis consequências para a validade e para a aplicação das normas.[54]
A base de validade das normas de ação se transforma na medida em que todo consenso mediado comunicativamente depende de razões. A autoridade do sagrado, sobre a qual as instituições encontram sustentação, perde a validade que tem per se.[55]
Na evolução, a comunidade de fé religiosa é quem torna possível o início da cooperação social, a qual se converte em uma comunidade de comunicação, sujeita à necessidade de cooperar e às coerções que a referida cooperação leva consigo.[56]
O sacro vem sendo determinante para a sociedade na ciência e na arte, onde se recorre à herança da religião. Só uma moral convertida em ética do discurso, fluidificada comunicativamente, pode substituir a autoridade do sagrado. Na ética do discurso se dissolve o núcleo arcaico do normativo e com ela se desgarra o sentido racional da validade normativa.[57]
(III) Tentativa de ilustrar o pensamento de Durkheim, a partir das considerações de Mead sobre a ética do discurso, é o que se segue. Daí Habermas afirmar que Mead parte de uma intuição de que dependem todas teorias morais universalistas, que se valem da proposta de existência de interesse comum ou interesse geral.[58]
Segundo Habermas, para Mead, a universalidade dos nossos juizos, tratada com ênfase por Kant, é a universalidade que se origina no fato de adotar a atitude da comunidade inteira, a atitude de todos os seres racionais. Mas a universalidade de uma norma moral só pode ser um critério de sua validade se o que com ele quer dizer é que as normas universais expressam de forma fundamentada a vontade comum de todos afetados.[59]
Kant e os utilitaristas, na visão de Habermas, trabalham com categorias da filosofia da consciência como os interesses e orientações de valor, reduzindo a estados internos e a episódios privados os motivos e os fins da ação.[60]
Quanto mais se substitui religião pela ação comunicativa na tarefa de suportar o peso da integração social, com mais força hão de fazerem-se sentir sobre a comunidade real de comunicação os efeitos empíricos do ideal de uma sociedade de comunicação, ilimitada e não distorcida. E, à medida que as pretensões de validades normativas se veem remetidas às suas confirmações por um consenso alcançado comunicativamente, impõem-se ao Estado moderno princípios democráticos de formação da vontade coletiva e princípios jurídicos do tipo universalista.[61]
(IV) O diagnóstico de Mead sobre o progresso da individualização, impossível de ser contido, oferece um bom ponto de apoio para o discurso sobre a identidade e identificação. Habermas afirma que a comunidade ideal de comunicação incorpora duas projeções utópicas e distintas ao estabelecer o momento prático-moral e o momento expressivo, pois a atitude do I se coloca em contraste com o Me. A apelação a uma comunidade mais ampla corresponde a um si mesmo mais amplo, um sujeito autônomo capaz de orientar-se em sua ação por princípios universais. Daí Mead falar na ideia de uma sociedade superior.[62]
Segundo Habermas, à comunidade de comunicação corresponde uma identidade do eu que possibilite a autorrealização sobre a base de um comportamento autônomo, afirmando que Mead e Durkheim determinam e definem a identidade dos indivíduos na realização desta com a identidade do grupo a que pertencem. A unidade do coletivo constitui o ponto de referência da comunidade de todos seus membros, a qual se expressa em que estes podem falar de si em primeira pessoa do plural.[63]
A relação entre estes dois mundos (o mundo externo e o interno) se reflete na relação entre dois componentes da identidade, o I e o Me. A primeira instância, o I, representa a entrada da subjetividade da natureza passional, manifestada de forma expressa,e segundo , o Me, caráter,abalados  por papéis sociais. Esses dois conceitos se correspondem de certo modo com as instancias isso e acima do eu, conforme modelo estrutural de Freud.[64]
Um numero qualquer de indivíduos pode ser autônomo exatamente da mesma maneira. Tanto Mead quanto Durkheim demarcam o conceito de identidade e questionam como podem identificar uma pessoa particular. Então, Habermas entende que deve provar o seguinte: a autoidentificação pretendida de efetuar uma pessoa é, de certo modo, condição para que essa pessoa possa ser identificada genérica e numericamente pelas as demais.[65]
Há incursão filológica sobre o I e o Me, bem como sobre o aqui e o perante o eu (tendo em vista a comunicação à distância).[66] Também, enquanto as entidades se caracterizarem e em geral porque um habitante pode dizer acerca de algo, as pessoas pertencem à classe de entidades que podem adotar elas mesmas o papel do habitante e utilizar a expressão “eu” referindo-se a si mesmo.[67]
Naturalmente, o nome por si só não basta. Mas a instituição de colocar nomes faz com que o nome da pessoa funcione como um indicador por ele podendo orientá-los para conseguir dados que possa identificar: data e lugar de nascimento, procedência familiar, estado civil, nacionalidade, religião e etc.[68] Com isso, Mead construiu seu conceito de identidade pessoal em dois níveis, evitando assim uma equivocada em seu conceito de aquisição de identidade.[69]
Para Habermas, deve-se deixar clara a condição de que o conceito da identidade do “eu” não seja uma construção ociosa, senão um conceito que se ajusta em medida às instituições dos membros da sociedade e que cristaliza em expectativas sociais.[70] Segue afirmando:
Si con Durkheim sostenemos que se da una tendencia evolutiva a la lingüistización de lo sacro, tendencia que puede descubrirse en la racionalización de las imágenes del mundo, en la universalización de la moral y del derecho, y también de la individualización progresiva de los sujetos, entonces hay que suponer que el concepto de identidad del yo se ajusta en medida creciente a la autocomprensión que acompaña a la práctica comunicativa cotidiana. Y en tal caso se plantea con toda seriedad la cuestión de si con la nueva etapa de formación de la identidad no han de cambiar también las condiciones y criterios de identidad.[71]
O “eu” reclama que a pessoa, quando fale de se mesma se identifique como alguém diferenciado das demais pessoas. Isso ganha prestígio no mundo ocidental porque a tradição cristã propugna em favor da imortalidade da alma, reafirmando a necessidade da manutenção da individualização, a partir do nome.
(V) Algumas reservas de Habermas contra as tendências idealistas e formalistas da teoria da sociedade de Mead. Inicia-se com a ideia de que a projeção utópica de uma comunidade ideal de comunicação pode conduzir a erro se a mal interpreta como iniciação a uma filosofia da história ou se mal entende o limitado papel metodológico que a lhe pode corresponder. E alerta:
La construcción de un discurso ilimitado y sin distorciones puede servirnos  a lo sumo como un trasfondo sobre el que situar a las sociedades modernas que conocemos, a fin de conseguir que resalten con mayor viveza los difusos contornos de algunas de sus tendencias evolutivas.[72]
Mead pode interpretar certas tendências evolutivas que Durkheim também tem em vista como uma racionalização comunicativa do mundo da vida. A cultura da sociedade e da personalidade se separam. A estrutura racional destas tendências à linguística se coloca em evidência, cada vez mais dependente de atitudes que, quando problematizadas, obrigam a tomar postura com um sim ou um não frente às pretensões de validade suscetíveis de críticas.[73]
Citando Luhmann, afirma que aos aspectos estruturais da evolução social devem contraporem-se os aspectos funcionais da mesma evolução se um não quer se iludir ou enganar-se acerca da impotência da razão comunicativa. Este é hoje o tema predominante na teoria dos sistemas.[74]
Para a análise que é proposta no momento, é oportuna a seguinte afirmação de Habermas:
Los valores culturales, o bien han sido abstraídos en valores formales básicos, como son la igualdad, la libertad, la dignidad humana, etc., o pierden su aura, quedando a merced del resultado de un proceso de entendimiento exento de todo prejuicio. En la cultura de masas, los contenidos valorativos experimentan una deflación que los convierte en componentes estereotípicos a la vez que manipulables, y, en las obras herméticas del arte moderno, quedan subjetivados. Naturalmente, este tipo de separación entre componentes formales y entre componentes normativos y expresivos, sólo puede tener lugar en plano de la cultura, pues en la práctica comunicativa cotidiana, que es donde se deslindan entre sí los mundos de la vida de los diversos colectivos, siguen estando entretejidos, ahora lo mismo que antes, en formas concretas de vida.[75]
Em uma mesma sociedade podem existir culturas diferentes. A insuficiência da teoria sistêmica lumahnniana não reflete a certeza de que o pensamento habermasiano seja infalível.
A judicialização da moral, equivocadamente, pressupõe uma atitude hipotética que possibilita considerar as normas como algo a que podemos outorgar ou negar validade social.[76]
A constatação de Habermas, no sentido de que, desde Aristóteles, o conceito de “bem” ou “bem supremo” encerra a relação, difícil de analisar, entre felicidade e justiça é aspecto de máxima importância porque, segundo Habermas, para que a vida seja bem aproveitada, as identidades individuais não podem contradizer exigências morais, mas sua subsistência mesma, seu conteudo, não é algo que não é suscetível de ser justificado a partir de pontos de vista universalistas.[77]
Tal crítica dependerá de uma análise mais aprofundada porque a pretensão de tornar possível justificar todos os fenômenos por meio de pontos de vista universalistas é pueril ou cândida, uma vez que não se pode ser conformista o suficiente para admitir um sistema que se autoconstroi, que se autorregula etc. Justificar com base no sacro, conforme é feito em Durkheim e Mead, é equivocado, mas isso não autoriza, por si só, vislumbrar total acerto nas teorias sistêmicas.
A segunda reserva é mais radical, isso segundo o próprio Habermas, a qual se dirige contra o idealismo da teoria da sociedade de Mead. A ação comunicativa de Mead é funcional, mas se olvida de setores políticos, tais quais o econômico e o político. Porém, a crítica habermasiana é utópica, visto que afirma:
Pues precisamente por ser cierto que la integración social social ha de venir asegurada en medida creciente por medio de un consenso comunicativamente alcanzado, resulta más urgente preguntarse por los limites de la capacidad integradora de la acción orientada al entendimiento, por los limites de la eficacia empírica de los motivos racionales.[78]
O pensador tudesco encerra sua posição, em favor do pensamento sistêmico, afirmando:
La racionalización del mundo de la vida, en la que el interés de Mead se centra, sólo se hace visible en todo su alcance cuando se la sitúa en el contexto de una história sistémica, contexto que sólo puede resultar accesible a un análisis funcionalista. La teoría de la división del trabajo social de Durkheim ofrece, en cambio, la ventaja de poner las formas de solidaridad social en conexión con la diferenciación estructural del sistema social.[79]
O pensamento de Habermas avançará, passando por Talcott Parsons, mas este não é o objeto de estudo no momento. Aqui, é suficiente dizer que as posições funcionalistas de Mead e Durkheim não  respondem a todos os problemas da sociedade complexa.
5. CARTA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DA UNIÃO EUROPEIA
5.1 Generalidades
A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, de 13.12.2007, foi publicada no Jornal Oficial da União Europeia do dia 14.12.2007. Sua análise não poderá ser feita sem o exame anterior de outras questões que são essenciais.
Há certa resistência à criação de um Direito criminal transnacional porque se criam ficções que não servem ao propósito da proteção efetiva dos direitos humanos no cenário internacional. Mesmo podendo ocorrer maior integração dos Estados num processo de contínua formação de blocos passíveis de desague em um mundo integrado, o Direito criminal nacional será mantido, sendo incabível vislumbrar seriamente um campo de proibições criminais até mesmo entre povos irmãos, como os latino-americanos.[80]
A luta internacional pela defesa dos direitos humanos tem lugar na luta contra o terror, mas há o risco de que tal luta comprometa o aparato civilizatório de direitos humanos, liberdades e garantias, sob o clamor de segurança máxima.[81]
Existem argumentos favoráveis e contrários à instituição de um Direito Penal Europeu. A Corte Europeia de Direitos Humanos tangencia o assunto e a proposta de uma Constituição Europeia se apresenta como solução normativa, mas existem muitos obstáculos fortes. De qualquer modo, está presente a proposta para estruturação de competência compartilhada na União Europeia (uma dela própria e outra do Estado parte).[82]
5.2 Direitos fundamentais, terrorismo e Direito penal do inimigo
A Fundação Abravanel publicou o livro, sendo que é uma instituição sem fins lucrativos que nasceu do intercâmbio de judeus de diversos níveis (profissionais, acadêmicos e periodistas).[83] Em tal obra há uma associação do terrorismo ao narcotráfico,[84] o que é equivocado. O Direito penal do inimigo também comete tal equívoco.[85]
O terrorismo rompe com as regras de confrontação justa ao tender à aniquilação total do outro, isso sem qualquer discurso político, sem busca do diálogo.[86] Também, em concepção terrorista, o Direito penal do inimigo (um “não Direito”) tem a opção pelo autor, apresentando incompatibilidade com o princípio do fato.[87]
O pensamento sistêmico de Habermas é extremamente aberto e, portanto, inseguro. Daí a preferência de enriquecer a análise com alguns aspectos do garantismo.[88]
A Liga das Nações, mediante manifestações de vários especialistas de diversos Estados, sancionou, em 16.11.1937, a Convenção para a Prevenção e Punição do Terrorismo, a qual foi o primeiro instrumento sobre terrorismo internacional, mas que nunca chegou a entrar em vigor.[89] Porém, não há convenção da ONU que estabeleça uma definição completa de terrorismo.[90]
Existem convenções da ONU que procuram prevenir o terrorismo ao mitigar seu impacto e ao criar incentivos para os Estados estabelecerem normas e mecanismos para prevenir e punir o terrorismo.[91] Porém, não se olvide, a todos devem ser assegurados direitos e garantias fundamentais, inclusive aos acusados de terrorismo.
A União Europeia vem trabalhando sobre a questão do terrorismo, tendo editado a Convenção Europeia Sobre a Supressão do Terrorismo, em 21.1.1977, em Estrasburgo. Esta convenção foi emendada em 2.003 e (em face dos ataques terroristas de Madrid, ocorridos em 11.3.2004, e de Londres, concretizados em 7.7.2005) foi novamente alterada no ano de 2.005.
A convenção de 1.977 tem uma previsão que merece destaque, que a inserção de um rol exemplificativo de condutas que sempre serão consideradas como atos de terrorismo, vedando-se considerar infrações políticas, a saber: captura de aeronaves, sequestro e tomada de reféns, utilização de bombas, granadas, foguetes, armas de fogo automáticas ou cartas ou pacotes com explosivos na medida que apresente perigo para pessoas.[92]
A Europa, no início deste século, se viu diante de ameaças significativas porque houve o incremento do potencial terrorista de pessoas e grupos, mormente diante das novas tecnologias desenvolvidas, o que ficou evidenciado diante dos ataques de 11.9.2001. Somente dez dias depois, o Conselho da Europa editou o road map, o qual implementa mais de duzentas medidas concretas de antiterrorismo.
Poucos meses depois, em 27.12.2001, foi editada a “Posição Comum” do Conselho da Europa, como uma declaração de princípios em que se afirmou “que o terrorismo é um verdadeiro insulto grave para o mundo e para a Europa e que a luta contra o terrorismo seria um objetivo prioritário da União Europeia”.[93]
A União Europeia editou a Decisão Marco do Conselho Sobre a Luta Contra o Terrorismo, de 13.6.2002, introduzindo pela primeira vez na história comunitária uma definição comum do delito de terrorismo para todos os Estados membros, obrigando a todos a adotarem nos seus respectivos Códigos Penais.
Os atentados de Madrid (2.004) e de Londres (2005) provocaram a atualização das normas de 2.001, sendo que as últimas muito se assemelharam às anteriores. Porém, a Europa ainda convive com ameaça de várias organizações, tais quais, HAMAS, FARC, ETA, HEZBOLLAH, Conselho Revolucionário Al Fatah, Partido dos Trabalhadores do Kurdistán etc.[94]
O terrorista não deverá merecer morte civil, não sendo razoável dizer que ele não mais pertence ao Estado.[95] Jakobs informa que todo direito está vinculado a uma autorização para emprego da força e a coação mais intensa é a criminal.[96] Porém, isso não pode corresponder a entender como lícitos os abusos estatais. Por isso, não se pode admitir ações desproporcionais em relação às ameaças à segurança que se pretende supostamente combater.[97]
Por oportuno, é conveniente lembrar que a violência estatal é a maior que se pode constatar.[98] É melhor que as normas imponham medidas preventivas de naturezas diversas, ao contrário de se ocuparem unicamente do aspecto criminal.
5.3 Direitos humanos constantes da Carta
5.3.1 Dignidade
Não é razoável dizer que a defesa da dignidade da pessoa humana se esgote apenas em discussões jurídicas. A dignidade da pessoa humana, após pesquisa realizada,[99] pode ser conceituada como o valor de cada pessoa humana poder se firmar com sua própria personalidade e liberdade de ser ela própria, titular de direitos e obrigações que permitam uma vida com padrões mínimos de razoabilidade e aceitabilidade em um Estado de Direito.
A dignidade da pessoa humana, fundamento da República Federativa do Brasil (CF, art. 1º, inc. III) “é um valor supremo que atrai o conteúdo de todos direitos fundamentais do homem”.[100] Conforme ensina Gilmar Ferreira Mendes, os valores vinculados à dignidade da pessoa humana (inviolabilidade da pessoa humana, respeito à sua integridade física e moral, inviolabilidade do direito de imagem e da intimidade) assumem peculiar relevo na ponderação de valores em colisão.[101]
Ante a colidência de direitos fundamentais, a intervenção judicial só se justificará se: (a) ela mostrar-se apta à sobrevivência do interesse contraposto; (b) não existisse solução menos gravosa; (c) o benefício logrado com a restrição a um interesse compensasse o grau de sacrifício imposto ao interesse antagônico.[102]
Conforme ensina Gilmar Ferreira Mendes, “Na condição direitos de defesa, os direitos fundamentais asseguram a esfera da liberdade individual contra interferências ilegítimas do Poder Público”.[103]
5.3.1.1 Dignidade da pessoa humana
Os fundamentos (ou princípios fundamentais) da República Federativa do Brasil incluem, dentre eles, a dignidade da pessoa humana, assim como a Carta da União Europeia prevê em seu art. 1º a tutela da dignidade da pessoa humana.
“Dignidade” é o primeiro título da Carta de Direitos Humanos da União Europeia, daí ser positiva a redação do art. 1º da Carta da União Europeia que dispõe: “A dignidade do ser humano é inviolável. Deve ser respeitada e protegida”.
5.3.1.2 Vida
Dispõe a Carta da União Europeia: “Artigo 2º Direito à vida 1. Todas as pessoas têm direito à vida. 2. Ninguém pode ser condenado à pena de morte, nem executado.”
A proteção da vida, seguramente, teria que incluir a proibição da pena de morte. Esta não é admitida pela União Europeia e por muitos paises, inclusive o Brasil. Porém, na guerra civil do Rio de Janeiro e em muitos atos da polícia brasileira se verificam execuções sumárias justificadas pela simples necessidade da lei e da ordem.
A Europa não está ilesa de tal raciocínio. Jean Charles de Menezes foi morto, em 22.7.2005, a tiros dentro de um metrô de Londres durante uma estúpida ação policial e seu único delito foi o de viver ilegalmente na Inglaterra. Como muitos brasileiros, a vítima do descaso estatal procurou trabalho em Londres e mandava dinheiro para a família. Porém, foi confundida com um terrorista e morreu.
Não é razoável construir um memorial em homenagem a Jean Charles, mas o Chefe da Polícia, Ian Blair, também não tem razão ao dizer que a polícia tinha o dever de atirar em um suspeito que se evadia. Data venia, não existiam elementos concretos de que era um terrorista, mas o homicídio culposo até encontra ambiente propício porque se deu logo em seguida aos ataques terroristas de Jul/2005.[104]
Existe uma corrente que agrupa várias teorias da pena, denominadas absolutas. Tais teorias entendem que a pena é a retribuição do mal ao infrator da lei, uma vez que a infração constitui um mal. Referidas teorias, com motivações distintas, concluem que a maior expressão de justiça está na lei de talião (olho por olho, dente por dente...), eis que respeitada a proporcionalidade.
Imaginemos algumas hipóteses para imposição de pena de morte: 1) Tício matou Caio e ocultou o cadáver para assegurar a impunidade. Descobriu-se que Tício agiu por motivo pouco relevante porque ofendido durante discussão banal de trânsito. Ele desferiu um tiro contra a vítima, matando-a instantaneamente; 2) Mévio matou vinte crianças e retalhou os corpos das vítimas, preparando-os para o consumo. Após devorar metade da carne, foi localizado e descobriu-se que ele era um religioso fanático que pregava a purificação da espécie humana por meio do consumo de carne proveniente de pessoas puras; 4) Semprônio, planejando roubar um banco, nele adentrou e matou seis vigilantes. Foi preso dois anos depois, momento em que morava em suntuosa casa, adquirida com o produto do crime.
Segundo a lei de talião, em nenhum dos casos, haveria justiça porque Tício será morto mediante tortura mental, haja vista que suportará o processo e aguardará execução premeditada, maior, portanto, que o mal por ele praticado. Em outros casos, a pena seria desproporcional por ser menor que o mal praticado pelo infrator da lei.
Não haveria proporção na morte de Mévio porque ele poderia ser um doente e, assim, ao contrário de pena, mereceria tratamento. Também, caso fosse Mévio efetivamente o monstro que se imagina, ante tão cruel hipótese, sua pena deveria ocorrer por várias vezes, mas isso apenas nos reduziria ao período bárbaro, já experimentado e sem sucesso no combate à criminalidade.
No caso de Semprônio, estar o agente se usufruindo do produto do crime não torna as mortes das vítimas mais dolorosas, não havendo a menor condição de se afirmar que há proporcionalidade entre a conduta de Semprônio e a pena de morte que lhe foi imposta e executada.
A discussão sobre a pena de morte deve passar pela proporcionalidade. Não havendo proporcionalidade, não se pode falar em pena justa. Também, não parece razoável a posição simplista exposta no sentido de que “foi pouco”. Ora, se é “pouco”, é desproporcional, portanto, a pena é injusta, ou seja, ao contrário de justificar a lei de talião e as teorias absolutas, deixa-as desmascaradas.
5.3.1.3 Integridade física e mental
Dispõe o art. 3º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia:
Direito à integridade do ser humano
1. Todas as pessoas têm direito ao respeito pela sua integridade física e mental. 2. No domínio da medicina e da biologia, devem ser respeitados, designadamente: a) O consentimento livre e esclarecido da pessoa, nos termos da lei; b) A proibição das práticas eugênicas, nomeadamente das que têm por finalidade a seleção das pessoas; c) A proibição de transformar o corpo humano ou as suas partes, enquanto tais, numa fonte de lucro; d) A proibição da clonagem reprodutiva dos seres humanos.
Não serão objetos de análise as questões relativas à bioética constantes do § 2º do art. 3º transcrito, até porque encerram questões valorativas que fogem à discussão jurídica que aqui pretende ser mantida, sendo oportuno dizer que o Direito, neste trabalho, é visto como ciência, exigindo o reconhecimento das limitações da fragmentariedade do conhecimento científico.
No Brasil, a ofensa dolosa ou negligente à integridade corporal ou mental constitui crime de lesão corporal (Código Penal, art. 129). Essa proteção é feita pelos diversos códigos penais existentes no mundo e a União Europeia, conforme transcrito, teve especial preocupação com a integridade física e mental do ser humano.
A proteção é importante porque afirma a proibição de se instituir as penas corporais de mutilação, castração etc. Todavia, é crescente a castração química, a ser imposta aos estupradores.
Alguns Estados admitem a castração química, embora ela seja uma pena cruel. Ocorre que em alguns lugares, como na Província de Mendonza, Argentina, fala-se em castração química voluntária, em que o condenado terá a pena reduzida ou maior facilidade para obtenção de benefícios (livramento condicional, progressão de regimes etc.) se aceitar a medida.
A castração química se caracteriza pela aplicação de medicamentos que diminuem o desejo sexual. A República Tcheca e a Espanha são exemplos de Estados partes da União Europeia que admitem a castração química, não obstante a previsão do art. 3º da Carta em comento.
5.3.1.4 Proibição da tortura e de tratos ou penas desumanas
A tortura já foi largamente utilizada no processo criminal, mormente entre os povos bárbaros. Nestes povos, o processo se baseava nas ordálias (ou juízo de Deus), dando grande prestígio à confissão ( a rainha das provas).
No atual estágio de civilização humana não há espaço para tais espécies de provas, mormente na Europa, sendo oportuno o que consta do art. 4º: “Ninguém pode ser submetido à tortura, nem a tratos ou penas desumanos ou degradantes”.
O Poder Judiciário está vinculado aos direitos fundamentais. No Brasil, por exemplo, deve defender direitos violados ou ameaçados de violência (Constituição Federal, art. 5º, inc. XXXV). Nesse sentido:
A vinculação das cortes aos direitos fundamentais leva a doutrina a entender que estão elas no dever de conferir a tais direitos máxima eficácia possível. Sob um ângulo negativo, a vinculação do Poder Judiciário gera o poder-dever de recusar aplicação a preceitos que não respeitem direitos fundamentais.[105]
O que não se pode entender é como a Constituição Federal proibe pena cruel (art. 5º, inc. XLVII, alínea “e”), alça a dignidade da pessoa humana ao nível de fundamento da República Federativa do Brasil (art. 1º, inc. III) e aparecem magistrados defensores da prisão em locais degradantes sob o argumento de que não se pode retirar do Estado seu ius puniendi.
A doutrina do constitucionalismo contemporâneo valoriza a tópica.[106] Esta tem sido objeto de preocupação porque pode ficar fora de controle na jurisprudência dos tribunais.[107] Todavia, vem impregnando a Justiça Criminal pátria, dando ensejo às mais diversas e contraditórias posições doutrinárias.[108]
Um sistema autopoiético não pode admitir a proposta de alguns, feita no sentido “de que o Judiciário deve assumir, na atualidade, posição mais destacada, entre os demais Poderes estatais, na produção normativa”.[109] É necessário que as normas se fechem em processo de acoplamento, mediante um procedimento que deve se dá em ambiente estruturalmente fechado e cognitivamente aberto, a fim de comunicando-se com o sistema global, se autoproduzir.
Não se pretende dizer que o Judiciário deve ficar inerte. Ao contrário, “a positivação da regra que consagra a aplicabilidade imediata das normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais serve como suporte de legitimidade para ampliação dos seus poderes”[110]. O Poder Judiciário, ao contrário de ver, em todos momentos, colisão entre direitos fundamentais, deveria atuar diretamente na defesa de tais direitos. Nesse sentido ensina Gilmar Ferreira Mendes:
Também indiscutível se afigura a vinculação da jurisdição aos direitos fundamentais. Dessa vinculação resulta para o Poder Judiciário não só o dever de guardar estrita obediência aos chamados direitos fundamentais de caráter judicial, mas também o de assegurar a efetiva aplicação do direito, em especial dos direitos fundamentais, seja nas relações entre os particulares e o Poder Público, seja nas relações tecidas exclusivamente entre particulares.[111]
Pode-se até concordar com a firmação de que a ponderação de bens não deve ser orientada numa única direção, pois a liberdade, embora seja muito importante, pode ceder lugar a outros interesses da comunidade, tais como o de proteção da segurança e da ordem pública.[112] Todavia, só poderá haver ponderação de bens se existirem dois ou mais em discussão, o que afasta a maioria dos casos de interesse ou comoção social, uma vez que a criação de tais situações, normalmente, é estabelecida por meio de comunicação de massa, sendo uma imposição ideológica de sentimento de vingança e esta não constitui bem fundamental.
A tortura, como instrumento de prova, deve ser repelida. O mesmo se aplica durante a execução da pena, em que a situação degradante poderá constituir tortura física ou mental. Porém, em nome do direito ao exercício pleno da jurisdição, a qual alcança a fase da execução, tem se admitido execuções de penas em locais superlotados, insalubres etc. Na Europa, tal prática é expressamente vedada.
No Brasil, a Constituição Federal veda a pena cruel e o tratamento desumano durante a sua execução, bem como proibe a prova obtida por meios ilícitos, sendo que a tortura constitui crime assemelhado ao hediondo (Lei n. 9.455, de 7.4.1997). A pena, que deveria atingir tão somente os aspectos constantes da sentença e da lei, acaba por ofender a dignidade da pessoa humana. Outrossim, em casos de profunda repercussão, como a guerra civil do Rio de Janeiro, o Poder Judiciário fecha os olhos às práticas policiais abusivas, validando provas evidentemente ilícitas ou ilegítimas.
5.3.1.5 Vedação de escravidão e de trabalho forçado
O trabalho escravo, certamente, foi uma das primeiras instituições na relação de subordinação. Porém, no atual estágio da civilização é necessário que o Direito de última instância, o criminal,[113] interfira na matéria trabalhista. Por isso, a legislação criminal trata como crime a redução da pessoa à condição análoga à de escravo.
No Brasil, o crime de redução a condição análoga à de escravo passou a ter conotação especial, o que fez emergir a Lei n. 10.803, de 11.12.2003. O crime está previsto no art. 149 do Código Penal, dentre os crimes contra a liberdade individual, sobre o qual preleciona Álvaro Mayrink da Costa:
A liberdade do trabalho é a forma de liberdade individual que se traduz no exercício democrático da faculdade, que possui o cidadão, de escolha do exercício da profissão nos limites do seu legítimo interesse. Dentro do pensamento econômico moderno, o maior desafio é suprimir o desemprego e realizar o ‘pleno emprego’... Para se exercer a igualdade econômica entre empregados e empregadores ainda é indispensável a intervenção do Estado para dirimir conflitos, objetivando o bem comum”.[114]
Os direitos sociais informam o próprio preâmbulo da Constituição Federal do Brasil, que institui “um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, e desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos...” Seu art. 1º proclama que a República Federativa do Brasil tem como fundamentos: a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, o pluralismo político. Tais fundamentos estão a indicar que é necessário o repúdio ao trabalho escravo.
A ex-Procuradora-Geral do Trabalho do Brasil, Sandra Lia Simon, dizia que o “desafio do Ministério Público do Trabalho é incrementar a sua atividade como órgão agente, erradicando o trabalho escravo”.[115] Por isso, é oportuna a seguinte redação do art. 5º da Carta:
Artigo 5º Proibição da escravidão e do trabalho forçado. 1. Ninguém pode ser sujeito à escravidão nem à servidão. 2. Ninguém pode ser constrangido a realizar trabalho forçado ou obrigatório. 3. É proibido o tráfico de seres humanos.
Os crimes contra a organização do trabalho estão previstos no título IV da parte especial do Código Penal brasileiro, merecendo destaque: a) aliciamento para o fim de emigração – art. 206; b) aliciamento de trabalhadores de um local para outro do território nacional – art. 207.
Referido título do Código Penal foi significativamente alterado pela Lei n. 9.777, de 29.12.1998, mas seria necessário observá-lo segundo todo sistema dinâmico de normas, a fim de evitar a manutenção de preceitos inadequados, como alguns que restaram mantidos. Não obstante isso, é fácil notar que os criminalistas pátrios preferem discutir tecnicamente os crimes, mas sem adentrar em uma discussão anterior: há razão para a tipificação de algumas condutas descritas nos arts. 197-207 do CP?[116]
A Constituição Federal se preocupa com as desigualdades regionais e com a dignidade da pessoa humana, procurando estabelecer um sistema tendente à igualdade em todo país. Tais preocupações norteiam, ou deveriam nortear, o Direito Público em geral, mas – contrariamente – tipifica-se a conduta de aliciamento de trabalhadores de uma região para outra. Ora, em sendo medida necessária para atingir ao programa estabelecido pela Constituição Federal, no sentido de minimizar as desigualdades regionais, não se justifica a pretensão condenatória que tender a simplesmente proibir que os nacionais, em busca do respeito às suas dignidades, se desloquem para as diferentes regiões de um país que tem dimensões continentais.
A percepção da importância do respeito à dignidade humana, da alocação da mão-de-obra ao local adequado, mesmo que diversa do habitat natural de cada um, só poderá decorrer de uma Justiça Especializada, mais atenta ao (sub)sistema produtivo da sociedade complexa.
O Brasil é um país em que grassam o analfabetismo e a hipocrisia governamental. É um país com um grande Produto Interno Bruto (PIB) e uma das maiores concentrações de renda do planeta, criando contraditoriamente um lugar propício para o estabelecimento de ricos e miseráveis. Ao contrário de uma resposta séria aos seus problemas internos, são criadas leis e muitas delas criminais.
A Lei n. 11.106, de 28.3.2005, tinha alterado o título do Cap. V da Parte Especial do Código Penal. A Lei n. 12.015, de 7.8.2009, o alterou novamente, passando a dispor: CAPÍTULO V: DO LENOCÍNIO E DO TRÁFICO DE PESSOA PARA FIM DE PROSTITUIÇÃO OU OUTRA FORMA DE EXPLORAÇÃO SEXUAL”.
A casa de prostituição, largamente existente no território nacional, continua sendo considerada ilícita, mas o tipo foi modificado, passando a estabelecer:
 Art. 229.  Manter, por conta própria ou de terceiro, estabelecimento em que ocorra exploração sexual, haja, ou não, intuito de lucro ou mediação direta do proprietário ou gerente:
Assim como ocorre com a aceitação de trabalhos em condições degradantes, a prostituição decorre da aceitação cultural ou da dificuldade econômica atravessada por determinado país. Por isso, a fronteira dos Estados Unidos da América continua sendo desafiadas por imigrantes ilegais e existem tantos brasileiros lavando banheiro, exercendo serviços domésticos etc. em países ricos, inclusive europeus, como foi o caso de Jean Charles de Menezes.
Ao lado das disposições que vedam o trabalho escravo, proibe-se o favorecimento à prostituição, in verbis:
Tráfico internacional de pessoa para fim de exploração sexual 
Art. 231. Promover ou facilitar a entrada, no território nacional, de alguém que nele venha a exercer a prostituição ou outra forma de exploração sexual, ou a saída de alguém que vá exercê-la no estrangeiro.
Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos.
§ 1o Incorre na mesma pena aquele que agenciar, aliciar ou comprar a pessoa traficada, assim como, tendo conhecimento dessa condição, transportá-la, transferi-la ou alojá-la.
§ 2o A pena é aumentada da metade se:
I - a vítima é menor de 18 (dezoito) anos;
II - a vítima, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato;
III - se o agente é ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou curador, preceptor ou empregador da vítima, ou se assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; ou
IV - há emprego de violência, grave ameaça ou fraude.
§ 3o Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa.
Tráfico interno de pessoa para fim de exploração sexual 
Art. 231-A. Promover ou facilitar o deslocamento de alguém dentro do território nacional para o exercício da prostituição ou outra forma de exploração sexual: 
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos. 
§ 1o  Incorre na mesma pena aquele que agenciar, aliciar, vender ou comprar a pessoa traficada, assim como, tendo conhecimento dessa condição, transportá-la, transferi-la ou alojá-la. 
§ 2o  A pena é aumentada da metade se: 
I - a vítima é menor de 18 (dezoito) anos;
II - a vítima, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato;
III - se o agente é ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou curador, preceptor ou empregador da vítima, ou se assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; ou
IV - há emprego de violência, grave ameaça ou fraude.
§ 3o Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa.
Homens e mulheres brasileiros lotam as casa de prostituição da Europa, muitos em condições degradantes, mormente na Espanha e na Itália. Aumenta a xenofobia na Suécia, mas ela está repleta de trabalhadores estrangeiros que se dispõem a fazer os serviços inferiores (lavar banheiros, varrer ruas, catar lixo etc.) aos quais eles não mais se sujeitam.
É da própria essência da globalização a exploração de povos mais pobres. Assim, caso a União Europeia consiga evitar completamente o tráfico de seres humanos terá dificuldades para atender necessidades essenciais, visto que faltarão pessoas para realizar aquelas atividades profissionais classificadas como inferiores. De qualquer modo, ao menos no campo da pena, é uma importante declaração a que consta do art. 5º da Carta de Direitos Humanos da União Europeia.
5.3.2 Liberdades
Já foi exposto anteriormente que a dignidade representa a liberdade atribuida a uma pessoa de se firmar como tal, detentora de direitos e obrigações. Desse modo, todo assunto relativo às liberdades está intimamente relacionado com a dignidade da pessoa humana.
Na tutela da liberdade, a Carta de Direitos Humanos da União Europeia dispõe:
TÍTULO II – LIBERDADES
Artigo 6º Direito à liberdade e à segurança. Toda a pessoa tem direito à liberdade e segurança.
Artigo 7º Respeito pela vida privada e familiar. Todas as pessoas têm direito ao respeito pela sua vida privada e familiar, pelo seu domicílio e pelas suas comunicações.
Artigo 8º Proteção de dados pessoais. 1. Todas as pessoas têm direito à proteção dos dados de caráter pessoal que lhes digam respeito. 2. Esses dados devem ser objeto de um tratamento leal, para fins específicos e com o consentimento da pessoa interessada ou com outro fundamento legítimo previsto por lei. Todas as pessoas têm o direito de aceder aos dados coligidos que lhes digam respeito e de obter a respectiva retificação. 3. O cumprimento destas regras fica sujeito a fiscalização por parte de uma autoridade independente.
Artigo 9º Direito de contrair casamento e de constituir família. O direito de contrair casamento e o direito de constituir família são garantidos pelas legislações nacionais que regem o respectivo exercício.
Artigo 10. Liberdade de pensamento, de consciência e de religião. 1. Todas as pessoas têm direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião. Este direito implica a liberdade de mudar de religião ou de convicção, bem como a liberdade de manifestar a sua religião ou a sua convicção, individual ou coletivamente, em público ou em privado, através do culto, do ensino, de práticas e da celebração de ritos. 2. O direito à objeção de consciência é reconhecido pelas legislações nacionais que regem o respectivo exercício.
Artigo 11. Liberdade de expressão e de informação. 1. Qualquer pessoa tem direito à liberdade de expressão. Este direito compreende a liberdade de opinião e a liberdade de receber e de transmitir informações ou ideias, sem que possa haver ingerência de quaisquer poderes públicos e sem consideração de fronteiras. 2. São respeitados a liberdade e o pluralismo dos meios de comunicação social.
Artigo 12. Liberdade de reunião e de associação. 1. Todas as pessoas têm direito à liberdade de reunião pacífica e à liberdade de associação a todos os níveis, nomeadamente nos domínios político, sindical e cívico, o que implica o direito de, com outrem, fundarem sindicatos e de neles se filiarem para a defesa dos seus interesses. 2. Os partidos políticos ao nível da União contribuem para a expressão da vontade política dos cidadãos da União.
Artigo 13. Liberdade das artes e das ciências. As artes e a investigação científica são livres. É respeitada a liberdade académica.
Artigo 14. Direito à educação. 1. Todas as pessoas têm direito à educação, bem como ao acesso à formação profissional e contínua. 2. Este direito inclui a possibilidade de frequentar gratuitamente o ensino obrigatório. 3. São respeitados, segundo as legislações nacionais que regem o respectivo exercício, a liberdade de criação de estabelecimentos de ensino, no respeito pelos princípios democráticos, e o direito dos pais de assegurarem a educação e o ensino dos filhos de acordo com as suas convicções religiosas, filosóficas e pedagógicas.
Artigo 15. Liberdade profissional e direito de trabalhar. 1. Todas as pessoas têm o direito de trabalhar e de exercer uma profissão livremente escolhida ou aceite. 2. Todos os cidadãos da União têm a liberdade de procurar emprego, de trabalhar, de se estabelecer ou de prestar serviços em qualquer Estado-Membro. 3. Os nacionais de países terceiros que sejam autorizados a trabalhar no território dos Estados-Membros têm direito a condições de trabalho equivalentes àquelas de que beneficiam os cidadãos da União.
Artigo 16. Liberdade de empresa. É reconhecida a liberdade de empresa, de acordo com o direito da União e as legislações e práticas nacionais.
Artigo 17. Direito de propriedade. 1. Todas as pessoas têm o direito de fruir da propriedade dos seus bens legalmente adquiridos, de os utilizar, de dispor deles e de os transmitir em vida ou por morte. Ninguém pode ser privado da sua propriedade, exceto por razões de utilidade pública, nos casos e condições previstos por lei e mediante justa indenização pela respectiva perda, em tempo útil. A utilização dos bens pode ser regulamentada por lei na medida do necessário ao interesse geral. 2. É protegida a propriedade intelectual.
Artigo 18. Direito de asilo. É garantido o direito de asilo, no quadro da Convenção de Genebra de 28 de Julho de 1951 e do Protocolo de 31 de Janeiro de 1967, relativos ao Estatuto dos Refugiados, e nos termos do Tratado da União Europeia e do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (a seguir designados).
Artigo 19. Proteção em caso de afastamento, expulsão ou extradição. 1. São proibidas as expulsões coletivas. 2. Ninguém pode ser afastado, expulso ou extraditado para um Estado onde corra sério risco de ser sujeito a pena de morte, a tortura ou a outros tratos ou penas desumanos ou degradantes.
O Título II é marcado por um grande número de normas de eficácia contida porque a legislação nacional do Estado-Membro pode restringir o alcance do direito ou garantia inserido na Carta de Direitos Humanos da União Europeia, o que é evidente pela inserção expressa da sujeição dos limites à legislação nacional.
O art. 6º traz o complicador de incluir o direito à segurança. A Europa, tradicionalmente, respeita a liberdade e a segurança dos povos dos Estados-Membros, mas a segurança é comprometida, principalmente, por ataques terroristas.
O art. 7º da Carta não apresenta maiores complicadores, visto que respeita à vida privada, à privacidade das comunicações das pessoas. O mesmo se aplica ao art. 8º que prevê a proteção de dados pessoais. Porém, neste último há a remessa às leis nacionais.
O direito de constituir família também é remetido às leis nacionais (art. 9º). Porém, nesse campo, a Europa está muito adiante de muitos outros povos porque, na maioria, admite a existência de família entre homossexuais. Isso se dá na Argentina, mas encontra resistência de países predominantemente islâmicos, os quais ainda punem com a morte o simples adultério.
A liberdade de pensamento, de consciência e de religião é um dos maiores complicadores porque é disso que decorrem os ataques terroristas e os maiores conflitos.
Nos morros do Rio de Janeiro, os integrantes do E.T.A. e os do I.R.A., todos enfrentam problemas em decorrência da visão distinta dos mesmos fatos. Enquanto as pessoas dos morros criarão condições para viverem sem o Estado, à margem dele, e com a proteção dos “traficantes”, o povo basco se vê diferente do Espanhol e o protestante da Irlanda do Norte se “protege” da dominação católica, advinda da Inglaterra.
O art. 10 da Carta de Direitos Humanos da União Europeia é salutar, mas a cogitação de crime só será impunível enquanto interiorizada, uma vez que ela exteriorizada poderá constituir induzimento ou apologia ao crime, ambos puníveis.
Outra norma que necessita de restrição pelos Estados-Membros é a do art. 11 porque nem toda liberdade de expressão pode ser admitida. A censura prévia é perigosa, mas pior do que ela é admitir o induzimento, a apologia ao crime ou, ainda pior, a ofensa aos fundamentais direitos à honra, integridade moral etc. das pessoas.
A liberdade de reunião e de associação exige, em primeiro plano, que a finalidade seja pacífica. Assim como a arte e a ciência não podem servir à produção criminal.
O direito à educação (art. 14) é fundamental. A Europa respeita isso, mas os estrangeiros que migram para lá emperram o processo educacional e criam problemas de toda ordem. De qualquer modo, a educação é um dos mais importantes direitos fundamentais protegidos pela Carta.
Um dos maiores problemas da atualidade é o trabalho, visto que o desemprego aumenta e muitas pessoas migram para a União Europeia em busca de salários mais dignos. Em razão disso, o direito ao trabalho profissional só é assegurado aos nacionais dos Estados-Membros, dependendo de autorização especial os nacionais de paises terceiros (art. 15).
Outra norma de eficácia contida é a que assegura a liberdade de empresa (art. 16). Um mundo globalizado tende a ter a livre iniciativa como fundamento da ordem econômica, o que se dá nos blocos econômicos. Uma ordem econômica fundamentada na livre iniciativa e que tem por princípio a livre concorrência terá que encontrar freios na legislação nacional, a fim de evitar abusos do poder econômico.
É importante a proteção à propriedade e o reconhecimento do direito sucessório mortis causa (art. 17). Preservando o fim social da propriedade, a Carta protege o uso, o gozo (ou fruição) e a disposição da coisa, sem mencionar o ius abutendi.
Um dos fundamentos em favor do Direito das Sucessões decorre da idéia de que a propriedade não pode ter a disposição limitada apenas por decorrência da morte. Porém, crescem os partidários de teorias contrárias à manutenção do direito das sucessões e os Estados vem aumentando os tributos incidentes sobre a herança. De qualquer modo, esse assunto será regulada pela lei nacional do Estado-Membro.
O art. 17 admite admite a desapropriação para fins públicos e protege a propriedade intelectual. Esta se manifesta pelos direitos autorais e de invenção.
É interessante verificar que o art. 18, na forma de tratados e convenções de Direito internacional, assegura o direito de asilo. O art. 19 também se refere ao Direito internacional, vedando a extradição para Estado em que a pessoa possa ser condenada à morte ou submetida à pena cruel ou degradante.
Marcelo Duarte Bauer, filho de um Coronel da Polícia Militar do Distrito Federal, foi acusado de ter matado sua namorada, Thaís Muniz Mendonça, em 10.7.1987. Ele foi pronunciado no dia 11.10.1989. Sendo importante a seguinte informação:
Marcelo Bauer fugiu para a Europa. A polícia do DF conseguiu encontrar o principal suspeito na Dinamarca, onde ele foi preso. Mas não por muito tempo. “Os advogados entraram com recurso, alegando uma série de deficiências no nosso país, com relação ao sistema penitenciário, que não respeitava direitos humanos”. A prisão dele foi relaxada.[117]
É importante destacar que a Dinamarca determinou a extradição em momento posterior porque houve pressão do governo brasileiro, mas, inicialmente, reconheceu que o Brasil tem pena cruel.
Referida posição deveria ser a definitiva e espera-se que após o advento da Carta de Direitos Humanos, a Dinamarca, ou qualquer outro Estado-Membro da União Europeia, não mais determine a extradição para país em que a prática da execução da pena privativa de liberdade resulte em efetiva pena desumana, ofensiva à dignidade da pessoa humana.
5.3.3 Igualdade
A perspectiva garantista da igualdade é oportuna porque é completamente diversa da que os germânicos tem sobre a mesma. Daí se transcrever o seguinte texto:
É da conjugação do princípio de tolerância com o valor primário e cada pessoa que emerge a complexa igualdade jurídica, a qual inclui diferenças pessoais e exclui diferenças sociais...
Em primeiro sentido, igualdade representa um valor atribuido a cada diferente pessoa “sem distinção”, permitindo que cada pessoa seja diversa e, ao mesmo tempo, como todas as outras. É igualdade formal ou política. Aqui adentra a importância da tolerância, que obriga o respeito às diferenças, tornando intolerável a violação ao respeito das diferenças que formam as diversas identidades das pessoas.[118]
O segundo sentido de igualdade é denominada por Luigi Ferrajoli de substancial ou social. Importa em desvalor associado às diferenças econômicas e sociais. Tais diferenças impedem o pleno desenvolvimento da pessoa humana porque deformam deformam a identidade e determinam a desigualdade. Daí serem intoleráveis. Porém, somente as desigualdades jurídicas que obstam a vida, a liberdade, a sobrevivência serão intoleráveis, cujos limites quantitativos e qualitativos tem análise dificílima na filosofia jurídica e política.[119]
Igualdade, em qualquer dos sentidos, não é uma tese descritiva, mas um princípio normativo, até porque e um juízo de valor ou, mais simplesmente, apenas valor. No primeiro, deve-se reconhecer que os homens são iguais, apesar das diferenças específicas, enquanto que, no segundo sentido, as desigualdades serão reconhecidas, mas com limites de intolerabilidade.[120]
A partir da perspectiva garantista é que o texto da Carta de Direitos Humanos da União Europeia deve ser analisado. Observe-se o que ela dispõe:
TÍTULO III - IGUALDADE
Artigo 20. Igualdade perante a lei. Todas as pessoas são iguais perante a lei.
Artigo 21. Não discriminação. 1. É proibida a discriminação em razão, designadamente, do sexo, raça, cor ou origem étnica ou social, características genéticas, língua, religião ou convicções, opiniões políticas ou outras, pertença a uma minoria nacional, riqueza, nascimento, deficiência, idade ou orientação sexual. 2. No âmbito de aplicação dos Tratados e sem prejuízo das suas disposições específicas, é proibida toda a discriminação em razão da nacionalidade.
Artigo 22. Diversidade cultural, religiosa e linguística. A União respeita a diversidade cultural, religiosa e linguística.
Artigo 23. Igualdade entre homens e mulheres. Deve ser garantida a igualdade entre homens e mulheres em todos os domínios, incluindo em matéria de emprego, trabalho e remuneração. O princípio da igualdade não obsta a que se mantenham ou adotem medidas que prevejam regalias específicas a favor do sexo sub-representado.
Artigo 24. Direitos das crianças. 1. As crianças têm direito à protecção e aos cuidados necessários ao seu bem-estar. Podem exprimir livremente a sua opinião, que será tomada em consideração nos assuntos que lhes digam respeito, em função da sua idade e maturidade. 2. Todos os actos relativos às crianças, quer praticados por entidades públicas, quer por instituições privadas, terão primacialmente em conta o interesse superior da criança.
3. Todas as crianças têm o direito de manter regularmente relações pessoais e contactos diretos com ambos os progenitores, excepto se isso for contrário aos seus interesses.
Artigo 25. Direitos das pessoas idosas. A União reconhece e respeita o direito das pessoas idosas a uma existência condigna e independente e à sua participação na vida social e cultural.
Artigo 26. Integração das pessoas com deficiência. A União reconhece e respeita o direito das pessoas com deficiência a beneficiarem de medidas destinadas a assegurar a sua autonomia, a sua integração social e profissional e a sua participação na vida da comunidade.
A distinção entre igualdade formal e material é significativa até porque pode exigir posturas diversas do Estado. Nesse sentido:
Enquanto a consagração da igualdade formal se relaciona, prioritariamente, de obrigações negativas do Estado (isto é, abstenções), a promoção da igualdade material depende, em larga medida, de condutas positivas (ações afirmativas) capazes de corrigir as desigualdades fáticas e minimizar o impacto da vulnerabilidade extrema de determinados grupos da sociedade.[121]
Não obstante a importância de tais direitos fundamentais, neste estudo não haverá preocupação de analisar em apartado cada um deles porque, em primeiro lugar, interessam mais diretamente os temas que tenham relação mais próxima com o Direito criminal e o Direito processual, sendo suficiente, neste campo, a exposição sucinta a respeito da visão garantista acerca da igualdade e a transcrição do conteudo da carta.
5.3.4 Solidariedade e cidadania
Pelas mesmas razões citadas na seção anterior, em que informei o interesse maior por assuntos correlatos aos criminais, entendo que a simples transcrição dos dois capítulos da Carta de Direitos Humanos que se seguirá, será suficiente para dar a notícia do seu conteudo.
TÍTULO IV – SOLIDARIEDADE
Artigo 27. Direito à informação e à consulta dos trabalhadores na empresa. Deve ser garantida aos níveis apropriados, aos trabalhadores ou aos seus representantes, a informação e consulta, em tempo útil, nos casos e nas condições previstos pelo direito da União e pelas legislações e práticas nacionais.
Artigo 28. Direito de negociação e de ação coletiva. Os trabalhadores e as entidades patronais, ou as respectivas organizações, têm, de acordo com o direito da União e as legislações e práticas nacionais, o direito de negociar e de celebrar convenções coletivas aos níveis apropriados, bem como de recorrer, em caso de conflito de interesses, a ações coletivas para a defesa dos seus interesses, incluindo a greve.
Artigo 29. Direito de acesso aos serviços de emprego. Todas as pessoas têm direito de acesso gratuito a um serviço de emprego.
Artigo 30. Proteção em caso de dispensa sem justa causa. Todos os trabalhadores têm direito a proteção contra as dispensas sem justa causa, de acordo com o direito da União e com as legislações e práticas nacionais.
Artigo 31. Condições de trabalho justas e equitativas. 1. Todos os trabalhadores têm direito a condições de trabalho saudáveis, seguras e dignas. 2. Todos os trabalhadores têm direito a uma limitação da duração máxima do trabalho e a períodos de descanso diário e semanal, bem como a um período anual de férias pagas.
Artigo 32. Proibição do trabalho infantil e proteção dos jovens no trabalho. É proibido o trabalho infantil. A idade mínima de admissão ao trabalho não pode ser inferior à idade em que cessa a escolaridade obrigatória, sem prejuízo de disposições mais favoráveis aos jovens e salvo derrogações bem delimitadas.
Os jovens admitidos ao trabalho devem beneficiar de condições de trabalho adaptadas à sua idade e de proteção contra a exploração econômica e contra todas as atividades susceptíveis de prejudicar a sua segurança, saúde ou desenvolvimento físico, mental, moral ou social, ou ainda de pôr em causa a sua educação.
Artigo 33. Vida familiar e vida profissional. 1. É assegurada a proteção da família nos planos jurídico, econômico e social. 2. A fim de poderem conciliar a vida familiar e a vida profissional, todas as pessoas têm direito a proteção contra a dispensa por motivos ligados à maternidade, bem como a uma licença por maternidade paga e a uma licença parental pelo nascimento ou adoção de um filho.
Artigo 34. Segurança social e assistência social. 1. A União reconhece e respeita o direito de acesso às prestações de segurança social e aos serviços sociais que concedem proteção em casos como a maternidade, doença, acidentes de trabalho, dependência ou velhice, bem como em caso de perda de emprego, de acordo com o direito da União e com as legislações e práticas nacionais. 2. Todas as pessoas que residam e se desloquem legalmente no interior da União têm direito às prestações de segurança social e às regalias sociais nos termos do direito da União e das legislações e práticas nacionais. 3. A fim de lutar contra a exclusão social e a pobreza, a União reconhece e respeita o direito a uma assistência social e a uma ajuda à habitação destinadas a assegurar uma existência condigna a todos aqueles que não disponham de recursos suficientes, de acordo com o direito da União e com as legislações e práticas nacionais.
Artigo 35. Proteção da saúde. Todas as pessoas têm o direito de aceder à prevenção em matéria de saúde e de beneficiar de cuidados médicos, de acordo com as legislações e práticas nacionais. Na definição e execução de todas as políticas e ações da União é assegurado um elevado nível de proteção da saúde humana.
Artigo 36. Acesso a serviços de interesse econômico geral. A União reconhece e respeita o acesso a serviços de interesse econômico geral tal como previsto nas legislações e práticas nacionais, de acordo com os Tratados, a fim de promover a coesão social e territorial da União.
Artigo 37. Proteção do ambiente. Todas as políticas da União devem integrar um elevado nível de proteção do ambiente e a melhoria da sua qualidade, e assegurá-los de acordo com o princípio do desenvolvimento sustentável.
Artigo 38. Defesa dos consumidores. As políticas da União devem assegurar um elevado nível de defesa dos consumidores.
TÍTULO V – CIDADANIA
Artigo 39. Direito de eleger e de ser eleito nas eleições para o Parlamento Europeu. 1. Todos os cidadãos da União gozam do direito de eleger e de serem eleitos para o Parlamento Europeu no Estado-Membro de residência, nas mesmas condições que os nacionais desse Estado. 2. Os membros do Parlamento Europeu são eleitos por sufrágio universal direto, livre e secreto.
Artigo 40. Direito de eleger e de ser eleito nas eleições municipais. Todos os cidadãos da União gozam do direito de eleger e de serem eleitos nas eleições municipais do Estado-Membro de residência, nas mesmas condições que os nacionais desse Estado.
Artigo 41. Direito a uma boa administração. 1. Todas as pessoas têm direito a que os seus assuntos sejam tratados pelas instituições, órgãos e organismos da União de forma imparcial, equitativa e num prazo razoável. 2. Este direito compreende, nomeadamente: a) O direito de qualquer pessoa a ser ouvida antes de a seu respeito ser tomada qualquer medida individual que a afete desfavoravelmente; b) O direito de qualquer pessoa a ter acesso aos processos que se lhe refiram, no respeito pelos legítimos interesses da confidencialidade e do segredo profissional e comercial; c) A obrigação, por parte da administração, de fundamentar as suas decisões. 3. Todas as pessoas têm direito à reparação, por parte da União, dos danos causados pelas suas instituições ou pelos seus agentes no exercício das respectivas funções, de acordo com os princípios gerais comuns às legislações dos Estados-Membros. 4. Todas as pessoas têm a possibilidade de se dirigir às instituições da União numa das línguas dos Tratados, devendo obter uma resposta na mesma língua.
Artigo 42. Direito de acesso aos documentos. Qualquer cidadão da União, bem como qualquer pessoa singular ou coletiva com residência ou sede social num Estado-Membro, tem direito de acesso aos documentos das instituições, órgãos e organismos da União, seja qual for o suporte desses documentos.
Artigo 43. Provedor de Justiça Europeu. Qualquer cidadão da União, bem como qualquer pessoa singular ou coletiva com residência ou sede social num Estado-Membro, tem o direito de apresentar petições ao Provedor de Justiça Europeu, respeitantes a casos de má administração na atuação das instituições, órgãos ou organismos da União, com exceção do Tribunal de Justiça da União Europeia no exercício das respectivas funções jurisdicionais.
Artigo 44. Direito de petição. Qualquer cidadão da União, bem como qualquer pessoa singular ou coletiva com residência ou sede social num Estado-Membro, goza do direito de petição ao Parlamento Europeu.
Artigo 45. Liberdade de circulação e de permanência. 1. Qualquer cidadão da União goza do direito de circular e permanecer livremente no território dos Estados-Membros. 2. Pode ser concedida liberdade de circulação e de permanência, de acordo com os Tratados, aos nacionais de países terceiros que residam legalmente no território de um Estado-Membro.
Artigo 46. Proteção diplomática e consular. Todos os cidadãos da União beneficiam, no território de países terceiros em que o Estado-Membro de que são nacionais não se encontre representado, de proteção por parte das autoridades diplomáticas e consulares de qualquer Estado-Membro, nas mesmas condições que os nacionais desse Estado.
A Carta de Direitos Humanos da União Europeia é abrangente, visando a enfrentar os mais diversificados níveis e setores da sociedade complexa, sendo interessante perceber a natureza de efetiva “união” que se procura implementar. O art. 46 dá tratamento igualitário aos cidadãos da União Europeia, assegurando a todos nacionais dos Estados-Membros as proteções diplomática e consular de quaisquer deles.
5.3.5 Direitos fundamentais adstritos às matérias criminal e processual
5.3.5.1 Generalidades
O Título VI da Carta de Direitos Humanos é tão-somente “justiça”. Esta não é objeto de estudo do Direito, mas da Filosofia. No entanto, grassa a ideia de que é possível vislumbrar justiça no exercício do Direito.
O estudo do jusfilósofo tende à discussão em torno da justiça, procurando defini-la ou saber se ela é unicamente um fim do Direito, mas essa é uma árdua tarefa. Da mesma forma, a jusfilosofia procura explicar as bases que dão sustentação ao Direito, o que é também extremamente complicado. Na verdade, são muitas as metas e tarefas da jusfilosofia, a saber:
Ø  proceder à crítica das práticas, das atitudes e atividades dos operadores do direito;
Ø  avaliar e questionar a atividade legiferante, bem como oferecer suporte reflexivo ao legislador;
Ø  proceder à avaliação do papel desempenhado pela ciência jurídica e o próprio comportamento do jurista ante ela;
Ø  investigar as causas da desestruturação, do enfraquecimento ou da ruína de um sistema jurídico;
Ø  depurar a linguagem jurídica, os conceitos filosóficos e científicos do Direito;
Ø  investigar a eficácia dos institutos jurídicos, sua atuação social e seu compromisso com as questões sociais, seja no que tange a indivíduos, seja no que tange a grupos, seja no que tange a coletividades, seja no que tange a preocupações humanas universais;
Ø  esclarecer e definir a teleologia do Direito, seu aspecto valorativo e suas relações com a sociedade e os anseios culturais;
Ø  resgatar origens e valores fundantes dos processos e institutos jurídicos;
Ø  por meio da  crítica conceitual institucional, valorativa, política e procedimental, auxiliar o juiz no processo decisório”.[122]
É importante que se tenha em vista que a análise mais ampla em grau de abstração e generalidades é uma análise própria da filosofia, razão da abordagem do presente estudo tender a uma perspectiva mais restrita, própria da fragmentariedade do conhecimento científico, pois o presente texto se localiza no campo da ciência do Direito.
5.3.5.2 Direito à ação e a um tribunal imparcial
Por tribunal parcial deverá ser entendido o tribunal de exceção, visto que a imparcialidade judicial sempre estará sempre presente. Quanto à ação, manifestada como direito, deve ser entendida como o direito autônomo e abstrato ao exercício da jurisdição ou o poder de invocar a tutela jurisdicional.[123]
Evitar tribunais de exceção, como os de Nuremberg, de Tóquio etc. foi um avanço do Direito internacional, o qual instituiu, por meio do Estatuto de Roma, de 1998, a Corte Internacional Criminal (CIC), um tribunal permanente para assuntos criminais.
Mesmo os tribunais permanentes não podem ser parciais. Daí existir a possibilidade da parte suscitar exceção ou impedimento que venha afastar determinado juízo, magistrado, membro do Ministério Público, serventuário da Justiça e até perito.
No Brasil, Juiz imparcial é concebido como garantia contida implicitamente na Constituição Federal. É certo que o estabelecimento de um juiz natural visa a evitar a parcialidade no julgamento. Nesse sentido, o Pacto de São José da Costa Rica estabelece:
Toda pessoa terá direito a ser ouvida , com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para que se determine seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza. (art. 8º, § 1º).
Na prática, a imparcialidade do Juiz é um mito. A Constituição Federal do Brasil, ao determinar que o Juiz resida na comarca (art. 93, inc. VII) tem em vista dotar permanentemente o município do Poder Judiciário, bem como fazer com que ele conheça os costumes do lugar e assim possa decidir melhor. Sua decisão deve ser parcial, em prol do interesse público.
O juiz começa a preparar a sua sentença a partir do momento que profere a decisão de recebimento da denúncia ou defere a petição inicial e, às vezes, a partir do momento em determina providências na fase da investigação policial. Entretanto, o que se espera é o mínimo de racionalidade em suas decisões, dando à sentença uma aparência de decisão imparcial.
A Constituição da Federal do Brasil é classificada como Constituição cidadã devido ao extenso rol de direitos e garantias fundamentais que arrola. Nela, o a ação judicial está assegurada pelo livre acesso ao Poder Judiciário (art. 5º, inc. XXXV), mas o Juiz imparcial não está expresso. Nesse ponto, a Carta de Direitos Humanos da União Europeia caminhou melhor porque deixou a garantido o juizo imparcial no seu art. 47.
O art. 47 insere a garantia de assistência judiciária gratuita a quem for juridicamente pobre. O acesso ao Poder Judiciário e a defesa são dependentes da representação processual, não estando tecnicamente equivocada a inserção, no artigo que assegura o direito de ação, a garantia da assistência judiciária gratuita àquele que não puder arcar com as despesas do processo sem privar-se de necessidades essenciais.
5.3.5.3 Presunção de inocência e direito de defesa
A garantia é extremamente controvertida, a partir da sua denominação. Ela assegura ao acusado o direito de ser considerado inocente até que legalmente se tenha provado a culpa (art. 48).
Ainda que haja sentença condenatória, sendo cabível recurso, deve-se entender que não está provada a culpa. Esta prova só se poderá afirmar concretizada com o trânsito em julgado de em julgado de sentença condenatória. Por isso, é melhor a redação da Constituição Federal da República Federativa do Brasil que estabelece que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória” (art. 5º, inc. LVII).
Para alguns, há princípio de inocência, para outros tal denominação é equivocada porque senão seria incabível a prisão cautelar, como indicativa de presunção de culpabilidade[124]. Em tal ponto parece correta a posição esposada por Mirabete, no sentido de que não há presunção de inocência, mas estado de inocência, o qual admite a prisão cautelar quando presentes os presentes seus requisitos e fundamentos legais.[125]
Marcellus Polastri entende que o correto é falar em princípio de não culpabilidade, pois não tem efeitos extremos e não se presume inocência, mas apenas a Constituição Federal assegura um estado de não culpabilidade[126]. De modo, diversamente, Alexandre de Moraes sustenta que se trata de presunção de inocência que é relativa[127].
O fato é que a presunção absoluta (iuris et de iure) não poderia ser quebrada, o que desautorizaria a prisão provisória, sendo que a presunção relativa (iuris tantum) não pode ficar condicionada a nenhum ato processual, mas às provas carreadas. Destarte, falar em presunção de inocência, realmente, parece equivocado.
De qualquer modo, Luigi Ferrajoli afirma que há presuncione di innocenza em matéria criminal.[128] Esta expressão é utilizada na tradução para a língua portuguesa. O que se assegura é um estado. Tal estado se alterará apenas pela sentença. Daí se poder inferir que não se trata de presunção, mas de um estado constitucionalmente assegurado, a ser mantido até a sentença.
Para Ferrajoli, o princípio da submissão à jurisdição enseja o 7º axioma do garantismo, que enuncia que não haverá culpa sem juizo e de que não haja juizo sem que a a acusação se sujeite à prova e à sua refutação, este objeto da tese n. 63 do garantismo.
Para Ferrajoli, trata-se de presunção iuris tantum, ou seja, até prova em contrário. A culpa, e não a inocência, deve ser demonstrada. O objeto do juizo é a prova da culpa, uma vez que a da inocência é presumida desde o início,[129] sendo oportuno transcrever:
Mesmo depois da entrada em vigor da Constituição republicana da Itália, que consagrou o princípio da presunção de não culpabilidade, o problema continuou na legislação italiana. Muitas leis, mormente depois de 1.970, iniciaram um período que Ferrajoli denominou de “mais vergonhoso” da história institucional do país. Muitos prazos processuais dobrados, muitas exceções que autorizam a prisão preventiva etc. fulminam o constitucional princípio de não culpabilidade.
Essa prática vergonhosa se verifica toda vez que os Estados pretendem manter o seu arbítrio, enganar o povo, como se dá na solução de ataques terroristas, na caótica situação dos morros do Rio de Janeiro, decorrente da total ausência do Estado. Nesse sentido, não se olvide que no caso de Jean Charles, Ian Blair chegou a defender que a polícia tinha mesmo que atirar para matar ante a suspeita de ser o rapaz um terrorista.
A ruptura do estado de inocência só poderá se dar diante de um devido processo legal, em que se assegure ampla defesa. Embora o § 2º do art. 48 da Carta não mencione o contraditório, este é importante instrumento da ampla defesa, expressamente assegurada em tal dispositivo normativo.
5.3.5.4 Legalidade e proporcionalidade
Neste momento em que se fala em princípios, manifesta-se oportuno o seguinte alerta:
Aceito a doutrina que informa que o Direito Público em geral é regido por tão-somente dois princípios: o da legalidade e o da supremacia do interesse público sobre o particular.[130] Os demais decorrem destes dois. Por isso, prefiro dizer que os diversos princípios mencionados pela doutrina jurídica são critérios orientadores do estudo e não verdadeiros princípios.[131]
Sob a rubrica “Princípios da legalidade e da proporcionalidade dos delitos e das penas”, o art. 39 da Carta encerra vários critérios orientadores do Direito criminal (enunciados pela doutrina como verdadeiros princípios). Porém, para não criar confusão terminológica, tratar-se-á aqui unicamente do princípio da legalidade, que traduz que só há crime, ou pena, se houver lei. Esta deve ser vista em sentido estrito, não sendo fonte criadora de crimes a medida provisória, o decreto, a resolução etc.
O princípio da legalidade se dirige a todas pessoas sujeitas à lei, traduzindo que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei, enquanto o princípio da reserva legal se dirige ao legislador, traduzindo que ele deve criar leis adequadas, atendendo a previsão da Constituição Federal.[132]
Na Constituição brasileira, o princípio da legalidade foi alçado ao nível de garantia individual fundamental (CF, art. 5º, inciso XXXIX) e com total razão, tendo em vista que não se pode conceber um Estado de Direito em que as pessoas sejam acusadas de delito não previsto em lei. Afinal, não podemos nos olvidar, antes de ser um Direito tutelar de garantias sociais, o Direito criminal visa a proteger os fundamentais direitos individuais da liberdade, da dignidade da pessoa humana, da integridade física etc.
Não é pacífica na doutrina a posição acerca da origem do princípio da legalidade (ou princípio da reserva legal). José Frederico Marques via as raízes do princípio da legalidade nas normas no Direito medieval, mormente nas magníficas instituições do Direito ibérico.[133] Não obstante isso, é dominante o entendimento de que a origem do princípio da legalidade está no Estatuto da Terra, da Inglaterra, datado de 1.215, visto que sua cláusula 39 dispunha que nenhum homem podia ser preso ou privado de seus bens a não ser pelo julgamento de seus pares ou pela lei da terra.
Para Antolisei a origem do princípio do princípio da legalidade está no mencionado Estatuto da Terra,[134] mas não se pode olvidar que Asúa sustentou que as declarações espanholas superam em antigüidade o sentido democrático do estatuto inglês.[135] De qualquer modo, é mais razoável a posição de Heleno Fragoso, no sentido de “o mais seguro antecedente do princípio da reserva legal é a Magna Charta, imposta pelos barões ingleses ao rei João Sem Terra”,[136] (o Estatuto da Terra), visto que é de tal diploma legal que se extrai a primeira expressão escrita do referido princípio.
O princípio da legalidade constou de todas Constituições brasileiras, desde a de 1824, bem como de todos os códigos. Com efeito, o Código Criminal de 1830 tratava do princípio da legalidade, o que foi mantido em todos os códigos penais posteriores.
Da redação do art. 49 da Carta se pode extrair a irretroatividade da norma incriminadora, bem como da novatio legis in peius (lex gravior) Outrossim, admite a retroatividade da novatio legis in mellius (lex mitior), mas o § 2º ressalta a inaplicabilidade retroativa da abolitio criminis. Tal dispositivo pode parecer equivocado, mas é o que melhor pode atender ao consenso necessário para adequação aos Direitos dos diversos Estados-Membros da União Europeia.
O art. 49, § 3º da Carta deixa evidente a necessidade de haver proporcionalidade. Zaffaroni fala em princípio da racionalidade, o qual, segundo o autor, exige certa vinculação eqüitativa entre o delito e sua conseqüência jurídica.[137] Com efeito, até mesmo para os adeptos das teorias absolutas,[138] para quem a pena é concebida unicamente em seu aspecto retributivo, a expressão máxima de justiça reside na lei de talião, ou seja, “olho por olho, dente por dente”. Tal proporcionalidade não deve ser considerada unicamente no momento da cominação ou da aplicação da pena, estende-se ao momento da sua execução.[139] O que não é proporcional não é razoável, daí o ser também denominado de princípio da razoabilidade e de princípio da proibição de excesso.
Da forma que o Direito criminal vem se apresentando, é inadmissível aceitar a idéia de ser a pena desproporcional válida. No entanto, em países mais pobres, a pena privativa de liberdade, na maioria das vezes, não atende sequer à idéia de justiça segundo a própria concepção retributiva, tendo em vista que se devolve ao condenado um mal maior que o produzido por ele.
O princípio da racionalidade  exprime a idéia de que a pena deve ser proporcional ao delito. Tal princípio caminha ao lado do princípio da humanidade, que defende o repúdio as penas cruéis. As penas não privativas de liberdade devem ser priorizadas. Há dois séculos Beccaria já condenava a aplicação de penas cruéis, no seu dizer “toda severidade que ultrapasse os limites se torna supérflua e, por conseguinte, tirânica”.[140]
No Brasil, o princípio da humanidade (também conhecido por princípio da humanização da pena) encontra-se previsto na Constituição Federal, que estabelece em seu art. 5º: “LLXVII – Não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX; b) de caráter perpétuo; c) de trabalhos forçados; d) de banimento; e) cruéis".
Pelo princípio da humanização da pena, o DCrim deve obedecer aos parâmetros modernos de humanidade, consagrados internacionalmente, mantendo-se a dignidade humana do acusado e do condenado (matéria muito vem disciplinada na Carta).
As penas do preceito constitucional transcrito, ferem a humanidade estabelecida para o estágio atual da civilização humana, tendo sido, portanto, abolidas de diversos ordenamentos jurídicos. Corrobora o fato de ferirem, também, o princípio da proporcionalidade.
Do ponto de vista prático, não se pode conceber uma pena maior que o mal praticado, visto que senão se estará criando flagrante norma inválida, eis que desafiará princípios que dão sustentação aos preceitos particularizados. No entanto, mais recentemente, com fundamento em um movimento criminológico denominado movimento de lei e ordem, muitas leis mais severas têm sido criadas.
Há certa razão em Marshall McLuhan ao dizer que o mundo se transformaria em uma aldeia global. A crescente intromissão do Direito internacional no Direito interno é notória. Assim, foi instituída a Corte Internacional Criminal (CIC) que admite a pena de prisão perpétua (Estatuto de Roma, art. 77, § 1º, alínea “e”).
No Brasil, desde 1940, é possível verificar normas desproporcionais. O simples furto é apenado com mínimo de um ano de reclusão. Mesmo em um sistema penitenciário ideal, o furto de uma bicicleta de R$ 200,00 (duzentos reais), por exemplo, não é equivalente a um ano de prisão. Não obstante tal desproporção, não é aí que se verifica maior absurdo.
A Lei n. 8.072, de 25.7.1990, equiparou as penas do atentado violento ao pudor e do estupro, esvaziando o sentido do instituto de política criminal do art. 15, 1ª parte, do CP, que trata da desistência voluntária. O estupro é um crime progressivo, ou seja, para se chegar à consumação do estupro (art. 213 do CP), é necessária a consumação anterior do atentado violento ao pudor (art. 214 do CP), tendo em vista que o primeiro exige a conjunção carnal (coito normal – vagínico – entre homem e mulher), enquanto que o atentando violento ao pudor só exige a prática de qualquer ato libidinoso. Assim sendo, ao equiparar o crime-meio ao crime-fim, o legislador violou flagrantemente o princípio da racionalidade, esvaziando todo conteúdo de política criminal da norma que institui a desistência voluntária.
A inovação legislativa, equivocadamente, retirou a razão de existirem dois crimes, visto que a pena era a única. O homem, depois de tocar em partes pudendas da vítima, não estará mais estimulado a deixar de continuar na sua conduta delituosa, visto que se desistir voluntariamente do crime intermediário, terá a mesma pena do crime fim, em princípio, mais grave. Mantendo o equívoco, a Lei n. 12.015, de 7.8.2009, revogou o art. 214 do CP, transformando a conduta do atentado violento ao pudor em estupro.
João Maurício Adeodato, preocupando-se com a legitimidade, escreveu:
“1) que o poder efetivo de decidir e exigir condutas pode ser qualificado de legítimo ou ilegítimo, pretendendo-se, obviamente, que haja algum critério objetivo para a distinção; 2) que o poder legítimo é mais desejável, seja por que razão for”.[141]
Ele entende que não se pode refutar a importância da legitimidade.[142] Tal precupação ganha relevo no estudo da pena. Uma concepção formal de legitimidade é aquela que se consubstancia pelo simples fato de observar a sucessão natural dos governos, ou seja, observadas as regras definidas com antecedência, há legitimidade. Ela não depende de comprovação empírica. Em matéria de pena, tal legitimidade não satisfaz, sendo necessária a legitimidade material, que é aquela que apresenta uma instância de referência empiricamente comprovável, como aquela que permite repudiar todas as penas inúteis, embora legalmente cominadas. E, mesmo que adotada a teoria absoluta, a pena deve, no mínimo, atender à necessária proporcionalidade.
O problema é que toda referência a instância de conteúdo tende a merecer a pecha de jusnaturalista, eis que os parâmetros são determinados segundo a natureza humana e sempre que o Direito e a política se afastam de tais parâmetros ontológicos, forçando a realidade numa direção, estar-se-á concretizando flagrante ilegitimidade.[143] Já que é assim, todos que tratam da legitimidade são compelidos a criar parâmetros de conteúdos.
Toda história de poder dos gregos está baseada na distinção entre governantes e governados, pela qual é necessário que estes existam para que aqueles possam, também, existir. Numa linguagem econômica, ganha destaque a globalização, refletindo intensificando o Direito criminal internacional para que os globalizantes possam sobreviver às custas dos globalizados.
Há algo parecido com a aldeia global de que falava Marshall, transferido-se a polis grega para todo o mundo. Na Carta de Direitos Humanos da União Europeia, o alcance das normas se dirigem a todos Estados-Membros.
Legitimidade exprime a qualidade ou o caráter do que é legítimo. Esta palavra, por sua vez, é derivada do “latim legitimus, de lex, exprime do vocábulo, de modo geral, tudo que está conforme as leis ou que se apresenta cumprindo as determinações legais”.[144] Só que a palavra latina lex decorre de legere, que significa escrever.[145] Assim, do ponto de vista formal, legitimidade exprime aquilo que está de acordo com a lei. Ocorre que, para os Romanos, a lei era o ato escrito emanado da autoridade pública. É então, a partir deles, que se começou a esvaziar a legitimidade material, prestigiando-se a formal.
A versão privada de lex denomina-se contrato.[146] Daí a máxima: “o contrato faz lei entre as partes”. Porém, um contrato, para que seja válido, necessita: a) objeto lícito e possível; b) forma; c) capacidade. Tomando por base o que se expõe, a pena, mesmo que não seja contrato livre, é negócio jurídico conforme a lei. Assim, ela deve, em todos os seus momentos, atender aos três requisitos expostos, ou seja, só pode ser cominada, aplicada e executada quando proporcional e demonstrar aptidão a atingir seus fins; só poderá ser imposta mediante o devido processo legal; e o Estado-Juiz deverá ter uma capacidade material para o exercício de seu múnus.
Em vários Estados, salvo raras exceções, a pena privativa de liberdade será notoriamente cruel, verbi gratia, a evidente a superpopulação carcerária na maioria das prisões brasileiras. Conseqüentemente, toda condenação à pena privativa de liberdade, quando o Juiz souber que na sua jurisdição há superpopulação, constituirá pena ilícita, uma vez que o Estado-Juiz saberá estar violando a CF.
5.3.5.5 Non bis in idem
O art. 50 proibe julgar a pessoa duas vezes pelo mesmo delito. Com isso, assegura a autoridade da coisa julgada. Guilherme de Souza Nucci fala em princípio da vedação da dupla punição e do duplo processo pelo mesmo fato[147]. Significa non (ou ne) bis in idem (não repetir no mesmo), ou seja, a mesma pessoa não poderá ser responsabilizada duas vezes pelo mesmo fato.
Há um filme estudunidense intitulado risco duplo que deturpa o princípio. Segundo a trama, um homem cria uma situação em que sua mulher o teria matado e ele fugiria enquanto ela cumpriria pena porque condenada pelo homicídio. Durante o período de cumprimento da pena, descobriu-se que ele estava vivo e ela resolveu terminar o cumprimento da pena e matá-lo ao final porque não poderia ser responsabilizada duas vezes pelo mesmo fato.
Uma leitura apressada do art. 50 da Carta levaria à conclusão de que a condenada realmente não poderia ser condenada novamente pela morte do marido. No entanto, a solução jurídica correta seria desconstituir a sentença condenatória anterior em sede de revisão criminal e julgar o homicídio motivado pela vingança da mulher.
Na hipótese, sequer seria cabível a detração do tempo da pena que foi cumprido[148], não obstante as posições existentes em sentido contrário. O Direito criminal não pretende fomentar a criminalidade por meio da sensação de impunidade que a “conta-corrente” com o Estado pode induzir. Daí a o ideal ser a indenização pelo erro judiciário.
A limitação à detração da pena decorrerá do fato de não se poder criar a mentalidade de que aquele que ficar preso por certo período terá uma conta-corrente com o Estado, sendo que, provado o equívoco da prisão, sempre terá o direito de abater o período em eventual condenação futura. No caso de prisão por fato anterior, tendo havido solução de continuidade entre as prisões, incabível será a detração, só se possibilitando a indenização.
No tocante à extraterritorialidade da lei criminal, nas hipóteses em que é admitida incondicionalmente, poderá ocorrer duplicidade de condenações, mas isso não importará em execução de penas em duplicidade, visto que o tempo de uma pena executada no estrangeiro será computada e abatida da pena aplicada no território nacional. Porém, em face do art. 50 da Carta, pode haver resistência de nacionais dos Estados-Membros às hipóteses de extraterritorialidade incondicionada, o que poderá subsistir, em face dos artigos da Carta que serão expostos adiante.
5.3.6 Interpretação e aplicação da Carta
A interpretação de normas que asseguram direitos deve ser extensiva. Caso alguma norma asseguratória de direitos fundamentais insira alguma restrição, esta deverá ter interpretação restritiva, visto que a ela estará dizendo que somente naqueles casos ocorrerá a restrição. A Carta de Direitos Humanos não discrepa dessa posição, visto que dispõe:
TÍTULO VII – DISPOSIÇÕES GERAIS QUE REGEM A INTERPRETAÇÃO E A APLICAÇÃO DA CARTA
Artigo 51. Âmbito de aplicação. 1. As disposições da presente Carta têm por destinatários as instituições, órgãos e organismos da União, na observância do princípio da subsidiariedade, bem como os Estados-Membros, apenas quando apliquem o direito da União. Assim sendo, devem respeitar os direitos, observar os princípios e promover a sua aplicação, de acordo com as respectivas competências e observando os limites das competências conferidas à União pelos Tratados. 2. A presente Carta não torna o âmbito de aplicação do direito da União extensivo a competências que não sejam as da União, não cria quaisquer novas atribuições ou competências para a União, nem modifica as atribuições e competências definidas pelos Tratados.
Artigo 52. Âmbito e interpretação dos direitos e dos princípios. 1. Qualquer restrição ao exercício dos direitos e liberdades reconhecidos pela presente Carta deve ser prevista por lei e respeitar o conteúdo essencial desses direitos e liberdades. Na observância do princípio da proporcionalidade, essas restrições só podem ser introduzidas se forem necessárias e corresponderem efetivamente a objetivos de interesse geral reconhecidos pela União, ou à necessidade de proteção dos direitos e liberdades de terceiros. 2. Os direitos reconhecidos pela presente Carta que se regem por disposições constantes dos Tratados são exercidos de acordo com as condições e limites por eles definidos. 3. Na medida em que a presente Carta contenha direitos correspondentes aos direitos garantidos pela Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, o sentido e o âmbito desses direitos são iguais aos conferidos por essa Convenção. Esta disposição não obsta a que o direito da União confira uma proteção mais ampla. 4. Na medida em que a presente Carta reconheça direitos fundamentais decorrentes das tradições constitucionais comuns aos Estados-Membros, tais direitos devem ser interpretados de harmonia com essas tradições. 5. As disposições da presente Carta que contenham princípios podem ser aplicadas através de atos legislativos e executivos tomados pelas instituições, órgãos e organismos da União e por atos dos Estados-Membros quando estes apliquem o direito da União, no exercício das respectivas competências. Só serão invocadas perante o juiz tendo em vista a interpretação desses atos e a fiscalização da sua legalidade. 6. As legislações e práticas nacionais devem ser plenamente tidas em conta tal como precisado na presente Carta. 7. Os órgãos jurisdicionais da União e dos Estados-Membros têm em devida conta as anotações destinadas a orientar a interpretação da presente Carta.
Artigo 53. Nível de proteção. Nenhuma disposição da presente Carta deve ser interpretada no sentido de restringir ou lesar os direitos do Homem e as liberdades fundamentais reconhecidos, nos respectivos âmbitos de aplicação, pelo direito da União, o direito internacional e as Convenções internacionais em que são Partes a União ou todos os Estados-Membros, nomeadamente a Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, bem como pelas Constituições dos Estados-Membros.
Artigo 54. Proibição do abuso de direito. Nenhuma disposição da presente Carta deve ser interpretada no sentido de implicar qualquer direito de exercer atividades ou praticar atos que visem a destruição dos direitos ou liberdades por ela reconhecidos ou restrições desses direitos e liberdades maiores do que as previstas na presente Carta.
Habermas recorre ao pensamento do início do Século XX para buscar as bases teóricas para o seu funcionalismo sistêmico. Daí decorre tantas referências ao sacro. No entanto, o “número de leitores da Bíblia, sobretudo na Europa ocidental, é muito menor hoje do que entre os contemporâneos de Churchill na década de 1.920”.[149] Por isso, é necessário modificar posturas, mormente na busca do consenso, o qual não pode estar fundamentado na religião, nem ser pressuposto da sociedade.
As disputas internas existem nos Estados-Membros da União Europeia, assim como existe no Rio de Janeiro. A diferença é que a Europa está mais preparada economicamente e intelectualmente para enfrentar seus problemas. Por isso, a Carta de Direitos Humanos da União Europeia tende a ser muito mais eficaz do que a Constituição “cidadã” brasileira.
A Constituição da República Federativa do Brasil traz um extenso rol de direitos e garantias fundamentais, os quais não excluem outros que podem decorrer de tratados e convenções de Direito Internacional (art. 5º, § 2º). E, por ser uma constituição analítica, gera a constante necessidade de ponderar os princípios que ela consagra.
Pedro Lenza cita Marcelo Neves para conceituar constitucionalização simbólica, para dizer que há “...predomínio, ou mesmo hipertrofia, no que se refere ao sistema jurídico, da função simbólica da atividade legiferante e do seu produto, a lei sobretudo em detrimento da função jurídico-instrumental”.[150]
O descompasso existente entre as leis e a sociedade complexa, entre o sistema jurídico em face das necessidades sociais e a questão relativa à legitimidade ou legitimação das normas e decisões judiciais, não pode ficar afastada hoje da teoria da constituição e da perspectiva sistêmica emprestada por Niklas Luhmann e Jürgen Habermas. Talvez seja por isso que Canotilho busca subsídios nesses dois pensadores para dar sustentação teórica à sua afirmação de que “as sociedades e os indivíduos autovinculam-se através de uma constituição a fim de resolver os problemas resultantes da racionalidade imperfeita e dos desvios das suas vontades”.[151]
Uma constitucionalização simbólica gera problemas e dá ensejo às construções alopoiéticas que são insustentáveis porque levam ao domínio de um setor da sociedade complexa por outro, em um processo em que não há a necessária auto(rre)produção do sistema jurídico.
O que se vê nas represálias aos “traficantes” do Rio de Janeiro e aos terroristas (Estados-Membros da União Europeia tiveram e tem intensa participação no Afeganistão e Iraque), não pode ser explicado pelas defences de atuar no cumprimento de uma ordem ou da necessidade militar, pois “as medidas para serem justificadas devem ser, especialmente, necessárias e proporcionais, ficando proibida a comissão de crimes internacionais”.[152]
A Carta de Direitos Humanos traz importante aparato jurídico para defesa de direitos fundamentais na União Europeia. De qualquer modo, prevê sua aplicação subsidiária às legislações nacionais dos Estados-Membros e, caso algum deles tenha proteção ainda maior, a Carta não poderá ser utilizada para restringi-los.
5. CONCLUSÃO
A perspectiva, desde o título, é a defesa de direitos fundamentais, a partir da ótica criminal, tentando verificar sua possibilidade diante do pensamento exposto por Habermas no Cap. V da sua Teoria da Ação Comunicativa.
Iniciamos falando de processo de favelização que se deu nas encostas dos morros do município do Rio de Janeiro para aduzir a total falta de Estado, o qual lhe oferece, contraditoriamente, uma “polícia pacificadora” para alterar todos seus costumes. Tal polícia tem por símbolo uma caveira com uma faca cravada na cabeça, representando fins diversos da pacificação proposta.
Na “pacificação” são usados “caveirões” e tanques de combate, evidenciando que não há consenso, mas arbítrio estatal contra supostos “traficantes”. Estes são classificados como inimigos e, sob a tutela judicial, são sumariamente execrados publicamente e tem seus direitos fundamentais suprimidos.
Conflitos internos não são prerrogativas de um povo tupiniquim. A Europa também os enfrenta, sendo que o E.T.A. visa a separação do povo basco, “libertando-o” do domínio Espanhol. Ainda pior é o I.R.A., o qual utiliza argumentos políticos para ocultar suas razões eminentemente religiosas para “livrar” a Irlanda do Norte do domínio da Inglaterra.
É possível verificar lógica nos funcionalismos de Durkheim e Mead, desde que concebidos a partir de grupos sociais antigos, em que a base estava na religião. Porém, quando Habermas conjuga as teorias dos autores mencionados com o pensamento freudiano o faz mal, eis que o concebe a partir de terminologias da Psicologia clínica, não aspirada por Freud.
Habermas entende que o funcionalismo de Mead é insuficiente porque vinculado unicamente à linguagem, entendo ser mais completa a posição de Durkheim, mas não fundamenta cientificamente as razões porque entende que o seu funcionalismo sistêmico é melhor dos que o dos dois, apenas se limitando a dizer que eles são incompletos e, portanto, imperfeitos.
A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, de 13.12.2007, traz um bom elenco de direitos fundamentais, sendo que ela não procura fazer a distinção entre direitos e garantias, razão do presente trabalho ter utilizado as palavras como sinônimas.
A partir dos direitos fundamentais relativos à dignidade da pessoa humana, os mais abrangentes, selecionamos os mais próximos de assuntos criminais para breves comentários, momento que ganhou destaque a perspectiva garantista de Luigi Ferrajoli.
Procuramos demonstrar que Jean Charles, o brasileiro que vivia como imigrante ilegal na Europa (ele tinha visto para estudos, mas apenas trabalhava) foi vítima do excesso durante operação policial. Ian Blair, o Chefe da Polícia inglesa da época dos fatos, vive como herói, o que evidencia que parece que os direitos humanos da Carta só são aplicáveis em favor de nacionais dos Estados-Membros.
O fato é que a Europa ocidental não é mais tão crente na Bíblia quanto era na época em que Mead e Durkheim produziam conhecimentos científicos, razão de ser equivocado pretender estabelecer, na Europa, normas transnacionais com fundamentação religiosa.
A crítica de Habermas, contida no Cap. V do livro analisado, não são suficientes para vislumbrar um consenso, seja ele religioso, pressuposto ou dado pela comunicação. O consenso, quiçá, será racional, sendo a Carta de Direitos Humanos da União Europeia importante passo nesse sentido.
A Carta respeita as legislações dos Estados-Membros, prevendo sua orientação segundo a subsidiariedade e, embora o Direito de integração seja mais vinculante que a simples proximidade dada pela globalização, esbarrará em carências de identidades nacionais para se poder falar em solução criminal para defesa de direitos fundamentais.
Rejeitar penas desumanas, degradantes, importa em não admitir que as mesmas ocorram em qualquer nível. Daí o acerto inicial da Dinamarca em indeferir pedido de extradição de brasileiro nato. O posterior decreto de extradição não poderia encontrar bases em sentimentos baseados no sacro ou na comunicação racional, mas apenas no setor político, o que demonstra ser o consenso, em muitas hipóteses, apenas parcial.
Todos os elementos fáticos apresentados, relativos à guerra civil concretizada no Brasil, ao brasileiro morto em Londres, aos grupos terroristas da Europa e, finalmente, Marcelo Bauer estão a evidenciar ausência de consenso com base sacro, na vontade comum ou, mais ainda, uma sociedade plenamente integrada.
A necessidade de sobrevivência, a cultura capitalista e muitos outros aspectos fomentam a cultura de povos de terceiro mundo de que é melhor viver como suburbanos e exercendo atividades profissionais concebidas como inferiores na União Europeia, onde grassa a xenofobia (vide as notórias manifestações ocorridas na Suécia), vivendo na marginalidade, sem qualquer possibilidade de falar em consenso normativo. Ali viverão como ilegais, sob a frágil condição de não cometer qualquer excesso, eis que são socialmente necessários e suportados, mas é bom que não tenham substrato jurídico que os ampare.
O rigor criminal, tentado no Brasil e alhures, não apresentou resposta razoável ao fenômeno cultural. Certamente, não é por meio dele que haverá respeito aos direitos fundamentais dos moradores dos morros cariocas, dos terroristas, dos imigrantes ilegais que estão na União Europeia etc.
Somente por meio de incursões em conhecimentos que transcendem ao científico que poderemos falar sobre proporcionalidade e legitimidade das normas, sendo que a Carta de Direito Humanos da União Europeia é extremamente salutar, até porque não institui crimes e penas para atender aos seus fins.
A Carta respeita à necessária subsidiariedade da norma transnacional, visto que a territorialidade informa, primordialmente, o Direito internacional, o que se estende ao Direito comunitário (ou de integração). A globalização e a criação de blocos econômicos mitigam a soberania, mas não a eliminam, razão de ser importante respeitar ao contido nas legislações dos Estados-Membros.



[1] Tal capítulo é apresentado sob o título: A mudança de paradigma em Mead y Durkheim, da atividade teleológica à ação comunicativa.
[2] As citações iniciais fazem referência ao livro de propriedade da Universidad Nacional de Lomas de Zamora (HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa, II: Crítica de la razón funcionalista. Madri: Taurus Humanidades, 1.999). Depois, adquiri um exemplar que traz os dois tomos da obra e, a partir da nota de rodapé n. 37, passei a utilizar: Habermas, Jürgen. Teoria de la acción comunicativa. Madrid: Trotta, 2.010. t. I e II.
[3] BETELHEIM, Bruno. Freud e a alma humana. 14. ed. São Paulo: Pensamento Cultrix, 1.982. passim.
[4] COULANGES, Fustel de. Acidade antiga. 4. ed. 2. tir. São Paulo: Martins Fontes, 2.000. passim.
[5] Exemplo do que se diz pode ser verificado em: SANTOS, Boaventura de Sousa. O discurso e o poder: Ensaio sobre a sociologia da retórica jurídica. Porto Alegre: Sérgio Fabris, 1.988.
[6] GALINDO, Rogério Waldrigues. A caveira do BOPE assusta até Stallone. Disponível em: <http://www.gazetadopovo.com.br/blog/caixazero/?id=1028108>. Acesso em: Acesso em: 28.11.2010, às 20h45. Para não deturpar a manifestação do autor, transcrevo-a: “A atração de nossos policiais militares pela violência é tão grotesca que até mesmo o brucutu Sylvester Stallone achou ridículo o símbolo do Bope, no Rio de Janeiro. Aquele da ‘faca na caveira’”.
[7] MALTCHIKV, Roberto. Líderes do tráfico transferidos para Rondônia não tem conversas com advogados gravadas. Disponível em: <http:// www.gazetadopovo.com.br/blog/caixazero/?id=1028108>. Acesso em: 1.12.2010, às 21h05.
[8] Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Na%C3%A7%C3%A3o. Acesso em: 29.11.2010, às 14h40.
[9] CHRISTOPHER, Catherwood. A loucura de Churchill. 2. ed. Rio de Janeiro: Record, 2.006.
[10] SCHILLING, Voltaire. ETA e as origens do terrorismo na Espanha. Disponível em: http://educaterra.terra.com.br/voltaire/atualidade/2004/03/17/001.htm. Acesso em: 29.1.2011, às 15h13.
[11] FOLHA ONLINE. 27.7.2009, 9h32. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/ folha/mundo/ult94u601946.shtml>. Acesso em 29.11.2010, às 18h26.
[12] Disponível em: <http://www.guerras.brasilescola.com/seculo-xxi/o-ira-na-atualidade.htm>. Acesso em: 29.11.2010, às 10h55.
[13] MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Execução criminal: teoria e prática. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2.010. p. 79.
[14] HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa. Madrid: Trotta, 2010.
[15] HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa, II: Crítica de la razón funcionalista. Madri: Taurus Humanidades, 1.999. p. 7.
[16] HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa, II: Crítica de la razón funcionalista. Madri: Taurus Humanidades, 1.999. p. 8.
[17] MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. A globalização é prejudicial. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura& artigo_ id=5791>. Acesso em: 30.11.2010, às 22h03.
[18] HERKENHOFF, João Baptista. A cultura da paz e da cidadania no Século XXI – integração sem exclusões. In D’ANGELIS, Wagner Rocha (Coord.). Direito da integração & direitos humanos no Século XXI. Curitiba: Juruá, 2.002. p. 96.
[19] HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa, II: Crítica de la razón funcionalista. Madri: Taurus Humanidades, 1.999. p. 11.
[20] Ibidem.
[21] HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa, II: Crítica de la razón funcionalista. Madri: Taurus Humanidades, 1.999. p. 13.
[22] Ibidem. p. 14-15.
[23] Ibidem. p. 16.
[24] Ibidem. p. 19.
[25] HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa, II: Crítica de la razón funcionalista. Madri: Taurus Humanidades, 1.999. p. 20.
[26] Ibidem. p. 21.
[27] Ibidem. p. 31.
[28] Ibidem. p. 37.
[29] Ibidem. p. 45-46. Nesse ponto, é feita alguma incursão sobre o alter e o ego para definir a percepção comunicativa de ambos, afirmando-se que não foi feita, por Mead, investigação experimental, mas calcada em Piaget.
[30] HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa, II: Crítica de la razón funcionalista. Madri: Taurus Humanidades, 1.999. p. 52-62.
[31] Ibidem p. 62-64.
[32] Ibidem. p. 66-69.
[33] Ibidem. p 70-78.
[34] HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa, II: Crítica de la razón funcionalista. Madri: Taurus Humanidades, 1.999. p. 79-81.
[35] Ibidem. p. 83.
[36] Ibidem. p. 89.
[37] HABERMAS, Jürgen. Teoria de la acción comunicativa. Madrid: Trotta, 2.010. t. I e II. p. 541.
[38] Ibidem. p. 543.
[39] ABREU, Lia Márcia Borges de. Os atos declarativos na constituição da relação do psicótico com o mundo e consigo mesmo. Disponível em: <http://www.filologia.org.br/pub_outras/sliit01/sliit01_91-100.html>. Acesso em: 12.10.2010, às 9h.
[40] HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa. Madrid: Trotta, 2.010. t. I e II. p. 544.
[41] HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa. Madrid: Trotta, 2.010. t. I e II. 544-546.
[42] Ibidem. p. 546-547.
[43] HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa. Madrid: Trotta, 2.010. t. I e II. p. 548.
[44] HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa. Madrid: Trotta, 2.010. t. I e II. p. 549-550.
[45] Ibidem. p. 551.
[46] Ibidem. p. 551
[47] HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa. Madrid: Trotta, 2.010. t. I e II. p. 552.
[48] Ibidem.
[49] Ibidem. p. 553.
[50] Ibidem. p. 554-557.
[51] HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa. Madrid: Trotta, 2.010. t. I e II. p. 558.
[52] Ibidem. p. 559.
[53] Ibidem. p. 559.
[54] HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa. Madrid: Trotta, 2.010. t. I e II. p. 560-561.
[55] Ibidem. p. 562.
[56] Ibidem. p. 564.
[57] Ibidem. p. 564-565.
[58] Ibidem. p. 565.
[59] HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa. Madrid: Trotta, 2.010. t. I e II. p. 566-567.
[60] Ibidem. 569.
[61] Ibidem. p. 570.
[62] HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa. Madrid: Trotta, 2.010. t. I e II. p. 571-572.
[63] Ibidem. p. 573-574.
[64] Ibidem p. 575. No livro, são utilizados os termos “ello” e “super-ego”, o que foram traduzidos neste texto, respectivamente, por “isso” e “acima do eu” porque mais adequados à posição freudiana.
[65] Ibidem. p. 577.
[66] HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa. Madrid: Trotta, 2.010. t. I e II. p. 578-579.
[67] Ibidem. p. 580.
[68] Ibidem. p. 581.
[69] Ibidem. p. 582.
[70] Ibidem. p. 583.
[71] HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa. Madrid: Trotta, 2.010. t. I e II. p. 583.
[72] Ibidem.
[73] Ibidem. p. 584.
[74] HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa. Madrid: Trotta, 2.010. t. I e II. p. 585.
[75] Ibidem. p. 585-586.
[76] Ibidem. p. 586.
[77] HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa. Madrid: Trotta, 2.010. t. I e II. p. 588.
[78] Ibidem.
[79] HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa. Madrid: Trotta, 2.010. t. I e II. p. 588.
[80] TASSE, Adel El. Direito internacional penal: A viabilidade de criação de delitos supranacionais e de julgamento dos mesmos por tribunal internacional. In D’ANGELIS, Wagner Rocha (Coord.). Direito da integração e direitos humanos no Século XXI. Curitiba: Juruá, 2.002. p.17.
[81] PIOVESAN, Flávia. Sistema internacional de proteção dos direitos humanos: inovações, avanços e desafios contemporâneas. In D’ANGELIS, Wagner Rocha (Coord.) Op. cit. p. 73.
[82] LIMA, José Antonio Farah Lopes de. Direito penal europeu. Leme: Mizuno, 2.007. passim.
[83] ZBAR, Agustín. Terrorismo internacional y derechos humanos: apuntes para a legislación antiterrorista. Buenos Aires: Abravanel, 2.008. p. 11.
[84] Ibidem. p. 15.
[85] JAKOBS, Günther; MELIÁ, Manuel Cancio. Derecho penal del enemigo. Buenos Aires: Hammurabi, 2.007. p. 99.
[86] ZBAR, Agustín. Op. cit. p. 17.
[87] JAKOBS, Günther; MELIÁ, Manuel Cancio. Derecho penal del enemigo. Buenos Aires: Hammurabi, 2.007. p. 105-106.
[88] FERRAJOLI, Luigi. Diritto e ragione: Teoría del garantismo penale. Roma: Laterza, 1989.
[89] ZBAR, Agustín. Terrorismo internacional y derechos humanos: apuntes para a legislación antiterrorista. Buenos Aires: Abravanel, 2.008. p. 23.
[90] Ibidem. p. 26.
[91] Ibidem. p. 26-27.
[92] ZBAR, Agustín. Terrorismo internacional y derechos humanos: apuntes para a legislación antiterrorista. Buenos Aires: Abravanel, 2.008. p. 48.
[93] Ibidem. p. 49.
[94] ZBAR, Agustín. Terrorismo internacional y derechos humanos: apuntes para a legislación antiterrorista. Buenos Aires: Abravanel, 2.008. p. 54.
[95] ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social. São Paulo: Martin Claret, 2001. p. 47.
[96] JAKOBS, Günther; MELIÁ, Manuel Cancio. Derecho penal del enemigo. Buenos Aires: Hammurabi, 2.007. p. 25.
[97] ZBAR, Agustín. Terrorismo internacional y derechos humanos: apuntes para a legislación antiterrorista. Buenos Aires: Abravanel, 2.008. p. 66.
[98] FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2.002. p. 749.
[99] Dentre os livros que consultados, podem ser citados o seguintes: BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 1.998; CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 4. ed. Coimbra: Almedina, 2.000; CRUZ, Álvaro Ricardo de Souza. Jurisdição constitucional democrática. Belo Horizonte: Del Rey, 2.004; MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade: estudos de direito constitucional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2.006; MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2.005; PEZZI, Alexandra Cristiana Giacomet. Dignidade da Pessoa Humana: Mínimo Existencial e Limites à Tributação no Estado Democrático de Direito. Curitiba: Juruá, 2.008; SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 25. ed. São Paulo: Malheiros, 2005; TORRES, Ricardo Lobo (Org.). Teoria dos direitos fundamentais. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2.001.
[100] SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 18. ed. São Paulo: Malheiros, 2.000. p. 109.
[101] MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade: estudos de direito constitucional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2.006. p. 95.
[102] SARMENTO, Daniel. Os princípios constitucionais e a ponderação de bens. TORRES, Ricardo Lobo (Org.). Teoria dos direitos fundamentais. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2.001. p. 59-60.
[103] MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade: estudos de direito constitucional. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2.006. p. 3.
[104] O desenrolar dos fatos e atos que os sucederam estão disponíveis em: <http://noticias.terra.com.br/mundo/noticias/0,,OI4578455-EI8142,00-Morte+do+ brasileiro+Jean+Charles+completa+cinco+anos.html>. Acesso em: 1.12.2010, às 9h40.
[105] BRANCO, Paulo Gustavo Gonet; COELHO, Inocêncio Mártires; MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2.007. p. 240.
[106] BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 256-257.
[107] LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do direito. 3. ed. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 1997. p. 201.
[108] Posição crítica à tópica pode ser encontrada, em: MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Imputação objetiva: discutindo com o Prof. Dr. Chaves Camargo. Teresina: Jus Navigandi, ano 8, n. 160, 13 dez. 2003. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/ doutrina/texto.asp?id=4572&p=2>. Acesso em: 26.2.2009, às 2h35.
[109] GUERRA FILHO, Willis Santiago. A filosofia do direito: aplicada ao direito processual e à teoria da constituição. São Paulo: Atlas, 2.001. p. 97.
[110] BARROSO, Luís Roberto. O direito constitucional e a efetividade de suas normas: limites e possibilidades da Constituição brasileira. 7. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2.003. p. 281.
[111] MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade: estudos de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2.004. p. 118.
[112] SARMENTO, Daniel. Os princípios constitucionais e a ponderação de bens. TORRES, Ricardo Lobo (Org.). Teoria dos direitos fundamentais. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2.001. p. 57.
[113] ORDEIG, Enrique Gimbernat. Conceito e método da ciência do direito penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 13.
[114] COSTA, Álvaro Mayrink da. Direito penal: parte especial. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 1.357.
[115] CALDEIRA, Regina S. Agente das mudanças – Dra. Sandra Lia Simón. Brasília: Justilex, Ano II, nº 24, dez/2.003, p. 6.
[116] São exemplos do que se expõe, no sentido de não ser mencionada a inadequação de certos tipos: BITENCOURT, Sérgio Roberto. Código penal comentado. São Paulo: Saraiva, 2.002. p. 813-838; COSTA, Álvaro Mayrink da. Direito penal – parte especial. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2.001. p. 1353-1400; MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código penal interpretado. São Paulo: Atlas, 1.999. 1211-1230; NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2.002. p. 623-642.
[117] Disponível em: <http://dftv.globo.com/Jornalismo/DFTV/0,,MUL853822-10044-221,00-ANOS+DE+IMPUNIDADE+PARA+O+SUPOSTO+ASSASSINO.html>. Acesso em: 1.12.2010, às 15h10.
[118] FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2.002. p. 726.
[119] Ibidem.
[120] MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Garantismo, igualdade e tutela de direitos fundamentais. Teresina: Jus Navigandi, ano 15, n. 2434, 1.3.2010. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/14425>. Acesso em: 1.12.2010, às 16h.
[121] MACHADO, Isabel Penido de Campos. O princípio da igualdade no sistema interamericano de proteção dos direitos humanos: do tratamento diferenciado ao tratamento discriminatório. In OLIVEIRA, Márcio Luiz de. O sistema interamericano de proteção dos direitos humanos: interface do direito constitucional contemporâneo. Belo Horizonte: Del Rey, 2.007. p. 129.
[122] BITTAR, Eduardo C. B, ALMEIDA, Guilherme Assis de. Curso de filosofia do direito. São Paulo: Atlas, 2001. p. 44/45.
[123] MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Prescrição penal. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2.007. p. 6-8.
[124] RUBIANES, Carlos J. Manual de derecho procesal penal. Buenos Aires: Depalma, 1.978. v. 1, p. 77-78.
[125] MIRABETE, Júlio Fabbrini; FABBRINI, Renato Nascimento. Processo penal. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2.005. p. 45.
[126] LIMA, Marcellus Polastri. Curso de processo penal. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2.006. v. 1. p. 41.
[127] MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2.005. p. 264.
[128] FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2.002. p. 441-450.
[129] FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2.002. p. 441.
[130] PIETRO, Maria Sylvia Zanella di. Direito administrativo. 8. ed. São Paulo: Atlas, 1997. p. 61.
[131] MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Execução criminal: teoria e prática. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2.010. p. 8.
[132] MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais. São Paulo: Atlas, 1.997. p. 110.
[133] MARQUES, José Frederico et al. Tratado de direito penal. Campinas: Bookseller, 1997. vol. 1, p. 182.
[134] ANTOLISEI, Francesco. Manuale di diritto penale. 2. ed. Milão: Giufrè, 1949. parte geral, p.31.
[135] ASÚA, Luiz Jimez de apud MARQUES, José Frederico. Tratado de direito penal. Campinas: Bookseller, 1997. vol. 1, p. 182.
[136] FRAGOSO, Heleno Cláudio, FRAGOSO, Fernando. Lições de direito penal. Rio de Janeiro: Forense, 1990. parte geral, p. 90.
[137] ZAFFARONI, Raúl Eugenio, e PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro. São Paulo : RT, 1997. p. 178.
[138] MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Execução criminal. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 29-30.
[139] DOTTI, René Ariel. A reforma penal e penitenciária. São Paulo: Ghignone, [1980?]. p. 55.
[140] BONESANA, Cesare (Marquês de Beccaria). Dos delitos e das penas. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1996. p. 63.
[141] ADEODATO, João Maurício Leitão. O problema da legitimidade: no rastro do pensamento de Hanna Arendt. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1989. p. 20.
[142] Ibidem. p. 21.
[143] Ibidem. p. 27.
[144] SILVA, De plácido e. Vocabulário jurídico. 20. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 480.
[145] Ibidem. p. 481.
[146] Não se afirma aqui que as palavras lex e contrato tem o mesmo sentido na sua origem, pois contrato deriva do latim contractus, que significa convenção, transação ou ajuste.
[147] NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 8. ed. São Paulo: 2.008. p. 48.
[148] MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Execução criminal. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2.007. p. 175-176.
[149] CHRISTOPHER, Catherwood. A loucura de Churchill. 2. ed. Rio de Janeiro: Record, 2.006. 19.
[150] LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2.009. p. 31.
[151] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional. 4. ed. Coimbra: Almedina, 2.000. p. 1.385.
[152] AMBOS, Kai. A parte geral do direito penal internacional: bases para uma elaboração dogmática. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2.008. p. 106.