quarta-feira, 27 de dezembro de 2023

O Juiz deve aplicar a lei. Violar a lei não é o seu papel.

 

O presente texto decorre de situações que enfrento com frequência e que me deixam indignado pela prática de alguns Advogados e de alguns Juízes de Direito e Desembargadores de Justiça. Com efeito, são impetrados mandados de segurança contra a Diretora Executiva do Centro Brasileiro de Pesquisa em Avaliação e Seleção e de Promoção de Eventos-CEBRASPE perante varas cíveis do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios-TJDFT porque candidatos perdem prazo para pagar inscrição do Programa de Avaliação Seriada-PAS ou do vestibular da Universidade de Brasília-UnB e são concedidas liminares ou antecipações dos efeitos das tutelas recursais para determinar a admissão da realização da prova, violando a legalidade e a isonomia.

Esclareça-se inicialmente que o Decreto n. 8.078, de 19.8.2013, qualifica o CESPE (instituído pela FUB como um centro administrativo e acadêmico seu) sob a denominação de CEBRASPE, como organização social, dispondo:

Art. 1o É qualificado como Organização Social o Centro Brasileiro de Pesquisa em Avaliação e Seleção e de Promoção de Eventos – CEBRASPE, associação civil com sede em Brasília, Distrito Federal, inscrito no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas – CNPJ sob o número 18.284.407/0001-53, registrado no 2o Ofício de Registro de Pessoas Jurídicas de Brasília, Distrito Federal, sob o no 000082415, de 13 de maio de 2013, que tem como objetivo realizar atividades de gestão de programas, projetos, apoio técnico e logístico para subsidiar sistemas de avaliação educacional, mediante a celebração de contrato de gestão a ser firmado com o Ministério da Educação.

Sem dizer qual será a nova categoria do CEBRASPE, em um arroubo inconsequente, o Decreto n. 11.062, de 4.5.2022, o desqualificou de organização social, mantendo-se a sua existência como ente privado. Isso faz com que a FUB tenha interesse porque os certames são seus, sendo o CEBRASPE mero executor dos PAS e vestibulares.

A tática é evitar a jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, o qual pacificou jurisprudência no sentido de que o edital é a lei do certame.[1] Caso queira impugná-lo, que o candidato o faça previamente,[2] visto que aos Juízes e Tribunais incumbe a aplicação, não a criação da lei.[3]

Adolescentes alegam ter imprimido o boleto e entregue a um dos genitores ou a irmãos mais velhos e que eles perderam o prazo por algum motivo que inventam, isso sem qualquer lastro probatório.

Como há interesse da Fundação Universidade de Brasília-FUB, instituída pela Lei n. 3.998, de 15.12.1961, para gerir os recursos humanos e materiais da UnB (art. 3º), peço a habilitação do Decano de Ensino de Graduação-DEG, que é quem assina os editais de PAS e vestibulares, pedindo para prevalecer a constitucional competência da Justiça Federal (Constituição Federal, art. 109, inciso I). Com isso, peço reconsideração das decisões e a remessa da ação mandamental para a Seção Judiciária do Distrito Federal, onde – espero – juízo efetivamente competente poderá reverter aquilo que o TJDFT vem equivocadamente consolidando.

O mandado de segurança exige prova pré-constituída, razão pela qual o direito de adolescentes não pode estar fundamentado em supostos erros de terceiras pessoas (pais, irmãos, tios, avós etc.) sem a necessária dilação probatória, incabível na ação mandamental.

Ao ter em vista o art. 5º, inciso II, da Constituição Federal, a FUB não pode se ver compelida a cumprir sentença (lei do caso concreto) que viole a lei geral, razão de se valer de todos recursos e meios jurídicos admissíveis em Direito para evitar ter que fazer algo não previsto em lei.



[1] Sempre cito decisão interlocutória paradigma, proferida nos autos do Mandado de Segurança n. 1113337-61.2023.4.01.3400, que informa claramente que conceder a liminar será violar o princípio da legalidade e o da isonomia. Dele consta o seguinte precedente, in litteris:

ADMINISTRATIVO. VESTIBULAR. MATRÍCULA. PERDA DE PRAZO. AUSÊNCIA DE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA DE FATO IMPEDITIVO ALHEIO À VONTADE DO IMPETRANTE. INEXISTÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO A SER PROTEGIDO POR MEIO DE MANDADO DE SEGURANÇA. 1. O mandado de segurança não admite dilação probatória, nem tampouco exame de questões de fato controvertidas, reclamando do impetrante prova pré-constituída a propósito do direito líquido e certo que afirma existente e pretende ver tutelado. 2. Não tendo o impetrante feito demonstração, à luz de prova pré-constituída, quanto a fato impeditivo e alheio a sua vontade que o impediu de efetivar sua matrícula na data designada pelo edital do vestibular para tanto, nem de vício ou irregularidade no edital no tocante a efetivação da matrícula, não se reconhece a existência de direito líquido e certo a ensejar a concessão da segurança. É de se ressaltar que não se pode considerar a circunstância de o pai do impetrante estar trabalhando em dois períodos, com intervalo de duas horas entre cada uma deles, como motivo de força maior que impossibilitasse o impetrante, porque dele a obrigação, de realizar sua matrícula na época oportuna, com o devido pagamento ou recolhimento bancária da taxa de inscrição. 3. Recurso de apelação e remessa oficial a que se dá provimento. (TRF - 1ª Região - 0002014-21.2008.4.01.4200 - DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS MOREIRA ALVES - SEXTA TURMA - e-DJF1 1.8.2011 PAG 101)

Para não pairar dúvidas sobre o que a sentença fundamenta, transcrevo um parágrafo dela:

Entender de modo contrário esbarraria exatamente na inteligência dos princípios da legalidade e da isonomia, bem como do instrumento convocatório, já que todos os participantes do certame deveriam observar os termos do edital.

[2] O mandado de segurança não é o procedimento adequado para declaração em tese de inconstitucionalidade de norma jurídica. Não tendo sido previamente impugnado em sede de ação de controle de (in)constitucionalidade, o edital será constitucional e, portanto, obediência a ele não importará em ilegalidade, seja por abuso ou desvio do poder.

[3] Carlos Maximiliano nos ensina que o brocardo in claris cessat interpretatio há muito se encontra significativamente mitigado. Aliás, sobre esse brocardo, diz ser “afirmativa sem nenhum valor científico, ante as ideias triunfantes na atualidade” (MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e interpretação do direito. 18. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p. 33). Assim, não desejamos que o Juiz seja “a boca da lei” e sim um intérprete coerente.

quarta-feira, 20 de dezembro de 2023

A possibilidade [mínima] de ANPP após a prolação de sentença condenatória

Serei sucinto sobre um assunto complexo e, ainda, controvertido acerca do acordo de não persecução penal (ANPP), a partir de um caso concreto inserido em processo recentemente arquivado no STF, no qual, enquanto Advogado, atuando pro bono publica, obtive êxito.

O ANPP foi inserido no CPP por força da Lei n. 13.964, de 24.12.2019,[1] ao trazer o novel art. 28-A,[2] pegando emprestado o modelo já existente na legislação processual italiana. Mas, com precário nível técnico, isso a partir da sua denominação.[3] Nesse sentido:

Portanto, seguindo esta tendência, em junho de 2015 entrou em vigor a nova redação do artigo 131, bis, do Código Penal Italiano, no qual crimes com pena máxima de até cinco anos, e desde que não haja relevante consequência, nem seja o autor do fato um a pessoal habitualmente envolvida em crimes, poderá o Ministério Público propor o arquivamento fundamentadamente. Esta medida foi adotada até mesmo na Itália recentemente, mesmo havendo a previsão expressa da obrigatoriedade da ação penal no artigo 112 da Constituição daquela Nação. Porém, a lei utilizou a saída de se estabelecer que nestas hipóteses não seria crime, no aspecto material. Curiosamente, as reclamações sobre estes arquivamentos partiram de setores ligados à defesa daquele país, e não dos órgãos estatais.[4]

Antes da alteração do CPP o ANPP já vinha sendo aplicado, por força da Resolução n. 181, de 7.8.2017, do Conselho Nacional do Ministério Público, em seu art. 18, já o previa. Com o advento da nova lei, retornou uma velha discussão já travada noutros momentos, eis que a norma é mista, tendo conteúdo material mais benéfico ao suposto agente. Ela será retroativa?

Por fatos de 27.5.2019, um homem foi denunciado no dia 13.8.2019, como incurso nas penas dos artigos 147 e 345 do CP (respectivamente, ameaça e exercício arbitrário pelas próprias razões) e art. 14 da Lei n. 10.826, de 22.12.2003 (porte de arma). Ele me pediu ajuda e, em resposta acusação, sustentei a ilegitimidade ativa do MPDFT para o crime do art. 345 do CP, por ser de ação de iniciativa exclusivamente privada (art. 345, parágrafo único do CP), o que foi acolhido.

Na sentença, de 2.12.2019, houve absolvição do crime do art. 147 do CP e condenação pelo do art. 14 da Lei n. 10.826/2003. Pena aplicada, 2 anos de reclusão e 10 dias-multa. Então, houve apelação do sentenciado, em 8.12.2019.

No dia 20.2.2020 os autos retornaram à vara de origem, momento em que foi requerido o ANPP, visto que já tinha se passado o prazo de vacatio legis (30 dias), ex vi do art. 20 da Lei 13.964/2019. Porém, o juízo não se pronunciou e restituiu o processo para a turma criminal. Ali, requereu-se ao relator da apelação o ANPP.

Os autos foram enviados ao MPDFT, o qual sustentou a preclusão, concretizada pela prolação da sentença condenatória. A turma, por maioria, negou provimento à apelação. Então, foi interposto Embargos Infringentes, conhecido e, por maioria, improvido.

Foram interpostos Recurso Especial (REsp) e Recurso Extraordinário (RE). Mas, esqueci de juntar a petição deste último, embora tenha pagado as suas custas e elaborado a petição de interposição.

O relator do REsp conheceu do recurso e julgou o mérito monocraticamente, negando provimento ao mesmo. Então, sobreveio agravo interno, o qual foi conhecido e improvido.

Em favor do condenado, impetrei habeas corpus substitutivo do recurso. Fiquei preocupado porque o relator é Pastor de igreja evangélica e o paciente é notório homossexual. Fui surpreendido pela liminar concessiva da ordem de habeas corpus. A Procuradoria-Geral da República interpôs agravo interno, o qual foi conhecido e improvido, nos seguintes termos:

EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. ART. 28-A DO CPP. ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL.  NORMA DE NATUREZA MISTA OU HÍBRIDA (MATERIAL E PROCESSUAL). APLICAÇÃO RETROATIVA A PROCESSOS EM CURSO QUANDO DA ENTRADA EM VIGOR DA NORMA. LIMITE TEMPORAL: TRÂNSITO EM JULGADO DA CONDENAÇÃO. DESNECESSIDADE DE CONFISSÃO ANTERIOR.

1. O art. 28-A do CPP é norma de natureza híbrida, ou mista, porque, embora discipline instituto processual, repercute na pretensão punitiva (de natureza material), devendo retroagir, ante o princípio da retroatividade da norma penal benéfica (CRFB, art. 5º, inc. XL).

2. O conteúdo processual da norma (e do instituto) obriga observar como marco temporal o momento processual do ANPP, e não o tempus delicti.  3. A retroatividade alcança processos em curso, tendo como limite o trânsito em julgado, pois, após esse momento, encerra-se a persecução penal e inicia-se a persecução executória.

4. O recebimento da denúncia e a existência de sentença condenatória não impedem a propositura do acordo.

5. No ANPP, a confissão não se destina à formação da culpa, podendo, então, haver retroação da norma a acusados não confessos, ainda que condenados, desde que o façam posteriormente, nos termos da lei.

6. O julgamento definitivo do Habeas Corpus n. 185.913/DF pelo Plenário, certamente, contribuiria para a segurança jurídica e a pacificação social sobre o tema. No entanto, após as idas e vindas concernentes à sua pauta, a análise da matéria tornou-se imperativa, sob pena de negar-se jurisdição, especialmente diante de recentes pronunciamentos de Ministros da Segunda Turma.

7. Agravo regimental do Ministério Público Federal ao qual se nega provimento.[5]

A matéria é controvertida, sendo que alguns defendem a possibilidade do ANPP para fatos anteriores à lei somente até o recebimento da denúncia, outros somente até a sentença e, por fim, há quem defenda até o trânsito em julgado definitivo da condenação. Essa última é a minha posição.

O Habeas Corpus n. 185.913/DF foi afetado ao plenário do STF. Seu relator é o Ministro Gilmar Mendes, o qual ao afetar ao Tribunal Pleno demonstrou as divergências internas sobre a matéria. A divergência está presente, também, na doutrina.[6]

Com esse texto espero contribuir para a evolução do conhecimento da matéria e, especialmente, com aqueles que desejam um caminho para o sucesso perante algum tribunal, isso acerca retroatividade da ANPP aos fatos que são anteriores à Lei n. 13.964/2019.



[1] Também denominado de pacote anticrime, a ementa da lei [Aperfeiçoa a legislação penal e processual penal] demonstra o quanto o seu ardoroso defensor, ex-Juiz Federal e então Ministro da Justiça, é pedante.

[2] Código de Processo Penal:

Art. 28-A. Não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante as seguintes condições ajustadas cumulativa e alternativamente:

I - reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo;

II - renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público como instrumentos, produto ou proveito do crime;

III - prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à pena mínima cominada ao delito diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo juízo da execução, na forma do art. 46 do Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal);

IV - pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), a entidade pública ou de interesse social, a ser indicada pelo juízo da execução, que tenha, preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito; ou

V - cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que proporcional e compatível com a infração penal imputada.

§ 1º Para aferição da pena mínima cominada ao delito a que se refere o caput deste artigo, serão consideradas as causas de aumento e diminuição aplicáveis ao caso concreto.

§ 2º O disposto no caput deste artigo não se aplica nas seguintes hipóteses:

I - se for cabível transação penal de competência dos Juizados Especiais Criminais, nos termos da lei;

II - se o investigado for reincidente ou se houver elementos probatórios que indiquem conduta criminal habitual, reiterada ou profissional, exceto se insignificantes as infrações penais pretéritas;

III - ter sido o agente beneficiado nos 5 (cinco) anos anteriores ao cometimento da infração, em acordo de não persecução penal, transação penal ou suspensão condicional do processo; e

IV - nos crimes praticados no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou praticados contra a mulher por razões da condição de sexo feminino, em favor do agressor.

§ 3º O acordo de não persecução penal será formalizado por escrito e será firmado pelo membro do Ministério Público, pelo investigado e por seu defensor.

§ 4º Para a homologação do acordo de não persecução penal, será realizada audiência na qual o juiz deverá verificar a sua voluntariedade, por meio da oitiva do investigado na presença do seu defensor, e sua legalidade.

§ 5º Se o juiz considerar inadequadas, insuficientes ou abusivas as condições dispostas no acordo de não persecução penal, devolverá os autos ao Ministério Público para que seja reformulada a proposta de acordo, com concordância do investigado e seu defensor.

§ 6º Homologado judicialmente o acordo de não persecução penal, o juiz devolverá os autos ao Ministério Público para que inicie sua execução perante o juízo de execução penal.

§ 7º O juiz poderá recusar homologação à proposta que não atender aos requisitos legais ou quando não for realizada a adequação a que se refere o § 5º deste artigo.

§ 8º Recusada a homologação, o juiz devolverá os autos ao Ministério Público para a análise da necessidade de complementação das investigações ou o oferecimento da denúncia.

§ 9º A vítima será intimada da homologação do acordo de não persecução penal e de seu descumprimento.

§ 10. Descumpridas quaisquer das condições estipuladas no acordo de não persecução penal, o Ministério Público deverá comunicar ao juízo, para fins de sua rescisão e posterior oferecimento de denúncia.

§ 11. O descumprimento do acordo de não persecução penal pelo investigado também poderá ser utilizado pelo Ministério Público como justificativa para o eventual não oferecimento de suspensão condicional do processo.

§ 12. A celebração e o cumprimento do acordo de não persecução penal não constarão de certidão de antecedentes criminais, exceto para os fins previstos no inciso III do § 2º deste artigo.

§ 13. Cumprido integralmente o acordo de não persecução penal, o juízo competente decretará a extinção de punibilidade.

§ 14. No caso de recusa, por parte do Ministério Público, em propor o acordo de não persecução penal, o investigado poderá requerer a remessa dos autos a órgão superior, na forma do art. 28 deste Código.

[3] JARDIM, Afrânio Silva; AMORIM, Pierre Souto Maior Coutinho de. Primeiras impressões sobre a Lei n. 13.964/2019, aspectos processuais. In MADEIRA, Guilherme; BADARÓ, Gustavo; CRUZ, Rogério Schietti (Coord.). Código de processo penal. São Paulo: Thomson Reuters, 2021. v. 1, p. 384-385.

[4] MELO, André Luís Alves de. A disfuncional confissão no acordo de não persecução penal (ANPP). Consultor Jurídico, MP no Debate, 21.12.2020. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2020-dez-21/mp-debate-disfuncional-confissao-acordo-nao-persecucao-penal/#:~:text=O%20ANPP%20(Acordo%20de%20N%C3%A3o,no%20artigo%203%C2%BA%20do%20CPP.>. Acesso em: 19.12.2023, às 19h.

[5] BRASIL. STF. 2ª Turma. Habeas Corpus n. 214.456/DF. Min. André Mendonça. Julgamento, em 3.7.2023. Disponível em: <chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://peticionamento.stf.jus.br/api/peca/recuperarpdf/15360059383>. Acesso em: 19.12.2023, às 17h25.

[6] (1) Não comentou, inicialmente, a retroatividade da lei: NUCCI, Guilherme de Souza. Pacote Anticrime comentado: Lei n. 13.964, de 24.12.2019. Rio de Janeiro: Forense, 2020. p. 60-66. (2) Equivocadamente, sustenta-se que o STF firmou jurisprudência no sentido de ser cabível o ANPP somente para fatos anteriores ao recebimento da denúncia: GARCETE, Carlos Alberto. 80 anos do código de processo penal: a paulatina naturalização do sistema acusatório. In MADEIRA, Guilherme; BADARÓ, Gustavo; CRUZ, Rogério Schietti (Coord.). Código... (op. cit.). p. 233.

domingo, 17 de dezembro de 2023

A antecipação dos efeitos da tutela recursal, em regra, perde os seus efeitos com a sentença de mérito

A minha especialização é jurídico-criminal. Mas, no exercício do meu cargo tenho que enfrentar outras demandas jurídicas, sendo recorrentes os mandados de segurança, especialmente de dependentes de militares, visando a transferência obrigatória para a Universidade de Brasília (UnB).

Grande parte dos pedidos buscam a tutela judicial para a imoralidade, visto que – especialmente no governo 2018-2022 – muitos Oficiais das Forças Armadas eram transferidos, parece, apenas para favorecer o ingresso de algum dependente em Cursos de Medicina nas Universidades Públicas Brasileiras, com enfoque especial na UnB.

Já enfrentei situação concreta, em que o Oficial Superior da Força Aérea Brasileira foi transferido para cidade paraguaia limítrofe o Brasil, seu filho conseguiu vaga de cortesia para ingressar em universidade pública ali, podendo residir no Brasil, e após 2 anos regressou ex officio para Brasília. Obviamente, por não haver congeneridade na forma de ingresso, o pedido administrativo foi indeferido. Então, ele ingressou com mandado de segurança.

Noutra situação, Oficial foi transferido para a China. Ali, sua filha ingressou no curso de Pré-Medicina, mediante seleção simplificada. 18 meses depois, retornou ex officio para Brasília. Novamente, por não haver congeneridade na forma de ingresso e não haver matrícula no Curso de Medicina, o pedido administrativo foi indeferido.

Nas 2 situações mencionadas, o juízo de origem indeferiu os pedidos de liminares. No entanto, o TRF1 concedeu as antecipações dos efeitos das tutelas recursais requeridas, determinando as matrículas dos recorrentes.

Temos que ter cuidado para não favorecer condutas imorais pela concretização de situação que imponha o reconhecimento da teoria do fato consumado,[1] isso a fim de que o processo não se torne instrumento para a consolidação de posturas imorais.

No caso da dependente de militar que foi à China e impetrou mandado de segurança no ano de 2020, anteontem, recebi a informação  de que a segurança foi denegada em sentença de mérito. Eis aí a situação, caso ela termine o curso, será aplicada a teoria do fato consumado. Assim, emerge a pergunta:

– poderíamos determinar o desligamento da aluna do curso?

Ao meu entender, a resposta é positiva. Isso porque o Superior Tribunal de Justiça entende:

EMENTA: AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DECISÃO DE ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. INTERPOSIÇÃO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO. DISCUSSÃO ACERCA DA RELAÇÃO JURÍDICA TRAVADA ENTRE AS CORRÉS NA AÇÃO ORIGINÁRIA. QUESTÃO DECIDIDA NA SENTENÇA PROLATADA ANTES DO JULGAMENTO DAQUELE AGRAVO. ACÓRDÃO EMBARGADO DA TERCEIRA TURMA QUE DECIDIU PELA PERDA DE OBJETO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO. MÉRITO DA CONTROVÉRSIA DECIDIDO EM OUTRO RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO CONTRA ACÓRDÃO DA APELAÇÃO, O QUAL DEFERIU EFEITO SUSPENSIVO, VEDANDO O LEVANTAMENTO DE VALORES DEPOSITADOS EM JUÍZO E O REPASSE DE QUAISQUER PAGAMENTOS À FUNDAÇÃO ORA EMBARGANTE ATÉ O TRÂNSITO EM JULGADO DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DESSEMELHANÇA DO CASO COM AQUELOUTROS TRATADOS NOS PARADIGMAS. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL INEXISTENTE. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA LIMINARMENTE INDEFERIDOS. REITERAÇÃO DAS ALEGAÇÕES. INSUBSISTÊNCIA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.

1. Os embargos de divergência - recurso de fundamentação vinculada e de cognição restrita - têm como fim precípuo uniformizar a jurisprudência do Tribunal, não se prestam a mero rejulgamento da causa pela Corte Especial, como fosse via recursal ordinária interna. É requisito elementar de admissibilidade do recurso haver soluções jurídicas diversas a partir da análise de casos fático-processuais semelhantes, o que deve ser demonstrado com o cotejo analítico entre os julgados comparados, consoante disposto no art. 1.043, § 4º, do Código de Processo Civil e do art. 266, caput, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça.

2. "A falta de similitude fático-jurídica entre o acórdão embargado e o apresentado como paradigma obsta a admissão do recurso de embargos de divergência, pois tem-se por não cumpridos os arts. 1.043, § 4º, do CPC e 266, § 4º, do RI/STJ" (AgInt nos EDcl nos EAREsp 1337814/RS, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, CORTE ESPECIAL, julgado em 22/03/2022, DJe 24/03/2022).

3. Nos presentes autos, sem arranhar o entendimento sufragado nos paradigmas, o acórdão embargado, ao dar provimento ao recurso especial da PETROBRAS, decidiu pela perda de objeto do agravo de instrumento exatamente em razão da superveniência de sentença de mérito na origem, anterior à prolação do acórdão recorrido. Assim, o entendimento esposado pelo acórdão embargado, dada as peculiaridades do caso, ao contrário de divergir da jurisprudência citada, ratifica a tese de prevalência da decisão de mérito sobre a tomada em caráter cautelar.

4. Agravo interno desprovido.[2] (grifei)

Com Araken de Assis, não digo que sempre o recurso de agravo de instrumento estará prejudicado, visto que tal recurso poderá ser julgado na mesma sessão de julgamento da apelação (CPC, art. 946, parágrafo único),[3] no entanto, a prevalência da sentença de mérito autorizará ao tribunal, ao julgar o agravo considerá-lo prejudicado, visto que, em casos que não se sustenta qualquer preliminar de incompetência ou outro vício que poderá anular a sentença, efetivamente, a sentença de mérito prejudicará o agravo. O mesmo se dará se o juízo a quo decidir em sentença reconhecendo preliminar arguida em sede de agravo de instrumento.

Para não cansar o leitor concluo o presente artigo sem me estender e desejando que prevaleça a moralidade e a isonomia em tais casos, evitando-se a aplicação da teoria do fato consumado.



[1] BRASIL. STJ. 2ª Turma. REsp 709.934/RJ (2004/0175944-8). Min. Humberto Martins. Julgamento, em 21.6.2007. Disponível em: <chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=200401759448&dt_publicacao=29/06/2007>. Acesso em: 17.12.2023, às 10h30:

EMENTA: ADMINISTRATIVO. DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. MATÉRIA AFETA AO STF. MILITAR. TRANSFERÊNCIA EX OFFICIO. ENSINO SUPERIOR. MATRÍCULA DE DEPENDENTE. CONGENERIDADE. DECURSO DE 6 ANOS DA CONCESSÃO DA SEGURANÇA. APLICAÇÃO DA TEORIA DO FATO CONSUMADO.

1. A apreciação de suposta ofensa a preceitos constitucionais não é possível na via especial, nem à guisa de prequestionamento; porquanto matéria reservada, pela Carta Magna, ao Supremo Tribunal Federal.

2. É assegurado o direito à transferência obrigatória de servidor militar estudante e de seus dependentes quando ele tenha sido removido ex officio e no interesse da Administração Pública, desde que a instituição de ensino seja congênere à de origem; ou seja, de pública para pública ou de privada para privada, caso dos autos.

3. Entretanto, na hipótese dos autos, verifica-se que, entre a sentença que concedeu a segurança tornando possível a matrícula da ora recorrida na UFRJ e a presente data, decorreram aproximadamente seis anos.

4. Impõe-se, no caso, a aplicação da Teoria do Fato Consumado, segundo a qual as situações jurídicas consolidadas pelo decurso do tempo, amparadas por decisão judicial, não devem ser desconstituídas, em razão do princípio da segurança jurídica e da estabilidade das relações sociais.

Recurso especial conhecido em parte e improvido. (grifei)

[2] BRASIL. STJ. AgInt nos Eresp 1971910/RJ e AgInt nos EDREsp 2019/0159243-6. Corte Especial. Min. Laurita Vaz. Julgamento, em 22.8.2023. Disponível em: <chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=201901592436&dt_publicacao=30/08/2023>. Acesso em: 15.11.2023, às 14h50.

[3] ASSIS, Araken de. Manual dos recursos. São Paulo; Revista dos Tribunais, 2016. p. 658.

terça-feira, 12 de dezembro de 2023

Prescrição da pretensão sancionatória administrativa não pode ser declarada antecipadamente, sem o decurso de 5 anos

Segue uma minuta de informações em mandado que elaborei. Espero que seja assinada porque exponho nela aquilo que realmente defendo. Veja-se:


AO JUÍZO DA XXXª VARA FEDERAL CÍVEL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO DISTRITO FEDERAL

Mandado de Segurança n. xxx

Impetrante: xxx

MÁRCIA ABRAHÃO MOURA, brasileira, maior, capaz, Presidente da Fundação Universidade de Brasília e Reitora da Universidade de Brasília, com endereço profissional localizado no Prédio da Reitoria, situado no Campus Universitário Darcy Ribeiro, em Brasília-DF, vem à presença desse douto juízo para apresentar

INFORMAÇÕES

em face do mandado de segurança em epígrafe, esclarecendo inexistir qualquer direito líquido e certo a ser tutelado na via mandamental, pois o impetrante não demonstra qualquer ilegalidade ou abuso de poder por parte da administração pública, visto que se insurge contra instauração de processo administrativo disciplinar, olvidando-se que a administração tem o poder-dever de apurar as infrações disciplinares que chegarem ao seu conhecimento.

Síntese do procedimento

2. A petição inicial, protocolada em xxx, na qual o impetrante sustenta que a administração pública tomou conhecimento da potencial infração no dia 4.4.2023. Tenta provar a prescrição da pretensão punitiva estatal sustentando prazo prescricional de 180 dias, sem que exista julgamento da autoridade impetrada. Então, pediu judicialmente:

Por todo o exposto, requer-se o conhecimento do presente writ constitucional e, liminarmente, inaudita altera pars, A SUSPENSÃO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR N° 23106.042041/2023-95 e, no mérito, A CONCESSÃO DA SEGURANÇA PLEITEADA PARA RECONHECER A PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA, arquivando-se o PAD anteriormente numerado.

Por fim, requer-se que todas as comunicações atinentes sejam direcionados aos causídicos que subscrevem a presente petição, através dos e-mails (i) xxx@gmail.com e (ii) yyy@gmail.com, para acompanhamento. (id. xxx).

3. Foi certificada negativamente a prevenção no mesmo dia xxx (id. xxx). Então, em xxx, esse douto juízo determinou a emenda da petição inicial, em relação ao valor da causa (id. xxx).

4. Intimado, em xxx, na mesma data e em xxx, o impetrante emendou a petição inicial (respectivamente, id. xxx e xxx). No dia xxx esse douto juízo escorreitamente decidiu:

A Lei 12.016/2009, em seu artigo 7º, III, exige, para a concessão da liminar em mandado de segurança, a presença simultânea de dois requisitos, a saber:

a) a existência de plausibilidade jurídica (fumus boni iuris); e

b) a possibilidade de lesão irreparável ou de difícil reparação (periculum in mora).

O segundo requisito está ausente, uma vez que a tramitação do Processo Administrativo Disciplinar até decisão final do processo, após manifestação da autoridade apontada como coatora, não traria danos irreversíveis ao impetrante.

Por outro lado, seria precipitado reconhecer a existência de prescrição sem sequer permitir à autoridade coatora manifestar-se sobre a alegação.

Ante o exposto, indefiro a liminar.

Intime-se a autoridade apontada como coatora para que preste informações no prazo legal de 10 dias (art. 7º, I, da Lei 12.016/2009).

Dê-se ciência do feito ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada, para que, querendo, ingresse no feito (art. 7º, II, da Lei 12.016/2009).

Decorrido o prazo para informações, colha-se o parecer do Ministério Público Federal (art. 12 da Lei 12.016/2009).

Ao final, venham-me os autos conclusos para sentença. (id. xxx)

5. Por fim, em xxx, foi certificada a notificação e a intimação da autoridade impetrada (id. xxx).

Razões para manutenção do indeferimento da liminar e, em definitivo, a denegação da segurança

6. O processo administrativo disciplinar foi instaurado pelo Ato da Reitoria n. xxx, de xxx, publicado no Boletim de Atos Oficiais da UnB, de xxx (SEI, id. xxx).

7. A íntegra do processo administrativo é apresentada juntamente com as presentes informações, o que torna possível a visualização de cada documento em anexo.

8. Na p. 11 da petição inicial (id. xxx), o impetrante insiste em sustentar má-fé da comissão processante -valendo-se até de suposta negação à existência de documento até 23.11.2023, olvidando-se que o documento pode ter sido inserido no SEI no dia 21.11.2023 e ter sido certificado digitalmente no dia seguinte, ficando tudo registrado, sem que se possa falar em má-fé. Apenas pretende tumultuar, valendo-se de uma só vez, de vários estratagemas para vencer o debate sem precisar ter razão, pois o ponto central é: não se pode definir o prazo prescricional antes do julgamento porque infrações conexas podem ser inseridas no processo administrativo e toda conclusão precipitada representará prejulgamento.[1]

9. Não se nega que a prescrição da pretensão punitiva da administração pública em matéria disciplinar é matéria de ordem pública, a qual deverá ser declarada de ofício pela Administração, sendo que a Lei n. 8.112, de 11.12.1990, dispõe:

Art. 112. A prescrição é de ordem pública, não podendo ser relevada pela Administração.

10. As sanções administrativas e criminais poderão ser cumuladas, no que tange aos servidores públicos regidos pelo regime jurídico único (Lei n. 8.112/1990, art. 125). Aliás, como regra geral, as sanções administrativas não prejudicam a aplicação da pena pelo juiz criminal e vice-versa. De outro modo, os prazos prescricionais constantes da Lei n. 8.112/1990 não são absolutamente rígidos, pois a lei prevê a aplicação dos prazos previstos na lei penal para as infrações administrativas. Os prazos encontram-se assim regulados:

Art. 142. A ação disciplinar prescreverá:

I - em 5 (cinco) anos, quanto às infrações puníveis com demissão, cassação de aposentadoria ou disponibilidade e destituição de cargo em comissão;

II - em 2 (dois) anos, quanto à suspensão;

III - em 180 (cento e oitenta) dias, quanto à advertência.

§ 1o. O prazo de prescrição começa a correr da data em que o fato se tornou conhecido.

§ 2o. Os prazos de prescrição previstos na lei penal aplicam-se às infrações disciplinares capituladas também como crime.

§ 3o. A abertura da sindicância ou a instauração de processo disciplinar interrompe a prescrição, até a decisão final proferida por autoridade competente.

§ 4o. Interrompido o curso da prescrição, o prazo começará a correr a partir do dia em que cessar a interrupção”.

11. O artigo transcrito “prevê os prazos de prescrição, contra a Administração”.[2] Com efeito o prazo prescricional previsto retira da administração o direito de iniciar a ação disciplinar contra os seus servidores, os quais poderão ser diferentes, quando as infrações administrativas também forem capituladas como crimes, já o dissemos.[3] Assim, sem julgamento da informante é impossível determinar o prazo da prescrição, até porque não houve processo administrativo sobre o crivo do contraditório.

12. A lei preceitua que a prescrição se interrompe na data da instauração da sindicância ou do processo disciplinar. Também, prevê que o lapso prescricional não corre durante o prazo do processo até a decisão final. Aqui, tacitamente, o foi criada uma causa suspensiva da prescrição, ou seja, ao ser interrompida, a prescrição fica parada, dormindo, enquanto persistir o motivo que impede o seu curso. Essa matéria foi pacificada pelo Superior Tribunal de Justiça.[4] Com isso, sem ter decorrido 5 anos, desde a data do conhecimento dos fatos pela autoridade impetrada, é precipitado falar em prescrição, uma vez que, fundamentadamente, a autoridade julgadora pode discordar do relatório conclusivo da decisão da comissão processante. Nesse sentido:

Art. 168. O julgamento acatará o relatório da comissão, salvo quando contrário às provas dos autos.

Parágrafo único. Quando o relatório da comissão contrariar as provas dos autos, a autoridade julgadora poderá, motivadamente, agravar a penalidade proposta, abrandá-la ou isentar o servidor de responsabilidade.

13. Veja-se que sequer há relatório de comissão de processo administrativo disciplinar em sentido estrito e sim de sindicância investigativa. Assim, é inconcebível falar em uma sanção máxima possível, a determinar previamente o lapso prescricional.

14. O impetrante utiliza a palavra estrangeira lawfare para imputar a prática de uso do Direito para substituir o arbítrio de forças militares tradicionais pelo Direito.[5] No entanto, na visão do Ministro Zanin, é uma estratégia do uso do Direito como arma política. No caso vertente, não há qualquer cunho político ou militar e sim a busca de apurar fatos violadores da disciplina administrativa e da moralidade pública, os quais são potencialmente graves.

15. A decisão de instauração do processo administrativo disciplinar foi precedida de fundamentada manifestação da Procuradoria Federal junto à Fundação Universidade de Brasília (PARECER n. xxx/yyy/CONS/PFFUB/PGF/AGU), portanto, fundamentada, na medida em que acolheu os fundamentos lançados no parecer que orientou a decisão que não acolheu o parecer da comissão sindicante. Ademais, prazo prescricional é análise jurídica, não meramente factual.

Pedido

Ante o exposto, sequer há plausividade no pedido, razão de requerer a manutenção do indeferimento da liminar pleiteada e, ao final, a denegação da segurança.

Termos em que

pede e espera deferimento.

Brasília-DF, xx de dezembro de xxx

MÁRCIA ABRAHÃO MOURA

Reitora da UnB


[1] SCHOPENHAUER, Arthur (1788-1860). 38 estratégias para vencer qualquer debate: a arte de ter razão. São Paulo: Faro Editorial, 2014. passim. Veja-se alguns estratagemas que podem ser vislumbrados: 3º (confunda a argumentação), 8º (desestabilize o oponente), 10º (use a Psicologia da negação), 17º (faça uso da dupla interpretação), 19º (desfoque, depois encontre uma brecha), 23º (provoque o oponente), 24º (torne a alegação do outro inconsistente), 26º (reforce um aspecto no oponente , depois destrua o seu valor), 29º não se importe em fugir do assunto se estiver a ponto de perder), 31º (complique o discurso do de seu oponente); 32º (“cole” um sentido ruim na alegação do outro), 33º (encontre e explore o ponto fraco) e 37º (destrua a tese boa pela prova frágil).

[2] RIGOLIN, Ivan Barbosa. Comentários ao Regime Jurídico Único dos Servidores Públicos Civis. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 241.

[3] Os prazos prescricionais penais estão insertos no art. 109 do CP, fazendo-se mister a lembrança de que determinadas pessoas são beneficiadas pela redução do quantum de metade (CP, art. 115).

[4] STJ. Súmula n. 635:

Os prazos prescricionais previstos no art. 142 da Lei n. 8.112/1990 iniciam-se na data em que a autoridade competente para a abertura do procedimento administrativo toma conhecimento do fato, interrompem-se com o primeiro ato de instauração válido - sindicância de caráter punitivo ou processo disciplinar - e voltam a fluir por inteiro, após decorridos 140 dias desde a interrupção.

Disponível em: <https://scon.stj.jus.br/SCON/sumstj/doc.jsp?livre=%22635%22.num.&b=SUMU&p=false&l=10&i=1&operador=E&ordenacao=-@NUM>. Acesso em: 11.12.2023, às 21h10.

[5] Aqui cabe inserir outros estratagemas para se vencer um debate sem precisar ter razão, além dos mencionados na nota 1: 31º (complique o discurso de seu oponente) e 36º (confunda e assuste o oponente com palavras complicadas).