segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

"Você" é uma palavra respeitosa: análise feita à luz do caso do Juiz que queria ser chamado de "doutor"

Já tive oportunidade de me manifestar sobre o tema neste "blog" anteriormente, ocasião em que publiquei um texto intitulado "Doutor é quem fez doutorado" [aqui]. Naquela oportunidade citei a sentença, mas não a transcrevi, o que faço a seguir:


PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO COMARCA DE NITERÓI – NONA VARA CÍVEL

Processo nº 2005.002.003424-4

S E N T E N Ç A

Cuidam-se os autos de ação de obrigação de fazer manejada por ANTONIO MARREIROS DA SILVA MELO NETO contra o CONDOMÍNIO DO EDIFÍCIO LUÍZA VILLAGE e JEANETTE GRANATO, alegando o autor fatos precedentes ocorridos no interior do prédio que o levaram a pedir que fosse tratado formalmente de "senhor".

Disse o requerente que sofreu danos, e que esperava a procedência do pedido inicial para dar a ele autor e suas visitas o tratamento de Doutor", "senhor", "Doutora", "senhora", sob pena de multa diária a ser fixada judicialmente, bem como requereu a condenação dos réus em dano moral não inferior a 100 salários mínimos. (...)

DECIDO. "O problema do fundamento de um direito apresenta-se diferentemente conforme se trate de buscar o fundamento de um direito que se tem ou de um direito que se gostaria de ter." (Noberto Bobbio, in "A Era dos Direitos", Editora Campus, p. 15).

Trata-se o autor de Juiz digno, merecendo todo o respeito deste sentenciante e de todas as demais pessoas da sociedade, não se justificando tamanha publicidade que tomou este processo. Agiu o requerente como jurisdicionado, na crença de seu direito. Plausível sua conduta, na medida em que atribuiu ao Estado a solução do conflito. Não deseja o ilustre Juiz tola bajulice, nem esta ação pode ter conotação de incompreensível futilidade. O cerne do inconformismo é de cunho eminentemente subjetivo, e ninguém, a não ser o próprio autor, sente tal dor, e este sentenciante bem compreende o que tanto incomoda o probo Requerente.

Está claro que não quer, nem nunca quis o autor, impor medo de autoridade, ou que lhe dediquem cumprimento laudatório, posto que é homem de notada grandeza e virtude. Entretanto, entendo que não lhe assiste razão jurídica na pretensão deduzida.

"Doutor" não é forma de tratamento, e sim título acadêmico utilizado apenas quando se apresenta tese a uma banca e esta a julga merecedora de um doutoramento. Emprega-se apenas às pessoas que tenham tal grau, e mesmo assim no meio universitário. Constitui-se mera tradição referir-se a outras pessoas de "doutor", sem o ser, e fora do meio acadêmico. Daí a expressão doutor honoris causa - para a honra -, que se trata de título conferido por uma universidade à guisa de homenagem a determinada pessoa, sem submetê-la a exame. Por outro lado, vale lembrar que "professor" e "mestre" são títulos exclusivos dos que se dedicam ao magistério, após concluído o curso de mestrado.

Embora a expressão "senhor" confira a desejada formalidade às comunicações - não é pronome -, e possa até o autor aspirar distanciamento em relação a qualquer pessoa, afastando intimidades, não existe regra legal que imponha obrigação ao empregado do condomínio a ele assim se referir. O empregado que se refere ao autor por "você", pode estar sendo cortês, posto que "você" não é pronome depreciativo. Isso é formalidade, decorrente do estilo de fala, sem quebra de hierarquia ou incidência de insubordinação.

Fala-se segundo sua classe social. O brasileiro tem tendência na variedade coloquial relaxada, em especial a classe "semiculta", que sequer se importa com isso. Na verdade "você" é variante - contração da alocução - do tratamento respeitoso "Vossa Mercê".

A professora de linguística Eliana Pitombo Teixeira ensina que os textos literários que apresentam altas frequências do pronome "você", devem ser classificados como formais. Em qualquer lugar desse país, é usual as pessoas serem chamadas de "seu" ou "dona", e isso é tratamento formal...

Em recente pesquisa universitária, constatou-se que o simples uso do nome da pessoa substitui o senhor/ a senhora e você quando usados como prenome, isso porque soa como pejorativo tratamento diferente. Na edição promovida por Jorge Amado "Crônica de Viver Baiano Seiscentista", nos poemas de Gregório de Matos, destacou o escritor que Miércio Táti anotara que "você" é tratamento cerimonioso. (Rio de Janeiro/São Paulo, Record, 1999).

Urge ressaltar que tratamento cerimonioso é reservado a círculos fechados da diplomacia, clero, governo, judiciário e meio acadêmico, como já se disse. A própria Presidência da República fez publicar Manual de Redação instituindo o protocolo interno entre os demais Poderes. Mas na relação social não há ritual litúrgico a ser obedecido. Por isso que se diz que a alternância de "você" e "senhor" traduz-se numa questão sociolingüística, de difícil equação num país como o Brasil de várias influências regionais.

Ao Judiciário não compete decidir sobre a relação de educação, etiqueta, cortesia ou coisas do gênero, a ser estabelecida entre o empregado do condomínio e o condômino, posto que isso é tema interna corpore daquela própria comunidade. Isto posto, por estar convicto de que inexiste direito a ser agasalhado, mesmo que lamentando o incômodo pessoal experimentado pelo ilustre autor, julgo improcedente o pedido inicial, condenando o postulante no pagamento de custas e honorários de 10% sobre o valor da causa.

P.R.I.

Niterói, 2 de maio de 2005.

ALEXANDRE EDUARDO SCISINIO
Juiz de Direito


Devo esclarecer alguns aspectos da sentença, a saber: (I) a sentença é muito coerente e ponderada; (II) A condenação aos ônus da sucumbência é uma imposição legal para tal espécie de ação; (c) o "nº", como abreviação da palavra "número", não deve ser utilizado porque não existe "númera" e, portanto, a abreviatura não precisa ter a bolinha (º) diferenciadora. O TRF1 fez um estudo sobre isso, o que destaquei neste blog [aqui]; (d) "P.R.I." significa: "Publique-se. Registre-se. Intimem-se as partes". Hoje, com a computação, não mais se justifica manter abreviados os comandos para providências cartorárias.

Quando sou chamado de "doutor", corrijo o interlocutor porque sou apenas doutorando. Outrossim, o tratamento deve ser reservado à formalidade acadêmica, razão de preferir ser chamado de "você" por meus alunos, visto que deve haver aproximação entre o professor e os seus alunos, não sendo salutar a barreira que se cria com formalidades desnecessárias.

"Você", como decorrência de "Vossa Mercê", é uma palavra muito respeitosa. Também, o tratamento respeitoso é, nas atitudes, mais importante do que o vocábulo empregado. Por isso, melhor do que invocar palavras respeitosas é exigir condutas respeitosas.

É doloso o atropelamento de ciclistas em Porto Alegre-RS

No dia 25.2.2011, um ciclista atropelou várias pessoas, cujas cenas foram gravadas e a matéria foi amplamente divulgada. Observe-se:

Vídeo mostra atropelamento de ciclistas em Porto Alegre

Publicado em 28.02.2011, às 03h17


O advogado de defesa do motorista que atropelou um grupo de ciclistas em Porto Alegre na noite de sexta-feira apresentará seu cliente à polícia na manhã desta segunda-feira. O defensor procurou o responsável pela Divisão de Crimes de Trânsito da Polícia Civil, na capital gaúcha, delegado Gilberto Almeida Montenegro, comunicando a decisão.




O proprietário do Golf preto que acelerou sobre cerca de doze ciclistas já foi identificado e era ele mesmo quem dirigia o veículo no momento do incidente. "Houve uma ação e uma reação. Amanhã ouvirei a outra parte. Então verificaremos o que houve e se foi culposo ou doloso", afirmou Montenegro.

O delegado sugere que houve excessos das duas partes envolvidas, ou seja, dos ciclistas e do motorista. "O grupo deveria ter comunicado a EPTC (Empresa Pública de Transporte e Circulação) e a Brigada Militar (BM, a Polícia Militar gaúcha) sobre o passeio. Um para coordenar o trânsito e permitir o amplo direito de ir e vir, o outro para segurança", disse o delegado.

No início da noite da sexta-feira, cerca de doze ciclistas foram atropelados quando faziam um passeio na região central de Porto Alegre. Três ciclistas foram encaminhados ao Hospital de Pronto Socorro, mas já foram liberados.

Como ocorre mensalmente, o grupo Massa Crítica, que promove a bicicleta como meio de transporte, iniciava seu passeio quando, na rua José do Patrocínio, no boêmio bairro Cidade Baixa, próximo ao centro da cidade, uma discussão teria ocorrido com o motorista.

Após troca de insultos, de acordo com relato de ciclistas ouvidos pela reportagem, o condutor do automóvel teria acelerado contra algumas bicicletas. Depois do acidente, o motorista fugiu do local. O carro foi encontrado na madrugada de sábado, abandonado em um bairro da zona leste.


Dolo é o elemento anímico. Não importa que os ciclistas não tenham autorização para a manifestação pública, que haja sinalização inadequada ou que tenham provocado o motorista. O dolo será existente, ainda que incidente a influência de violenta emoção por injusta provocação da vítima, fazendo incidir o privilégio ou a atenuante genérica, esta do art. 65, inc. III, alínea "c".

Difícil é dizer se incidente homicídio tentado ou lesão corporal. Isso dependerá da demonstração do dolo. Caso tenha havido animus necandi, o motorista deverá ser processado por homicídio (CP, art. 121). Do contrário, caso fique demonstrado animus laedente, será hipótese de lesão corporal.

De qualquer forma, é equivocado dizer que a simples provocação das vítimas seja suficiente para transformar o dolo em negligência (esta é dominada de culpa no Código Penal).

A negligência, como omissão ao dever de cuidado, é suficiente para abranger todas modalidades de "culpa", referidas pela doutrina criminal. Sendo que, com base nas modalidades de "culpa", as imagens evidenciam que não houve imprudência (atuação positiva e excessiva causadora de um dano previsível) ou imperícia (contrariedade à técnica).

Com base na velocidade empreendida, nas declarações do condutor do veículo e outros elementos externos se poderá dizer se houve dolo para homicício ou apenas lesão corporal, mas, evidentemente, será equivocada eventual pretensão de classificar os fatos como lesão corporal.

Finalmente, houve concurso formal imperfeito de crimes, aplicando-se a regra do art. 70, caput, in fine, do Código Penal, pela qual as penas serão aplicadas separadamente para todos os delitos concretizados, ou seja, aplicar-se-á a regra da realidade, segundo a qual, para cada crime deverá haver uma pena.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

O excesso da autoridade policial caracterizará crime: análise feita a partir do vídeo da escrivã torturada

O vídeo que pode ser encontrado na direção eletrônica abaixo vem sendo veiculado em diversos meios de comunicação de massa, sendo que já assisti até mesmo quem defenda a legalidade do ato policial. No entanto, o vídeo evidencia o crime de tortura, observe-se: http://pbagora.com.br/conteudo.php?id=20110221144003&cat=policial&keys=delegado-deixa-escriva-nua-faz-revista-forca

Uma escrivã de polícia, supeita do crime de corrupção passiva, teve suas calças retiradas violetamente pela equipe policial, sendo que o Delegado de Polícia insistiu na tese de que deveria presenciar a busca pessoal, não podendo ocorrer a diligência na presença apenas das policiais militares do quadro feminino que estavam presentes.

Houve, no mínimo, tortura mental e - para piorar - o vídeo se encontra irremediavelmente publicado aos olhos de brasileiros e de estrangeiros, aumentando o constrangimento da moça, uma vítima de uma visão policialesca tacanha que assola o Brasil.

Não compactuo com a corrupção que grassa neste país. Porém, a tutela de direitos fundamentais se estende a todos, inclusive àquela moça que foi vítima do abuso de autoridade, caracterizado pela tortura concretizada.

Vendo o vídeo, observa-se que ela até admitiu se despir na frente do delegado e das policiais presentes, mas que saissem os outros homens presentes. Porém, prevaleceu a truculência, a intransigência e a violação aos direitos fundamentais da moça.

O sistema punitivo estatal não pode justificar o abuso, a tortura, em nome da finalidade de esclarecer a verdade. Toda medida deve encontrar proporcionalidade. No caso, a pena pela corrupção que seria fixada em regime inicial aberto (ou semi-aberto) foi largamente excedida pela atuação arbitrária e abusiva da autoridade policial.

Ele falou que ela estaria presa em flagrante por desobediência, mas, enquanto Escrivã de Polícia (praticando crime contra a administração pública), a ela não se aplicaria tal delito, uma vez que se trata de crime de particular contra a administração pública. Outrossim, a desobediência é crime de menor potencial ofensivo, não ensejando autuação em flagrante, salvo se a Escrivã de Polícia tivesse se recusado a assinar o termo de compromisso de comparecer em juízo (Lei n. 9.099/1995, art. 69, parágrafo único).

Noticia-se que ela foi demitida. Entendo que a demissão será cabível e até devida, caso se desmonstre em devido processo legal a corrupção passiva,  mas isso não poderá ser obstáculo para impor as penas cabíveis à autoridade policial, inclusive, a demissão.

No caso, por ato administrativo extracontratual, há responsabilidade civil do estado pelos danos causados à moça, a qual poderá ingressar com a ação de conhecimento contra o Estado para ver reparados  os danos causados pelo agente público. Este, por sua vez, deverá responder pelos danos em ação regressiva.

Extinção da punibilidade baseada em certidão de óbito falsa não faz coisa julgada material

Do informativo mensal do STF, expedido em Dez/2010, o qual compila os Informativos n. 611-613, é possível extrair:

A 1ª Turma, em conclusão de julgamento, indeferiu, por maioria, habeas corpus impetrado em favor de pronunciado, em sentença transitada em julgado, pela suposta prática de homicídio. A defesa sustentava que a desconstituição do despacho interlocutório que teria declarado extinta a punibilidade do paciente — pois baseado em certidão de óbito falsa — seria nula, uma vez que violado o princípio da coisa julgada. Ademais, alegava não haver indícios suficientes a apontar o acusado como autor do delito — v. Informativo 611. O Min. Dias Toffoli, relator, acompanhado pelos Ministros Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski, manteve a posição externada por ocasião do pedido de adiamento do feito, no sentido de indeferir a ordem. Afirmou que o suposto óbito do paciente seria fato inexistente e que, portanto, não poderia existir no mundo jurídico. Por essa razão, reputou não haver óbice à desconstituição da coisa julgada. Em relação à suposta ausência de justa causa para a pronúncia do paciente, aduziu que a análise da tese implicaria revolvimento fático-probatório, inviável na sede eleita. Vencido o Min. Marco Aurélio, que concedia a ordem.
HC 104998/SP, rel. Min. Dias Toffoli, 14.12.2010. (HC-104998)
(Informativo 613, 1ª Turma)


Entendo que assiste razão ao dizer que a decisão que declara extinta a punibilidade não faz coisa julgada material, mas os fundamentos da decisão do STF não são jurídicas, visto que abandona a teoria geral do processo, pela qual a ação é autônoma e abstrata em relação ao direito subjetivo em discussão.

No meu Execução Criminal: Teoria e Prática (6. São Paulo: Atlas, 2010, p. 222-229), enfrento a questão e critico diversas posições que são apresentadas nos tribunais, concluindo que a declaração da extinção da punibilidade não é de mérito, mas questão incidental prejudicial do exame do mérito.

A declaração da extinção da punibilidade, portanto, baseada em novas provas poderá ser discutida em outro processo, eis que só é capaz de produzir a coisa julgada formal.

Extinção da punibilidade e certidão de óbito falsa - 3

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

O que se pode dizer sobre o 11º Big Brother Brasil (BBB 11)

Recebi uma mensagem eletrônica que me fez refletir. Reproduzirei sua integra a seguir, mas tenho críticas ao texto que atribuido a Luís Fernando Veríssimo, sendo que procurarei estabelecer uma linguagem adequada ao meio acadêmico:


"BIG BROTHER BRASIL
(Luiz Fernando Veríssimo)
Que me perdoem os ávidos telespectadores do Big Brother Brasil (BBB), produzido e organizado pela nossa distinta Rede Globo, mas conseguimos chegar ao fundo do poço...A  décima primeira (está indo longe!) edição do BBB é uma síntese do que há de pior na TV brasileira. Chega a ser difícil,... encontrar as palavras adequadas para qualificar tamanho atentado à nossa modesta inteligência.
Dizem que em Roma, um dos maiores impérios que o mundo conheceu, teve seu fim marcado pela depravação dos valores morais do seu povo, principalmente pela banalização do sexo. O BBB é a pura e suprema banalização do sexo. Impossível assistir, ver este programa ao lado dos filhos. Gays, lésbicas, heteros... todos, na mesma casa, a casa dos “heróis”, como são chamados por Pedro Bial. Não tenho nada contra gays, acho que cada um faz da vida o que quer, mas sou contra safadeza ao vivo na TV, seja entre homossexuais ou heterossexuais. O BBB é a realidade em busca do IBOPE...
Veja como Pedro Bial tratou os participantes do BBB. Ele prometeu um “zoológico humano divertido” . Não sei se será divertido, mas parece bem variado na sua mistura de clichês e figuras típicas.
Pergunto-me, por exemplo, como um jornalista, documentarista e escritor como Pedro Bial que, faça-se justiça, cobriu a Queda do Muro de Berlim, se submete a ser apresentador de um programa desse nível. Em um e-mail que  recebi há pouco tempo, Bial escreve maravilhosamente bem sobre a perda do humorista Bussunda referindo-se à pena de se morrer tão cedo.
Eu gostaria de perguntar, se ele não pensa que esse programa é a morte da cultura, de valores e princípios, da moral, da ética e da dignidade.
Outro dia, durante o intervalo de uma programação da Globo, um outro repórter acéfalo do BBB disse que, para ganhar o prêmio de um milhão e meio de reais, um Big Brother tem um caminho árduo pela frente, chamando-os de heróis. Caminho árduo? Heróis?
São esses nossos exemplos de heróis?
Caminho árduo para mim é aquele percorrido por milhões de brasileiros: profissionais da saúde, professores da rede pública (aliás, todos os professores), carteiros, lixeiros e tantos outros trabalhadores incansáveis que, diariamente, passam horas exercendo suas funções com dedicação, competência e amor, quase sempre mal remunerados..
Heróis, são milhares de brasileiros que sequer têm um prato de comida por dia e um colchão decente para dormir e conseguem sobreviver a isso, todo santo dia.
Heróis, são crianças e adultos que lutam contra doenças complicadíssimas porque não tiveram chance de ter uma vida mais saudável e digna.
Heróis, são aqueles que, apesar de ganharem um salário mínimo, pagam suas contas, restando apenas dezesseis reais para alimentação, como mostrado em outra reportagem apresentada, meses atrás pela própria Rede Globo.
O Big Brother Brasil não é um programa cultural, nem educativo, não acrescenta informações e conhecimentos intelectuais aos telespectadores, nem aos participantes, e não há qualquer outro estímulo como, por exemplo, o incentivo ao esporte, à música, à criatividade ou ao ensino de conceitos como valor, ética, trabalho e moral.
E ai vem algum psicólogo de vanguarda e me diz que o BBB ajuda a "entender o comportamento humano". Ah, tenha dó!!!
Veja o que está por de tra$$$$$$$$$$$$$$$$ do BBB: José Neumani da Rádio Jovem Pan, fez um cálculo de que se vinte e nove milhões de pessoas ligarem a cada paredão, com o custo da ligação a trinta centavos, a Rede Globo e a Telefônica arrecadam oito milhões e setecentos mil reais. Eu vou repetir: oito milhões e setecentos mil reais a cada paredão.
Já imaginaram quanto poderia ser feito com essa quantia se fosse dedicada a programas de inclusão social: moradia, alimentação, ensino e saúde de muitos brasileiros?
(Poderiam ser feitas mais de 520 casas populares; ou comprar mais de 5.000 computadores!)
Essas palavras não são de revolta ou protesto, mas de vergonha e indignação, por ver tamanha aberração ter milhões de telespectadores.
Em vez de assistir ao BBB, que tal ler um livro, um poema de Mário Quintana ou de Neruda ou qualquer outra coisa..., ir ao cinema..., estudar... , ouvir boa música..., cuidar das flores e jardins... , telefonar para um amigo... , visitar os avós... , pescar..., brincar com as crianças... , namorar... ou simplesmente dormir.
Assistir ao BBB é ajudar a Globo a ganhar rios de dinheiro e destruir o que ainda resta dos valores sobre os quais foi construída nossa sociedade."

Não poderia refutar a idéia de alguma pessoa ler o presente texto no exterior e não entender o que será exposto por não conhecer o tal programa "Big Brother Brasil", exibido pela Rede Globo de Televisão, uma grande emissora de televisão, em franco declínio no Brasil.

O "Big Brother Brasil" foi importado da Inglaterra, sendo que houve um litígio entre o Sistema Brasileiro de Televisão (SBT), do empresário Sílvio Santos, e a Rede Globo porque esta estaria violando direitos daquele que teria ingressado com o programa no Brasil sob a denominação de "Casa dos Artistas".

No SBT, artistas (atores, músicos etc.) seriam confinados em uma casa, sem qualquer privacidade, expostos à curiosidade popular. A Rede Globo optou por pessoas do povo, escolhendo jovens de diferentes níveis sociais, com preferência por aqueles que expressam os sonhadores que pouco se prepararam para um sucesso acadêmico ou profissional que exige certo nível de intelectualidade.

Já se viu de tudo no programa: sexo ao vivo, declarações de dependência química, traições, triângulos amorosos e muito pouco (ou nada) de aproveitável. Na 11ª edição do programa, houve uma preferência por incluir homossexuais (masculinos e femininos).

A primeira perspectiva que se deve ter é que o programa cativa, acirra a curiosidade, o que se pode constatar pelo fato da Rede Record ter incluindo a sua versão do "Big Brother", isso por meio do programa denominado "A Fazenda".

"A fazenda" é um programa que não tem recebido tantas críticas quanto o "big brother", talvez porque seus participantes tenham melhor nível. O programa da Rede Globo demonstra o péssimo nível médio da intelectualidade brasileira, visto que até o programa está em língua estrangeira.

Habermas informa que a identidade de um povo se dá pela língua, sendo que a Rede Globo procura minar e destruir o pouco que resta dessa identificação nacional por meio do fomento à utilização de palavras e expressões estrangeiras. Isso repercurte em nossa moralidade, já desgastada.

A construção valorativa do homem já trouxe grandes embates filosóficos, mas é inegável que Nietzsche tinha razão ao dizer que o valor é algo "Humano demasiado humano". Nesta construção de valores, a inclusão no BBB 11 de uma categoria humana pouco preocupada com a intelectualidade, com o trabalho etc. gera, sem dúvida, um efeito negativo sobre o público telespectador.

O programa não estaria no ar por tantos anos se não fosse economicamente rentável. A curiosidade e o envolvimento passional que se verifica nas camadas sociais menos cultas faz com que o programa se mantenha viável para a Rede Globo, mas não precisa ser tão apelativo.

Pedro Bial parece pretender forçar intrigas e paixões entre os concorrentes, a fim de envolver os telespectadores com as vontades decorrentes das sexualidades homossexuais e heterossexuais dos confinados. Ao final, discursos vazios que pouco podem acrescer aos telespectadores fazem a tônica do programa, o qual, sinceramente, não é digno de uma assistência atenta e demorada.

O Dicionário Aurélio apresenta como significado da palavra herói, a "pessoa que, por qualquer motivo, é o centro das atenções". Nesse sentido, os integrantes da casa do "big brother" podem ser considerados heróis, mas não como pessoas extraordinárias, visto que a própria escolha tende a encontrar a indentificação com o geral, ou seja, com a mediocridade, com o fato de ser comum (vulgar).