sábado, 27 de agosto de 2011

Zaffaroni, "suas" casas de prostituição e inocência

Neste texto procurarei tratar rapidamente de assuntos jurídicos e metajurídicos que envolvem o Ministro da Corte Suprema da Nação Argentina Raul Eugénio Zaffaroni, relativos à propriedade de 15 imóveis alugados, 6 dos quais para a mesma pessoa e para funcionamento de casas de prostituição. Tudo será feito à vista do direito fundamental de inocência.
Estive em Buenos Aires recentemente e percebi que algo muito comum nos locais turísticos da cidade é a propaganda da prostituição. Em bancas de revista, telefones públicos, postes de luz etc. avistam-se, dentre muitos outros, os seguintes anúncios:

Uma das principais avenidas de Buenos Aires é a 9 de Julio, a qual abriga o Obelisco. Ao seu lado podemos encontrar a Rua Cerrito, como uma via marginal, repleta de hotéis. Assim, o lugar é turístico, fomentando o turismo sexual, preocupante em todos países em crise financeira.
A Rua Montivideo também está próxima ao Obelisco, o que tende a evidenciar que tais locais ficam estrategicamente próximos de hotéis, pontos em que param e transitam turistas dispostos a gastar algum dinheiro com o prazer de alcançar o “novo”.
A prostituição sempre existiu, tendo sido repelida e até mesmo fomentada ao longo da história. Assim como na Argentina, no Brasil a prostituição não é lícita, uma vez que não se reconhece a profissão, proibe-se a participação na prostituição alheia e incrimina-se a manutenção de casa de prostituição.
Zaffaroni é um criminalista que, academicamente, é mais respeitado fora da Argentina do que ali dentro, onde é visto como importante aliado do Governo Kirchner. Então, a oposição pede que ele se explique quanto a manutenção de imóveis para a prostituição.
Do ponto de vista econômico, (sub)sistema da sociedade complexa que Jakobs diz predominar no mundo globalizado, alugar para funcionamento de prostíbulos é vantajoso porque o pagamento é feito em dinheiro, sem declarações à Receita Federal e, portanto, sem tributação, o que gera razoável “caixa 2”. Ademais, são 6 apartamentos alugados em lugares nobres (centro da Cidade Autônoma de Buenos Aires e Recoleta).
Veja-se o que se diz, na Argentina, sobre o caso:
Gustavo Vera, representante de la ONG La Alameda, presentó este martes una nueva ampliación a la denuncia promovida en diciembre del 2009 presunta “explotación de la prostitución ajena”, en la que, entre otros, figuran seis inmuebles que serían de Zaffaroni. El escrito presentado en la fiscalía correccional N° 7, a cargo de Edgardo Orfila, solicitó se investigue si inmuebles del ministro de la Corte Suprema Raúl Zaffaroni eran explotados como prostíbulos por una asociación ilícita integrada por quien figuraba como inquilina del magistrado. Según consigna el texto presentado ante el fiscal hay “suficientes” elementos de juicio “como para afirmar que el doctor Eugenio Raúl Zaffaroni dio en arriendo sus departamentos a personas que los utilizaron para explotar la prostitución”. Para los denunciantes, el juez “no pudo explicar adecuadamente” por qué motivo se celebraron cinco contratos de locación de inmuebles destinados a vivienda con la misma persona y con prohibición de sublocar. “La gente normal no vive en cinco inmuebles al mismo tiempo ya que, en principio los seres humanos no sólo carecemos del don de la ubicuidad, sino que, además, los inquilinos de mono ambientes no suelen ser personas de gran fortuna”, precisa el texto de la ampliación.[1]
Segundo consta, há representação contra Zaffaroni, em razão dos imóveis alugados, mas ele diz que a administração dos mesmos é feita por terceira pessoa e que desconhecia tais fatos, o que deve ser analisado à luz do estado de inocência, expressamente contido na Constituição da República Federativa do Brasil (art. 5º, inc. LVII) e na Constituição da Nação Argentina (art. 18).
Ontem, na posse do novo Procurador-Geral do Trabalho, em lindo discurso, ele disse ter forte preocupação com o trabalho degradante no campo. Mais preocupante é a prostituição degradante, sendo que a sua manutenção na ilicitude fomenta um pouco disso porque as pessoas (homens e mulheres) que vivem de tal atividade são marginalizadas, excluídas de direitos previdenciários, garantias de emprego etc.
Em um mundo globalizado em que os mercados estão em total descrédito, tende-se a propagar prostituição, como única forma de alcançar o mínimo necessário a uma vida digna. Aliás, a prostituição decorre de muitas causas alheias às jurídicas, razão de ser necessário ver com reservas aquilo que se afirma contra Zaffaroni.
Aspectos econômicos dão suporte à representação da oposição congressista argentina ao Governo Kirchner, mas aspectos políticos estão em desfavor da oposição. No momento, enquanto juristas, devemos entender que Zaffaroni, antes de ser um Ministro, é uma pessoa e, portanto, detentor de direitos fundamentais. Como tal, não pode ser considerado culpado sem o trânsito em julgado de sentença criminal condenatória.


[1] Diario Judicial. 24.8.2011. Brevatas. Disponível em: <http://www.diariojudicial.com/contenidos/2011/08/23/noticia_0003.html#>. Acesso em: 27.8.2011, às 17h15.


sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Ditaduras na Argentina e no Brasil: uma releitura


“Ditaduras Militares da Argentina e do Brasil” são os períodos de revoluções militares que traziam um discurso de moralização, havidos nos dois países (na Argentina, de 1986 ao final da década de 1970, e no Brasil, oficialmente, de 1964 a 1985 – digo isso porque o último Presidente da República militar, João Baptista Figueiredo, Mar/1979 a Mar/1985, foi colocado ali para fazer a transição e saída dos militares do poder).
Na Argentina o período de ditadura foi muito mais violento do que o do Brasil e o Assunto está me preocupando por estou tratando dele na minha tese de doutorado.
No dia 23.8.2011 estive com o meu orientador, Prof. Dr. Ricardo Kohler, com quem conversei sobre o assunto, momento em que falamos de una justicia torta. Curiosamente, logo que sai do escritório do Dr. Kohler, passei pela Plaza de Tribunales e me deparei com a seguinte cena:

“Justiça torta” porque é crescente o movimento que pretende admitir anistias para atos terroristas daqueles que se opunham aos governos militares de então, mas desejam o rigor contra os militares, aos quais se atribuem delitos de tortura e homicídio. O movimento das fotos anteriores dizia exatamente isso. Vejam-se as fotos:


Para os amigos das vítimas de terrorismos, inocentes foram atingidos e a anístia deve ser plena. Eles partem da idéia de que o governo atual da Argentina é tendencioso e a Corte Suprema de Justicia de la Nación Argentina (CSNA) também o é, o que contamina todo Poder Judiciário. Vejam-se as fotos do mais conhecido jurista argentino da atualidade, Ministro da CSNA, Raul Engénio Zaffaroni com as Madres de Mayo e das acusações que fazem:





No Governo Lula foram diversas as críticas à indústria de anistias aos “perseguidos políticos” dos governos militares. Sua sucessora, Dilma Rousseff se achega a Cristina Fernández de Kirchner e o discurso de impunidade de apenas um dos lados é uma crescente. Então, indo almoçar na Plaza de Congreso, passei em frente à sede das Madres de Mayo e vi a prova de que elas estão imiscuídas com a política do momento:


Direitos fundamentais, tanto as Supremas Cortes do Brasil e da Argentina como a Corte Interamericana de Direitos Humanos, devem ver que são assegurados no Pacto de São José da Costa Rica para todos, não apenas para terroristas. Os atos de terrorismo atingem e atingiram pessoas inocentes aqui e alhures, sendo que eles não podem ser visto como “única maneira de expressão possível” em regimes totalitários. Daí ser necessário o aprofundamento da pesquisa sobre o assunto, bem como pararmos de sermos parciais e desejosos da prevalência dos discurso político e econômico mais favoráveis e “bonitinhos” do momento.

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Rigor lingüístico é essencial nas traduções de obras científicas.

Estou preocupado com a minha tese. Alguém terá que fazer a versão do texto resultante da pesquisa para a língua espanhola. Esse alguém deve ser afeito à ciência do Direito porque os novos conhecimentos jurídicos exigem novas palavras. Assim, como a nova palavra decorrerá do necessário neologismo para indicar o seu sentido científico, é mister que as traduções sejam feitas por quem a conhece.

Como exemplo de uma tradução defeituosa, apresento a "Coleção Estudos de Direito Penal", publicada pela Editora Manole, especificamente sobre os ensaios (transformados em pequenos livros) de autoria de Günter Jakobs e traduzidos para o português por Antônio Maurício Ribeiro Lopes. A tradução foi feita de ensaios traduzidos da língua alemã para a espanhola por Manuel Cancio Meliá. Este, em vários momentos, usou a palavra competência, ora para designar a aptidão criminal da vítima, ora dos funcionários públicos e ora das vítimas (o que é correto na língua espanhola). A tradução para a língua portuguesa mantém a palavra competência para designar aptidãocapacidade ou responsabilidade jurídico-criminal.

O português jurídico informa que a palavra competência, em sentido estrito, significa a delimitação da jurisdição (eventualmente, e apenas em sentido amplo, significará os poderes conferidos aos agentes públicos para a prática de determinados atos), sentido completamente diverso daquele empregado na tradução criticada, sendo lamentável verificar erro crasso em obra traduzida por notável jurista. Tal equívoco pode levar o leitor neófito em Direito à falsa compreensão do texto. Daí a concretização do alerta neste "blog".

domingo, 7 de agosto de 2011

Buenos Aires e a prática do "cavalo louco".

Estou pensando sobre uma prática muito comum em Buenos Aires: a do "cavalo louco" (pega a coisa alheia e sai correndo).  Penso sobre isso porque a res pode estar no corpo da vítima e resultar em lesão (v.g. óculos, relógio, brinco, gargantilha etc.). No entanto, caso não resulte em lesão, a solução jurídica não será tão fácil.

Violência é violência. O roubo se distingue do furto pela violência ou ameça praticada contra pessoa. Assim, a violência do furto será contra a coisa, uma vez que se houver violência ou grave ameaça contra a pessoa, haverá roubo. No caso do "cavalo louco", a jurisprudência vem entendendo que, havendo lesão haverá roubo, sem ela haverá furto.

Violência é violência. Porém, puxar uma corrente grossa, derrubando a vítima e a arrastando por alguns metros será diferente de puxar uma corrente fina do pescoço da vítima, arrebentando-a sem que ela perceba. Então, quando haverá roubo ou furto na prática do "cavalo louco"?

Somente os casos concretos poderão responder.