segunda-feira, 14 de março de 2011

Uma linda mulher, só no cinema

Nos idos dos anos 2000-2002, li em uma revista um artigo com título igual ou semelhante ao desta postagem e de conteúdo parecido com o que transcreverei adiante. A revista discutia unicamente a prostituição, sendo que lamento muito o seu estravio, visto que é muito séria, com artigos interessantes.

Sábado (dia 12.3.2011), fui surpreendido pelo meu irmão que comprou ingressos para o filme intitulado Bruna Surfistinha em um posto de abastecimento de combustíveis e me noticiou que estávamos indo ao cinema.

Mesmo não gostando dos ambientes das salas de cinema (não gosto de nada estremamente limitador e os cinemas em geral impõem limites excessivos), acompanhei o meu irmão e vi uma película de uma menina adotiva (Raquel), pressionada pelo irmão mais velho. Ela tinha o hábito de furtar e foi envolvida em um escândalo de sexo oral com um colega de colégio e resolveu sair de casa por não gostar dos normais limites impostos pelos pais adotivos e se entregou à prostituição.

Inicialmente, tinha 17 anos de idade, mas disse ter 18 anos e foi admitida em uma casa. Era a preferida dos clientes e conheceu Carol, uma amante de um velho casado, mantida por este. Carol usava cocaina, sendo que Raquel a seguiu e, em função da droga, foi expulsa da casa em que era explorada sexualmente.

Uma colega que lhe ajudou muito na organização dos programas sexuais se sentiu desvalorizada por Raquel (Bruna Surfistinha), abandoando-a, iniciando-se um período de decadência para a prostituta que foi parar na rua e em um "vintão", onde desmaiou durante uma relação sexual.

Ela decidiu continuar a vida de prostituição por mais 6 meses (cerca de 600 a 800 programas sexuais) para depois abandoná-la. Esta é, em apertada síntese, a história do filme protagonizado pela atriz Debora Secco.

Sobre o tema, é interessante o texto que se segue:

São Paulo, segunda-feira, 14 de março de 2011
O amargo veneno do escorpião

A VIDA REAL DAS GAROTAS DE PROGRAMA DE LUXO PASSA LONGE DO GLAMOUR DAS TELAS

CARLOS MINUANO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

No cinema ou na literatura, a coisa até parece fácil e divertida. Mas, na real, a vida de uma garota de programa passa longe do clima de videoclipe do sucesso de bilheteria "Bruna Surfistinha".
Há duas semanas em cartaz, o filme foi assistido por mais de 1 milhão de pessoas.
O longa é inspirado no livro "O Doce Veneno do Escorpião" (Panda Books), que relata as experiências de Bruna, codinome de Raquel Pacheco, 26, que viveu como garota de programa dos 17 aos 21 anos.
O filme de Marcus Baldini, com Deborah Secco como Bruna, parece uma peça publicitária, mas traz um pouco do lado B da prostituição.
Caso da passagem da personagem pelo chamado "baixo clero" dos bordéis, ou o famoso "vintão" -nome e preço do programa.
O longa e a história real de Bruna mostram também como tudo pode começar a partir de uma brincadeira: na cena inicial, Deborah Secco encarna uma lolita que despe sua camisola via webcam.
Pode ser o primeiro passo para um universo por onde transitam jovens (incluindo aí uma penca de adolescentes) que vendem o corpo para qualquer um que pague.

"CÁRCERE PRIVADO"
A jovem Drica*, 24, vive no circuito de luxo da prostituição. Seus clientes são empresários, advogados e "todo tipo de gente com dinheiro".
Ela conta que começou aos 21 anos, imaginando que ganharia altas cifras. Mesmo atendendo a "clientes vips", ela vivia sob o que chama de "cárcere privado".
"Entrava às 21h e era obrigada a ficar até às 4h da manhã. Só podia sair se pagasse multa de R$ 100, mesmo se estivesse passando mal."
Já Valentina, 22, apesar de formada em fisioterapia e moda, decidiu vender o corpo quando sua família, no interior paulista, sofreu um revés financeiro.
Para ela, a violência pesou. "Há clientes que agridem, há humilhação."
Depois de dois anos como garota de programa, ela hoje é hostess de uma boate de São Paulo e observa dramas até piores aos que viveu.
"Há clientes hoje que querem uma parceira para o sexo e para se drogar em quantidades gigantescas", diz.

TRÁFICO DE PESSOAS
A cada cliente, existem novos perigos. Valentina tem amigas que desapareceram no exterior, aliciadas por redes de tráficos de pessoas.
"Algumas são mantidas presas. Dificilmente voltam."
Assim como o preço do programa, o perfil da prostituição entre jovens varia de acordo com a região do país. "No Norte e Nordeste, o problema é a pobreza extrema mesmo", afirma a promotora Laila Shukair, da Associação Brasileira de Magistrados e Promotores de Justiça da Infância e da Juventude.
Famílias desestruturadas se tornam alvos fáceis de redes de tráfico de pessoas -a terceira atividade criminosa mais lucrativa no mundo, depois de drogas e armas.
O dinheiro que as meninas ganham vai embora tão rápido como veio. "É uma compensação. Se você não torra com drogas, gasta tudo no shopping", diz Valentina.
Nas ruas desde os 20 anos, Ticiane diz que o pior é a solidão. "Não tenho mais vida pessoal, namorado ou amigos." Ela também reclama da violência. "Saí com três rapazes que me levaram para uma rua deserta. Se não fosse um vigia noturno, acho que tinha morrido."
A promotora Shukair aponta três responsáveis. "A família falhou na educação. O Estado não garantiu o direito constitucional de essas adolescentes se desenvolverem sexualmente de forma saudável. E falhou a sociedade três vezes: na figura de quem explora, de quem paga e de todos que se omitem."


*Todos os nomes das meninas são fictícios

Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/folhatee/ fm1403201113.htm. Acesso em: 14.3.2011, às 10h30.

Há alguns anos, quando me deslocava para lecionar Direito Criminal (Material e Processual) em curso de especialização realizado pela Faculdade de Ciências e Tecnologia de Unaí (FACTU), localizada na cidade de Unaí, Estado de Minas Gerais, pedi ao motorista para fazer uma pausa, visto que estava com sede e ali comprei uma revista sobre prostituição, sendo que na capa constava, em destaque, algo semelhante ao título do presente texto.

Tenho 2 filhas e me preocupo com o tema como pai e pesquisador, visto que temos delitos relativos à prostituição, matéria que já foi abordada por mim, inclusive em palestras (vide:
MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Crimes contra a dignidade sexual. Teresina: Jus Navigandi, ano 14, n. 2340, 27.11.2009. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/13917>. Acesso em: 13.3.2011, às 10h40). Também, certa feita, enquanto professor de Direito Penal IV do Centro Universitário do Distrito Federal (UDF), uma excelente aluna Júlia Riccardi, realizou pesquisa exemplar sobre prostituição, esclarecendo como sua prática já foi combatida e até fomentada durante a história da humanidade.

A aparente vida fácil das prostitutas e o constante sonho de encontrar um milionário semelhante ao ator Richard Gere, do filme "Uma linda mulher" é um engodo bem retratrado pelo texto anteriormente transcrito. Porém, a prostituta vende o seu corpo assim como todo trabalhador que se vale do corpo para sustentar a sua vida, não sendo ela inferior ao professor  (que vive do seu intelecto), do lutador e do atleta em geral (que vivem das suas forças e das suas habilidades) etc.

Não quero que uma das minhas filhas se transforme em prostituta porque sei que é uma atividade de extremo sofrimento. Muitas ficam na prostituição por longos anos por estarem acostumadas aos elevados rendimentos, mas todas sabem que a vida profissionalmente ativa é curta. Em tal certeza, vivem o sonho de "Uma linda mulher".

Em muitos paises a prostituição é uma profissão como outra qualquer e deveria ser assim no Brasil. No entanto, a hipocrisia, bloqueios religiosos etc. atrapalham sua regulação por lei, o que piora ainda mais o nível de vida das prostitutas, empurando-as para a marginalidade e aumentando as dores que são impostas a elas.

Os homens se valem de prostitutas e ao final dizem que elas não prestam. No entanto, não param de se valer delas, sendo que a prostituição, hoje, não é privilégio do sexo feminino. Muitos homens se prostituem.

A prostituição deve parar de ser tratada como problema jurídico e como desvio moral. Existem problemas anteriores graves, sendo que uma soma de fatores sociais, educacionais, econômicos etc. fomentam a manutenção de uma prática antiga e, hipocritamente, muito rejeitada.

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