quarta-feira, 9 de março de 2011

"Ciclista morto em assalto": o Jornal de Brasília errou.

De <http://www.jornaldebrasilia.com.br/site/index.php>, é possível extrair a postagem abaixo:

RECANTO DAS EMAS
Ciclista morre baleado e moradores tentam linchar criminoso


Para conhecimento dos fatos, apresento o inteiro teor da matéria eletrônica, in verbis:

Publicação: Terça-feira, 08/03/2011 às 18:50:22   Atualização: 08/03/2011 às 20:47:21


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Um ciclista foi baleado por volta das 18h30 desta terça-feira (08) na altura da quadra 800 do Recanto das Emas. Claudimiro de Oliveira, de 40 anos, pedalava com um grupo de amigos quando um assaltante menor de idade os abordou. Após o assalto, Claudimiro seguiu o criminoso para tentar recuperar o material roubado, entrou em luta corporal e foi baleado nas costas. Muitos moradores – inclusive crianças – testemunharam o crime e tentaram linchar o menor.

Os moradores foram contidos pelo Corpo de Bombeiros que chegou primeiro ao local. Não se sabe o estado de saúde do adolescente, mas testemunhas afirmam que ele saiu gritando, sentindo bastante dor. Segundo a Polícia Militar, o criminoso participou de uma tentativa de roubo a um ônibus instantes antes  com um grupo de outros três assaltantes. 

O grupo da vítima partipava da atividade semanalmente. Claudimiro era proprietário de uma loja que vendia utensílios para bicicletas no Recanto das Emas. 

O menor foi conduzido ao Hospital Regional do Gama e, depois, para a DCA. Alguns moradores que participaram das agressões foram levados à Delegacia.

Fonte: Da redação do clicabrasilia.com.br, com informações de Ana Paula Andreolla
Disponível em: <http://www.jornaldebrasilia.com.br/ site/noticia.php?id=330325>. Acesso em: 9.3.2011, às 10h30.

O texto transcrito não apresenta os equívocos que pretendo apresentar. Refiro-me à matéria de autoria de Ana Paula Andreolla (Ciclista morto em assalto. Brasília: Jornal de Brasília, 9.3.2011, Caderno Segurança, p. 8), publicada hoje, de onde se pode extrair uma série de equívocos:

(I) a jurisprudência trata com extremo rigor o crime de latrocínio, impondo os maiores gravames aos seus agentes, portanto, caso estívessemos diante de um crime, poderíamos falar em latrocínio, não em roubo seguido de homicídio;

(II) o autor do disparo causador da morte é adolescente, razão de não praticar crime, mas fato definido como crime que se denomina ato infracional.

(III) fomenta-se a redução de mortes em crimes violentos utilizando adequada informação, não apenas incentivando a revolta contra os seus agentes.

Já tive oportunidade de publicar um artigo em que sustento que a culpabilidade integra o conceito de crime (vide: MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de Mesquita. A Culpabilidade Integra o Conceito Analítico de Crime. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 24.8.2009. Disponível em: <www.investidura.com.br/ biblioteca-juridica/artigos/direito-penal/4160>. Acesso em: 09.3.2011, às 10h45. Destarte, esclarecendo minha segunda afirmação, transcrevo parte da matéria publicada no jornal impresso:

"No local, muitas pessoas - e inclusive crianças - testemunharam o homicídio". Homicídio é crime, devendo ser analisado juridicamente, sendo que é equivocado dizer que o adolescente o tenha praticado. O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n. 8.069, de 13.7.1990), em seu art. 103, diz que o a prática de fato definido como crime será ato infracional. Assim, o adolescente praticou fato definido como crime, mas não homicídio, visto que a ele é incabível a prática de crime.

Homicídio é crime contra a vida, sendo que a morte concretizada para possibilitar o roubo caracterizará latrocínio. Este, segundo a jurisprudência pátria (esta é o costume do tribunal) se consuma com o resultado morte. Destarte, ainda que a subtração não tenha se completado, com a morte da vítima, haverá latrocínio e não homicídio.

É lamentável que a jurisprudência tenha em vista apenas o rigor (a pena mínima do latrocínio é de 20 anos - Código Penal, art. 157, § 3º, in fine - enquanto que o somatório das penas do homicídio consumado por ter sido praticado para assegurar a vantagem ou impunidade de outro crime a do roubo é de 17 anos e 4 meses. Observe-se: Código Penal, art. 121, § 2º, inc. V: pena - 12 anos; e art. 157, § 2º, inc. I e II: pena - 5 anos e 4 meses). Em casos como o narrado, talvez houvesse roubo consumado e mais homicídio, eis que a conduta causadora da morte seria superveniente à consumação da subtração e da violência ensejadora do dano patrimonial.

Os ciclistas, segundo a notícia, quando abordados,  estavam em número muito maior do que o dos agentes. Com isso, fica evidente que a subtração se deu mediante o emprego de arma de fogo. Por isso, longe de fazer uma apologia à conduta das vítimas, melhor seria informar a população sobre o erro na conduta caracterizada pela reação.

Vi o jogador de futebol Roger apelando por providências das autoridades públicas porque a sua mãe foi vítima de disparos de arma de fogo porque reagiu a um roubo e, mesmo sabendo que o índice de objetos recuperados é pequeno em relação aos roubados, digo que são necessárias medidas que vão além das policialescas que o Estado constuma oferecer.

Mais do que de polícia, em um caderno de "Segurança", a imprensa tem o importante papel de informar bem, inclusive criticando as reações aos roubos. Porém, não basta isso, em uma sociedade complexa, são necessárias muitas medidas que vão além, parafraseando Foucault, de "Vigiar e Punir".

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