quarta-feira, 27 de dezembro de 2023

O Juiz deve aplicar a lei. Violar a lei não é o seu papel.

 

O presente texto decorre de situações que enfrento com frequência e que me deixam indignado pela prática de alguns Advogados e de alguns Juízes de Direito e Desembargadores de Justiça. Com efeito, são impetrados mandados de segurança contra a Diretora Executiva do Centro Brasileiro de Pesquisa em Avaliação e Seleção e de Promoção de Eventos-CEBRASPE perante varas cíveis do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios-TJDFT porque candidatos perdem prazo para pagar inscrição do Programa de Avaliação Seriada-PAS ou do vestibular da Universidade de Brasília-UnB e são concedidas liminares ou antecipações dos efeitos das tutelas recursais para determinar a admissão da realização da prova, violando a legalidade e a isonomia.

Esclareça-se inicialmente que o Decreto n. 8.078, de 19.8.2013, qualifica o CESPE (instituído pela FUB como um centro administrativo e acadêmico seu) sob a denominação de CEBRASPE, como organização social, dispondo:

Art. 1o É qualificado como Organização Social o Centro Brasileiro de Pesquisa em Avaliação e Seleção e de Promoção de Eventos – CEBRASPE, associação civil com sede em Brasília, Distrito Federal, inscrito no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas – CNPJ sob o número 18.284.407/0001-53, registrado no 2o Ofício de Registro de Pessoas Jurídicas de Brasília, Distrito Federal, sob o no 000082415, de 13 de maio de 2013, que tem como objetivo realizar atividades de gestão de programas, projetos, apoio técnico e logístico para subsidiar sistemas de avaliação educacional, mediante a celebração de contrato de gestão a ser firmado com o Ministério da Educação.

Sem dizer qual será a nova categoria do CEBRASPE, em um arroubo inconsequente, o Decreto n. 11.062, de 4.5.2022, o desqualificou de organização social, mantendo-se a sua existência como ente privado. Isso faz com que a FUB tenha interesse porque os certames são seus, sendo o CEBRASPE mero executor dos PAS e vestibulares.

A tática é evitar a jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, o qual pacificou jurisprudência no sentido de que o edital é a lei do certame.[1] Caso queira impugná-lo, que o candidato o faça previamente,[2] visto que aos Juízes e Tribunais incumbe a aplicação, não a criação da lei.[3]

Adolescentes alegam ter imprimido o boleto e entregue a um dos genitores ou a irmãos mais velhos e que eles perderam o prazo por algum motivo que inventam, isso sem qualquer lastro probatório.

Como há interesse da Fundação Universidade de Brasília-FUB, instituída pela Lei n. 3.998, de 15.12.1961, para gerir os recursos humanos e materiais da UnB (art. 3º), peço a habilitação do Decano de Ensino de Graduação-DEG, que é quem assina os editais de PAS e vestibulares, pedindo para prevalecer a constitucional competência da Justiça Federal (Constituição Federal, art. 109, inciso I). Com isso, peço reconsideração das decisões e a remessa da ação mandamental para a Seção Judiciária do Distrito Federal, onde – espero – juízo efetivamente competente poderá reverter aquilo que o TJDFT vem equivocadamente consolidando.

O mandado de segurança exige prova pré-constituída, razão pela qual o direito de adolescentes não pode estar fundamentado em supostos erros de terceiras pessoas (pais, irmãos, tios, avós etc.) sem a necessária dilação probatória, incabível na ação mandamental.

Ao ter em vista o art. 5º, inciso II, da Constituição Federal, a FUB não pode se ver compelida a cumprir sentença (lei do caso concreto) que viole a lei geral, razão de se valer de todos recursos e meios jurídicos admissíveis em Direito para evitar ter que fazer algo não previsto em lei.



[1] Sempre cito decisão interlocutória paradigma, proferida nos autos do Mandado de Segurança n. 1113337-61.2023.4.01.3400, que informa claramente que conceder a liminar será violar o princípio da legalidade e o da isonomia. Dele consta o seguinte precedente, in litteris:

ADMINISTRATIVO. VESTIBULAR. MATRÍCULA. PERDA DE PRAZO. AUSÊNCIA DE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA DE FATO IMPEDITIVO ALHEIO À VONTADE DO IMPETRANTE. INEXISTÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO A SER PROTEGIDO POR MEIO DE MANDADO DE SEGURANÇA. 1. O mandado de segurança não admite dilação probatória, nem tampouco exame de questões de fato controvertidas, reclamando do impetrante prova pré-constituída a propósito do direito líquido e certo que afirma existente e pretende ver tutelado. 2. Não tendo o impetrante feito demonstração, à luz de prova pré-constituída, quanto a fato impeditivo e alheio a sua vontade que o impediu de efetivar sua matrícula na data designada pelo edital do vestibular para tanto, nem de vício ou irregularidade no edital no tocante a efetivação da matrícula, não se reconhece a existência de direito líquido e certo a ensejar a concessão da segurança. É de se ressaltar que não se pode considerar a circunstância de o pai do impetrante estar trabalhando em dois períodos, com intervalo de duas horas entre cada uma deles, como motivo de força maior que impossibilitasse o impetrante, porque dele a obrigação, de realizar sua matrícula na época oportuna, com o devido pagamento ou recolhimento bancária da taxa de inscrição. 3. Recurso de apelação e remessa oficial a que se dá provimento. (TRF - 1ª Região - 0002014-21.2008.4.01.4200 - DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS MOREIRA ALVES - SEXTA TURMA - e-DJF1 1.8.2011 PAG 101)

Para não pairar dúvidas sobre o que a sentença fundamenta, transcrevo um parágrafo dela:

Entender de modo contrário esbarraria exatamente na inteligência dos princípios da legalidade e da isonomia, bem como do instrumento convocatório, já que todos os participantes do certame deveriam observar os termos do edital.

[2] O mandado de segurança não é o procedimento adequado para declaração em tese de inconstitucionalidade de norma jurídica. Não tendo sido previamente impugnado em sede de ação de controle de (in)constitucionalidade, o edital será constitucional e, portanto, obediência a ele não importará em ilegalidade, seja por abuso ou desvio do poder.

[3] Carlos Maximiliano nos ensina que o brocardo in claris cessat interpretatio há muito se encontra significativamente mitigado. Aliás, sobre esse brocardo, diz ser “afirmativa sem nenhum valor científico, ante as ideias triunfantes na atualidade” (MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e interpretação do direito. 18. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p. 33). Assim, não desejamos que o Juiz seja “a boca da lei” e sim um intérprete coerente.

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