sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

A exclusão da tipicidade pelo consentimento do ofendido ao tráfico de pessoas para prostituição


RESUMO
O presente artigo tem como objetivo analisar o consentimento da pessoa para o tráfico destinado à prostituição, especialmente, o transnacional. O assunto passará pela análise da Lei n. 13.344, de 6.10.2016, que entrou em vigor no dia 21.11.2016, o que evidencia a sua relevância e atualidade, até porque decorrente de uma série de protocolos que deu ensejo à Convenção de Palermo, restando saber se o consentimento do ofendido será causa de exclusão da ilicitude ou da tipicidade, sendo que a pesquisa tenderá a demonstrar que o consentimento do ofendido excluirá a tipicidade e, portanto, o fato típico.
Palavras chave:  Prostituição Internacional. Crime. Consentimento do ofendido. Tipicidade.


1. INTRODUÇÃO
Escolher um tema para escrever um artigo acadêmico é algo complicado. Porém, entre os movimentos de lei e ordem e o abolicionismo, será necessário verificar qual posição poderá ser adotada sobre a utilização de propagandas para levarem brasileiras e brasileiros ao exterior para se prostituírem sob o manto de trabalho, mas perdendo as dignidades, especialmente sexuais.
O problema se centra na dúvida sobre o consentimento da pessoa para o tráfico destinado à prostituição exclui a tipicidade ou a ilicitude. Partiremos de uma única hipótese, que é a tendente a afirmar que o consentimento do ofendido será causa excludente da tipicidade.
Para enfrentarmos o problema, trataremos de aspectos superficiais históricos, da luta internacional por evitar o tráfico de pessoas, conjugando com a luta internacional para evitar a violência contra mulheres.
Trabalharemos com a hipótese de que nem todo assédio para levar pessoas ao exterior poderá ser considerado crime, visto que, nem sempre, a dignidade da pessoa humana estará em jogo.
 A relevância do tema é marcante, haja vista a luta internacional para evitar o tráfico de pessoa, a motivação da Lei n. 12.015, de 7.8.2009, bem como a recente publicação da lei n. 13.344, de 6.10.2016, que “Dispõe sobre a prevenção e repressão ao tráfico interno e internacional de pessoas e sobre as medidas de atenção às vítimas”.
2. DA DIGNIDADE À PROSTITUIÇÃO
Nesta seção passaremos inicialmente pelo significado jurídico de dignidade, para, conhecendo, desde o início, o conceito de prostituição, podermos enfrentar a questão da dignidade em face da prostituição, a fim de sabermos o que exatamente leva à prostituição e especialmente ao tráfico de pessoas para tais fins. Para tanto, desde logo, aspectos históricos não poderão ser olvidados.
Como o escopo desta pesquisa será buscar entender se o assédio de modelos brasileiras para atuarem como prostitutas no exterior, não será enfrentada a questão da prostituição masculina, a qual também passa pelo tráfico de pessoas, mas foge do cerne do presente trabalho.
2.1 Significado jurídico complexo de dignidade
Existem discussões filosóficas, alheias ao objeto desta pesquisa, que indagam sobre a cientificidade do Direito. No entanto, ela se norteará por aspectos científicos. Com isso, procuraremos afirmar o quê é a dignidade na sua essência.
A dignidade da pessoa humana consta da Constituição Federal, como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil (art. 1º, inc. III). Lexicologicamente, dignidade, do latim dignitas, é a qualidade de quem ou daquilo que é digno, é uma autoridade moral, uma nobreza, um decoro ou uma respeitabilidade.[1]
Canotilho, inspirador do modelo analítico da Constituição Federal da República Federativa do Brasil, se refere ao art. 2º da Constituição lusitana que prestigia a dignidade da pessoa humana, expondo que é um princípio antrópico (relativo ou pertencente ao homem) que acolhe a ideia pré-moderna e moderna da dignitatis-hominis, ou seja, “do indivíduo conformador de si próprio e da sua vida segundo o seu próprio projeto espiritual”.[2]
Uma pessoa poder firmar-se como ela mesma exigirá uma pluralidade de direitos que autorizarão a ela ser distinguida das demais pessoas. Nesse sentido, afirma José Afonso da Silva:
Dignidade da pessoa humana é um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida. “Concebido como referência constitucional unificadora de todos os direitos fundamentais [observam Gomes Canotilho e Vital Moreira], o conceito de dignidade da pessoa humana obriga a uma densificação valorativa que tenha em conta o seu amplo sentido normativo-constitucional e não uma qualquer ideia apriorística do homem, não podendo reduzir-se o sentido da dignidade humana à defesa dos direitos pessoais tradicionais. esquecendo-a nos casos de direitos sociais, ou invocá-los para construir ‘teoria do núcleo da personalidade’ individual, ignorando-a quando se trate de garantir as bases da existência humana. Daí decorre que a ordem econômica há de ter por fim assegurar a todos existência digna (art. 170), a ordem social visará a realização da justiça social (art. 193), a educação, o desenvolvimento da pessoa e seu preparo para o exercício da cidadania (art. 205) etc., não como meros enunciados formais, mas como indicadores do conteúdo normativo eficaz da dignidade da pessoa humana.[3]
Em Gilmar Mendes, Inocêncio Coelho e Paulo Gustavo Branco, encontra-se presente a ideia de singularidade que representa a dignidade.[4] Assim, a dignidade é um conjunto de valores que permitirão à pessoas ser ela mesma, em oposição à ideia de coletividade.
Robert Alexy vê a dignidade da pessoa humana como norma e como princípio orientador de direitos fundamentais que não tem caráter absoluto, mas na dicção da Constituição alemã, é um princípio que deverá prevalecer quando houver colidência com outros princípios.[5] De toda sorte, conforme esclarece Virgílio Afonso da Silva, enquanto regra, a dignidade de pessoa humana é imutável, mas é ponderável como todos os demais princípios.[6]

2.2 Rápida visão sobre a ilicitude da prostituição

A prostituição não é crime e, nem sempre, foi ou é imoral. No entanto, conforme ensina Nelson Hungria, desde remota antiguidade, o lenocínio (intermediação para a prostituição feminina), por sua vez, tem sido objeto de repressão jurídico-criminal.[7] Sólon (638 a.C – 558 a.C), chegou a editar norma que punia o lenocínio com a morte.
Deve-se reconhecer a grande dificuldade que se encontra para estabelecer a origem precisa da prostituição. Por oportuno, transcreve-se a lição de Magalhães Noronha:
Os historiadores aludem à fase da hospitalidade, em que a prostituição era um dever, em épocas primitvas. Mais tarde, apresenta-se com caráter religioso. Na Fenícia, adorava-se Astarté, cuja imagem apresentava os dois sexos. Suas festas eram verdadeiras orgias, dirigidas por sacerdotes. No Egito, as virgens escolhidas por suas belezas, eram consagradas a Ísis. Os ministros do culto incumbiam-se não só de iniciá-las na licenciosidade e luxúria, mas de conseguir-lhes o casamento, depois que haviam se prostituído. Esse gênero de prostituição acarretava para o país grandes lucros, pois centenas de milhares de estrangeiros para lá eram atraídos. As próprias filhas dos reis prostituíam-se. Conta-se que a pirâmide de Quéops foi erguida pelos vultosos lucros de sua filha. Entre os assírios e babilônios adorava-se Milita. Toda mulher tinha que ir, ao menos uma vez em sua vida, ao templo e aí esperar que fosse solicitada por um homem, que lhe atirando qualquer moeda (a qual se tornava sagrada) e invocando a deusa, com ela se afastava do templo e a possuía. Em hipótese alguma, facultava-se à mulher recusar a posse sexual. Cumprido o ato, podia voltar, então, à sua casa. Tal preceito tinha de ser observado por toda mulher, mesmo as mais ricas e nobres. Na índia, incumbia à donzela deixar que um sacerdote a deflorasse. Aliás, no Kama-Sutra vê-se que a sexologia é uma parte da religião, ou de qualquer modo, com ela se relaciona.[8]
Vê-se, pois, que a prostituição teve até mesmo uma conotação religiosa, sendo que a ideia perpassou até mesmo pela cultura romana, que cultuou Afrodite (versão grega) ou Vênus (versão romana), a deusa do amor. E, mesmo no autar da deusa Pudititia, orgias se concretizavam. Também, nos templos das deusas Vênus Volúpia e Vênus Salácia, ocorriam, respectivamente, busca dos libertinos para a inspiração das práticas mais voluptuosas e aperfeiçoamento das cortesãs nas suas profissões.[9] E, Magalhães Noronha continua apresentando um outro momento:
Na Grécia, não faltavam organizações sagradês de meretrizes. É certo que as leis de Sólon protegiam a família, punindo o adultério, o rapto, a sedução, o tráfico etc., mas reconheciam o meretrício. Essa classe era constituída por escravas, quase todas estrangeiras e moravam em lugares mantidos pelo Estado. Os proventos eram entregues aos sacerdotes de Afrodite Pandemus. O legislador, ao que parece, dava ainda à prostituição um fundo religioso. Em Atenas e outras cidades gregas, os alcoices estabeleciam-se nas proximidades dos banhos, os quais não se destinavam apenas a fins higiênicos.
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Com o advento do Cristianismo, tratou de reprimir-se o meretrício. O Imperador Tácito tentou a supressão dos prostíbulos em Roma. Teodósio, o Grande, e Valentiano I proibiram a prostituição. Justiniano também se lançou à empresa. Todas essas tentativas, como que a demonstrar, já, a complexidade do problema, foram vãs. E, assim, a prostituição passou para a Idade Média.[10]
Podemos afirmar, com Nelson Hungria, que “A prostituição é um mal inextirpável. Ignorada, tolerada, regulamentada ou proibida, sempre existiu e há de existir sempre. É inútil tentar extingui-la”.[11] Em apertada síntese, o doutrinador apresentou os clássicos sistemas de tratamento da prostituição pelo Estado, quais seja:
(a) ignorância – o Estado não se imiscui em assuntos relativos à prostituição, mantendo-a à margem da legalidade ou da proibição, como se não existisse;
(b) tolerância ou abolicionista – o Estado percebe a prostituição, mas a assimila como um mal potencial, tolerando-a até certos níveis, mas sem intervir em suas práticas menos “agressivas”. Baseia-se na proposta de não punir a prostituta, mas de lhes impor a obrigação de respeitar o pudor público e prevenir a proliferação de doenças;
(c) regulamentação – é o sistema mais aceito no atual estágio da humanidade. Países com maior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) preferem regulamentar a prostituição para defesa da dignidade da pessoa humana e defesa da saúde pública;
(d) proibição – incriminar a prostituição, especialmente a feminina, é uma postura corrente em Estados machistas, baseada em Lombroso, mas sem base científica porque se a prostituição, por si mesma, se afetar alguém, será a própria pessoa prostituída e a autolesão não poderá constituir crime.
Normalmente, a prostituição traz sofrimentos, sendo que há grande discriminação social e o trabalho sexual não é agradável como pode parecer, ao menos é o que se pode verificar na história de Gabriela Leite[12] e Raquel Pacheco.[13] Nesse sentido, Sidio R. de Mesquita Júnior afirma:
A aparente vida fácil das prostitutas e o constante sonho de encontrar um milionário semelhante ao ator Richard Gere, do filme "Uma linda mulher" é um engodo bem retratrado pelo texto anteriormente transcrito. Porém, a prostituta vende o seu corpo assim como todo trabalhador que se vale do corpo para sustentar a sua vida, não sendo ela inferior ao professor (que vive do seu intelecto), do lutador e do atleta em geral (que vivem das suas forças e das suas habilidades) etc.[14]
Mirian Hatcher, Coordenadora de programas de justiça para mulheres e tráfico humano, Cook County Sheriff’s Office, no mesmo sentido, afirma:
Há exatos 25 anos, uma das comédias românticas de maior sucesso da história do cinema, "Uma Linda Mulher", estreava nos Estados Unidos. O filme arrecadou quase meio bilhão de dólares até hoje.
Julia Roberts encantou as audiências como uma "prostituta feliz", e sua química com Richard Gere, um investidor agressivo fazendo negócios em Los Angeles, era inegável. Os dois incendiaram a tela.
O único problema é que a prostituição retratada no filme não poderia estar mais distante da verdade.
A prostituição é terrível. A maioria envolve tráfico de sexo. É intrigante saber que o roteiro do filme originalmente era uma história sombria, um alerta. Da minha perspectiva de sobrevivente, essa é a triste realidade.
Muito poucas entre nós escolhem "cair na vida". Não somos felizes e com certeza não curtimos o sexo com os clientes. De acompanhantes de alto nível a garotas compradas online, as mulheres prostituídas são atrizes.[15]
Diversamente, na Austrália, para marcar o 25º aniversário do filme “Uma Linda mulher” foi lançado um “blog” que pretendia evidencia o que se transcreveu, no sentido de que a realidade das profissionais do sexo é muito mais difícil do que a apresentada no cinema. Isso criou uma reação em que muitas prostitutas pretenderam evidenciar não se poder generalizar a realidade das prostitutas em um país em que a prostituição é legalizada como profissão.[16]
No Brasil, assim como a autolesão não é crime, o suicídio e a prostituição não são crimes. Todavia, a participação na prostituição alheia poderá constituir crime. Mais difícil será reparar o dano causado à prostituta que for deslocada de lugar, especialmente para o estrangeiro, razão de destacarmos o assunto para análise em seção específica.
3. LENOCÍNIO E DO TRÁFICO DE PESSOAS
Lenocínio é uma palavra que decorre do latim lenocinium, significando alcovitice ou inculcação de mulheres, sendo o ato de aliciar mulheres para ações contrárias à castidade.[17]
O convite à prostituição poderá ter fim de lucro ou não. De qualquer modo, esse é um assunto que preocupa o mundo desde alguns séculos, o que exige uma abordagem mais detalhada. Especialmente no que tange ao lenocínio tendente à transferir pessoas de um País para outro país.
3.1 A luta internacional contra o tráfico de pessoas
Hedel Torres apresenta vários quadros comparativos, visando a demonstrar a evolução legislativa internacional, desde a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789) até a Declaração e Programa de Ação da 3ª Conferência (2001).[18] No entanto, pretendemos abordar o assunto de uma forma um pouco mais abrangente, razão de nos reportarmos a um artigo de Ela Wiecko. Ela apresenta o seguinte quadro:
·      1814 – Tratado de Paris entre Inglaterra e França, para proibir o tráfico de negros;
·      1926 – Reafirmação da convenção de 1814 pela Sociedade das Nações;
·      1953 - Reafirmação da convenção de 1926 pela Organização das Nações Unidas;
·      1956 – Convenção de Genebra, que repetiu os conceitos e ampliou o foco para redução às condições análogas à de escravo, vedando a imobilização por dívidas e a servidão (debt bondage) e a subjugação e exploração da mulher;
·      1904 – Acordo para a Repressão do Tráfico de Mulheres Brancos, de Paris, convolado em Convenção no ano seguinte;
·      1910 – em Paris, Convenção Internacional para a Repressão do Tráfico de Mulheres Brancas;
·      1921 – Convenção Internacional de Genebra para a Repressão do Tráfico de Mulheres e Crianças;
·      1933 – ainda em Genebra, Convenção Internacional para a Repressão do Tráfico de Mulheres Maiores.[19]
Após o estabelecimento da Organização das Nações Unidas, em 24.10.1945, para substituir a ineficiente Liga das Nações, inicia-se nova fase com expressa anulação e substituição das anteriores, seguindo-se:
Ø 1947 – Protocolo de Emenda à Convenção Internacional para a Repressão do Tráfico de Mulheres e Crianças e à Convenção Internacional para a Repressão do Tráfico de Mulheres Maiores;
Ø 1949 – Convenção e Protocolo Final para a Repressão do Tráfico de Pessoas e do Lenocínio (Lake Success);
Ø 1979 – Convenção sobre a Eliminação de todas Formas de Discriminação contra a Mulher (reconheceu a ineficácia da Convenção de 1949);
Ø 1983 – cobrança de relatórios pelo Conselho Econômico e Social da ONU;
Ø 1992 – Programa de Ação para a Prevenção da Venda de Crianças, Prostituição Infantil e Pornografia Infantil;
Ø 1993 – Conferência Mundial dos Direitos Humanos, com especial preocupação com a “eliminação de todas as formas de assédio sexual, exploração e tráfico de mulheres”;
Ø 1994 – Resolução da Assembleia Geral da ONU definiu o tráfico como o movimento ilícito ou clandestino de pessoas através das fronteiras nacionais e internacionais, principalmente de países em desenvolvimento e de alguns países com economias em transição, com o fim de forçar mulheres e crianças a situações de opressão e exploração sexual ou econômica, em benefício de proxenetas, traficantes e organizações criminosas, assim como outras atividades ilícitas relacionadas com o tráfico de mulheres, por exemplo, o trabalho doméstico forçado, os casamentos falsos, os empregos clandestinos e as adoções fraudulentas.
Ø 1996 – Programa de Ação da Comissão de Direitos Humanos para a Prevenção do Tráfico de Pessoas e a Exploração da Prostituição;
Ø 1998 – O Estatuto de Roma definiu os crimes internacionais de escravidão sexual e de prostituição forçada contra a humanidade e de guerra;
Ø 1998 – Convenção Interamericana sobre o Tráfico Internacional de Menores. Conceituou como tráfico internacional de pessoas com menos de 18 anos a “subtração, transferência ou retenção, ou a tentativa de subtração, transferência ou retenção de um menor, com propósitos ou por meios ilícitos”;
Ø 2000 – Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, adotada em Nova York.[20]
Deve-se destacar aqui que o tráfico de pessoas constou do Estatuto de Roma, que está em vigor no Brasil, promulgado pelo Decreto n. 4.388, de 25.9.2002, que institui a Corte Internacional Criminal. Em tal estatuto, muitas condutas foram tipificas como crimes contra a humanidade, com penas elevadíssimas
Art. 7º - Crimes contra a humanidade
1. Para os efeitos do presente Estatuto, entende-se por "crime contra a humanidade", qualquer um dos atos seguintes, quando cometido no quadro de um ataque, generalizado ou sistemático, contra qualquer população civil, havendo conhecimento desse ataque:
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c) Escravidão;
d) Deportação ou transferência forçada de uma população;
e) Prisão ou outra forma de privação da liberdade física grave, em violação das normas fundamentais de direito internacional;
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g) Agressão sexual, escravatura sexual, prostituição forçada, gravidez forçada, esterilização forçada ou qualquer outra forma de violência no campo sexual de gravidade comparável;
h) Perseguição de um grupo ou coletividade que possa ser identificado, por motivos políticos, raciais, nacionais, étnicos, culturais, religiosos ou de gênero, tal como definido no parágrafo 3o, ou em função de outros critérios universalmente reconhecidos como inaceitáveis no direito internacional, relacionados com qualquer ato referido neste parágrafo ou com qualquer crime da competência do Tribunal;
i) Desaparecimento forçado de pessoas;
j) Crime de apartheid;
k) Outros atos desumanos de caráter semelhante, que causem intencionalmente grande sofrimento, ou afetem gravemente a integridade física ou a saúde física ou mental.
2. Para efeitos do parágrafo 1o:
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c) Por "escravidão" entende-se o exercício, relativamente a uma pessoa, de um poder ou de um conjunto de poderes que traduzam um direito de propriedade sobre uma pessoa, incluindo o exercício desse poder no âmbito do tráfico de pessoas, em particular mulheres e crianças;
d) Por "deportação ou transferência à força de uma população" entende-se o deslocamento forçado de pessoas, através da expulsão ou outro ato coercivo, da zona em que se encontram legalmente, sem qualquer motivo reconhecido no direito internacional;
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f) Por "gravidez à força" entende-se a privação ilegal de liberdade de uma mulher que foi engravidada à força, com o propósito de alterar a composição étnica de uma população ou de cometer outras violações graves do direito internacional. Esta definição não pode, de modo algum, ser interpretada como afetando as disposições de direito interno relativas à gravidez;
g) Por "perseguição'' entende-se a privação intencional e grave de direitos fundamentais em violação do direito internacional, por motivos relacionados com a identidade do grupo ou da coletividade em causa;
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i) Por "desaparecimento forçado de pessoas" entende-se a detenção, a prisão ou o sequestro de pessoas por um Estado ou uma organização política ou com a autorização, o apoio ou a concordância destes, seguidos de recusa a reconhecer tal estado de privação de liberdade ou a prestar qualquer informação sobre a situação ou localização dessas pessoas, com o propósito de lhes negar a proteção da lei por um prolongado período de tempo.
3. Para efeitos do presente Estatuto, entende-se que o termo "gênero" abrange os sexos masculino e feminino, dentro do contexto da sociedade, não lhe devendo ser atribuído qualquer outro significado.
Artigo 8o – Crimes de Guerra
1. O Tribunal terá competência para julgar os crimes de guerra, em particular quando cometidos como parte integrante de um plano ou de uma política ou como parte de uma prática em larga escala desse tipo de crimes.
2. Para os efeitos do presente Estatuto, entende-se por "crimes de guerra":
a) As violações graves às Convenções de Genebra, de 12 de Agosto de 1949, a saber, qualquer um dos seguintes atos, dirigidos contra pessoas ou bens protegidos nos termos da Convenção de Genebra que for pertinente:
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viii) Tomada de reféns;
b) Outras violações graves das leis e costumes aplicáveis em conflitos armados internacionais no âmbito do direito internacional, a saber, qualquer um dos seguintes atos:
viii) A transferência, direta ou indireta, por uma potência ocupante de parte da sua população civil para o território que ocupa ou a deportação ou transferência da totalidade ou de parte da população do território ocupado, dentro ou para fora desse território;
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x) Submeter pessoas que se encontrem sob o domínio de uma parte beligerante a mutilações físicas ou a qualquer tipo de experiências médicas ou científicas que não sejam motivadas por um tratamento médico, dentário ou hospitalar, nem sejam efetuadas no interesse dessas pessoas, e que causem a morte ou coloquem seriamente em perigo a sua saúde;
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xxi) Ultrajar a dignidade da pessoa, em particular por meio de tratamentos humilhantes e degradantes;
c) Em caso de conflito armado que não seja de índole internacional, as violações graves do artigo 3o comum às quatro Convenções de Genebra, de 12 de Agosto de 1949, a saber, qualquer um dos atos que a seguir se indicam, cometidos contra pessoas que não participem diretamente nas hostilidades, incluindo os membros das forças armadas que tenham deposto armas e os que tenham ficado impedidos de continuar a combater devido a doença, lesões, prisão ou qualquer outro motivo:
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ii) Ultrajes à dignidade da pessoa, em particular por meio de tratamentos humilhantes e degradantes;
iii) A tomada de reféns;
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e) As outras violações graves das leis e costumes aplicáveis aos conflitos armados que não têm caráter internacional, no quadro do direito internacional, a saber qualquer um dos seguintes atos:
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vi) Cometer atos de agressão sexual, escravidão sexual, prostituição forçada, gravidez à força, tal como definida na alínea f do parágrafo 2o do artigo 7o; esterilização à força ou qualquer outra forma de violência sexual que constitua uma violação grave do artigo 3o comum às quatro Convenções de Genebra;
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viii) Ordenar a deslocação da população civil por razões relacionadas com o conflito, salvo se assim o exigirem a segurança dos civis em questão ou razões militares imperiosas;
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xi) Submeter pessoas que se encontrem sob o domínio de outra parte beligerante a mutilações físicas ou a qualquer tipo de experiências médicas ou científicas que não sejam motivadas por um tratamento médico, dentário ou hospitalar nem sejam efetuadas no interesse dessa pessoa, e que causem a morte ou ponham seriamente a sua saúde em perigo;
Segundo o art. 77, as penas de prisão podem ser fixadas em prazos determinados, até o máximo de 30 anos, o a prisão poderá ser perpétua, cumulando multa e restrições de direitos. De qualquer modo, sublinhou-se “que a Corte Internacional Criminal, criada pelo presente Estatuto, será complementar às jurisdições penais nacionais”.
O cerne deste artigo não é o exame do Direito Criminal Internacional, mas do Direito Criminal pátrio, sendo que a presente seção tem o objetivo único de evidenciar a necessidade de criminalizar o tráfico de pessoas no âmbito interno, até porque, por tratado de Direito Internacional, o Brasil se obrigou a combater. Porém, não se olvide, a complementariedade não pode significar em sujeição do Direito Internacional à jurisdição nacional, sendo importante verificar a autonomia e a relevância da necessária comunicação da ordem jurídica interna com a internacional.[21]
Vê-se, pois, em face do caráter complementar da jurisdição da Corte Internacional Criminal, que a criação de uma lei que fosse abrangente em relação ao tráfico de pessoas era uma necessidade, até porque, o Código Penal só incriminava o tráfico de pessoas violador da organização do trabalho (arts. 206 e 207) e contra a dignidade sexual (arts. 231 e 231-A).
3.2 A evolução legislativa interna sobre o tráfico de pessoas
Não cuidaremos aqui das Ordenações do Reino (Ordenações Afonsinas, Manuelinas e Filipinas), que eram aplicáveis aos crimes praticados no território da Colônia porque interessa-nos especialmente o momento em que se inicia, no mundo, o combate ao tráfico de pessoas, especialmente contra o tráfico negreiro, o que corresponde aproximadamente ao momento da declaração da independência do Brasil.
No Código Penal da República (Decreto n. 847, de 11.10.1890), incriminou-se o lenocínio (arts. 277-278), mas sem qualquer referência ao tráfico de pessoas. Damásio Evangelista de Jesus, sem indicar o dispositivo legal, afirma ter sido criminalizado o tráfico de mulheres no referido código.[22] Todavia, o exame detalhado do código em exame evidencia que não houve preocupação com o tráfico dirigido à prostituição.[23] Para o referido autor, a proteção ao tráfico estaria implícita na proibição do lenocínio, o que é parece não ser uma afirmação adequada porque a alcovitice não dependerá necessariamente do tráfico de pessoas.
A Consolidação das Leis Penais (Decreto n. 22.213, de 14.12.1932), inovou. Os §§ 1º e 2º do seu art. 278 dispuseram:
§ 1º Aliciar, atrair ou desencaminhar, para satisfazer as paixões lascivas de outrem, qualquer mulher menor, virgem ou não, mesmo com o seu consentimento; aliciar, atrair ou desencaminhar, para satisfazer as paixões lascivas de outrem, qualquer mulher maior, virgem ou não, empregando para esse fim ameaça, violência, fraude, engano, abuso de poder, ou qualquer outro meio de coação; reter, por qualquer dos meios acima referidos, ainda por causa de dívidas contraídas, qualquer mulher maior ou menor, virgem ou não, em casa de lenocínio, obrigá-la a entregar-se à prostituição.
§ 2º Os crimes de que tratam este artigo e o seu § 1º serão puníveis no Brasil, ainda que um ou mais atos constitutivos das infrações neles previstas tenham sido praticados em país estrangeiro.
Essa ideia do crime de ser punível o tráfico consentido fica mantido nos arts. 231 e 231-A do Código Penal, significativamente alterado, nessa parte, pelas Leis n. 11.106, de 28.3.2005, e 12.015, de 7.8.2009.
A Convenção de Palermo (2000) fez nascer duas Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI’s) no ano de 2011, uma no Senado e outra na Câmara dos Deputados. O relatório final da CPI da Câmara dos Depurados foi apresentado, em 20.5.2014, com 393 páginas.[24] No Senado, a Senadora Marinor de Brito, também em 2011, requereu a instauração de CPI para investigar o tráfico de pessoas. A CPI no dia 19.12.2016, apresentou seu relatório final com 227 páginas.[25]
A conclusão da CPI do Senado resultou no Projeto de Lei n. 479/2012, que ganhou o Substitutivo n. 2/2015 da Câmara. A da Câmara dos Deputados, por sua vez, inicialmente, houve o Projeto de Lei n. 7.370/2014, resultando na Lei n. 13.344, de 6.10.2016, publicada no dia 7.10.2016, com prazo de vacatio legis de 45 dias (art. 17), a qual tem a seguinte ementa:
Dispõe sobre prevenção e repressão ao tráfico interno e internacional de pessoas e sobre medidas de atenção às vítimas; altera a Lei n. 6.815, de 19 de agosto de 1980, o Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), e o Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal); e revoga dispositivos do Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal).
Vê-se, pois, que a nova lei entrou em vigor no dia 21.11.2016, o que torna a presente pesquisa bastante atual, até porque está em vigor, com poucos dias de vigência.
No campo criminal, forão revogados os seguintes artigos:
Tráfico internacional de pessoa para fim de exploração sexual
Art. 231. Promover ou facilitar a entrada, no território nacional, de alguém que nele venha a exercer a prostituição ou outra forma de exploração sexual, ou a saída de alguém que vá exercê-la no estrangeiro.
Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos.
§ 1o Incorre na mesma pena aquele que agenciar, aliciar ou comprar a pessoa traficada, assim como, tendo conhecimento dessa condição, transportá-la, transferi-la ou alojá-la.
§ 2o A pena é aumentada da metade se:
I - a vítima é menor de 18 (dezoito) anos;
II - a vítima, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato;
III - se o agente é ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou curador, preceptor ou empregador da vítima, ou se assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; ou
IV - há emprego de violência, grave ameaça ou fraude.
§ 3o Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa.
Tráfico interno de pessoa para fim de exploração sexual
Art. 231-A. Promover ou facilitar o deslocamento de alguém dentro do território nacional para o exercício da prostituição ou outra forma de exploração sexual:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos.
§ 1o Incorre na mesma pena aquele que agenciar, aliciar, vender ou comprar a pessoa traficada, assim como, tendo conhecimento dessa condição, transportá-la, transferi-la ou alojá-la.
§ 2o A pena é aumentada da metade se:
I - a vítima é menor de 18 (dezoito) anos;
II - a vítima, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato;
III - se o agente é ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou curador, preceptor ou empregador da vítima, ou se assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; ou
IV - há emprego de violência, grave ameaça ou fraude.
§ 3o Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa.
O Projeto de Lei n. 117/2003 pretendeu modificar a Parte Especial do Código Penal. Sendo oportuno expor:
Já se tentou modificar todo CP, mas sem sucesso. Desse modo, a Parte Especial do CP (PE/CP) já se encontrava obsoleta, mormente em relação aos crimes contra os costumes, uma vez que a evolução social tornou extremamente diferentes os costumes nos últimos anos. Corolário foi alterar o Título VI, da PE/CP. Essa modificação foi proposta pela Deputada Federal Iara Bernardi, por meio do Projeto de Lei n. 117, datado de 19.2.2003, depositado na mesma data.
O projeto original era tímido, eis que visava apenas à modificação dos arts. 216 e 231 do CP, fundamentado na ideia de que o CP “em vigor contempla mecanismos, estereótipos, preconceitos e discriminação em relação às mulheres”. Porém, algumas emendas foram apresentas, sendo mais ousada a de origem do Deputado Luiz Antônio Fleury.
A redação final do projeto foi apresentada por meio do substitutivo do Senado Federal, o que constituiu o texto final aprovado pelo Congresso Nacional e sancionado sem qualquer veto pelo Presidente da República.[26]
A Lei n. 11.106, de 28.3.2005, instituiu o crime do art. 231-A e deu nova redação ao art. 231, ambos transcritos, mas que tem a redação transcrita a partir da Lei n. 12.015, de 7.8.2009. Sobre tal lei, expus alhures:
A grande inflação legislativa nacional é preocupante. As leis são feitas açodadamente, o que tem sido objeto de críticas. O pior é que temos o hábito de tentar resolver o problema da criminalidade por meio da criação de leis mais rigorosas como se essa fosse uma solução efetiva para os graves problemas que enfrentamos.
Em 2.003 foi instaurada Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI), mediante requerimento da Deputada Federal Maria do Rosário (PT-RS), a qual foi designada relatora da CPMI, que teve como Presidente a Senadora Patrícia Saboya Gomes (PPS-CE), cujas atividades perduraram por um ano e, após a visita feita a 21 estados, foi elaborado relatório final, apresentado ao Congresso Nacional no dia 7.7.2004, às 17h30.
O relatório resultou em um livro de 63 páginas e a presidência da CPMI ofertou notoriedade em favor da parlamentar. Esta foi denominada "heroína do Ceará" pela Revista Isto É. Sem dúvida, a Senadora Patrícia Saboya Gomes soube utilizar bem a CPMI para alcançar algum destaque na mídia. Seu trabalho resultou em vários indiciamentos, inclusive, o do atleta Zequinha Barbosa. Em função de tal CPMI, foi elaborado o Projeto de Lei n. 253, de 13.9.2004.
..............................................................................................................
O Projeto de Lei n. 253/2004, na Câmara dos Deputados, em face de projeto de lei substitutivo, ganhou o n. 4.850/2005, sendo que, ao final, foi proposta uma consolidação das emendas de vários Deputados Federais, sendo relator da mencionada consolidação o Deputado Federal Flávio Dino, de onde resultou o texto transformado na Lei n. 12.015, de 7.8.2009, publicada no Diário Oficial da União, Seção 1, de 10.8.2009. Esta merece críticas positivas e negativas.[27]
Novamente emerge a ideia de resolver o problema da criminalidade por meio de novas lei criminais, tendo sido editada a mencionada Lei n. 13.344, que instituiu novo crime contra a liberdade individual, no Título I da Parte Especial do Código Penal, in verbis:
Tráfico de Pessoas
Art. 149-A. Agenciar, aliciar, recrutar, transportar, transferir, comprar, alojar ou acolher pessoa, mediante grave ameaça, violência, coação, fraude ou abuso, com a finalidade de:
I - remover-lhe órgãos, tecidos ou partes do corpo;
II - submetê-la a trabalho em condições análogas à de escravo;
III - submetê-la a qualquer tipo de servidão;
IV - adoção ilegal; ou
V - exploração sexual.
Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.
§ 1o A pena é aumentada de um terço até a metade se:
I - o crime for cometido por funcionário público no exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-las;
II - o crime for cometido contra criança, adolescente ou pessoa idosa ou com deficiência;
III - o agente se prevalecer de relações de parentesco, domésticas, de coabitação, de hospitalidade, de dependência econômica, de autoridade ou de superioridade hierárquica inerente ao exercício de emprego, cargo ou função; ou
IV - a vítima do tráfico de pessoas for retirada do território nacional.
§ 2o A pena é reduzida de um a dois terços se o agente for primário e não integrar organização criminosa.
A nova lei é multidisciplinar, alterando várias normas e tem um rigor maior a ser imposto ao criminoso que incorrer no tráfico interno e externo de pessoas do que o arts. 231 e 231-A, que ela revogará.
O tipo tem núcleo composto alternativo, o que significa dizer que basta a realização de uma das condutas descritas no caput do art. 149-A transcrito para que haja consumação, até porque se trata de crime formal, ou seja, de consumação precipitada ou antecipada.
3.3 O consentimento do ofendido como excludente de crime
Foi desenvolvida a tese, no sentido de que o consentimento da vítima, nos delitos cujo objeto jurídico seja disponível, constitui causa excludente da ilicitude,[28] o que não pode ser admitido, embora seja praticamente pacífico tal entendimento na doutrina criminal pátria hodierna.
Fernando Capez ensina que o consentimento do ofendido constitui: (a) irrelevante criminal nos crimes em que o bem jurídico é indisponível, v.g., homicídio; (b) excludente de tipicidade se o dissentimento, ou o consentimento, for exigência expressa do tipo, v.g., furto; (c) excludente de ilicitude nos crimes em que o consentimento, ou o dissenso, não forem exigência expressa do tipo; (d) causa de diminuição de pena, somente quando prevista na lei.[29]
Diz-se que o consentimento do ofendido constitui causa supralegal excludente da ilicitude, um verdadeiro princípio de Direito que não autorizaria considerar ilícito um fato que foi considerado irrelevante pela pessoa atingida, desde que ela possa dispor livremente do bem jurídico afetado. Tal construção, ante a máxima nullun crimen sine injura parece tentadora, mas não pode prevalecer porque ilícito o fato continuará sendo, o que pode lhe faltar, na verdade, é o fato típico, a culpabilidade ou a punibilidade.
Assis Toledo afirmava que o consentimento do ofendido era causa supralegal excludente da ilicitude, um verdadeiro princípio do Direito, acima da lei. Ele sugere a hipótese do dano (CP, art. 163) com o consentimento expresso do proprietário da coisa, ou o encarceramento (CP, art. 148) de quem expressamente consentiu.[30] Ao meu aviso, a existência do delito pressupõe a contraposição do dono do objeto jurídico, isso quando se trata de bem disponível e desembaraçado. Havendo consentimento prévio, não haverá o fato típico, eis que não existirá sujeito passivo, uma vez que “alienado” o objeto jurídico.
O consentimento da vítima tem relevância, nos delitos de ação criminal de iniciativa exclusivamente privada, visto que o ofendido pode se manter inerte, elidindo a punibilidade. Também, tem relevância para o grau de censura, que tem relação com as consequências do delito. Desse modo, ao contrário de se reservar à doutrina a correta política criminal, deve-se exigir do legislador o adequado exercício do seu poder legiferante, só se reservando à iniciativa pública da ação criminal à hipótese que extrapole bem jurídico disponível.
Dizer que a censura criminal (culpabilidade), deve ser concebida segundo cada injusto concretizado (a “justiça do caso concreto”), entendo o consentimento da vítima, no atual estágio da história do Direito Criminal (que pretende ser mais humano e menos interventor) é possível dizer que o fato não tem relevância jurídico-criminal a ponto de possibilitar a drástica censura de tal ramo do Direito. Não constitui a melhor postura de política-criminal transformar em crime de ação criminal de iniciativa pública aquele que se refere a bem jurídico suficiente, visto que se a lei entende que o fato é grave o suficiente para ensejar iniciativa pública incondicionada (não depender da vontade da vítima a existência do processo), é porque o fato é grave, sendo inoportuno atribuir ao julgador o dever de se imiscuir na eleição de quais objetos jurídicos são relevantes, a ponto de desnaturar a iniciativa pública da ação criminal.
Alguém poderá ver alguma contraditio in terminis entre o que foi exposto neste tópico e aquele relativo à tentativa inidônea, visto que, assim como naquela hipótese, o agente teve a intenção de praticar o resultado, mas acabou alcançado pela máxima nullum crime sine injura. Então, poder-se-ia admitir a inserção de um preceito que puna como tentado, o delito consumado de ação criminal de iniciativa pública incondicionada que, após sua realização, contou com o consentimento do ofendido. Essa poderia ser uma solução. No entanto, voltamos a dizer: sendo disponível o bem jurídico, interessa principalmente ao seu titular decidir sobre sua proteção, não se podendo pensar em crime praticado por aquele que contou com a liberalidade desembaraçada do proprietário.
Finalmente, para que se possa pensar em consentimento do ofendido válido é necessário que ele preencha os requisitos gerais dos negócios jurídicos: a) capacidade; b) objeto lícito (não pode o titular dispor de bem sobre o qual recaia algum ônus que impeça a liberalidade, v.g., posse direta de terceiro); c) vontade livre (aqui é importante esclarecer que o ardil ou a coação utilizada pelo agente pode constituir novo crime, ao contrário de tornar o fato atípico, v.g., na hipótese apresentada continuará existindo o furto e a coação moral constituirá o crime de ameaça, ex vi do art. 147 do CP).
4. O CONSENTIMENTO DO OFENDIDO NO TRÁFICO DE PESSOAS
Os protocolos que deram ensejo à Convenção de Palermo deixam evidente que, no tráfico de pessoas, o consentimento livre do ofendido é causa excludente da tipicidade. Com isso, o consentimento o ofendido excluirá o próprio fato típico, não se chegando a discutir a ilicitude.
O Decreto n. 5.017, de 12.3.2004, promulga o Protocolo Adicional à Convenção das Unidas contra o Crime Organizado Transnacional Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianças, Seu art. 3º, dentre as definições, dispõe:
Para efeitos do presente Protocolo:
a) A expressão "tráfico de pessoas" significa o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração. A exploração incluirá, no mínimo, a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, escravatura ou práticas similares à escravatura, a servidão ou a remoção de órgãos;
b) O consentimento dado pela vítima de tráfico de pessoas tendo em vista qualquer tipo de exploração descrito na alínea a) do presente Artigo será considerado irrelevante se tiver sido utilizado qualquer um dos meios referidos na alínea a);
c) O recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de uma criança para fins de exploração serão considerados "tráfico de pessoas" mesmo que não envolvam nenhum dos meios referidos da alínea a) do presente Artigo;
d) O termo "criança" significa qualquer pessoa com idade inferior a dezoito anos.
O consentimento mediante fraude, de pessoa incapaz (criança, adolescente ou doente mental), coação ou violência será inválido. Veja-se que o pagar para quem detenha autoridade sobre a vítima, a fim de obter o consentimento, manterá a tipicidade do fato, ex vi da alínea “a”.
Revogado o art. 231-A do Código Penal, mas já na vigência da redação anterior, o TJDTFT decidiu:
Apelação Criminal 2008 01 1 118698-6 APR
Órgão
1ª Turma Criminal
Processo N.
Apelação Criminal 20080111186986APR
Apelante (s)
M. F. O. E OUTROS
Apelado (s)
M. P. D. F. E T.
Relatora
Desembargadora SANDRA DE SANTIS
Revisor
Desembargador MARIO MACHADO
Acórdão Nº
387.974
E M E N T A
APELAÇÃO CRIMINAL – RUFIANISMO – TRÁFICO INTERNO DE PESSOAS – INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA – PROVA ILÍCITA – PRORROGAÇÕES SUCESSIVAS – CERCEAMENTO DE DEFESA – INDEFERIMENTO DE PERGUNTAS – EXPLORAÇÃO DA PROSTITUIÇÃO ALHEIA – CONDENAÇÃO MANTIDA – CONSENTIMENTO VÁLIDO DAS VÍTIMAS – ATIPICIDADE DA CONDUTA.
I. A interceptação das comunicações telefônicas foi precedida de ordem judicial fundamentada e as renovações foram autorizadas em razão da necessidade da medida para fins de investigação criminal. Preliminar de ilicitude da prova rejeitada.
II. As perguntas formuladas pela defesa foram indeferidas pelo Juiz por não terem relação com a causa e por importarem em repetição de questionamentos já respondidos pela testemunha. Preliminar rejeitada.
III. Há provas suficientes de que a ré tirou proveito da prostituição alheia, razão pela qual a condenação por rufianismo deve ser mantida.
IV. O consentimento válido das supostas vítimas em submeterem-se à prostituição impede a tipificação do crime do artigo 231-A do Código Penal.[31]
Vê-se que o crime do art. 149-A terá a mesma ideia, no sentido de que o consentimento da pessoa vítima que seja válido, será causa excludente da tipicidade, não se falando em excludente supralegal da ilicitude.
5. ÚLTIMAS CONSIDERAÇÕES
Iniciamos a partir da noção de dignidade, visando a demonstrar que a maior preocupação com o tráfico de pessoas será com a dignidade, sendo que, para tanto, explicamos inicialmente a dignidade.
Aspectos históricos da prostituição foram enfrentados, evidenciando que ela nem sempre foi recriminada. Passamos, então, por sua origem vetusta, comentando suas fases da antiguidade, até que chegamos ao momento atual.
Apresentamos, então, as fases clássicas de tratamento da prostituição, quais sejam: ignorância; tolerância ou abolicionista; regulamentação; e proibição. O Brasil admite um sistema de tolerância sui generis em que a prostituição não será crime, mas participar da prostituição será crime.
Procuramos demonstrar que a escolha pela prostituição, normalmente, gera sofrimentos, razão de termos evidenciar dois casos de grande notoriedade: o de Gabriela Leite e o de Raquel Pacheco. Depois, en passant, passamos por casos concretos internacionais em que, de um lado se fala em sofrimento e, de outro, se alega que a prostituição não é ruim.
Trabalhamos com o lenocínio e o tráfico de pessoas, evidenciando a luta internacional para evitar tais práticas. A seguir, evidenciamos que o Estatuto de Roma já punia o tráfico de pessoas. Porém, como sua aplicação é subsidiária, ressaltamos a importância de se ter uma lei nacional para atender à vontade manifestada pela adesão à Convenção de Palermo.
Tratamos da evolução legislativa nacional para combate ao tráfico de pessoas, demonstrando que o lenocínio e o tráfico contra a organização do trabalho eram as condutas puníveis. Então, tratamos do processo legislativo que possibilitou a Lei n. 13.344/2016.
Foi desenvolvida a tese, no sentido de que o consentimento da vítima, nos delitos cujo objeto jurídico seja disponível, constitui causa excludente da ilicitude,[32] o que não pode ser admitido, embora seja praticamente pacífico tal entendimento na doutrina criminal pátria hodierna.
Defendemos o consentimento do ofendido como causa excludente da tipicidade, em desprestígio da alegação de que o consentimento será causa supralegal excludente da ilicitude. Então, passamos ao ponto central em que confirmamos a hipótese eleita, visto que os protocolos internacionais que deram ensejo à Convenção de Palermo consideram o consentimento do ofendido causa excludente de tipicidade.
REFERÊNCIAS
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BRASIL. TJDFT. 1ª Turma Criminal. Apelação Criminal 20080111186986. Relatora: Sandra de Santis. Disponível em: <http://tj-df.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/5757965/apr-apr-1186981520088070001-df-0118698-1520088070001/inteiro-teor-101952539>. Acesso em: 22.11.2016, às 1h26.
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TORRES, Hédel de Andrade. Tráfico de mulheres: exploração sexual: liberdade à venda. Brasília: Rossini Corrêa, 2012.





[1] SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. 20. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 267.
[2] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 4. ed. Coimbra: Almedina, 2000. p. 225.
[3] SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 25. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 105.
[4] MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 140.
[5] ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 111-114;
[6] SILVA, Virgílio Afonso da. Direitos fundamentais: conteúdo essencial, restrições e eficácia. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 200-202.
[7] HUNGRIA, Nelson. Comentários ao código penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1959. p. 267.
[8] NORONHA, Edgard de Magalhães. Direito penal. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 1974. 3. ed. p. 238-239.
[9] Ibidem. p. 239.
[10] Ibidem. p. 239-240.
[11] HUNGRIA, Nelson. Op. cit.. p. 276.
[12] LEITE, Gabriela. Filha, mãe, avó e puta: a história da mulher que decidiu ser puta. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009. passim.
[13] SURFISTINHA, Bruna. O doce veneno do escorpião. São Paulo: Panda Bookes, 2012.
[14] MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Uma linda mulher, só no cinema. Brasília: Estudos Jurídicos e Filosóficos, 14.3.2011. Disponível em: <http://sidiojunior.blogspot.com.br/2011/03/uma-linda-mulher-so-no-cinema.html>. Acesso em: 25.10.2016, às 2h.
[15] HATCHER, Marian. “Uma linda mulher” e a terrível verdade sobre a prostituição. 24.3.2015. Disponível em: <http://www.brasilpost.com.br/marian-hatcher/uma-linda-mulher-prostituicao_b_ 6933902.html>. Acesso em: 25.10.2016, às 2h10.
[16] BBC TRENDING. Prostitutas na Austrália postam “selfies” para mostrar a “outra face” da profissão. Disponível em: <http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/04/150403_prostitutas_selfie_ australia_pai>. Acesso em: 25.10.2016, às 2h29.
[17] SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. 20. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 486.
[18] TORRES, Hédel| de Andrade. Tráfico de mulheres: exploração sexual: liberdade à venda. Brasília: Rossini Corrêa, 2012. passim.
[19] CASTILHO, Ela Wiecko V. de. Tráfico de pessoas: da Convenção de Genebra ao Protocolo de Palermo. Disponível em: <http://pfdc.pgr.mpf.mp.br/atuacao-e-conteudos-de-apoio/publicacoes/ trafico-de-pessoas/artigo_trafico_de_pessoas.pdf>, Disponível em: 8.11.2016, às 2h05.
[20] Ibidem.
[21] Sobre esse assunto: JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano. O tribunal penal internacional: a internacionalização do direito penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. p. 160-174; e BERGSMO, Morten. O regime jurisdicional da corte internacional criminal. In CHOUKR, Fauzi Hassan; AMBOS, Kai (Coord.). Tribunal penal internacional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 221-244.
[22] JESUS, Damásio Evangelista de. Tráfico internacional de mulheres e crianças - Brasil: aspectos regionais e nacionais. São Paulo: Saraiva. 2003, p. 76.
[23] Por lealdade ao leitor, transcreve-se os dois artigos citados:
Art. 277. Excitar, favorecer, ou facilitar a prostituição de alguem para satisfazer desejos deshonestos ou paixões lascivas de outrem:
Pena – de prisão cellular por um a dous annos.
Paragrapho unico. Si este crime for commettido por ascendente em relação á descendente, por tutor, curador ou pessoa encarregada da educação ou guarda de algum menor com relação a este; pelo marido com relação á sua propria mulher:
Pena – de prisão cellular por dous a quatro annos.
Além desta pena, e da de interdicção em que incorrerão, se imporá mais:
Ao pae e mãe a perda de todos os direitos que a lei lhe concede sobre a pessoa e bens do descendente prostituido;
Ao tutor ou curador, a immediata destituição desse munus;
A’ pessoa encarregada da educação do menor, a privação do direito de ensinar, dirigir ou ter parte em qualquer estabelecimento de instrucção e educação;
Ao marido, a perda do poder marital, tendo logar a acção criminal, que prescreverá em tres mezes, por queixa contra elle dada sómente pela mulher.
Art. 278. Induzir mulheres, quer abusando de sua fraqueza ou miseria, quer constragendo-as por intimidações ou ameaças, a empregarem-se no tratico da prostituição; prestar-lhes, por conta propria ou de outrem, sob sua ou alheia responsabilidade, assistencia, habitação e auxilios para auferir, directa ou indirectamente, lucros desta especulação:
Penas – de prisão cellular por um a dous annos e multa de 500$ a 1:000$000.
[24] BRASIL. Câmara dos Deputados. CPI do Tráfico de Pessoas no Brasil. Arnaldo Jordy (Presidente) e Flávia Morais (Relatora). Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/comissoes/comissoes-temporarias/parlamentar-de-inquerito/54a-legislatura/cpi-trafico-de-pessoas-no-brasil/relatorio-final-aprovado-e-parecer-da-comissao/relatorio-final-aprovado-e-parecer-da-comissao>. Acesso em: 13.11.2016, às 9h56.
[25] BRASIL. Senado Federal. CPI do Tráfico de Pessoas no Brasil. Vanessa Grazziotin (Presidente) e Lídice da Mata (Relatora). Disponível em: <http://www.senado.gov.br/atividade/materia/ getPDF.asp?t=121034&tp=1>. Acesso em: 13.11.2016, às 10h11.
[26] MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. A Lei n. 11.106 e a Ação de Iniciativa Pública Secundária. Juiz de Fora: Universo Jurídico, ano XI, 28.8.2008. Disponível em: <http://uj.novaprolink.com.br/doutrina/5739/a_lei_n_11_106_e_a_acao_de_iniciativa_publica_secundaria_>. Acesso em: 14.11.2016, às 10h58.
[27] MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Breves comentários à Lei n. 12.015/2009. Teresina: Revista Jus Navigandi, ano 14, n. 2335, 22.11.2009. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/13362>. Acesso em: 14.11.2016, às 11h16.
[28] TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos de direito penal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1994. p. 215/216.
[29] CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. v. 1, p. 262-264.
[30] TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos de direito penal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1994. p. 172.
[31] BRASIL. TJDFT. 1ª Turma Criminal. Apelação Criminal 20080111186986. Relatora: Sandra de Santis. Disponível em: <http://tj-df.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/5757965/apr-apr-1186981520088070001-df-0118698-1520088070001/inteiro-teor-101952539>. Acesso em: 22.11.2016, às 1h26.
[32] TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos de direito penal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1994. p. 215/216.

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