quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Democracia e polícia preventiva.

Meu primo por afinidade, Rafael Jucá, um excelente amigo, me enviou um artigo interessante de autoria de Rizzato Nunes, intitulado A lei seca e o direito do cidadão-consumidor de se locomover (disponível em: http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI5502805-EI11353,00-A+lei+seca+e+o+direito+do+cidadaoconsumidor+de+se+locomover.html), sendo que o texto, em apertada síntese traz o seguinte: (a) desde os idos da década de 1970 que o sonho por democracia era latente nos brasileiros, mas - mesmo com os vanços e a Constituição Federal de 1988 - as práticas estatais guardam métodos ditatoriais; (b) as  barreiras policiais de trânsito violam o fundamental direito de ir e vir, sem maiores justificativas, até porque ter ingerido bebida alcoólica não é suficiente para caracterizar o delito de trânsito, sendo exigido estar sob a influência de alcóol; (c) as barreiras policiais de trânsito estão mais para a caracterização do crime de abuso de autoridade (Lei n. 4.898, de 9.12.1965, art. 3º, alíneas "a" e "i"); (d) as práticas policiais provocam profunda tristeza a quem tem mais de 36 anos de magistério jurídico.

Tenho me manifestado contra as novas leis criminais mais rigorosas, inclusive, entendo equivocada a Lei n. 11.705, de 19.6.2008, a denominada "lei seca", que alterou a Lei n. 9.503, de 23.9.1997, o nosso Código de Trânsito.

A crítica que faço ao texto do nobre docente articulista que citei está no fato de que a nova lei estabelece que é infração administrativa a direção de veiculo automotor sobre a influência de álcool ou qualquer outro psicotrópico, independentemente da quantidade de álcool ingerido (arts. 165 e 276).

A Constituição Federal se equivoca ao reduzir a segurança pública ao aparelho policial, mas ela distingue bem a polícia preventiva  (administrativa) da repressiva (judiciária), lembrando uma dicotomia do sistema francês, o qual - ressalte-se - não é o melhor.

As ações policiais preventivas (que visam a evitar a prática de crimes) são inerentes ao Estado e não podem ser consideradas, por si mesmas, caracterizadoras de atos de abuso de autoridade ou qualquer outra conduta que venha a violar direitos dos consumidores, até porque na relação de trânsito de veículos não há qualquer vínculo de consumo dos condutores e passageiros dos veículos automotores para com o Estado.

Um Estado despido de um poder de polícia não evidenciará a soberania necessária à sua caracterização como tal. Assim, em que pese assistir razão ao nobre docente articulista, no sentido de ser exigível a "influência" do psicotrópico para caracterização do delito (seja ele administrativo ou criminal), as barreiras policiais preventivas são legítimas, mesmo nas democracias garantistas.

Não confundamos democracia com ditadura da maioria. Lamentavelmente, ao se falar em democracia tem-se em vista a "regra da maioria", como se as minorias não pudessem ser legitimamente representadas e não detivessem direitos fundamentais. Porém, mesmo em democracias legítimas, em que se respeitem direitos fundamentais, tal qual o direito de ir e vir, não se pode prescindir de ações de polícia preventiva.

As práticas jurídicas dos tribunais, do Conselho Superior de Justiça, das Polícias, do Ministério Público e até mesmo das advocacias (pública e privada), bem como de todos os (sub)sistemas que cuidam das leis, geram profunda tristeza, o que não exigirá 36 anos de prática (a desilusão vem em prazo muito menor). Tal tristeza é tão profunda que a melhor palavra a ser utilizada - em liguagem estritamente jurídica - é nojo. Porém, as ações ações de polícia preventiva decorrem do ius imperii estatal. O exercício desse direito, ao lado dos outros 3 direitos dináticos básicos (ius gladii, ius majestatis e ius honorum), evidenciará a soberania, sem representar delito.

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