sábado, 7 de julho de 2018

Como é difícil defender a moralidade pública no Brasil: desejo apenas minimizar danos.

Eu, um garantista, sou contra a intervenção jurídico-criminal como regra. Prefiro a intervenção externa ao Direito Criminal, especialmente a partir da administrativa. Mas, parecem não gostarem disso.

Opinei pela atuação imediata para apuração de atos de improbidade afministrativa, mas cometi o erro de não mencionar um relatório de comissão sindicante, juridicamente inexistentes (tanto a comissão quanto o relatório, o que deu azo a devolverem os autos para que eu adequasse o meu parecer, o que ensejou a seguinte manifestação:



INTERESSADOS: FUB -FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
ASSUNTOS: INSTAURAÇÃO/INSTRUÇÃO/JULGAMENTO DE SINDICÂNCIA
(..)
EMENTA: SINDICÂNCIA. INDÍCIOS DE ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. COMUNICAÇÃO AO MPF. PARECER N. 318/2018/CONS/PFFUB/PGF/AGU REJEITADO. EMENDA. 1. A questão da improbidade, mencionada no parecer rejeitado, não está superada. 2. Quanto à (in)existência de relatório da comissão sindicante, a emenda se manifesta oportuna, mas a conclusão será a mesma.
Senhor Coordenador de Consultivo,
O procedimento veio a esta Procuradoria Federal junto à Fundação da Universidade de Brasília (PF/FUB) para subsidiar a decisão, especialmente sobre proposta da comissão sindicante para que houvesse remessa dos autos Câmara de Conciliação e Arbitragem da Administração Federal – CCAF/AGU. Então, proferi o PARECER n. (...), o qual foi rejeitado por essa coordenação e procedo à emenda, nos termos das considerações que se seguem.
2. Creio ter esclarecido quantum satis a inexistência de relatório conclusivo e é sobre ele que devo tratar. Ora, com todas as vênias possíveis, não há relatório. Na data da sua elaboração inexistia comissão sindicante, visto que a prorrogação de prazo sequer foi publicada. E, ainda que tivesse sido publicada, o relatório foi elaborado depois de transcorridos 30 dias da suposta prorrogação de prazo (vide item 12 do parecer rejeitado).
3. Não darei aqui uma aula sobre os planos de existência, validade e eficácia da norma jurídica porque aqui não sou um Professor, mas um jurista que se dirige juridicamente a outros setores da sociedade complexa. Ainda que eles não sejam jurídicos, deverão se esforçar para receber as informações como suas e, em um processo de autopoesis, legitimar tais informações pelo procedimento (ou de ação comunicativa que tenderá ao consenso). O fato é que, o que se pretende que eu faça a emenda para atender o que é juridicamente inexistente.
4. Não desenvolverei aqui uma tese, apenas emendando o que foi exposto para manter a posição externada de forma fundamentada. Para tanto, não me prenderei exclusivamente à literalidade das normas porque a interpretação gramatical é apenas o início do momento interpretativo, mas a interpretação não se esgota nele. Por isso, supero a literalidade e chamo a atenção para o fato de que estou me dirigindo a juristas e leigos em Direito. Quanto aos primeiros, a desnecessidade de esclarecimentos é presumida, enquanto aos demais, como é uma atividade de consultoria, apresento a presente emenda para complementar a fundamentação do parecer rejeitado, justificando-o.
5. Não vi o documento SEI n. 1585073, mas ele nada mudaria em minhas conclusões. A comissão sindicante informa que realizou trabalhos de forma exaustiva, mas eu, não fosse a praticamente certa inutilidade da proposição, sugeriria a instauração de processo administrativo disciplinar contra os seus membros (não o fiz porque se caminhar na direção que pretendem conduzir, o resultado será o arquivamento pela (de)mora administrativa. Com efeito, no ocaso da minha vida de servidor público em atividade, já estou cansado de quimeras.
6. Mandar o processo para a CCAF/AGU será intensificar a incidência do art. 169, § 2º, da Lei n. 8.112/1990. Pior, contra a atual Reitora da UnB/Presidente da FUB, eis que estará dando causa à prescrição, mas ela foi quem tentou fazer alguma coisa para apurar os fatos. Pior será transmitir a ideia de continuidade de impunidade, isso em tempos de “Lava Jato”.
7. Esclareci que a incidência da improbidade afastaria sanções menos graves, mas isso foi objeto de crítica, baseando-se essa coordenação na literalidade da lei. No entanto, sem pretender criar qualquer doutrina, afirmo com a unanimidade doutrinária (a unanimidade nem sempre será burra) é peremptória ao declarar que a interpretação gramatical é o primeiro momento interpretativo, mas a interpretação não se esgota nele.
8. A empresa contratada é autora de ação judicial e o Denatran e a FUB são litisconsortes passivos. Assim, seria forçada a interpretação do art. 18 do Decreto 7.392, de 13.12.2010, dentre as causas de incidência da competência da CCAF, eis que há uma empresa demandando 2 órgãos da administração pública, o que não evidencia necessariamente colidência entre tais órgãos. Ademais, estamos diante de processo disciplinar e não de solução de controvérsias entre órgãos públicos.
9. Dois órgãos devedores solidários, ante o caso vertente, não significará que a FUB será eleita como aquele que terá o dever de arcar inteiramente pelos danos. Assim, não entendo o porquê de se pretender, desde já, a conciliação, salvo se não for para procrastinar e gerar a prescrição da necessária responsabilidade administrativa: “dar nome aos bois”. A saída parece inteligente, mas irresponsável com o erário.[1]
10. Sempre me manifestei contra a intervenção jurídico-criminal, mas tenho plena consciência garantista de que a intervenção prévia, especialmente a administrativa, deve minimizar a pena por intermédio de soluções extra criminais.
11. Um processo tendente a apurar falta administrativa disciplinar, em face do princípio da congruência, deve ter solução disciplinar. No entanto, invertendo-se, para resolver responsabilidade civil judicializada em sede de sindicância disciplinar. Mas, protelar por poucos meses gerará a prescrição punitiva por fatos que contam com indícios de improbidade administrativa.
12. As “iniciativas” da FUB têm levado ao nada. Isso reforça o fundamento para que os fatos sejam levados ao controle externo (MPF e TCU) para que, responsabilizando particulares, evitem a indevida responsabilização da administração pública. Esta, enquanto denominada União ou FUB, não tem argumento plausível contra a cobrança judicial da empresa contratada. A única saída coerente é pensar no poder de regresso do Estado. Não se olvide, são quase 10 milhões de reais “jogados no lixo” e que estão onerando diariamente o Estado. Por que não se propõe retirar imediatamente tudo e vender ou doar para empresa de reciclagem?
13. A legalidade estrita não exige do servidor público cegueira aos fatos ou a “solução” legal alheia às consequências fáticas de eventual procrastinação jurídica, sem incidência de responsabilidades pessoais aos efetivos negligentes com o dever de probidade.
14. Tudo que posso dizer é que encaminhar o processo para qualquer outra solução jurídica diversa da responsabilidade civil por improbidade administrativa será dolosamente objetivar gerar dano à administração pública.
Ante o exposto, opino no sentido de devolver os autos ao GRE no sentido de imprimir todos os documentos (inclusive os dois pareceres) e encaminhar urgentemente ao Ministério Público Federal no Distrito Federal para providências, especialmente porque se aproxima prazo prescricional quinquenal. E, como a demissão só pode ser uma vez, ratifico a posição de que instaurar processo administrativo disciplinar será bis in idem ou tendência à impunidade.


[1] Carlos Maxiliano dizia que se apaixonar não é fundamentar. Mas, pergunto-me: como não me entusiasmar, em favor da Administração Pública, perante o caso vertente.

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