1.
ENTENDENDO A ADPF N. 378
A Constituição Federal, por meio da Emenda à
Constituição n. 3, de 17.3.1993, passou a dispor: “A arguição
de descumprimento de preceito fundamental, decorrente desta Constituição, será
apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma da lei”. Sua criação teve em
vista suprir a lacuna deixada pela Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI),
pois esta não pode ser proposta contra lei ou atos normativos anteriores à
Constituição Federal vigente.
A petição
inicial ADPF n. 378 foi protocolada no dia 3.12.2015[1][2]
e distribuída ao mais recente Ministro do STF, Edson Fachin, o qual determinou
a oitiva dos interessados, no prazo comum de 5 dias, e, em 8.12.2015, concedeu
liminar “acautelatória” do procedimento do impedimento[3]
da Presidente da República Dilma Roussef.
A petição
inicial se fez acompanhar de parecer dos Professores Juarez Tavares e Geraldo
Prado, dois notáveis juristas pátrios, que reclamam o respeito às garantias
constitucionais aos direitos fundamentais no processo de impedimento do(a)
Presidente da República, conforme consta da própria petição inicial.
2. DA MEDIDA CAUTELAR DETERMINADA
O inteiro
teor da decisão interlocutória proferida pelo Min. Edson Fachin, datada de
8.12.2015 e publicada em 10.12.2015, é o seguinte:
MEDIDA CAUTELAR NA ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE
PRECEITO FUNDAMENTAL 378 DISTRITO FEDERAL
RELATOR :MIN. EDSON FACHIN
REQTE.(S) :PARTIDO COMUNISTA DO BRASIL
ADV.(A/S) :ADEMAR BORGES DE SOUSA
FILHO E OUTRO(A/S)
INTDO.(A/S) :PRESIDENTE DA
REPÚBLICA
PROC.(A/S)(ES) :ADVOGADO-GERAL DA
UNIÃO
INTDO.(A/S) :CONGRESSO NACIONAL
PROC.(A/S)(ES) :ADVOGADO-GERAL DA
UNIÃO
DECISÃO MONOCRÁTICA:
Em 08/12/2015, o Partido requerente apresentou pedido de medida cautelar
incidental para que se anule a decisão de recebimento da denúncia pelo
Presidente da Câmara dos Deputados contra a Presidente da República e que,
assim, outra decisão seja proferida por ele com a devida observância do direito
de defesa prévia da Presidente da República.
Ainda em 08/12/2015, foi apresentado pelo requerente
segundo pedido de medida cautelar incidental para que, no momento de formação
da Comissão Especial da Câmara dos Deputados, a eleição de seus membros observe
a regra de indicação pelos partidos, por meio das lideranças partidárias,
através de voto aberto e que a composição da Comissão Especial se dê segundo a
representação proporcional dos partidos, e não dos blocos partidários.
Tendo em vista que, dos 03 (três) pedidos cautelares
incidentais, 02 (dois) deles dizem respeito aos mesmos pedidos cautelares
feitos anteriormente quando da proposição da Arguição de Descumprimento de
Preceito Fundamental 378, aguardem-se as informações e manifestações requeridas
no prazo comum de 05 (cinco) dias no Despacho proferido em 03/12/2015.
Dada
a urgência do feito e a relevância respectiva para que esta Corte chancele a
segurança jurídica constitucional ao procedimento, consigno que,
em respeito ao princípio da colegialidade, pedi ao Presidente do Supremo
Tribunal Federal, em 08/12/2015, dia para julgamento na primeira sessão
ordinária do Tribunal Pleno desta Corte após o decurso do prazo das informações
e manifestações das medidas cautelares requeridas. O prazo estabelecido no
Despacho proferido em 03/12/2015 expirará em 11/12/2015, sendo que a primeira
sessão ordinária subsequente do Tribunal Pleno desta Corte será em 16/12/2015.
Em relação ao pedido cautelar incidental que requereu a
suspensão da formação da Comissão Especial em decorrência da decisão da Presidência
da Câmara dos Deputados de constituí-la por meio de votação secreta,
verifica-se, na ausência de previsão constitucional ou legal, bem como à luz do
disposto no art. 188, inciso III, do Regimento Interno da Câmara dos Deputados,
a plausibilidade jurídica do pedido, bem como, ante a iminência da instauração
da Comissão Especial, o perigo de dano pela demora da concessão liminar
requerida.
É coerente e compatível com a Constituição da República
de 1988 procedimento regular que almeja, em face de imputação de crime de responsabilidade,
o respectivo impedimento de Presidente da República.
Emergindo dúvidas relevantes no curso do procedimento,
aptas a suscitar pronunciamento do Supremo Tribunal Federal, impende submeter o
processo ao crivo do exame constitucional diante do Tribunal Pleno.
Com o objetivo de (I) evitar a prática de atos que
eventualmente poderão ser invalidados pelo Supremo Tribunal Federal, (II)
obstar aumento de instabilidade jurídica com profusão de medidas judiciais posteriores
e pontuais, e (III) apresentar respostas céleres aos questionamentos
suscitados, impende promover, de imediato, debate e deliberação pelo Tribunal
Pleno, determinando, nesse curto interregno, a suspensão da formação e a não
instalação da Comissão Especial, bem como a suspensão dos eventuais prazos,
inclusive aqueles, em tese, em curso, preservando-se, ao menos até a decisão do
Supremo Tribunal Federal prevista para 16.12.2015, todos os atos até este
momento praticados.
Em caráter excepcional, com fulcro na Lei 9.882/1999,
art. 5º, §1º, se sustenta essa decisão monocrática, ad
referendum do Tribunal Pleno, por ser portadora de transitória
eficácia temporal de 08 (oito) dias, a contar de hoje, diante da magnitude do
procedimento em curso, da plausibilidade para o fim de reclamar legítima
atuação da Corte Constitucional e da difícil restituição ao estado anterior
caso prossigam afazeres que, arrostados pelos questionamentos, venham a ser
adequados constitucionalmente em moldes diversos.
Solicitem-se informações à Presidência da Câmara dos
Deputados, no prazo de 24 horas, contados da comunicação desta decisão, sobre a
forma de composição e eleição da referida Comissão Especial Comunique-se, com
a máxima urgência, inclusive via fax ou outro meio mais expedito,
o teor do presente despacho.
Publique-se. Intime-se.
Brasília, 08 de dezembro de 2015, 22h28min.
Ministro EDSON FACHIN
Relator
Documento
assinado digitalmente[4]
Causa
estranheza a distribuição aleatória ter sido feita àquele Ministro que ainda “não
pagou sua dívida” com o Partido dos Trabalhadores, aquele da Presidente da
República que o nomeou Ministro do STF, a primeira mulher a ser Presidente da
República e, possivelmente, a primeira a ser impedida a prosseguir com o seu
mandato.
O
interessante é que o prognóstico que se pode fazer da situação brasileira não é
bom. Desse modo, atrasar o andamento da ADPF n. 378 pode ser pior, pois a
popularidade da Presidente(a) da República tende a piorar. De qualquer modo, o
partido político que propôs a ação espera é que seja declarada nula a decisão
de início do processamento do impedimento da Presidente e que ele não reinicie.
3. PROCESSO E JULGAMENTO DA ADPF N. 378-DF
O processo,
juridicamente, é concebido como um conjunto de atos coordenados entre si,
tendentes à aplicação da lei material ao caso concreto. Ele não é um fim em si
mesmo, mas um instrumento finalístico, tem em si a finalidade de tornar
possível a aplicação da lei a determinado caso. No caso da ADPF n. 378-DF, o
PCdoB tinha em vista a tutela de direitos fundamentais da Presidente(a) da
República, sendo que inicio pela visão geral do julgamento, conforme
informativo do STF:
Por maioria, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF)
julgou parcialmente procedente a Arguição de Descumprimento de Preceito
Fundamental (ADPF) 378, que discute a validade de dispositivos da Lei
1.079/1950 que regulamentam o processo de impeachment de Presidente da República. Com o
julgamento, firmou-se o entendimento de que a Câmara dos Deputados apenas dá a
autorização para a abertura do processo de impeachment, cabendo ao
Senado fazer juízo inicial de instalação ou não do procedimento, quando a
votação se dará por maioria simples; a votação para escolha da comissão
especial na Câmara deve ser aberta, sendo ilegítimas as candidaturas avulsas de
deputados para sua composição; e o afastamento de Presidente da República
ocorre apenas se o Senado abrir o processo.
A corrente majoritária seguiu o voto do ministro Luís
Roberto Barroso, divergente do relator da ação, ministro Edson Fachin, que
rejeitava alguns dos principais pedidos feitos pelo Partido Comunista do Brasil
(PCdoB), autor da ADPF, como a necessidade de defesa prévia do Presidente da
República, a vedação ao voto secreto para a formação da comissão especial e a
possibilidade de o Senado rejeitar a instauração do processo.
Seguiram a divergência as ministras Rosa Weber e Cármen
Lúcia e os ministros Luiz Fux, Marco Aurélio, em menor extensão, e o Presidente, ministro Ricardo Lewandowski. O ministro Teori Zavascki divergiu do
voto do ministro Barroso apenas quanto à comissão especial, por entender
cabível o voto secreto. Com o relator, votaram os ministros Dias Toffoli e
Gilmar Mendes. O ministro Celso de Mello divergiu do relator em relação ao papel
do Senado. Para ele, não há qualquer relação de subordinação do Senado em
relação à Câmara.
Confira abaixo como votou cada ministro.
Ministro Teori Zavascki
O ministro Teori Zavascki acompanhou o voto do ministro
Barroso quantos ao rito a ser adotado para o procedimento do impeachment,
com exceção ao ponto em que Barroso considera ilegítimo o voto secreto para a
eleição da comissão especial.
Para Zavascki, a constituição de comissões deve observar
as regras regimentais das casas legislativas. O regimento interno da Câmara dos
Deputados, de acordo com o ministro, embora não faça menção específica a essa
comissão especial, distingue o procedimento em relação a atos deliberativos e
atos eletivos. A norma prevê, segundo Teori Zavascki, que em relação a atos deliberativos,
o voto deve ser aberto. No entanto, do que diz respeito aos atos eletivos, a
votação pode ser secreta. “Há uma escolha, uma indicação de quem vai deliberar.
Não vejo inconstitucionalidade na escolha secreta daqueles que vão deliberar. É
uma questão interna corporis, que
seria compatível com a Constituição Federal”, disse. Portanto, para o ministro
Teori, é legítima a votação por voto secreto para a escolha da comissão
especial.
O ministro votou pela adoção, na íntegra, dos
procedimentos realizados em 1992, no julgamento do ex-Presidente Fernando
Collor. “Na formulação de juízo sobre as questões da sua competência, o
Judiciário deve, em nome da segurança jurídica, observar a sua jurisprudência”,
frisou.
Quanto ao papel das casas legislativas, o ministro Teori
afirmou que cabe à Câmara dos Deputados, tanto em relação aos crimes de
responsabilidade, quanto em relação aos crimes comuns, apenas autorizar a
instauração do processo. O Senado, de acordo com o ministro, tem
discricionariedade para abrir ou não o processo, como o STF tem
discricionariedade para aceitar ou não denúncia. “Há uma perfeita sintonia fina
entre o que acontece em relação ao julgamento pelo Senado e pelo Supremo”.
Ministra Rosa Weber
Em seu voto, a ministra Rosa Weber divergiu em parte do
voto do relator, Edson Fachin. Ela defendeu que o juízo da Câmara dos Deputados
é de mera admissibilidade e autorização de um pedido de impeachment de Presidente da República. Dessa forma,
essa decisão não se vincula obrigatoriamente ao Senado Federal que, para a
ministra, tem a função de processar e o julgar. Outro ponto de discordância da
ministra é em relação ao voto secreto. Rosa Weber entendeu que o voto, em
matéria de pedido de impeachment do Presidente da República, deve ser
aberto em todas as etapas do processo. “Se a deliberação final há de ser em
voto aberto por força da própria Constituição, a constituição da comissão
especial, que seria acessório, não pode deixar de seguir a sorte do principal,
na mais absoluta transparência”. Assim Rosa Weber acompanhou integralmente a
divergência aberta pelo voto do ministro Luís Roberto Barroso.
Ministro Luiz Fux
O ministro Luiz Fux, em seu voto, também defendeu que o
rito de impeachment deve ser semelhante ao adotado em
1992, no caso do ex-Presidente Fernando Collor. Para ele, o Supremo Tribunal
Federal já tem jurisprudência nesse sentido e já estabeleceu um rito
procedimental, depois da Constituição de 1988. “Se já iniciado o processo
sugere-se um novo rito, só esse fato já viola a segurança jurídica”, afirmou o
ministro. Assim, Luiz Fux, foi contrário ao voto do relator em quatro pontos e
acompanhou a divergência aberta no voto do ministro Luís Roberto Barroso.
Com base no princípio da publicidade, direcionado pela
Constituição de 1988, o ministro Luiz Fux defendeu o voto aberto em julgamento
de pedido de impeachment do Presidente da República. Também entendeu que o Senado Federal pode ou não
instaurar o processo admitido pela Câmara. Sobre a formação da Comissão
Especial na Câmara dos Deputados, que já analisa o pedido de impeachment, Fux também
divergiu do voto do relator Edson Fachin. Para ele, os membros do colegiado
precisam ser indicados pelos líderes dos partidos, sem candidaturas avulsas.
Ainda sobre a comissão, o ministro defendeu que a indicação dos parlamentares
deve ser feita pelo voto aberto, o que invalida, nesse ponto, o procedimento já
adotado pela Câmara.
Ministro Dias Toffoli
O ministro Dias Toffoli acompanhou em seu voto o
entendimento do relator, ministro Edson Fachin, destacando seu posicionamento
em três pontos principais: o Senado não pode rejeitar o processamento doimpeachment aprovado na Câmara; a votação pode ser
secreta, uma vez que se trata de em votação eletiva – a escolha da comissão
especial – e é lícita a existência de candidaturas avulsas para a formação da
comissão.
Em relação às candidaturas avulsas, o ministro aprofundou
seu argumento, sustentando que um veto às candidaturas avulsas seria, além de
uma interferência indevida em matéria interna corporis, uma atitude contrária
ao princípio democrático. “Nós estaríamos tolhendo a representação popular,
tolhendo a soberania popular a mais não poder, porque qualquer um dos 513
deputados pode ser candidato”, afirmou.
Ministra Cármen Lúcia
A ministra Cármen Lúcia acompanhou a divergência
inaugurada pelo ministro Luís Roberto Barroso. “Sem responsabilidade não há
democracia, sem democracia não há justiça, sem justiça não há dignidade, menos
ainda cidadania”, afirmou, ao ressaltar que a questão é gravíssima para o
Brasil. A ministra baseou-se nos três pilares da dinâmica democrática estatal:
responsabilidade, legalidade e segurança jurídica. Ao votar, ela considerou
prudente seguir o que já foi aplicado pelo Supremo na análise do processo de impeachment do ex-Presidente Fernando Collor em
coerência com a Constituição Federal de 1988. A ministra Cármen Lúcia destacou
ainda o limite estrito de atuar “de tal maneira que a segurança jurídica não
fosse de qualquer forma tisnada” e salientou a juridicidade a ser assegurada no
processo, “a fim de que eventuais teorias não pudessem fazer sucumbir direitos
de minorias ou de maiorias”. Ela ressaltou que ao Senado Federal compete
processar “e, como competência não é faculdade, é dever, então ele tem que
processar para receber ou não a denúncia”.
Ministro Gilmar Mendes
Para o ministro Gilmar Mendes, o relator enfrentou todas
as questões suscitadas na ADPF “e deu a elas respostas plausíveis que vêm sendo
reconhecidas pela Corte”. Quanto ao papel da Câmara dos Deputados e do Senado
Federal, ele considerou que o relator apresentou solução adequada e respeitosa
para a convivência entre as duas casas. “Eu também compartilho da ideia de que
é necessário preservar a jurisprudência estabelecida no caso Collor e o roteiro
seguido com adaptações”, disse o ministro, ao ressaltar que “deve-se ter enorme
cuidado para não agravar uma situação que já está muito agravada”. Em relação
ao voto secreto e à candidatura avulsa, o ministro Gilmar Mendes também
acompanhou o voto do relator.
Ministro Marco Aurélio
O ministro Marco Aurélio aderiu em menor extensão à
divergência apresentada pelo ministro Luís Roberto Barroso. Segundo ele, nada
justifica a existência do voto secreto, portanto considerou que, no caso, a
votação tem que ser aberta. “Há de prevalecer sempre o interesse público,
princípio básico da administração pública, que direciona a publicidade e a
transparência, que viabiliza a busca de um outro predicado que é a eficiência”,
ressaltou.
O ministro Marco Aurélio afastou a candidatura avulsa, em
homenagem à existência dos partidos políticos. “Ante à ênfase dada pela Carta
aos partidos políticos, não há campo para ter-se candidatura avulsa, cuja
espontaneidade é de um subjetivismo maior”, destacou. De acordo com o ministro,
ao Senado cumpre julgar e também processar, portanto há possibilidade ou não
daquela casa legislativa concluir pelo arquivamento da acusação formalizada.
Sobre a defesa prévia, o ministro assentou que “a oportunidade ótima da audição
é aquela que antecede a instauração da acusação pelo Senado da República”. Em
seu entendimento o quórum para instauração no Senado deve ser qualificado em
dois terços dos membros.
Ministro Celso de Mello
O decano do STF seguiu majoritariamente o voto do
relator, à exceção da parte relativa ao papel do Senado Federal. Segundo o
ministro Celso de Mello, a Constituição de 1988 reduziu os poderes da Câmara
dos Deputados, que, no caso do impeachment, “se limita, a partir de uma
avaliação eminentemente discricionária, a conceder ou não a autorização” para a
abertura do processo. “Sem ela, o Senado não pode instaurar um processo de impeachment, mas, dada a
autorização, o Senado, que dispõe de tanta autonomia quanto a Câmara, não
ficará subordinado a uma deliberação que tem conteúdo meramente deliberativo”,
afirmou.
O ministro assinalou que as consequências da instauração
do processo são “radicais e graves”, devido ao afastamento de Presidente da
República, que pode acarretar problemas gravíssimos. Por isso, considera lícito
que o Senado tenha o mesmo juízo discricionário reconhecido à Câmara, ou seja,
a possibilidade de declarar improcedente a acusação e extinguir o processo.
Ministro Ricardo Lewandowski
Em seu voto, o Presidente da Corte, ministro Ricardo
Lewandowski, acompanhou a posição adotada pelo ministro Luís Roberto Barroso,
destacando três pontos do seu entendimento. Um foi a impossibilidade de voto
secreto que, para o ministro, tem hipóteses taxativas previstas na
Constituição, e a publicidade dos atos deve ser a regra, sendo necessário o
voto aberto no caso. Outro ponto foi a participação do Senado no processamento
do impeachment, hipótese
que, para o Presidente, é facultada pela Constituição Federal – ou seja, o
Senado não se vincula ao entendimento da Câmara pelo processamento do impeachment.
Quanto à questão da participação de representantes de
blocos na comissão especial, o Presidente entendeu que ela é possível, uma vez
que pela Constituição Federal tanto eles como os partidos podem formar a
comissão. Mas afastou em seu pronunciamento a tese da possibilidade de candidaturas
avulsas. “Afasto a possibilidade de candidaturas avulsas. O regime político que
adotamos é o da democracia representativa. E ela se faz mediante os partidos
políticos. Não há a menor possibilidade de candidaturas avulsas”. Ele assinalou
ainda que o processo de impeachment é
pedagógico, como instrumento para afastar maus governantes. “Se é algo para
melhorar a democracia, precisa ser transparente”, afirmou. “Não há nenhuma
razão para permitir que os representantes do povo possam de alguma forma atuar
nas sombras”.
Maioria simples
Ao final, os ministros decidiram por maioria que o juízo
de admissibilidade do pedido de impeachment por parte do Senado (que, uma
vez aceito, resulta no afastamento do Presidente da República) exige maioria
simples, com a presença da maioria absoluta. A condenação, porém, necessita de
maioria qualificada (dois terços dos membros). Prevaleceu, nesse ponto, o voto
do ministro Luís Roberto Barroso, no sentido de manter o entendimento do STF quando definiu o rito no
caso do impeachment de Fernando
Collor, em 1992. Ficaram vencidos os ministros Edson Fachin e Marco Aurélio.
Mérito
Por estar devidamente instruída a ADPF para
julgamento de mérito, tendo se manifestado nos autos todos os interessados e a
Procuradoria Geral da República, os ministros converteram a apreciação da
liminar em julgamento definitivo da ação.[5]
Destaco,
desde o início, que o voto que mais me convenceu foi o do Min. Dias Toffoli,
até porque assegurou o voto secreto para nomeação de comissões, o que é assunto
interna corporis, assunto sobre o
qual a jurisprudência do STF foi abandonada para invadir assuntos próprios de
um Poder constitucionalmente instituído para legislar e que criou o seu próprio
regimento interno.
Este,
Regimento Interno da Câmara dos Deputados, foi declarado inconstitucional?
Lamentável
que, “no tapetão”, o governo tenha conseguido reverter a nomeação da Câmara dos
Deputados. Ótimo que a decisão trará maior maturidade ao processo de natureza
político-jurídica. Embora a decisão seja casuística, sem fundamentação
jurídica, obriga estabelecer chapa única para escolha da comissão, a ser
escolhida por dirigentes dos partidos.
Não existe
razão para isso e se a Câmara dos Deputados alterar seu Regimento Interno para
inserir expressamente a escolha de Comissão Especial para decidir sobre o
impedimento da República, terá aplicação imediata e o STF terá que inventar
novas razões para a pífia posição, por maioria, vencedora.
No
16.12.2015, o STF iniciou o julgamento do Min. Edson Fachin, o qual, em apertada
síntese, sustentou:
EMENTA: DIREITO
CONSTITUCIONAL. REGIME DE RESPONSABILIDADE DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA. CRIMES DE
RESPONSABILIDADE. IMPEACHMENT.
EXIGÊNCIA DE LEI ESPECÍFICA. LEI 1.079/1950. FILTRAGEM CONSTITUCIONAL. DEVIDO
PROCESSO LEGAL. CONTRADITÓRIO E AMPLA
DEFESA. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DOS
REGIMENTOS INTERNOS DAS CASAS DO CONGRESSO. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. CÂMARA DOS
DEPUTADOS. DEFESA PRÉVIA AO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA PELO PRESIDENTE DA CÂMARA.
FORMAÇÃO E COMPOSIÇÃO DA COMISSÃO ESPECIAL NA CÂMARA DOS DEPUTADOS. AUTORIZAÇÃO
DA CÂMARA DOS DEPUTADOS PARA O PROCESSAMENTO E JULGAMENTO NO SENADO FEDERAL.
INSTAURAÇÃO DO PROCESSO NO SENADO. AFASTAMENTO DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA.
1. O impeachment integra, à luz da Constituição da República Federativa
do Brasil de 1988 e da Lei 1.079/1950, o rol de procedimentos presentes no
Estado Democrático de Direito, configurando-se em processo de índole dúplice,
de natureza jurídico-política para o fim de examinar a imputação e definir a
ocorrência ou não de crime de responsabilidade por parte de Presidente da
República, devendo o Supremo Tribunal Federal assegurar a realização plena do
procedimento nos estritos termos da lei e da Constituição.
2. O conteúdo do juízo exclusivamente
político no procedimento de impeachment é
imune à intervenção do Poder Judiciário, não sendo passível de ser reformado,
sindicado ou tisnado pelo Supremo Tribunal Federal, que não deve adentrar no
mérito da deliberação parlamentar.
3. Restringe-se a atuação judicial, na
hipótese, à garantia do devido ADPF 378 MC/DF processo legal. A forma do
procedimento de impeachment deve
observância aos direitos e garantias do acusado, especialmente aos princípios
da legalidade, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa,
previstos pela Constituição da República e pela Convenção Americana de Direitos
Humanos (Pacto de São José da Costa Rica).
4. Sendo a lei existente sobre a
matéria anterior à Constituição de 1988, e não tendo havido pelo Parlamento
edição de lei específica para o respectivo regramento, em termos procedimentais
e formais pode o Poder Judiciário à luz de filtragem constitucional examinar a
legislação pretérita iluminada por preceitos fundamentais previstos no Texto
Constitucional e na Convenção Americana de Direitos Humanos, em sede de Ação de
Descumprimento de Preceito Fundamental, a teor do inciso I, do parágrafo único,
do artigo 1º. da Lei 9.882/1999.
5. A atuação judicial pode, assim,
adequar, em tais limites e naqueles definidos pelos pedidos na presente ADPF, o
procedimento quando necessário à observância de regras e preceitos
constitucionais.
6. Deve-se adotar, na espécie, a
técnica da “interpretação conforme” ao artigo 38 da Lei 1.079/50, de maneira a
consignar que a única interpretação passível de guarida pela ordem constitucional
contemporânea se resume na seguinte assertiva: os Regimentos Internos da Câmara
dos Deputados e do Senado Federal somente possuem aplicação no rito do
impeachment naquilo que dizem respeito à auto-organização interna dos referidos
órgãos legislativos, mas não para a autorização, processamento e julgamento do impeachment.
7. Não há violação à reserva de lei
exigida pelo art. 85 da Constituição de 1988 na aplicação de regras dos
regimentos internos das Casas Legislativas, desde que não sirvam para
regulamentar a autorização, processamento e julgamento do impeachment.
8. Considerando que o recebimento
operado pelo Presidente da Câmara dos Deputados configura juízo sumário da
admissibilidade da denúncia para fins de deliberação colegiada, não há obrigatoriedade
de defesa prévia a essa decisão. Não se reconhece que a exigência de defesa
prévia ao recebimento da denúncia constitua derivação necessária da cláusula do
devido processo legal. Reconhecido o direito de manifestação anterior à
aprovação do primeiro parecer proferido pela Comissão Especial, há
contraditório prévio à admissibilidade conclusiva, o que é suficiente para
garantir o devido processo legal.
9. As causas de impedimento, suspeição
e outras limitações impostas aos magistrados, próprias do processo
jurisdicional, que visam à garantia de um juízo dotado da mais absoluta
imparcialidade, não se compatibilizam com o processo jurídico-político do impeachment.
10. No que diz respeito à formação e à
composição da Comissão Especial na Câmara dos Deputados, uma autêntica
filtragem constitucional da Lei 1.079/50 exige a equiparação normativa dos
blocos parlamentares aos partidos políticos, tanto quanto for possível, nas
circunstâncias passíveis de legítimo alvedrio por parte do Legislativo. Não cabe
ao Poder Judiciário tolher uma opção feita pela Câmara dos Deputados no
exercício de uma liberdade política que lhe é conferida pela ordem
constitucional, conforme art. 58, §1º, da Constituição da República de 1988.
11. Tendo em vista o disposto no art. 58
da Constituição da República de 1988 não há ofensa direta à normatividade
constitucional quando as instâncias competentes da referida casa legislativa
deliberaram em favor do modelo de votação fechada para a eleição da Comissão
Especial.
12. O direito ao contraditório e à
ampla defesa implica: (I) dar interpretação conforme ao art. 20, §2º da Lei
1.079/1950 a fim de firmar o entendimento de que antes da discussão em plenário
seja lida a manifestação do Presidente da República sobre o parecer preliminar
elaborado pela Comissão Especial; (II) declarar a recepção do art. 22, caput da Lei 1.079/50 para que, no caso
de o plenário decidir que a denúncia deve ser objeto de deliberação, o
Presidente da República deverá ser notificado para contestar a denúncia, indicando
meios de prova; (III) dar interpretação conforme ao art. 22, §3º a fim de
firmar o entendimento de que a oportunidade de contradizer o parecer final da
Comissão Especial configura meio inerente ao contraditório.
13. A indicação da tipicidade é pressuposto
da autorização de processamento, na medida de responsabilização do Presidente
da República nas hipóteses prévia e taxativamente estabelecidas.
14. Em relação ao art. 23, §1º, da Lei
1.079/50, deve-se dar interpretação conforme a Constituição vigente para
inferir que à expressão “decretada a acusação”, constante no art. 59, I, da
Constituição de 1946, deve ser dirigida uma interpretação evolutiva, à luz do
art. 51, I, da Constituição da República de 1988. Portanto, deve-se fixar
interpretação constitucional possível ao §1º do art. 23 da lei em comento, isto
é, o efeito lógico da procedência da denúncia na Câmara dos Deputados é a
autorização para processar o Presidente da República por crime de
responsabilidade. Dessa forma, declara-se a não recepção dos artigos 23, §5º;
80, caput, ab initio; e 81 da Lei 1.079/1950.
15. À luz do disposto no art. 58 da
Constituição da República, bem como do art. 24, caput, da Lei 1.079/1950, inexiste competência do Senado para
rejeitar a autorização expedida pela Câmara do s Deputados. O comando
constitucional é claro ao indicar, no art. 86, que “admitida a acusação contra
do Presidente da República, será ele submetido a julgamento”, não havendo
faculdade da Mesa do Senado pois, quando recebe a autorização, deve ela instaurar
o processo.[6]
A atuação
prévia, com concessão de medida cautelar, soou meio estranho, até porque foi
designado o dia 16.12.2015 para votação da cautelar e a tramitação na Câmara
dos Deputados não poderia ensejar nenhum constrangimento irreparável ou de
difícil reparação. Assim, o perigo da demora não estava presente, o que esvazia
a liminar de conteúdo.
Flávio Dino
de Castro e Costa requereu sua admissão no feito como “amigo da corte” (amici curiae), sustentando que o tema
interessa a toda federação e, portanto, aos Estados e Distrito Federal. Como
ele é governador do Estado do Maranhão, entendeu ser cabível como “amigo da
corte”. No entanto, o então relator, decidiu, em 15.12.2015, que, embora a Lei
n. 9.882, de 3.12.1999, não preveja a admissão de “amigo da corte” na ADPF,
reconheceu que aquele tribunal tem admitido o “amigo da corte” em tal espécie
de ação, isso por analogia ao art. 7º, § 2º, da Lei n. 9.868, de de 10.11.1999
(que dispões sobre o processo e o julgamento das ações direta de inconstitucionalidade
e declaratória de constitucionalidade, mas não seria cabível na hipótese porque
admite-se instituições e órgãos, negando-se a possibilidade às pessoas físicas,
especialmente quando a ação foi promovida pelo PCdoB, ao qual o requerente é
filiado e participa da sua Comissão Política Nacional. Ademais, o indeferimento
não gera prejuízo à parte, razão de sequer ser cabível recurso.
Nas redes
sociais, o Diretor do Departamento de Administração (Deadm) da Fundação
Nacional de Saúde, publicou uma série de manifestações de apoio ao Governo
Dilma, sendo que o contestei, especialmente, porque o apoio feito à
Presidente(a) da República, quando admitido o processo do seu impedimento, em
8.12.2015, a maioria dos Governadores das Unidades da Federação que a apoiaram
eram do Nordeste, sabidamente, a região do Brasil que mais apresenta problemas
de concentração de riquezas e piores níveis do IDH.
O julgamento
iniciou no dia 16.12.2015, sendo que o Min. Fachin apresentou um relatório
sucinto, mas que enumera 11 pedidos constantes da petição inicial. Tais
pedidos, a partir do relatório do Min. Fachin, [7] serão
apresentados adiante.
Será com a
análise dos principais aspectos do voto do Min. Luís Roberto Barroso, ao lado
da posição do relator e outras, que discorrerei rapidamente sobre a ADPF n.
378-DF para dizer que negar vigência ao Regimento Interno da Câmara dos
Deputados é um absurdo jurídico, especialmente porque o que houve, criação de
“chapa avulsa”, apenas ampliou o debate democrático.
No STF o
julgamento se encerrou no dia 17.12.2015, mas o Presidente, Min. Ricardo
Lewandowski deixou para proclamar o resultado na sessão extraordinária de
18.12.2015, a que encerrou o ano de atividades no STF.
Passo a transcrever
o que o STF entendeu do voto do Min. Luís Roberto Barroso:
Com o voto do ministro Luís Roberto Barroso, o Plenário
do Supremo Tribunal Federal (STF) retomou nesta quinta-feira (17) o julgamento
de liminar na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 378, na
qual se discute a validade de dispositivos da Lei 1.079/1950 que regulamentam o
processo de impeachment de
Presidente da República. Em seu entendimento, a Câmara dos Deputados apenas dá
a autorização para a abertura do processo de impeachment, cabendo ao
Senado fazer juízo inicial de instalação ou não do processo. O ministro entende
também que a votação para escolha da comissão especial na Câmara dos Deputados
deve ser aberta e que o afastamento do Presidente ocorre apenas se o Senado
abrir o processo.
O ministro destacou que o papel do STF no processo de impeachment deve ser o de árbitro, no sentido de
preservar a segurança jurídica e garantir o uso de normas claras, estáveis e
que estejam vigendo antes do início do jogo. Barroso destacou que seu voto foi
pautado pela jurisprudência do STF e pelos ritos adotados pelo Congresso, com a
chancela da Suprema Corte, durante o processo de impeachment o ex-Presidente Fernando Collor, em 1992.
O ministro Barroso salientou que a Lei 1.079/1950 foi
elaborada sob a vigência da Constituição de 1946, segundo a qual a Câmara
desempenhava papel de recebedora da denúncia, cabendo ao Senado apenas o
julgamento. Entretanto, observou, esse modelo foi alterado pela Constituição de
1988 que, em seu artigo 51, deu expressamente à Câmara competência unicamente para
autorizar, por dois terços de seus membros, a instauração de processo contra Presidente, cabendo ao Senado, segundo o artigo 86, processar e julgar em todas
as fases, inclusive quanto ao recebimento da denúncia.
De acordo com ele, quando a Constituição confere ao
Senado a tarefa de processar e julgar, esse papel envolve também o juízo
preliminar sobre o recebimento da denúncia. Para o ministro, a Câmara autoriza,
mas não pode determinar ao Senado a abertura do processo, pois isso
significaria submissão de uma das casas legislativas a outra. Lembrou ainda
que, no processo de impeachment do
ex-Presidente Fernando Collor, em 1992, esse foi o rito adotado.
O ministro destacou que o rito do impeachment definido pelo STF em 1992 estabeleceu a
necessidade de juízo prévio e, caso rejeitado o parecer da Câmara dos Deputados
autorizando a abertura do processo, a proposta seria arquivada. Aprovado o
parecer, a Presidência do Senado é transferida ao Presidente do STF e só neste
momento o Presidente da República é afastado do cargo.
“Quem olhar para a Constituição não verá nenhum momento
em que um órgão constitucional fique subordinado a outro. Eu penso que seria um
papel indigno de um órgão constitucional funcionar como carimbador de papéis
para dar execução à determinação da Câmara dos Deputados. Atos menos gravosos
que o afastamento de Presidente da República, como derrubada de veto, dependem
de pronunciamento das duas casas”, afirmou.
Voto aberto
No entendimento do ministro, a eleição da votação da
comissão especial da Câmara dos Deputados deve ser feita por voto aberto.
Segundo ele, embora os casos de votação secreta elencados na Constituição seja
absolutamente fechado, é possível que em um documento infraconstitucional
preveja voto secreto. Entretanto, observou, a Lei 1.079/1950, que regulamenta o
processo de impeachment, não prevê voto secreto para formar a comissão.
Destacou ainda que o regimento interno da Câmara, ao tratar da composição de
comissões, sejam elas temporárias ou permanentes, em nenhum momento menciona
votação secreta.
“O voto secreto foi instituído por uma deliberação
unipessoal e discricionária do Presidente da Câmara. Portanto, sem autorização
constitucional, sem autorização legal, sem autorização regimental. A vida em
democracia não funciona assim”, assinalou.
O ministro Barroso ressaltou que, além da impossibilidade
dogmática de se criar um procedimento sem previsão legal ou constitucional, em
um processo como o de impeachment, com grande impacto sobre a
legitimidade democrática, pois pode representar a destituição constitucional de
um Presidente da República, deve prestar a máxima reverência aos princípios
republicano, democrático, representativo e da transparência.
“Eu acho que o cidadão brasileiro tem o direito de saber
a postura de cada um de seus representantes. Esse não é um procedimento
interno, é um procedimento que tem que ser transparente para a sociedade
brasileira”, disse.
Rito na Câmara e no Senado
De acordo com o ministro Barroso, deve ser seguido o
mesmo rito adotado no processo de impeachment do ex-Presidente Collor. Em sua opinião, a
Lei 1.079/1950 não foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988 nesta
parte, pois o papel das casas legislativas foi significativamente alterado. Ele
considera que a Câmara dos Deputados deve se manifestar uma única vez, com
quórum de dois terços, e apenas sobre a autorização para a instauração do
processo.
Já o Senado, explica, deve se pronunciar em três
momentos. Inicialmente, pelo recebimento ou não da denúncia, por maioria
simples. Depois, também por maioria simples, deve se manifestar em relação à
pronúncia. Para a condenação, a votação deverá ter quórum qualificado, com a
aprovação de dois terços dos membros.
Candidaturas avulsas
No entendimento do ministro, as candidaturas avulsas para
a composição da comissão especial que analisará a admissibilidade do impeachment são ilegítimas. Segundo ele, a Lei
1.079/1950 estabelece participação proporcional dos partidos na comissão, dessa
forma, a escolha dos membros deve ser realizada pelos respectivos líderes, e
não pelo plenário da Câmara.
Observou ainda que a Constituição delega a
cada uma das casas legislativas a forma de composição das comissões, mantida a
proporcionalidade. Entretanto, o regimento interno da Câmara dos Deputados
estabelece que os integrantes da comissão devem ser indicados pelos líderes de
partidos.
Penso:
Como
escrever pouco sobre tudo isso?
Tentarei!
1º Pedido (a): seja realizada interpretação conforme à
Constituição do art. 19 da Lei n. 1.079/1950, para se fixar, com efeito ex tunc – abrangendo os processos em
andamento –, a interpretação segundo a qual o recebimento da denúncia referido
no dispositivo legal deve ser precedido de audiência prévia do acusado, no
prazo de quinze dias.
11º pedido (k): seja realizada interpretação conforme do
art. 19 da Lei 1.079/1950, com efeitos ex
tunc – alcançando processos em andamento –, para fixar a interpretação
segundo a qual o Presidente da Câmara dos Deputados apenas pode praticar o ato
de recebimento da acusação contra a Presidente da República se não incidir em
qualquer das hipóteses de impedimento ou suspeição, esta última objetivamente
aferível pela presença de conflito concreto de interesses.[8]
Dispõe o
preceito impugnado:
Art. 19. Recebida a denúncia, será lida
no expediente da sessão seguinte e despachada a uma comissão especial eleita,
da qual participem, observada a respectiva proporção, representantes de todos
os partidos para opinar sobre a mesma.
A
interpretação deste preceito não apresenta relevância jurídica e, no contexto
de uma medida cautelar, não tem relevância jurídica suficiente para se dizer
que há fumaça do bom direito capaz de ensejar a decisão liminar proferida. Com
efeito, embora eu não concorde, com a reforma legislativa de 2008, a
jurisprudência tem confirmado a validade dos procedimentos comuns ordinário e
sumário, constantes do Código de Processo Penal, nos quais o recebimento da
denúncia é anterior à manifestação do réu (art. 396), o que se aplica aos
procedimentos especiais, ex vi do
art. 394, § 4º do codex.
No processo
criminal em sentido estrito, a regra é o recebimento da denúncia ou da queixa
sem a oitiva prévia do acusado. Nos denominados “crimes de responsabilidade” da
Lei n. 1.079, de 10.4.1950, não existem propriamente crimes, não se submetendo
a um processo criminal imparcial, mas político-jurídico que não resultará
propriamente em uma pena, mas em uma sanção de impedimento ao exercício de
qualquer dos cargos que a lei enumera pelo prazo de 5 anos, período em que o
sentenciado ficará impedido de exercer qualquer função pública (Lei n.
1.079/1950, art. 68, parágrafo único). Aliás, a própria Constituição Federal
veda a prisão do(a) Presidente(a) da República, enquanto não sobrevier sentença
condenatória por crime comum (art. 86, § 3º). Portanto, em sendo a regra para o
mais severo (processo criminal), a do recebimento da denúncia sem manifestação
prévia do acusado, não há incompatibilidade do procedimento da Lei n.
1.079/1950 com o ordenamento jurídico pátrio.
Em matéria
criminal, a palavra denúncia, em
sentido estrito, é a petição inicial
elaborada por membro do Ministério Público. Na Lei n. 1.079/1950, a denúncia será firmada por qualquer
cidadão (arts. 14, 41 e 75), remontando seu sentido amplo, que decorre do verbo
latino denuntiare (anunciar,
declarar, avisar, citar), ou seja, comunicação que se faz em juízo. No processo
de impedimento da Presidente(a) da República, a petição inicial é apresentada à
Câmara dos Deputados (Lei n. 1.079/1950) e ali recebida sem a defesa prévia
do(a) acusado(a), ex vi do art. 19
transcrito.
2º Pedido (b): seja
declarada a ilegitimidade constitucional (não recepção) das expressões
“regimentos internos da Câmara dos Deputados e do Senado federal”, constantes
do art. 38 da Lei 1.079/1950.
Dispõe o artigo impugnado: “Art. 38. No processo e julgamento do
Presidente da República e dos Ministros de Estado, serão subsidiários desta
lei, naquilo em que lhes forem aplicáveis, assim os regimentos internos da
Câmara dos Deputados e do Senado Federal, como o Código de Processo Penal”.
Os regimentos internos dos tribunais
disciplinam procedimentos, o que não os tornam inconstitucionais, o que
evidentemente, não pode afastar os regimentos internos das Casas Legislativas
para o procedimento do impedimento.
Não se olvide que o cabimento de
embargos infringentes em ações criminais originárias no STF, cujas decisões não
sejam unânimes, decorrerão de previsão do regimento interno (art. 333, inc. I),
o que foi objeto de profunda discussão na Ação Criminal n. 470 (mensalão do PT), sendo que o STF, por
maioria, assentou entendimento de que o seu regimento deve prevalecer, tendo
como importante o denso voto do Min. Celso de Mello.[9]
Como sustentou
o Min. Dias Toffoli, o STF não poderia se imiscuir em assuntos interna corporis da Câmara dos Deputados.
Ora, o art. 17, inc. I, alínea “m”, do Regimento Interno da Câmara dos
Deputados (RICD) comete ao Presidente da Câmara “nomear Comissão Especial,
ouvido o Colégio de Líderes”. Na discordância, poderia ele optar pela chapa
avulsa?
Parece-me
que estender o aspecto democrático da discussão não pode tornar nula a escolha,
a ser declarada pelo Poder Judiciário, até porque a petição inicial não diz que
foi violado o Regimento Interno da Câmara dos Deputados, mas impugna a sua
aplicação ao procedimento de impedimento do(a) Presidente da República. Desse
modo, dizer que a nomeação de comissão especial deve ser por voto aberto, data venia, é, no mínimo, extra petita.
Diversamente,
o Min. Luís Roberto Barrroso, não admite a inserção de “chapa avulsa” sob o
seguinte fundamento:
4. NÃO É POSSÍVEL A APRESENTAÇÃO DE CANDIDATURAS OU CHAPAS AVULSAS
PARA FORMAÇÃO DA COMISSÃO ESPECIAL (CAUTELAR INCIDENTAL): É incompatível com o
art. 58 e § 1º da Constituição que os representantes dos partidos políticos ou
blocos parlamentares deixem de ser indicados pelos líderes, na forma do
Regimento Interno da Câmara dos Deputados, para serem escolhidos de fora para
dentro, pelo Plenário, em violação à autonomia partidária.
A construção
do STF foi desproporcional porque a Constituição Federal, em seu art. 58, dispõe:
“§ 1º Na constituição das Mesas e de cada Comissão, é assegurada, tanto quanto
possível, a representação proporcional dos partidos ou dos blocos parlamentares
que participam da respectiva Casa”. Há aí alguma vedação à chapa avulsa
indicada pelos partidos?
A resposta é
negativa, mas o STF inventou para invadir assuntos interna corporis.
Não se
olvide que os arts. 85-86 da Constituição Federal não tratam de serem as
sessões públicas ou secretas quando das nomeações de comissões na Câmara dos
Deputados. Desse modo, não parece cabível o entendimento que permite que o
Poder Judiciário faça uma drástica intromissão nos assuntos internos do Poder
Legislativo.
3º pedido (c): seja declarada a recepção dos artigos 19,
20, 21, 22 e 23, caput, da Lei
1.079/1950, afastando-se a interpretação segundo a qual o art. 218 do Regimento
Interno da Câmara dos Deputados substitui o procedimento previsto nos referidos
preceitos legais.
4º pedido (d): seja realizada interpretação conforme a
Constituição do art. 19 da Lei 1.079/1950, afastando-se a interpretação segundo
a qual a formação da comissão especial deve se dar com representantes dos
blocos parlamentares no lugar de representantes dos partidos políticos.
5º pedido (e): seja
realizada interpretação conforme dos artigos 18, § 1º, 22, 27, 28 e 29 da Lei
1.079/1950, para se fixar a interpretação segundo a qual toda a atividade
probatória deve ser desenvolvida em primeiro lugar pela acusação e por último
pela defesa.
6º pedido (f): seja realizada interpretação conforme do §
1º do art. 22 e dos artigos 28 e 29, todos da Lei 1.079/1950, para se fixar a interpretação
segundo a qual, em cada fase processual – perante a Câmara Federal e perante o
Senado Federal –, a manifestação do acusado, pessoalmente ou por seus
representantes legais, seja o último ato de instrução.
7º pedido (g): seja
realizada interpretação conforme a Constituição do artigo 24 da Lei 1.079 para
se fixar a interpretação segundo a qual o processo de impeachment, autorizado pela Câmara, pode ou não ser instaurado no
Senado, cabendo a decisão de instaurá-lo ou não à respectiva Mesa, aplicando-se
analogicamente o disposto no artigo 44 da própria Lei 1.079/1950, não sendo tal
decisão passível de recurso.
8º pedido (h): seja realizada interpretação conforme a
Constituição do artigo 24 da Lei 1.079/1950 para se fixar a interpretação
segundo a qual a decisão da mesa do Senado pela instauração do processo deve
ser submetida ao Plenário da Casa, aplicando-se, por analogia, os artigos 45,
46, 48 e 49 da própria Lei 1.079/1950, exigindo-se, para se confirmar a
instauração do processo, a decisão de 2/3 dos senadores.
9º pedido (i): seja declarada a ilegitimidade
constitucional – não recepção – dos §§ 1º e 5º do art. 23, e dos artigos 80 e
81 da Lei 1.079/1950.
10º pedido (j): seja realizada interpretação conforme dos
artigos 25, 26, 27, 28, 29 e 30 da Lei 1.079/1950, para se fixar a
interpretação segundo a qual os Senadores só devem realizar diligências ou a
produção de provas de modo residual e complementar às partes, sem assumir, para
si, a função acusatória.
Agrupei os
pedidos porque entendo que a abordagem não pode ser separada, até porque o Min.
Luís Roberto Barroso os reuniu parte deles, conforme se pode ver no início do
voto, quando abriu a divergência:
II. MÉRITO: PONTOS DE DIVERGÊNCIA COM O RELATOR 1. PAPEIS DA
CÂMARA DOS DEPUTADOS E DO SENADO FEDERAL NO PROCESSO DE IMPEACHMENT (ITENS “C”,
“G”, “H” E “I”):
1.1. Apresentada denúncia contra o Presidente da República por
crime de responsabilidade, compete à Câmara dos Deputados autorizar a
instauração de processo (art. 51, I, da CF/1988). A Câmara exerce, assim, um
juízo eminentemente político sobre os fatos narrados, que constitui condição
para o prosseguimento denúncia. Ao Senado compete, privativamente, “processar e
julgar” o Presidente (art. 52, I), locução que abrange a realização de um juízo
inicial de instauração ou não do processo, isto é, de recebimento ou não da
denúncia autorizada pela Câmara.
1.2. Há três ordens de argumentos que justificam esse
entendimento. Em primeiro lugar, esta é a única interpretação possível à luz da
Constituição de 1988, por qualquer enfoque que se dê: literal, histórico, lógico
ou sistemático. Em segundo lugar, é a interpretação que foi adotada pelo
Supremo Tribunal Federal em 1992, quando atuou no impeachment do então Presidente Fernando Collor de Mello, de modo
que a segurança jurídica reforça a sua reiteração pela Corte na presente ADPF.
E, em terceiro e último lugar, trata -se de entendimento que, mesmo não tendo
sido proferido pelo STF com força vinculante e erga omnes, foi, em alguma medida, incorporado à ordem jurídica
brasileira. Dessa forma, modificá-lo, estando em curso denúncia contra a
Presidente da República, representaria uma violação ainda mais grave à
segurança jurídica, que afetaria a própria exigência democrática de definição
prévia das regras do jogo político.
1.3. Partindo das premissas acima, depreende-se que não foram
recepcionados pela CF/1988 os arts. 23, §§ 1º e 5º; 80, 1ª parte (que define a
Câmara dos Deputados como tribunal de pronúncia); e 81, todos da Lei n.
1.079/1950, porque incompatíveis com os arts. 51, I; 52, I; e 86, § 1º, II,
todos da CF/1988.
Não obstante
a notoriedade jurídica do Min. Luís Roberto Barroso, entendo que a sua posição
é completamente dissonante do que estabelece a Constituição Federal. Com
efeito, houve a declaração de não recepção de dispositivos que nada tem a ver
com o momento procedimental do impedimento da Presidente da República que se
materializa, eis que a Constituição Federal dispõe:
Art. 51. Compete privativamente à Câmara dos
Deputados:
I - autorizar, por dois
terços de seus membros, a instauração de processo contra o Presidente e o
Vice-Presidente da República e os Ministros de Estado;
II -
proceder à tomada de contas do Presidente da República, quando não apresentadas
ao Congresso Nacional dentro de sessenta dias após a abertura da sessão
legislativa;
Ao contrário
de respeitar o sistema constitucional, a posição vencedora, esposada pelo Min.
Luís Roberto Barroso, negou eficácia ao art. 51, inc. III, da Constituição
Federal, pois dar vigência a preceito de lei que não contraria a Constituição
Federal, emanado do Poder Legislativo é um absurdo.
Parece que o
voto vencedor foi proferido sem se atentar para procedimento semelhante, em
duas fases, que é o dos crimes dolosos contra a vida, procedimento especial que
consta do Código de Processo penal, a partir do art. 406. Nele consta uma parte
do iudicio acusationis e outra do iudicio causae. Embora o tribunal
popular seja o competente para decidir, julgar, os crimes dolosos contra a
vida, o Juízo de pronúncia será o singular. Desse modo, a decisão proferida na
ADPF n. 378 está em descompasso com o sistema normativo pátrio e com a própria
jurisprudência, que pacificamente acolhe, ao exemplo do consagrado pela Lei n.
1.079/1950, um procedimento em duas fases, em que o juízo da causa sucederá ao
de pronúncia.
Na Lei n.
1.079/1950, o procedimento é bicameral, tendo o RICD estabelecido, como regra,
que as comissões, desde a Mesa, são nomeadas por voto secreto. Veda-se o
escrutínio secreto, nos termos do art. 188, apenas na fase de decisão sobre a
instauração do processo, não na fase de nomeação da comissão que decidirá sobre
a remessa dos autos ao Senado Federal, in
verbis: “IV – autorização para instauração de processo, nas infrações
penais comuns ou nos crimes de responsabilidade, contra o Presidente e o
Vice-Presidente da República e os Ministros de Estado”.
O preceito
impugnado no terceiro pedido tem a seguinte redação: “Art. 218. É
permitido a qualquer cidadão denunciar à Câmara dos Deputados o Presidente da
República, o Vice-Presidente da República ou Ministro de Estado por crime de
responsabilidade”. Ele não altera o que está nos arts. 19-23 da Lei n. 1079/1950.
Tais artigos
da lei estabelecem a formação da comissão especial e o acolhimento ou rejeição
da petição inicial pela Câmara dos Deputados, com a participação de todos os
partidos, mediante votação nominal. Isso é processo ou procedimento?
Na esteira
do que venho sustentando, o Regimento Interno da Câmara pode ter prevalência,
sendo que os argumentos vencedores não me convenceram, mas na dicção do exposto
pelo Min. Luís Roberto Barroso, a vontade normativa é a da transparência e,
portanto, o voto deve ser aberto, sem a possibilidade de “chapa avulsa”, ou
seja, os membros da comissão especial serão indicados pelos partidos em votação
aberta.[10]
Sobre esse
pedido, embora o tendo o Min. Luís Roberto Barroso tenha discutido o 3º pedido
em conjunto com outros pedidos, o destacou em item seguinte, expondo:
2. RITO DO
IMPEACHMENT NA CÂMARA (ITEM “C”):
2.1. O rito do impeachment
perante a Câmara, previsto na Lei n. 1.079/1950, partia do pressuposto de que a
tal Casa caberia, nos termos da CF/1946, pronunciar-se sobre o mérito da
acusação.
Estabeleciam-se, em virtude disso, duas deliberações pelo Plenário
da Câmara: a primeira quanto à admissibilidade da denúncia e a segunda quanto à
sua procedência ou não. Havia, entre elas, exigência de dilação probatória.
2.2 Essa sistemática foi, em parte, revogada pela Constituição de
1988, que, conforme indicado acima, alterou o papel institucional da Câmara no impeachment do Presidente da República.
Conforme indicado pelo STF e efetivamente seguido no caso Collor, o Plenário da
Câmara deve deliberar uma única vez, por maioria qualificada de seus integrantes,
sem necessitar, porém desincumbir-se de grande ônus probatório. Afinal, compete
a esta Casa Legislativa apenas autorizar ou não a instauração do processo (condição
de procedibilidade).
2.3. A ampla defesa do acusado no rito da Câmara dos Deputados
deve ser exercida no prazo de dez sessões (RI/CD, art. 218, § 4º), tal como
ocorreu no caso Collor (MS 21.564, Rel. para o acórdão Min. Carlos Velloso).
Caso assim não se entenda, deve ser aplicado por analogia o prazo de 20 (vinte)
dias previsto no art. 22 da Lei n. 1.079/1950.
Destaque-se
que a Constituição Federal de 1946 foi a melhor da nossa história. Não obstante
a Constituição Federal vigente ser a que trouxe o maior rol de direitos
fundamentais, é simbólica. Aliás, sobre o assunto, na minha tese de
doutoramento, informei que quanto mais analítica, mais a Constituição tende a
ser simbólica.[11]
Modificar o
escrutínio, aberto ou secreto, não modificará probidade do procedimento porque,
espera-se os representantes do povo serão probos. Ademais, não há previsão
constitucional ou legal de escrutínio aberto para a nomeação de comissão.
Assim, o que houve foi invenção de tribunal, legislando sem ter poderes para
tal. No entanto, o Min. Luís Roberto Barroso sustentou:
5. A VOTAÇÃO PARA FORMAÇÃO DA COMISSÃO ESPECIAL SOMENTE PODE SE
DAR POR VOTO ABERTO (CAUTELAR INCIDENTAL):
No processo de impeachment,
as votações devem ser abertas, de modo a permitir maior transparência, accountability e legitimação. No
silêncio da Constituição, da Lei n. 1.079/1950 e do Regimento Interno sobre a
forma de votação, não é admissível que o Presidente da Câmara dos Deputados possa,
por decisão unipessoal e discricionária, estender hipótese inespecífica de
votação secreta prevista no RI/CD, por analogia, à eleição para a Comissão
Especial de impeachment. Além disso,
o sigilo do escrutínio é incompatívelcom a natureza e a gravidade do processo
por crime de responsabilidade. Em processo de tamanha magnitude, que pode levar
o Presidente a ser afastado e perder o mandato, é preciso garantir o maior grau
de transparência e publicidade possível. Nesse caso, não é possível invocar
como justificativa para o voto secreto a necessidade de garantir a liberdade e
independência dos congressistas, afastando a possibilidade de ingerências
indevidas. Se a votação secreta pode ser capaz de afastar determinadas pressões,
ao mesmo tempo, ela enfraquece a possibilidade de controle popular sobre os
representantes, em violação aos princípios democrático, representativo e republicano.
Por fim, a votação aberta (simbólica) foi adotada para a composição da Comissão
Especial no processo de impeachment de
Collor, de modo que a manutenção do mesmo rito seguido em 1992 contribui para a
segurança jurídica e a previsibilidade do procedimento.
O voto
invocou um caso concreto como se fosse jurisprudência, quando é sabido que a
jurisprudência é o costume do tribunal, o que contraria a sua posição. Mais,
ainda, se reconhece que o RICD prescreve o escrutínio secreto para nomeação de
comissão, portanto, não poderia lhe negar vigência.
Quanto ao
procedimento, em 10 sessões, nada há a obstar o que se expôs, até porque
respeita ao procedimento anteriormente aplicado, não existindo razões para
modificá-lo, isso sem alteração legislativa.
O art. 19,
que o PCdoB pediu para prevalecer, não regulamenta o procedimento. Ele regula a
matéria dispondo que os “representantes de todos os partidos para opinar sobre
a mesma”. Isso, em princípio, não foi violado, eis que, no caso concreto, o
Presidente da Câmara procurou fazer valer a maior democracia e, no conflito
interno dos partidos, provocou a deliberação sobre qual chapa seria melhor para
deliberar sobre a composição da Comissão Especial, o que está regulamentado no
RICD, assunto interna corporis no
qual o STF não poderia ter se imiscuído.
No 4º
pedido, novamente volta a discussão interna
corporis que não exigirá maiores explicações porque já foi explicitado quantum satis e não pretendo tornar este
texto exageradamente longo.
Sou a favor
de que a defesa se manifeste depois da acusação, eis que a ampla defesa é
constitucional. No entanto, temos procedimentos criminais que não respeitam
isso, v.g., Lei n. 11.343, de 23.8.2006,
e não declarados inconstitucionais pelo STF, inexistindo, portanto, razão para se
pretender que a oitiva do acusado se dê depois da instrução probatória, até
porque ele se confirmará ao final, quando o(a) processo(a) terá chance para se
manifestar, razão de dizer que os pedidos 5º e 6º não encontram amparo na
jurisprudência do STF.
Novamente
invadindo assuntos interna corporis
da Câmara dos Deputados, maculando a atuação do Poder Legislativo por interveniência
inoportuna do Poder Judiciário, o Min. Luís Roberto Barroso sustentou:
3. RITO DO IMPEACHMENT NO SENADO (ITENS “G” E “H”):
3.1. Por outro lado, há de se estender o rito relativamente
abreviado da Lei n. 1.079/1950 para julgamento do impeachment pelo Senado, incorporando-se a ele uma etapa inicial de
instauração ou não do processo, bem como uma etapa de pronúncia ou não do
denunciado, tal como se fez em 1992. Estas são etapas essenciais ao exercício,
pleno e pautado pelo devido processo legal, da competência do Senado de
“processar e julgar” o Presidente da República.
3.2. Diante da ausência de regras específicas acerca dessas etapas
iniciais do rito no Senado, deve-se seguir a mesma solução jurídica encontrada
pelo STF no caso Collor, qual seja, aplicação das regras da Lei n. 1.079/1950
relativas a denúncias por crime de responsabilidade contra Ministros do STF ou
contra o PGR (também processados e julgados exclusivamente pelo Senado).
3.3.Conclui-se, assim, que a instauração do processo pelo Senado
se dá por deliberação da maioria simples de seus membros, a partir de parecer
elaborado por Comissão Especial, sendo improcedentes as pretensões do autor da
ADPF de (I) possibilitar à própria Mesa do Senado, por decisão irrecorrível,
rejeitar sumariamente a denúncia; e (II) aplicar o quórum de 2/3, exigível para
o julgamento final pela Casa Legislativa, a esta etapa inicial do
processamento.
Não há que
se discordar do entendimento exposto porque a recepção no Senado, certamente,
parará por uma nova admissibilidade que permitirá, em face da sua autonomia,
rejeitar a acusação. É como se fosse a instituição de um segundo grau de
jurisdição complementar, isso porque adotado um sistema bicameral para o
procedimento, em nada dissonante com o sistema democrático adotado pela nossa
Constituição Federal.
No Senado da
República poderão ser realizadas diligências complementares e sua sessão de
julgamento será aberta, com votos nominais dos Senadores, exigindo 2/3 dos
votos para declaração do impedimento do(a) Presidente(a) da República. É o
mesmo quorum que se exige para o
processamento na Câmara e etapa inicial no Senado.
Passarei às
minhas conclusões, convergindo e divergindo das posições do STF para expor que
efetivamente não estivemos diante de um julgamento jurídico adequado.
4. CONCLUSÃO
No item 5 do
seu voto, o Min. Luís Roberto Barroso admite a aplicação subsidiária dos
regimentos internos da Câmara dos Deputados e do Senado da República, mas negou,
em seu voto a aplicação do RICD para nomeação de comissão, o que constitui contraditio in terminis.
Estabeleceu
o interrogatório como último ato, o que concordo porque, não havendo prejuízo,
não poderá ensejar nulidade. Aliás, é o que proponho para os processos da lei antidrogas (Lei n. 11.343, de 23.8.2006),
mas não encontra eco nas mentes dos juízes.
Ao final,
ficou claro:
(1) concessão
parcial das cautelares requeridas pelo autor;
(2) denegação,
de modo a afirmar que não há direito à defesa prévia ao ato do Presidente da
Câmara;
(3) interpretação
conforme a Constituição do art. 38 da Lei n. 1.079/1950, que é possível a
aplicação subsidiária dos Regimentos Internos da Câmara e do Senado ao processo
de impeachment, desde sejam
compatíveis com os preceitos legais e constitucionais pertinentes;
(4) declarar
recepcionados pela CF/88 os arts. 19, 20 e 21 da Lei n. 1.079/1950, interpretados
conforme a Constituição, para que se entenda que as “diligências” e atividades
ali previstas não se destinam a provar a (im)procedência da acusação, mas
apenas a esclarecer a denúncia, e para declarar não recepcionados pela CF/88 os
arts. 22, caput, 2ª parte [que se inicia com a expressão “No caso
contrário...”], e §§ 1º, 2º, 3º e 4º, da Lei nº 1.079/1950, que determinam
dilação probatória e segunda deliberação na Câmara dos Deputados, partindo do
pressuposto que caberia a tal casa pronunciar-se sobre o mérito da acusação;
(5) denegação,
por reconhecer que a proporcionalidade na formação da comissão especial pode
ser aferida em relação aos partidos e blocos partidários;
(6) estabelecer
que a defesa tem o direito de se manifestar após a acusação;
(7) estabelecer
que o interrogatório deve ser o ato final da instrução probatória;
(8) dar
interpretação conforme a Constituição ao art. 24 da Lei 1.079/1950, a fim de
declarar que, com o advento da CF/88, o recebimento da denúncia no processo de impeachment ocorre apenas após a decisão
do Plenário do Senado Federal, em votação nominal tomada por maioria simples e presente
a maioria absoluta de seus membros;
(9) declarar
constitucionalmente legitima a aplicação analógica dos arts. 44, 45, 46, 47, 48
e 49 da Lei n. 1.079/1950 – os quais determinam o rito do processo de impeachment contra Ministros do STF e
PGR – ao processamento no Senado Federal de crime de responsabilidade contra
Presidente da República, denegando-se o pedido de aplicação do quórum de 2/3 do
Plenário do Senado para confirmar a instauração do processo;
(10) declarar
que não foram recepcionados pela CF/88 os arts. 23, §§ 1º e 5º; 80, 1ª parte; e
81, todos da Lei n. 1.079/1950, porque estabelecem os papeis da Câmara e do
Senado Federalde modo incompatível com os arts. 51, I; 52, I; e 86, § 1º, II,
da CF/1988;
(11) afirmar
que os Senadores não precisam se apartar da função acusatória;
(12) reconhecer
a impossibilidade de aplicação subsidiária das hipóteses de impedimento e
suspeição do CPP relativamente ao Presidente da Câmara dos Deputados;
Cautelar
Incidental:
(13) não é
possível a formação da comissão especial a partir de candidaturas avulsas;
(14) a
eleição da comissão especial somente pode se dar por voto aberto.
Pelas razões
expostas, considero temerária a atuação do STF. Ele legislou para invadir a seara
interna corporis do Poder Legislativo,
especialmente da Câmara dos Deputados, sendo que a sua “interpretação conforme”
dada à Lei n. 1.079/1950, não diverge do possível, mas, ratifico, não deve o
STF legislar sob o manto de interpretar.
[1] BICUDO, Hélio Pereira; PASCHOAL, Janaína
Conceição. Petição inicial da ADPF n. 378, datada de 31.8.2015. Disponível em:
<http://famildf.com.br/files/Peticao_Inicial__Helio_Bicudo.pdf>.
Acesso em: 20.12.2015, às 11h48.
[2] SOUZA NETO, Cláudio Pereira de; BORGES,
Ademar. Petição inicial da ADPF n. 378. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/adpf378.pdf>.
Acesso em: 20.12.2015, às 6h03.
[3] Concordo com Habermas, no sentido de que o
consenso só será possível por meio de uma identificação que se dá especialmente
por meio da fé e da língua. Portanto, a palavra inglesa impeachment, que significa impedimento
ou impugnação, será evitada neste
artigo, até porque defendo a tradição como consuetudo ou desuetudo,
respectivamente, capaz de consolidar ou revogar normas. Com isso, não posso ser
plenamente contrário ao estrangeirismo, mas o evito.
[4] BRASIL. STF. Disponível em: <http://stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?numero=
378&classe=ADPF&origem=AP&recurso=0&tipoJulgamento=M>.
Acesso em: 18.12.2015, às 12h30. Ali consta: documento assinado
digitalmente conforme MP n. 2.200-2/2001 de 24.8.2001, que institui a
Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser
acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob
o número 9973547.
[5] BRASIL.
STF. Redação. STF reafirma rito aplicado ao processo de impeachment de Fernando Collor.
17.12.2015. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=
306614>. Acesso em: 19.12.2015, às 16h.
[6] BRASIL. STF. ADP n. 378-DF. Rel. Edson
Fachin. Disponível em: <http://stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=4899156>. Acesso em: 18.12.2015, às
22h.
[7] BRASIL. STF. Pleno. ADPF n. 378-DF. Min.
Edson Fachin. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADPF378relator.pdf>.
[8] BRASIL. STF. Pleno. ADPF n. 378-DF. Min.
Edson Fachin. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADPF378relator.pdf>.
[9] STV. Pleno. AP n. 470. Pleno. Voto do Min.
Celso de Mello. Disponível em: <http://
www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/AP_470__EMBARGOS_INFRINGENTES.pdf>.
Acesso em: 20.12.2015, às 5h41.
[10] Rapidamente o PT ajustou para que o Deputado
Federal Leonardo Picciani retornasse à liderança do partido na Câmara, visando
a construir uma comissão de aliados que rejeitem a petição inicial. Isso
evidencia que ninguém busca uma comissão imparcial, mas, ao contrário, que
atenda aos seus interesses. A posição governamental sobre o retorno do líder
está em: <http://radioagencianacional.ebc.com.br/politica/audio/2015-12/leonardo-picciani-retorna-lideranca-do-pmdb>.
Acesso em: 20.12.2015, às 6h53.
[11] MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Funcionalismo e garantismo en la defensa de
los derechos fundamentales em el processo criminal. Buenos Aires: UNLZ,
tese defendida em 28.4.2015.
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