Estou lutando para tentar adequar o fundamento legal do dispositivo de uma sentença à sua motivação, mas isso não será fácil porque poderá criar riscos aos Juízes e tribunais que determinarem ou mantiverem prisões provisórias em descompasso com as provas dos autos, portanto, sem os requisitos legais.
Não foi conhecido o pedido para declaração da ilegalidade da prisão e conhecido, mas improvido, o pedido para mudar o fundamento legal da absolvição.
A luta continua porque exerceremos a ampla defesa com todos os recursos a ela inerentes. Segue o texto que serviu de base, foi quase o que está abaixo que eu disse à 2ª Turma Criminal do TJDFT:
Processo
n. 2016.02.1.004409-9 (0018185-52.2016.8.07.0003)
Excelentíssima Juíza desse
egrégio Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, Maria Ivatônia,
MD.ª Relatora da apelação apregoada;
é com todo respeito, Senhor
Presidente dessa colenda 2ª Turma Criminal, Exm.º Desembargador de Justiça Jair
Soares, que inverto a ordem de cumprimentos, haja vista que se trata da única
mulher nessa veneranda Turma Criminal, isso em tempos em que testemunhamos a
luta por igualdade de gêneros;
Exmo. Desembargador de Justiça
Roberval Belinati, um magistrado reconhecido pelo forte aspecto humanitário e
uma fé inabalável em Deus. Também, um notável Professor;
Exm.º Sr. Desembargador de
Justiça Silvânio Barbosa dos Santos, um Professor, ainda que afastado
temporariamente, um grande Professor Universitário;
Exm.º Desembargador de Justiça
João Timóteo de Oliveira;
e
Exm.ª Sr.ª Procuradora de
Justiça Consuelita Valadares Coelho, Md.ª Representante do Ministério Público
do Distrito Federal e Territórios;
Colenda Turma, nestes autos o
Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, em contrarrazões e em seu
parecer, opina pelo conhecimento integral, de todos os fundamentos do recurso,
e pelo seu improvimento.
JEFERSON RAMOS BARBOSA
BEZERRA, em 12.9.2016, tinha 18 anos, 3 meses e 1 dia. Naquele
dia 12.9.2016 ele foi preso e se iniciou um processo kafikiano, em que aquele
rapaz, ora apelante, não podia entender o porquê de não ser solto.
O
apelante estava sendo assistido por um Advogado constituído quando uma aluna me
pediu para continuar gratuitamente porque o pai do apelante não tinha condições
financeiras de honrar o compromisso assumido com o causídico.
Colenda
turma criminal, no dia 12.9.2016, às 19h, Marciana retornava do trabalho a pé,
quando uma motocicleta de cor escura (azul ou preta) parou perto dela uma
motocicleta e o rapaz desceu da garupa e lhe roubou um telefone, vales
transportes e pouco dinheiro. Enquanto isso, o apelante fechava a borracharia
em que era empregado, isso juntamente com o seu patrão.
O
Advogado anterior impetrou habeas corpus
e a ordem requerida, já com sustentação oral feita por mim, foi denegada. E, em
6.12.2016, foi realizada audiência de instrução (que era para ser de instrução
e julgamento). Após a oitiva das testemunhas, as partes não requereram
diligências e eu estava pronto para alegações finais orais, mas o Juízo,
alegando atraso, determinou a apresentação por memoriais.
Estava
provada a inocência do réu, então pensei nas características da prisão
cautelar, especialmente, a provisoriedade, a revogabilidade, a urgência e a
fungibilidade. Pensei então no porquê da resistência de mandar soltar o réu ou
de substituir a medida cautelar por outra medida alternativa da prisão prevista
no art. 319 do Código de Processo Penal.
Veneranda
Turma, Enrico Ferri já afirmava que seria bom que os Juízes criminais fossem
especializados nessa matéria. A Constituição Federal é compatível com essa
ideia ao delimitar a jurisdição, dividindo-a em competências. Cria até justiças
especializadas para matéria criminal, a eleitoral (arts. 118-121) e a militar
(art. 124).
A
prisão cautelar foi fixada nos autos do processo de conhecimento, não em
processo autônomo. Assim, é sobre um vício do processo, de uma prisão de natureza
processual criminal, que se requer a análise dessa colenda turma.
Nenhum
pedido cível é aqui feito. Se houvesse condenação, existiriam efeito civis
automáticos. Caso da decisão de Vossas Excelências possam decorrer eventuais
efeitos civis, estes não serão aqui discutidos, pois, sabemos, essa respeitável
turma não é competente para julgar eventual pedido de reparação de danos.
Assim, não há como pretender afastar a competência dessa veneranda turma para
julgamento de uma apelação que versa sobre vício do processo criminal, que foi
a manutenção de uma medida cautelar, mesmo depois de cessado o indício de
autoria que a autorizasse.
Nenhuma
outra prova seria produzida, preclara relatora. Então, por que manter aquela
prisão?
Senhora
Relatora e Senhores Desembargadores, se negar a conhecer do presente pleito
será negar ao apelante o princípio da inafastabilidade do Poder Judiciário
(Constituição Federal, art. 5º, inc. XXXV), a ampla defesa, com todos recursos
a ela inerentes (art. 5º, inc. LV, da Carta Magna) e o devido processo legal
(art. 5º, inc. LIV, da Constituição Federal).
O
fundamento legal para tratar das nulidades na apelação, quando ocorrerem após
as alegações finais se extrai da dicção do art. 571 do Código de Processo Penal.
Não nos olvidemos que no procedimento dos crimes dolosos contra a vida, as
nulidades havidas após a pronúncia serão arguidas em plenário e as deste
deverão constar de ata e poderão ser objeto de apelação. E, no caso que ora se
examina, a soltura consta da sentença absolutória, ocultando o vício de ter a
prisão ilegal se mantido injustificadamente entre a audiência de instrução (e
que deveria ser de instrução e julgamento) e a absolvição, isso por 37 dias.
Não podemos esquecer que o art. 3º do Código de Processo Penal admite a
analogia e ainda que não estivesse implícito no art. 571 mencionado, o vício da
cautelar se equivale a uma nulidade gravíssima, um vício equivalente ao
cerceamento de defesa.
Por
isso, com todo respeito que essa veneranda turma merece, eventual remessa da
discussão ao juízo cível constituirá, negativa de prestação jurisdicional
perante o juízo próprio, o criminal, eis que estamos diante de um processo
criminal em que a prisão, por força dele, se concretizou.
Mudando
de fundamento a ser discutido, quanto à incoerência de dizer que as provas eram
insuficientes para a condenação... não gosto de ler textos durante a sustentação
oral e não quero cansar Vossas Excelências, até porque distribui memoriais e
deles consta uma parte da sentença, bem como conta das razões da apelação, mas
peço vênia para ler um pequeno trecho da sentença absolutória:
...Marciana
"reconheceu com precisão o réu como sendo um dos autores do roubo de seu
celular, bem como reconheceu a motocicleta que estava em seu poder, como sendo
aquela utilizada no roubo cometido contra a sua pessoa" Todavia, não consta dos autos o termo de
reconhecimento com a descrição das características que levaram a vítima a
chegar a tal conclusão. Somado a isso, a
testemunha de Defesa, Antônio Carlos, confirmou que o acusado não estava no
local do crime, haja vista que após iniciarem o fechamento da borracharia em
que trabalham, por volta das 18h45, e encerrá-lo aproximadamente às 19h10, o
réu logo adentrou no estabelecimento comercial vizinho, de propriedade da
testemunha Josimar, que disse que o acusado lá permaneceu, mexendo no seu
celular, só tendo saído para lanchar, por volta das 20h, oportunidade em que se
deslocou a pé. (grifei)
Vê-se,
pois, que é imperiosa a modificação do fundamento legal da absolvição, do art.
386, inc. VII, do CPP para, conforme fundamentos da própria sentença, art. 386,
inc. IV, do Código de Processo Penal.
Volto
ao fundamento da prisão ilegal, dizendo algo que consta das razões de apelação
e o MPDFT não contestou nas suas contrarrazões:
-
ao pedir para o juízo criminal de Brazlândia ao menos decidir sobre a
liberdade, o Juiz reafirmou que estava atrasado e disse: “doutor só são mais 5
dias!”
Essa
afirmação consta das razões da apelação, familiares do acusado e os alunos que
me acompanhavam ouviram, e o MPDFT não contestou em suas contrarrazões.
Tentei
minimizar o mal que era imposto ao apelante, mas no dia 19.12.2016, estive no
fórum de Brazlândia e não consegui falar com o Juiz.
O
apelante ficou preso até 12.1.2017!
Penso
no sofrimento do apelante e dos seus familiares pela sua ausência nas festas
natalinas. Pior ainda... é notório e prescinde de provas, a virada do ano 2016
para o 2017 foi de rebeliões em presídios que se iniciaram em Roraima e Manaus
e chegaram a Natal. Rumores alardeavam a sua extensão para todo território
nacional... milhares poderiam morrer, inclusive um inocente, o apelante.
Faço
aqui um aparte para dizer que estou aqui buscando o bem de um negro pobre, o
faço gratuitamente porque acredito que o bem pode ajudar a melhorar essa
sociedade que, parafraseando o cacique do cachimbo da paz, ... “Essa tribo é violenta
demais”.
Em
face de todo o exposto, requeiro que entre a data da audiência de instrução,
6.12.2016, e a data da efetiva soltura, 12.1.2017, seja declarada a ilegalidade
da prisão cautelar. E, com espeque no que está expresso na sentença recorrida,
a modificação do fundamento legal da absolvição.
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