SIDIO ROSA DE
MESQUITA JÚNIOR
ANÁLISE CRÍTICA
DO DIREITO CRIMINAL:
teoria geral do Direito Criminal, teoria da norma
jurídico-criminal, teoria do crime e teoria da pena
Volume 1
BRASÍLIA
2022
ÍNDICE
____________________
Abreviaturas e siglas
Nota do autor
Introdução
1.
Introdução,
1.1 Divisão da obra em volumes,
1.2 O código penal vigente,
1.3 Como o assunto será tratado,
1.4
Motivação do autor,
2.
Noções preliminares,
2.1 Proposta de estudo,
2.2 O porquê do estudo filosófico,
2.2.1 Objeto de estudo da jusfilosofia,
2.2.2 Graus do conhecimento, conceito e autonomia
do DCrim,
2.2.3 A localização de topoi e o problema
das classificações,
2.3 Relações do DCrim,
2.4 Denominação,
2.5 História do DCrim e a sua relação com a
filosofia,
2.5.1 Generalidades,
2.5.2 Ideias e instituições criminais,
2.5.2.1 Significado de ideias e instituições
criminais,
2.5.2.2 Fase da vingança,
2.5.2.3 Lei de talião e a pena de morte,
2.5.2.4 Composição,
2.5.2.5 Códigos escritos,
2.5.2.6 Povos antigos
2.5.2.6 Direito da igreja
2.5.2.7 Período humanitário,
2.5.2.8 Período criminológico,
2.5.3 Escolas criminais,
2.5.3.1 Escola clássica,
2.5.3.2 Escola positiva,
2.5.3.3 Funcionalismo,
2.5.3.4 Formação multidisciplinar do direito e o
funcionalismo criminal: teorias do discurso,
2.5.4 DCrim no Brasil,
2.5.4.1 Das ordenações do reino ao código penal
vigente,
2.5.4.2 Lei das contravenções penais e distinção
entre crime e contravenção,
2.6 Sanção criminal e outras sanções,
2.7 Fontes do direito criminal,
2.7.1 Fontes materiais,
2.7.2 Fontes formais,
2.7.2.1 Imediatas,
2.7.2.2 Mediatas,
2.8 Posição enciclopédica,
2.9 Outras classificações,
2.10 Caracteres do dcrim,
2.11 DCrim, Penalogia, Política Criminal,
Vitimologia e Criminologia,
2.11.1 Objeto de estudo de cada ciência,
2.11.2 Conceituando a criminologia,
2.11.3 Autonomia da criminologia,
2.11.4 Método de estudo da criminologia,
2.11.5 Criminologia clássica (ou positiva?),
2.11.6 Vertentes hodiernas,
2.11.6.1 Contextualizando a criminologia e dentre
os movimentos que tendem ao combate da criminalidade,
2.11.3.2 As denominadas escolas criminológicas,
2.11.3.3 Criminologia crítica e abolicionismo,
minimalismo e maximização do DCrim,
3.
Lei criminal e outras regras gerais,
3.1 Objetivos deste capítulo,
3.2 Conceito e espécies de normas criminais,
3.2.1 Conceito e elementos mínimos,
3.2.2 Classificação,
3.3 Hermenêutica e interpretação da norma
criminal,
3.3.1 Distinção entre hermenêutica e
interpretação,
3.3.2 Escola da exegese,
3.3.3 Escola histórico-evolutiva e direito livre,
3.3.4 Métodos de interpretação,
3.4 Lei criminal no tempo,
3.4.1 Princípios da legalidade e da reserva legal,
3.4.2 O garantismo e o direito criminal funcionalista,
3.4.3 Bases do garantismo,
3.4.4 Congruência das teorias: funcionalismo e
garantismo,
3.4.5 Criação, extinção e repristinação da norma
criminal,
3.4.6 Tipo (elementos e espécies) e norma
criminal em branco,
3.4.7 Princípio da anterioridade,
3.4.8 Princípio da irretroatividade,
3.4.9 Retroatividade benéfica da lei criminal,
3.4.10 Ultra-atividade da lei criminal,
3.4.11 O fenômeno da ultra-atividade e
retroatividade da lei ao mesmo tempo (lex
tertia),
3.4.12 Tempo do crime,
3.5 Lei criminal no espaço,
3.5.1 Princípio da territorialidade,
3.5.1.1 Sentido do princípio,
3.5.1.2 O princípio da territorialidade ante a
corte internacional criminal,
3.5.2 Da extraterritorialidade,
3.5.3 Lugar do crime,
3.6 A norma criminal quanto às pessoas,
3.6.1. Distinção entre imunidade e prerrogativa
de foro,
3.6.2 Imunidades,
3.6.2.1 Espécies básicas,
3.6.2.2 Imunidade absoluta,
3.6.2.3 Imunidade relativa,
3.7 Pena cumprida no estrangeiro,
3.8 Sentença estrangeira,
3.9 Contagem do prazo,
3.10 Legislação especial,
4.
Teoria do injusto criminal: parte objetiva do delito,
4.1 Introdução,
4.2 O crime: conceitos,
4.2.1 Conceitos formal e material de crime,
4.2.1.1 Funcionalismo criminal e imputação
objetiva,
4.2.1.2 Conceitos formal e material propriamente
ditos,
4.2.2 Conceito analítico ou operacional de crime,
4.2.2.1 Conceitos quadripartido(e) e
tripartido(e),
4.2.2.2 Conceitos bipartidos(es),
4.3 Fato típico,
4.3.1 Conduta,
4.3.1.1 Teorias,
4.3.1.2 Injustos comissivo, omissivo e comissivo
por omissão,
4.3.3.3 O dolo e a negligência como elementos da
conduta (incluindo o conceito e as espécies de perigo),
4.3.4 Relação de causalidade, uma das principais
problemáticas do delito,
4.3.4.1 Limites do art. 13 do CP,
4.3.4.2 Teorias de maior prestígio,
4.3.4.3 Aplicação das teorias e posição dominante
na doutrina pátria (até o advento da teoria da imputação objetiva),
4.3.4.4 A minha posição, em face da legislação
brasileira,
4.3.4.5 Causalidade na omissão,
a. Crimes omissivos impróprios são
(in)constitucionais,
b. Poder-dever de agir,
c. Tentativa de crime omissivo impróprio,
4.4.4.6 Ponderações acerca da inserção da relação
de causalidade na lei,
4.4.4.7
A imputação objetiva segundo Chaves Camargo,
4.4.4.8 Exemplos que demonstram a inadequação da
imputação objetiva,
4.3.5 Resultado,
4.3.5.1 Espécies de resultado e classificação dos
delitos segundo seus resultados (material ou de dano, formal ou de perigo e de
mera conduta),
4.3.5.2 O iter criminis,
4.3.5.3 Consumação e tentativa,
4.3.6 Tipicidade,
4.3.6.1 Generalidades,
4.3.6.2 Retorno aos elementos e espécies de tipo,
4.3.6.3 Problemas decorrentes da adoção da
adequação social,
4.3.6.5 Tipicidade conglobante,
4.3.6.6 Princípio da insignificância,
4.3.6.7 Modificação e realização do resultado,
4.3.7 Últimas considerações acerca do fato típico,
4.3.7.1 Atribuição objetiva do resultado,
4.3.7.2 Política criminal – primeira parte:
crimes complexos e crimes conexos e os princípios da subsidiariedade, da
consunção e da alternatividade,
4.3.7.3 Política criminal – segunda parte:
tentativa, desistência voluntária, arrependimento eficaz e arrependimento
posterior,
4.3.7.4 Política criminal – terceira parte: crime
impossível,
4.3.7.5 Delitos: doloso, negligente,
preterintencional e qualificado pelo resultado,
4.3.7.6 Erro de tipo,
4.3.7.7 Erro determinado por terceiro,
4.3.7.8 Erro sobre a pessoa,
4.4 ILICITUDE
4.4.1 Denominação (antijuridicidade, ilicitude ou
injusto?) e relação com o fato típico,
4.4.2 Ilicitude objetiva e ilicitude subjetiva,
4.4.3 Ilicitude formal e ilicitude material,
4.4.4 Excludentes da ilicitude,
4.4.4.1 Generalidades,
4.4.4.2 A ilicitude e o princípio da adequação
social,
4.4.4.3 Consentimento da vítima,
4.4.4.5 Excludentes legais,
A. Generalidades,
B. Estado de necessidade,
C. Legítima defesa,
D. Estrito cumprimento do dever legal,
4.4.4.7 Excesso negligente ou doloso,
ABREVIATURAS E SIGLAS
_________________________________
CADE – Conselho Administrativo de Defesa
Econômica
CC – Código Civil
CF – Constituição Federal
CP – Código Penal
CPP – Código de Processo Penal
DCrim – Direito Criminal
DProc – Direito Processual
DAdm – Direito Administrativo
DConst – Direito Constitucional
DCiv – Direito Civil
DExecCrim – Direito de Execução Criminal
EC – Emenda à Constituição
LICPCPP – Lei de Introd. ao Código Penal e ao
Código de Processo Penal
LEP – Lei de Execução Penal
PG/CP – Parte Geral do Código Penal
SINIC – Sistema Nacional de Identificação Criminal
STJ – Superior Tribunal de Justiça
STF – Supremo Tribunal Federal
TACrim – Tribunal de Alçada Criminal
TJDFT – Tribunal de Justiça do Distrito Federal e
Territórios
v.g. –
verbi gratia
NOTA DO AUTOR
_________________________
O presente livro volta-se ao público acadêmico em
geral. É uma obra que pretende merecer o status de análise propedêutica
e doutrinária do Direito Criminal pátrio, mas sem esgotar todos os assuntos que
o Direito Criminal aborda, uma vez que, até em um tratado, é impossível
enfrentar todos os temas que o exame científico da norma criminal viabiliza.
Não obstante isso, o objetivo é desenvolver uma análise mais aprofundada e
crítica do DCrim.
O livro irá além do Código Penal (CP), não sendo
apenas uma abordagem momentânea da legislação vigente. Apresenta um conteúdo
atualizado e crítico das posições consolidadas e que estão emergindo acerca do
Direito Criminal (DCrim), mas com razoável enfoque jusfilosófico, base do
discurso jurídico na atualidade.
Restringir o DCrim às normas que constituem seu
objeto de estudo é equivocado. Pior seria restringi-lo à legislação criminal,
uma vez que o conceito de norma jurídica é mais amplo que o conceito de lei. É
por essa razão que o estudo estará permeado de análises que induzirão o leitor
a perceber que o cientista do Direito não pode resolver todas as questões que
lhe são apresentadas. A maioria dos problemas jurídico-criminais ensejam
discussões que tem soluções metajurídicas.
Este livro conterá análises mais aprofundadas no
primeiro volume, que versará inicialmente sobre a propedêutica processual, onde
a preocupação maior será a de apresentar o conceito e a evolução histórica do
DCrim. Outrossim, uma das maiores preocupações dos 3 primeiros capítulos será
contextualizar o DCrim, esclarecendo três pontos principais:
Ø é necessário empregar terminologias adequadas e
se esclarecer o conceito de cada palavra utilizada, evitando-se cair discussões
vazias, pois, conforme Heidegger nos ensinou, é necessário que se tenha
definições claras do “ente”, do “ser” e “do fenômeno”, a fim de evitar
confusões que tornam equivocados os estudos e, consequentemente as conclusões.[1]
Ele dizia que o pensamento e o discurso residem e se movem na linguagem.[2]
Assim, é mister o rigor terminológico e o emprego de palavras adequadas ao
estudo científico que se desenvolve;
Ø a questão da legitimidade, para parte da
jusfilosofia, é anterior ao Direito. Todavia, ninguém duvida que é melhor que a
norma seja legítima, o que enseja a análise, já no Cap. 1, de questões
relativas à evolução da jusfilosofia e sua posição atual, com profundos
reflexos na teoria do crime e da pena.
Ø a norma jurídica precisa ser definida, uma vez
que constitui pressuposto do crime e da pena. Esclarecer o alcance da norma, em
relação ao tempo, ao espaço e às pessoas, é fundamental, a fim de possibilitar
sua correta aplicação aos casos concretizados;
A teoria do crime será desenvolvida a partir do 4º
capítulo, sendo que este volume corresponderá ao previsto na maioria das
faculdades de Direito, visando a atender ao programa de Direito Penal I e de
Direito Penal II, visto que incluirá a teoria da pena, a inciativa da ação, os
efeitos da condenação e a extinção da punibilidade.
O 2º volume visará a atender aos conteúdos
programáticos: (a) Direito Penal III: Parte Especial: dos crimes contra a
pessoa aos crimes contra a dignidade sexual; (b) Direito Penal IV: Parte Especial:
dos crimes contra a família aos crimes contra a administração pública.
A legislação criminal especial será tangenciada
nos 2 volumes, de acordo com a aproximação dos temas em discussão, mas
recomendando-se a complementação dos estudos com livros, ensaios e artigos
específicos.
O estudo procurará ser profundo, mas com
apresentação sucinta, evitando-se repetições de conceitos e teorias expostos no
primeiro volume. Com isso, a compreensão do exposto no volume que tratará da
parte especial exigirá conhecimento prévio do objeto de estudo do primeiro
volume.
A crítica, aqui utilizada no sentido de
indagação, acompanhará todo livro. O objetivo será propiciar conclusões
racionais acerca de casos concretos e tornar possível a construção do saber
jurídico-criminal do estudante da graduação em Direito, bem como contribuir
para a evolução teórica daqueles que já trilham esse fascinante caminho.
1
INTRODUÇÃO
____________________
1.1 DIVISÃO DA OBRA EM VOLUMES
O DCrim vem sofrendo muitas transformações nos
últimos anos. Não há acordo na doutrina sobre muitos aspectos. Assim, por
responsabilidade, o estudo não pode apresentar uma única posição doutrinária.
Procurarei ser o mais abrangente possível, isso
no tocante à apresentação, mesmo que de forma sucinta, das posições
doutrinárias divergentes e das várias teorias incidentes sobre os assuntos que
serão examinados, ganhando prestígio especial as teorias da norma e do crime,
calcadas na moderna corrente jusfilosófica denominada funcionalismo. Para
tanto, será necessário reservar este volume à propedêutica, na qual se estudará
a teoria geral do DCrim, a partir da sua história, relações e fontes, até
chegar às teorias da norma jurídico-criminal e do crime.
1.2 O CÓDIGO PENAL VIGENTE
O Código Penal (Decreto-lei n. 2.848, de
7.12.1940) é dividido em duas partes principais, uma geral e outra especial, o
qual foi instituído em 1940, com início de vigência em 1941. A Parte Geral (PG)
foi completamente modificada em 1984 (Lei n. 7.209, de 11.7.1984).
Na impossibilidade concreta de se criar um novo
Código Penal, foram inseridas várias as modificações no texto da PE. Por outro
lado, a PG não restou ilesa, ou seja, várias leis posteriores à Lei n.
7.209/1984 modificaram substancialmente o conteúdo desta.
A PG, como o próprio nome sugere, traz normas
gerais aplicáveis aos crimes em espécie, dando a orientação sobre a aplicação
da lei, definindo o crime, as condições de aplicação das sanções criminais, a
iniciativa da ação e a punibilidade. A PE descreve os crimes em espécie,
cominando a pena aplicável a cada um deles. Excepcionalmente, a PE e traz
algumas disposições gerais que incidirão sobre determinados delitos. De
qualquer modo, em relação às constantes da PG serão especiais, visto que se
destinarão aos crimes que especialmente serão disciplinados por ela, em desprestígio
das disposições da PG.
O estudo da PE exige a constante aplicação dos
conhecimentos relativos à PG. É impossível dissociar as duas partes, visto que
é a PG quem oferece as orientações para hermenêutica e aplicação da PE.
Destarte, serão frequentes, nos comentários aos dispositivos da PE, as
referências aos preceitos da PG. Por outro lado, apresentarei preceitos
constantes da legislação criminal extravagante, mormente quando houver
semelhança entre o preceito CP e o da lei especial que será mencionada.
1.3 COMO O ASSUNTO SERÁ TRATADO
A apresentação dos assuntos acompanhará a
distribuição do CP, sendo que, por opção didática, serei razoavelmente fiel à
sequência da lei, pois assim o leitor conhecerá mais facilmente cada um dos
temas expostos. No entanto, os artigos serão reunidos em capítulos, podendo
ocorrer algumas inversões nas sequências das disposições legais, tudo visando a
facilitar a compreensão de cada norma expressa no CP.
Devo esclarecer que adotei uma postura que
procura atender ao acadêmico e candidato a concurso público. Não obstante isso,
esta obra pode trazer elucidações e contribuições rápidas, até mesmo para
profissionais mais experientes, não sendo, portanto, uma obra destinada
unicamente aos neófitos no estudo das teorias do crime e da pena.
Na esteira dessa linguagem didática, evitarei
tornar a obra exageradamente extensa, expondo os assuntos de maneira que,
segundo minha visão, são mais facilmente compreendidos. Dessa forma, procurarei
facilitar a leitura deste livro.
O objetivo é apresentar seriamente o DCrim. O
discurso não será o utilizado pelos meios de comunicação de massa nem o discurso
corrente nos manuais tendentes exclusivamente aos concursos públicos. O
objetivo é consolidar uma posição doutrinária, evitando uma prática despida da
teoria que possa sustentá-la. Por isso, alerto desde já, há a possibilidade da
prática decorrer de certas paixões populares e outros motivos metajurídicos,
nem sempre os mais salutares para o desenvolvimento do conhecimento
jurídico-criminal.
Pretender discutir profundamente todos os fatos
relativos aos crimes e à criminalidade é impossível ao jurista. Sendo o
conhecimento científico fragmentário, o jurista verificará suas limitações ao
encontrar várias questões que dependerão do conhecimento de outras ciências.
Refutarei, portanto, algumas previsões legais que têm a pretensão de reunir na
figura do jurista todos os conhecimentos das diversas ciências que circundam o
fenômeno criminal. Daí a impossibilidade teórica de se admitir certas
determinações legais, v.g., relativas à “personalidade do agente”,
conforme será exposto no presente livro.
1.4 MOTIVAÇÃO DO AUTOR
O que motiva o autor é a busca por uma estrutura
razoável de aplicação do DCrim. Este é denominado “Direito de última
instância”, dizendo-se que ele deve se afastar daqueles campos em que os outros
ramos da ciência jurídica forem capazes de resolverem os conflitos por meio de
suas próprias coercibilidades. Mais ainda, a solução de muitos problemas deve
encontrar soluções pacíficas, não por meio de batalhas judiciais e sanções
jurídicas, o que permite concluir pela total inviabilidade de se tentar ver no
Direito Criminal a panaceia para todos os males da sociedade complexa.
A visão crítica, a concordância ou a discordância
em relação às posições consolidadas na doutrina e nos tribunais permeará todo
livro. No entanto, o farei de maneira fundamentada, haja vista que não é
adequado concordar ou discordar com a afirmação de outrem sem a necessária
racionalidade que possibilita o conhecimento científico.
Heidegger será citado neste curso por várias
vezes. Ele acreditava:
A vida cotidiana faz do homem um ser preguiçoso e
cansado de si próprio, que, acovardado diante das pressões sociais, acaba
preferindo vegetar na banalidade e no anonimato, pensando e vivendo por meio de
ideias e sentimentos acabados e inalteráveis, como ente exilado de si mesmo e
do ser.[3]
O que se espera é ver um leitor atento, disposto
a analisar cada posição que será apresentada neste curso e que se procure
conhecer melhor cada uma das teorias e disposições legais que serão
mencionadas. Assim, ele estará produzindo os efeitos desejados.
Weber enfrentou a questão relativa à neutralidade
axiológica que se imagina necessária para exposição de conclusões sobre as
experiências científicas realizadas, concluindo que é necessária a serenidade,
mas, se necessário, deve-se “nadar contra a corrente”.[4]
Discordo daqueles que dizem ser melhor não
enfrentar questões polêmicas, bastando a simples referência às construções já
consolidadas. Como dizem os religiosos, se houvesse apenas uma pessoa a ser
salva, Deus mandaria Seu Filho para sofrer tudo o que sofreu, pois o seu
sacrifício não teria ocorrido em vão. Este é um livro pretende ser científico,
razão de colher o exemplo bíblico apenas para demonstrar o quanto considero
importante a imaginação capaz de analisar criticamente o sistema jurídico e,
quiçá, desconstruir vários equívocos de tal sistema. Se encontrar um
simpatizante às ideias nele contidas, tê-lo escrito já terá valido a pena.
Espera-se que cada leitor deste livro tenha a
vontade de aprender um pouco mais do DCrim, sendo necessária, portanto, a dúvida.
Desse modo, pede-se que, antes de iniciar o estudo deste livro, cada leitor se
livre das convicções e supostas certezas tendentes a prejudicar a evolução
intelectual. Este não é um curso que versa sobre conhecimentos que nos são
dados. Ele visa a possibilitar a evolução científica do sistema
jurídico-criminal.
Assim como a guerra, às vezes, é o instrumento
para a construção de um ambiente de paz, é o conflito intelectual que
possibilitará o surgimento de algo melhor que DCrim e permitirá a presença de algum
conhecimento mais humana, eficaz e útil do que a pena. Quiçá alguém consiga
criar um novo Direito, melhor que o DCrim consolidado, sendo que melhor será se
este livro vier a contribuir de alguma maneira para tal evolução.
Concordo com Weber e entendo que as palavras de
Nietzsche são aqui oportunas: “Eu sou alguém e, sobretudo, não confundais com
os outros”.[5]
Essa visão permitirá a construção de uma análise
crítica com a adoção de teses, em alguns momentos, destoantes das posições
consolidadas sobre determinadas matérias, mas sem deixar de explicar as
posições dominantes.
2
NOÇÕES PRELIMINARES
________________________________
2.1 PROPOSTA DE ESTUDO
Neste capítulo, procurarei definir o DCrim,
situando-o dentro do sistema jurídico. Também, apresentarei uma síntese da sua
evolução histórica, sempre visando a possibilitar a completa noção das razões
pelas quais o Direito se encontra no atual estágio de desenvolvimento, bem como
as lições que o inspiram. Esse estudo estará permeado de filosofia, uma vez que
a história da filosofia e a do pensamento jurídico-criminal tendem a se
aproximar desde a antiguidade.
O estudo preliminar do conceito do DCrim –
incluindo nele os aspectos que possibilitam conhecer sua denominação e as
regras de interpretação das normas criminais – é fundamental para o
entendimento dos preceitos do CP, razão pela qual este capítulo se dedicará às
matérias propedêuticas, às vezes, não expressas nas leis criminais.
Observe-se, no entanto, que a conceituação de uma
ciência não é preocupação do cientista. Enquanto cientista do Direito, o
jurista deve preocupar-se em delimitar e conceituar seu objeto de estudo, não a
própria ciência, o conceito desta é preocupação da Filosofia, mais
especificamente da jusfilosofia, que é a parte da Filosofia que se ocupa do
Direito.
O objeto básico deste capítulo é situar o
estudante do Direito acerca de aspectos históricos e filosóficos, bem como
apresentar conceitos propedêuticos necessários, a fim de permitir a compreensão
de estudos concernentes à norma, ao crime e à pena, que dependerão de tais
noções.
2.2 O PORQUÊ DO ESTUDO FILOSÓFICO
Há uma parte da filosofia geral que se ocupa de
assuntos jurídicos, a qual é denominada jusfilosofia. A sua análise é
fundamental porque importantes pensadores já disseram que o Direito, antes de
ser uma ciência é uma parte da filosofia.
O estudo do jusfilósofo tende à discussão em
torno da justiça, procurando defini-la ou saber se ela é unicamente um fim do
Direito, mas essa é uma árdua tarefa. Da mesma forma, a jusfilosofia procura
explicar as bases que dão sustentação ao Direito, o que é também extremamente
complicado. Na verdade, são muitas as metas e tarefas da jusfilosofia, a saber:
Ø proceder à crítica das práticas, das atitudes e atividades
dos operadores do direito;
Ø avaliar e questionar a atividade legiferante, bem como
oferecer suporte reflexivo ao legislador;
Ø proceder à avaliação do papel desempenhado pela ciência
jurídica e o próprio comportamento do jurista ante ela;
Ø investigar as causas da desestruturação, do enfraquecimento
ou da ruína de um sistema jurídico;
Ø depurar a linguagem jurídica, os conceitos filosóficos e
científicos do Direito;
Ø investigar a eficácia dos institutos jurídicos, sua atuação
social e seu compromisso com as questões sociais, seja no que tange a
indivíduos, seja no que tange a grupos, seja no que tange a coletividades, seja
no que tange a preocupações humanas universais;
Ø esclarecer e definir a teleologia do Direito, seu aspecto
valorativo e suas relações com a sociedade e os anseios culturais;
Ø resgatar origens e valores fundantes dos processos e
institutos jurídicos;
Ø por meio da crítica conceitual institucional, valorativa,
política e procedimental, auxiliar o juiz no processo decisório.[6]
A fragmentariedade do conhecimento científico
exige uma rápida incursão na filosofia, a fim de construir bases razoáveis para
a perspectiva mais genérica e abstrata. Também, questões concernentes à
legitimação do direito não é uma tarefa do cientista do Direito, mas do
jusfilósofo.
Prepararei caminho para a compreensão da
utilidade dos estudos jusfilóficos tendentes a explicar o que é efetivamente o
cerne do Direito, seu fundamento de validade, como instrumento para tornar
possível a coexistência social. É sabido que ubi societas ibi ius, sendo
que ele só se justifica na medida em que tenha alguma utilidade social. No
entanto, muitos problemas emergem, a partir da coercibilidade das normas
jurídicas, visto que sempre restarão indagações sobre o que dá ao mais forte o
direito de oprimir o mais fraco, ou ainda, nem sempre a vontade da maioria
representará sabedoria, cabendo, então, discutir sobre o porquê de não fazer a
vontade da minoria.
A busca incansável do homem por justiça reflete
no Direito, provocando-lhe inúmeras transformações. Destarte, as considerações
preliminares procuram apenas demonstrar que o enfoque do jusfilósofo é mais amplo
que o do cientista do Direito, definindo, então, o objeto do presente curso.
Não se tratando de um livro de jusfilosofia, o
assunto terá apresentação sucinta, mas pretendendo afastar a superficialidade
exagerada. Em alguns pontos o enfoque será apenas informativo, como meras
noções propedêuticas, suficientes ao estudo do objeto maior deste trabalho que
é procurar dizer se depois de muitos séculos de história da humanidade
conseguimos explicar coerentemente a existência de normas jurídicas e,
fundamentalmente, sua coercibilidade. Assim, noções introdutórias, como as do
presente topoi, não serão mais significativamente aprofundadas, pois
procuram unicamente contribuir para o delineamento adequado da exposição que se
seguirá.
2.2.1 Graus do conhecimento, conceito e autonomia
do DCrim
O Direito é uma ciência. Seu conceito é
razoavelmente complicado, exigindo o conhecimento dos graus deste. Paulo Nader
apresenta três níveis de conhecimento: o vulgar, o científico e
o filosófico. Delimitar os níveis dos conhecimentos que serão objetos do
presente curso é importante para evitar confusões na interpretação das posições
que constarão de todo texto.
O conhecimento vulgar é superficial,
decorrendo da experiência, das assimilações assistemáticas e fragmentárias.[7]
Ele contém uma série de imprecisões, visto que superficial.
O conhecimento científico “consiste na
apreensão mental das coisas por suas causas ou razões, através de métodos
especiais de investigação”.[8]
Com efeito, a ciência é o processo pelo qual o homem se relaciona com a
natureza, visando dominá-la. Este processo se configura na determinação segundo
um método e na expressão em linguagem matemática de leis em que se podem
ordenar os fenômenos naturais, do que resulta a possibilidade de, com rigor,
classificá-los e controlá-los. No tocante às ciências humanas, a racionalidade
não estará em critérios matemáticos, mas em discursos e métodos indutivos ou
dedutivos, decorrentes da experiência social ou de cada indivíduo.
O conhecimento filosófico, por sua vez, é
mais amplo, apresentando maior grau de abstração e generalidade. É por meio da
Filosofia que se procura conjugar os vários conhecimentos parciais das diversas
ciências isoladas.[9]
Não obstante isso, não se deve entender que a Filosofia é a soma dos
conhecimentos das diversas ciências, pois, se assim fosse, o filósofo teria que
conhecer tudo de cada uma delas, o que seria humanamente impossível.
Aos três níveis do conhecimento, apresentados
neste topoi, pode-se acrescer o conhecimento teológico, que é
aquele que é obtido pela fé. Aliás, dessa espécie de conhecimento, conforme se
exporá adiante, tratou Augusto Comte. É inegável que há um conhecimento que é
dado pela fé, sendo plenamente cabível a posição de Eduardo Bittar e de Eduardo
de Almeida, in verbis:
... Contudo, por se pensar que a fé é pura crença
(ato de confiança e entrega em si), pensa-se, normalmente que está dissociada
de qualquer preocupação racional. Ao contrário, a verdadeira e inabalável
crença solidifica-se por instrumentos racionais, por expedientes
comprobatórios, lógicos e lúcidos, distanciando-se, dessa forma, do fanatismo e
da cegueira sectária.[10]
Em face da proximidade dos enfoques filosófico
e científico, são os conhecimentos que nos interessam. Porém,
Filosofia é uma palavra de origem grega que decorre de philos (amizade,
amor) e sophia (ciência, sabedoria). Atribuem sua origem a Pitágoras que
recusava o título de sábio, ou seja, preferia dizer que não era o senhor
de todas as verdades, mas um fiel amigo do saber.[11]
Destarte, pode-se concluir que conhecimento filosófico não pode estar
vinculado a qualquer escopo prático ou utilitário, sendo, portanto, uma
dedicação desinteressada ao conhecimento.
A Filosofia, nos dias atuais, é “o método de
reflexão pelo qual o homem se empenha em interpretar a universalidade das
coisas”.[12]
O filósofo atua espontaneamente e instintivamente procurando captar a realidade
como um todo e o profundo significado dos objetos. Essa atividade, segundo
Miguel Reale, dá maior importância à teoria do ser, mas, na atualidade,
põe em relevo a teoria do conhecimento.[13]
Não obstante tal afirmação, não se pode olvidar que Martin Heiddegger, no
século passado restaurou a importância da teoria do ser, dizendo que
este é a essência do fundamento, a partir de sua constituição ontológica.[14]
Corroborando, Habermas afirma que “Kant caiu no descrédito porque, valendo-se
dos fundamentos transcendentais, criou uma nova disciplina: a teoria do
conhecimento”.[15]
Esse estudo filosófico encontra setores de
observação. Desse modo, a jusfilosofia é um capítulo da Filosofia Geral, sendo
que aquela se destina ao conhecimento mais genérico do Direito, dizendo qual é
o seu conceito, seus fundamentos e sua razão de ser.
A Filosofia do Direito se ocupa da teoria do
conhecimento,[16]
podendo ser concebida como “o estudo crítico-sistemático dos pressupostos
lógicos, axiológicos e históricos da experiência jurídica”.[17]17
Se fôssemos nos prender à teoria pura do direito, de Kelsen, diríamos que a
ciência do Direito se ocupa somente das normas, dizendo “o que ele é” e “como
ele é”, não se preocupando sobre como ele “deve ser”, ou como “deve ser feito”.
Kelsen, dizia que o cientista deve se preocupar com seu objeto de estudo, que é
o sistema dinâmico de normas. O jurista deve buscar o conhecimento científico,
fazer ciência e não política do Direito.[18]
Isso que Kelsen denominou de política do Direito é objeto de estudo da
filosofia do Direito.
Gustav Radbruch já dizia que o problema do
conceito do Direito, só à primeira vista, parece pertencer ao Direito.[19]
Assim, quando Kelsen conceituava o Direito, fazia Filosofia e não ciência do
Direito. Nesse sentido, preleciona Miguel Reale: “A definição do Direito só
pode ser obra da Filosofia do Direito. A nenhuma Ciência Jurídica particular é
dado definir o Direito, pois é evidente que a espécie não pode abranger o
gênero”.[20]
Este curso dirá qual é a concepção filosófica do
Direito, tentando tratar de suas tarefas primordiais de seu caráter lógico, que
cabe ao filósofo do Direito resolver, quais sejam: seu fundamento ou
legitimidade; sua força coercitiva; e sua utilidade.
Incumbe ainda lembrar que a Filosofia do
Direito é uma parte da Filosofia, que faz a contemplação valorativa do
Direito.[21]
Essa concepção não corresponde com o conceito de ciência jurídica, eis
que esta se ocupa da ordem jurídica, ou seja, das normas jurídicas, sendo,
assim, a ciência do direito positivo vigente, não do direito justo.
Afirmou-se que a Filosofia do Direito ocupa-se do
“direito justo”, não interessando o ser, mas o dever-ser.
Entretanto, tal proposta foi contestada, fazendo-se oportuna a lição de
Radbruch:
A Filosofia de Kant já nos ensinou que era
impossível extrair daquilo que é aquilo que deve ser, o valor, a
legitimidade. Jamais alguma coisa será justa só porque é ou foi, ou
mesmo só porque será. Daqui se conclui que são de rejeitar o positivismo, o
historicismo e o evolucionismo; o primeiro porque infere o dever-ser do ser; o
segundo, porque infere o dever-ser daquilo que já foi; e finalmente o terceiro,
porque infere o dever-ser daquilo que será ou tende a ser.[22]
Deve-se destacar que os autores de Filosofia do
Direito tendem ao Direito Criminal. Hoje, conforme sustenta Habermas, a tarefa
da Filosofia não é exclusiva dos filósofos. Também, ele considera equivocada a
limitação “a uma filosofia do direito especializada juridicamente, que tem seu
ponto forte na discussão dos fundamentos do Direito Penal”.[23]
A jusfilosofia é importante para o conhecimento
do DCrim, eis que, conforme exposto, preocupa-se com as razões para a
existência de certas normas, bem como sobre a justiça (ou injustiça) delas
decorrente. Neste curso, a importância da jusfilosofia é mais acentuada, tendo
em vista os fundamentos da imputação objetiva decorrem exatamente das novas
vertentes jusfilosóficas.
Defende-se, há muitos anos, o estudo da
Filosofia, pelo criminalista. Basileu Garcia, por exemplo, dizia:
Não poderia o jus-penalista isolar-se na sua torre
de marfim, cerrando os ouvidos aos debates filosóficos concernentes ao objeto
de sua própria ciência. Ao contrário, ele deve manter-se alerta às discussões e
conclusões que se apresentam, no terreno filosófico, a respeito dos temas
penais. Mesmo porque as normas legais refletem, grande número de vezes, um
princípio filosófico, o qual, por obra dos juristas, se encarnou em determinado
preceito da lei positiva.[24]
Aliás, no mesmo sentido, Maggiore já dizia que a
doutrina do Direito sem Filosofia assemelha-se a uma daquelas estátuas antigas,
que tinham belos olhos, mas sem pupilas. Segundo referido autor, ela adentra no
Direito, mesmo sem ser convidada.[25]
Portanto, a jusfilosofia é inarredável de todo aquele que pretende estudar
DCrim.
Ver o Direito como ciência importa dizer que o
jurista é um cientista, alguém que tem determinado objeto de estudo. Em uma
visão kelsiana, seu objeto é a norma, que traduz a ideia de regra, de medida
etc. No entanto, o conceito de norma jurídica é zetético,[26] tornando-se
necessário conhecer algo mais que leis escritas, eis que a zetética representa
uma abertura constante para questionamento dos objetos em todas as direções.[27]
Poderíamos de maneira simplista e dizer que o
DCrim é a ciência que estuda o conjunto de normas que instituem crimes e as
medidas aplicáveis a quem os pratica. Daí se infere que o DCrim tem por objetos
de estudo a norma e os fatos.
Não poderíamos, no entanto, dizer que ele é o
conjunto de normas relativas aos crimes e às medidas aplicáveis a quem os
pratica porque sendo ciência, seu fim é o estudo. Assim, não constitui conjunto
de normas, mas o estudo desse conjunto. Aliás, convém, ressaltar que não são
raras as proposições no sentido de ser o DCrim “um conjunto de normas” que
definem crimes e medidas aplicáveis a quem os pratica. Todavia, não se pode
confundir o conceito de uma ciência com o do seu objeto de estudo. No caso, o
DCrim é a ciência e o conjunto de normas é seu objeto de estudo.
Ocorre que o DCrim, na maioria das vezes, protege
objetos jurídicos provindos de outros ramos do Direito, fazendo que ele se
relacione com os demais. Também, se relacionará com outras ciências, com a
filosofia e com a teologia.
O Direito é, portanto, a ciência que estuda o
conjunto de normas jurídicas, bem como as consequências decorrentes da violação
de cada uma delas. Ocorre que,
sendo o conhecimento científico fragmentário, não resta outra alternativa senão
dar autonomia relativa a cada um dos ramos do Direito, a fim de tornar possível
o conhecimento de todo o seu objeto.
Direito é ciência, sendo que a autonomia de cada
um dos seus ramos é apenas relativa. Cada ramo do Direito é uma parte
especializada da ciência. Por isso, gosto do conceito ofertado por Juarez
Cirino: “O Direito Penal é o setor do ordenamento jurídico que define crimes,
comina penas e prevê medidas de segurança aplicáveis aos autores das condutas
incriminadas”.[28]
Diz-se que o Direito se assemelha a uma árvore,
pois tem um tronco e vários galhos (ramos). Dessa forma, os vários ramos do
Direito se interligam por meio desse tronco.[29]
Em sentido oposto, existem vários autores que tratam da autonomia das ciências
jurídicas, para os quais não mais existem ramos do Direito, mas ciências
jurídicas autônomas.
É inegável, no entanto, mesmo admitida a autonomia,
que os ramos do Direito são interdependentes. É no DCrim que a característica
unitária do Direito melhor se reflete, visto que as violações às leis criminais
representam, antes de ser uma violação propriamente criminal, o descumprimento
de um dever anterior, normalmente contido em outro ramo do Direito.
O Direito, numa abordagem genérica – aqui tratado
como uma ciência que se divide em ramos com autonomias meramente relativas –
surgiu de uma necessidade do homem estabelecer normas para as suas relações.
Daí a máxima ubi societas, ibi ius (onde está a sociedade, está o
direito). Dessa noção podemos deduzir que o direito é uma ciência social, que
existirá onde houver vida em sociedade, sem esta não haverá Direito.[30]
Nesse sentido, João Maurício Adeodato ensina que pode até existir sociedade sem
Direito, mas é impossível pensar em Direito sem sociedade.[31]
A vetusta origem do Direito Criminal transcende
em antiguidade a origem dos demais ramos do Direito, pois, desde os primórdios,
emergiu a necessidade de se coibir a prática dos fatos que mais profundamente
atingissem as pessoas do grupo social e, consequentemente, o próprio grupo.
Tais normas referiam-se às mais graves violações aos direitos individuais ou
coletivos, visto que a solução de pequenos problemas não era disciplinada,
cabendo aos particulares resolverem suas pendengas.[32]
Como ciência, tem necessariamente um objetivo,
haja vista que não se justifica estudar certo objeto sem ter em vista
determinado fim.[33]
O conhecimento científico tem estado em crise porque se tem afirmado muitas
coisas sobre ele, mormente sobre a sua insuficiência. Porém, falo como Bertrant
Russell, afirmando: “A ciência, em nenhum momento, está inteiramente certa, mas
é raro estar inteiramente errada e, normalmente, tem maior chance de estar
certa do que as teorias não-científicas. Portanto, é racional aceitá-la
hipoteticamente”.[34] No
mesmo sentido, Carl Sagan afirma: "A ciência está longe de ser um
instrumento perfeito de conhecimento. É apenas o melhor que temos".[35]
2.2.2 A localização de topoi e o problema
das classificações
O cientista, mais do que qualquer outro
estudioso, deverá localizar topoi, ou seja, um plano comum em que possa
delimitar o seu objeto de estudo e se aprofundar até encontrar a sua essência,
a sua natureza. Daí resulta a fragmentariedade do conhecimento jurídico e o
excesso de classificações.
Um alerta que faço aos meus alunos: as
classificações, em diversas oportunidades, carecem de critério. Ratifico que
cada observador arbitra seu próprio critério, segundo sua ótica, o que torna,
às vezes, pouco compreensíveis certas classificações. Mas, para se conhecer
qualquer coisa na sua essência, mister é delimitar o objeto de estudo, razão
pela qual as classificações são fundamentais. Ao deixar de delimitar o objeto
do estudo, incorre-se, normalmente, em confusões que induzem os leitores a
equívocos.[36]
Entende-se por neologismo (palavra formada por neo
– novo – e logos – palavra), toda palavra ou vocábulo novo
introduzido na linguagem, formado ou derivado de outras.[37]
Ele é importante em linguagem técnica, a fim de permitir a comunicação clara,
mas devem ser evitados os abusos, uma vez que o excesso poderá, ao contrário de
auxiliar, tornar a linguagem confusa e pouco compreensível. Nesse sentido,
Ferri expôs:
Depois destas noções elementares, julgo inútil
estorvo referir as prolixas indagações e as diversas classificações... Estas
divagações escolásticas e mais ou menos criptográficas sobre as normas penais e
sobre os seus destinatários, grosseiramente copiadas das noções gerais do
direito, não trazem nenhuma contribuição útil nem ao conhecimento científico
nem à aplicação prática da justiça penal, pois esta, em vez de volatizar-se nas
abstrações lógicas e distinções escolásticas, tem necessidade de ser estudada
sobre o terreno da realidade humana.[38]
Tentaremos não nos prender a uma suposta
realidade ditada pelo ser-em-si. Tentaremos ir um pouco adiante, mas sem
perder de vista o Direito como ciência, a fim de estabelecermos um modelo com
segurança mínima e necessária à estabilização social.
2.2 RELAÇÕES DO DCrim
A grande influência do Direito Internacional em
determinado Estado é crescente, falando-se, hoje, em DCrim Internacional.
Muitos crimes se relacionam com a proteção da ordem internacional, aproximando
o DCrim do Direito Internacional. Outrossim, em muitos outros aspectos serão
percebidas relações entre esses ramos do Direito, principalmente no que tange
às imunidades e outros limites de aplicação da lei. Hoje, ante a ratificação do
Brasil ao Estatuto de Roma, que instituiu o a Corte Internacional Criminal, é
impossível deixar de tratar de aspectos relevantes do Direito Internacional, mais
especificamente de sua parte que cuida da matéria criminal. Por isso, faremos
alguma alusão à CIC em vários momentos deste livro.
O Direito Constitucional é muito importante, mas
a Constituição Federal não traz em si todos os objetos jurídicos do Direito
Interno. Ela traz rol exemplificativo dos direitos fundamentais, aos quais
podem ser acrescidos outros (CF, art. 5º, § 2º). Não obstante isso, muitos
aspectos relevantes, de natureza criminal, constam do seu rol, traçando limites
e programas a serem respeitados pelo legislador infraconstitucional, bem como
pelo aplicador da lei, o que evidencia a relação do DCrim com o Direito
Constitucional).
O Direito Civil talvez seja o que tenha maior
amplitude numa determinada ordem jurídica, uma vez que disciplina a maioria das
relações das pessoas do Estado. Modificar um Código Civil, como ocorreu em
2002, em que o velho CC de 1916 foi revogado, cedendo lugar a um novo, altera
toda uma ordem jurídica, intervindo diretamente na vida das pessoas. No
entanto, como a mudança era extremamente necessária, havendo muitas leis que já
consagravam a nova ideologia, o povo não se arrefeceu tanto com a nova lei.
Porém, não se olvide, o DCrim trata da família, do casamento, da fraude
contratual, do patrimônio etc., todos objetos do Direito Civil, o que faz com
que se tenha plena certeza da relação de referidos ramos do Direito.
O DCrim se relaciona, em síntese, com todos os
ramos do Direito, uma vez que trata de crimes contra a ordem administrativa,
tributária, financeira, econômica, organização do trabalho etc. Outrossim, o
DCrim não fica alheio às demais ciências, haja vista que ele se relaciona com a
Matemática (na medida em que adota critérios exatos para dosimetria da pena e
requisitos para certos benefícios), a Medicina (a Psiquiatria Forense é
fundamental para o estabelecimento da culpabilidade de algumas pessoas, bem
como os diversos ramos de referida ciência auxiliarão na constatação de
ilícitos e respectivas gravidades, v.g., lesão corporal), a Psicologia
(fundamental para análise de algumas perturbações mentais e suas influências
sobre a pessoa envolvida no delito), a Física (importante na análise dos locais
de crime) etc.
Finalmente, cumpre observar que Enrique Ordeig
sustenta que a distinção entre o DCrim e os outros ramos da ciência do Direito
está na consequência. Ocorrendo um suposto fato hipotético ilícito, as
consequências poderão ser diversas nos outros ramos do Direito, mas no DCrim
ela será a pena (eventualmente a medida de segurança).[39]
A proposta de Ordeig está parcialmente correta. O
crime é composto por duas partes: uma objetiva e outra subjetiva. Como a pessoa
que não pode entender o caráter ilícito do fato não preenche a parte subjetiva
do delito, entendemos que sua conduta resta fora do DCrim, sendo a pena a única
consequência possível em tal ramo do Direito (salvo nos casos de absolvição,
nos quais não incidirá a coerção criminal).
Assim como o Estado intervém nas liberdades
individuais para proteção da sociedade, retendo veículos automotores sem
condições de segurança para transitarem na via pública, veda a autorização para
que pessoa sem adequada coordenação motora possa ter habilitação para condução
de veículo automotor etc., determina o tratamento de doentes mentais que
evidenciam periculosidade potencial, manifestada pela concretização de conduta
definida como crime.
2.4 DENOMINAÇÃO
Quatro denominações se destacam, a saber: a) Direito
Criminal; b) Direito Repressivo; c) Direito Penal; d) Nova
Defesa Social. Nova defesa social tem sido a preferida pelo legislador,
desde o final do século XIX, mas não é a melhor para este ramo do Direito por
duas razões: a) ele não comina somente pena como aplicáveis ao infrator
da lei. Prevê, também, a aplicação de medida de segurança (o estudo da medida de segurança deveria
ser objeto do Direito Sanitário, mas – nos tribunais – não evoluímos para
considerarmos os arts. 96-99 do CP revogados pela Lei n. 10.216, de 6.4.2001);
b) estuda as condutas proibidas, cominando penas aos que as praticarem. Pelo
que se vê, a denominação Direito Penal exprime somente os efeitos da
infração da norma, desprestigiando a conduta capaz de gerar a pena.
Denominá-lo de Direito Repressivo também é
inadequado, pois o DCrim, no atual estágio da civilização é uma garantia
individual de liberdade – um Direito cooperativo, não um Direito que intervém
inoportunamente na regularidade da vida social – pois a pessoa só poderá ser
acusada de um crime e sofrer uma sanção se estas estiverem previamente previstas
na lei. Dessa forma, a melhor denominação, para a doutrina, é a primeira, DCrim,
tendo em vista que parte da essência da matéria, que é o crime. Embora usemos
com maior frequência a denominação que preferimos, devemos ratificar que é
generalizada “a preferência pela designação Direito Penal, não só no Brasil
como em outros países”.[40]
Nova Defesa Social é o DCrim contemporâneo e a tendência do futuro,
isso segundo Mirabete (posição mantida pelo seu filho).[41]
Digo, no entanto, que o Direito (todo ele) é um dos instrumentos de defesa
social desenvolvidos pelo homem, sendo incabível falar unicamente no DCrim como
tal, o que permite repudiar a denominação.
2.5 HISTÓRIA DO DCrim E SUA RELAÇÃO COM A
FILOSOFIA
2.5.1 Generalidades
Desde a Grécia antiga que se busca dizer o que é
justiça, bem como explicar a coercibilidade das normas. Passamos por diversas
fases, sendo que não podemos chegar ao funcionalismo, sem um estudo prévio da
história da jusfilosofia. Desse modo, a apresentação de um escorço histórico visa
a conduzir o leitor à compreensão das posições jusfilosóficas hodiernas.
Demonstrarei a evolução das posições que
procuraram explicar a legitimação do Direito. Destarte, o enfoque inicial é
histórico, apenas procurando estabelecer o cerne de cada uma das grandes fases
que antecederam o conhecimento multidisciplinar que predomina hodiernamente no
meio jusfilosófico. Dessa forma, a longa fase do jusnaturalismo, que se
caracteriza, no campo da busca da legitimação do Direito, pelo
transcendentalismo, é apresentada muito rapidamente, preocupando-se,
basicamente, em demonstrar a inarredável ideia de que toda coercibilidade do
Direito está em algo superior ao homem.
A partir do positivismo, emergiram várias ideias
sistêmicas, pelas quais a legitimação do Direito é dada normalmente por um
conjunto de normas. Com efeito, Kelsen apresenta o Direito como sendo um
sistema dinâmico de normas. De outro modo, Hegel procurou empreender maior
dinamismo ao pensamento kantiano. Augusto Comte, por sua vez, embora positivista,
propôs a observação do fato social. Este último, não empreendeu estudos de
Sociologia Jurídica, mas não ficou completamente alheio ao seu objeto, o que
vem a demonstrar que o Direito, com ele, começou a abrir espaço para discussões
multisciplinares, que é o cerne da discussão hodierna em torno da validade e
utilidade do DCrim.
A Sociologia Jurídica, que se desenvolveu nos
últimos anos do século XIX, iniciou uma nova vertente filosófica, sendo que o
conhecimento do Direito passou a um discurso multidisciplinar, que encontrou
seu ápice em Habermas.
Ao longo deste estudo, demonstrarei o pensamento
apresentado por Luhmanniano, que é aquele em que a norma emerge do próprio
sistema jurídico, não de outros (sub)sistemas da sociedade. Assumo duvidar de
que exista alguma proposta filosófica adequada à coercibilidade do DCrim, razão
pela entendo que este livro deve ficar sem uma conclusão peremptória, visto que
a única solução cabível neste momento é continuar perseguindo uma proposta
razoável no que concerne a um DCrim efetivamente justo.
Este capítulo partirá de uma rápida e sucinta
visão da evolução histórica do pensamento filosófico e jurídico, até chegar aos
tempos atuais, interessando principalmente a evolução a partir de Augusto
Comte, visto que é partir dele que os fatos sociais passaram a influenciar mais
fortemente a Filosofia do Direito e todo Direito Criminal.
2.5.2 Ideias e instituições criminais
2.5.2.1 Significado de ideias e instituições
criminais
Ideias são trabalhos mentais desenvolvidos para
combater o mal, o pecado, a ofensa, o direito subjetivo etc. (mal este que hoje
é denominado delito). A exteriorização de tais ideias leva à tradição, ao
costume, às fases de combate aos males por meio de comportamentos padronizados,
ou seja, instituições criminais.
O desenvolvimento da vida em sociedade trouxe a
necessidade de imposição de normas. Daí, aquele que as infringisse poderia
sofrer uma sanção, a qual tinha o aspecto de retribuição do mal praticado, era
uma vingança praticada pelo particular, pelo grupo, em nome de Deus, visando aplacar
a ira da Divindade, ou em nome do príncipe, para evitar que este punisse o
grupo. Assim, a pena decorria de uma ideia que se desenvolvia para
combater a violação das normas consuetudinárias existentes.[42]
Tais ideias se padronizavam, passando a constituir instituições criminais.
2.5.2.2 Fase da vingança
Na antiguidade, a pena era um meio de se aplacar
a ira de Deus, do homem ou do príncipe, sendo que este representava a vontade
coletiva. Daí, falar-se, respectivamente, em vingança divina, privada e
pública.
Não é possível dizer qual foi a primeira delas,
dependendo obviamente do ponto de vista do cientista. Para um criacionista, a vingança
divina foi a primeira, enquanto para o evolucionista a primeira fase foi a
da vingança privada. Finalmente, para quem entende que o Direito surgiu
por meio da força, em que os mais fortes oprimiam os mais fracos, a vingança
pública seria a primeira. O fato é que as três fases da vingança
coexistiram no tempo, não sendo possível determinar, com certeza, qual foi a
primeira delas, até porque todas foram anteriores à escrita e as primeiras leis
escritas já consagravam as três fases.
Na fase da vingança privada, o ilícito
representava a violação de um direito privado que assegurava ao particular
resolver (ou superar) sua ira. O próprio particular, ou seu grupo, aplicava a
punição.
A vingança divina era exercida em nome de
deus, castigava-se em nome dele, para aplacar sua ira, senão ele puniria todo
povo por meio de pragas. Os registros históricos estão a indicar que o Direito
não se estabeleceu com base na dominação do mais forte sobre o mais fraco, mas,
na antiguidade, se fundamentou precipuamente na religião.[43]
Na fase da vingança pública, punia-se em
nome da coletividade para que ela ficasse satisfeita. Os marxistas diriam que o
Direito é instrumento de dominação. Assim, a primeira vingança seria a pública.
Essa é a posição dos autores que se dizem alternativistas.[44]
A fase da vingança se caracterizava pela
desproporcionalidade entre o mal praticado e a sanção que se aplicava ao
infrator. Nem mesmo na bíblia, de onde retiramos a máxima no sentido de que
“deus é amor”, encontraremos proporcionalidade. Assim, em nome de deus, do
princípio ou do próprio ofendido, grupos inteiros eram dizimados, o que exigia
providências para limitação do castigo.
2.5.2.3 Lei de talião e a pena de morte
Estabelecia a proporcionalidade exata entre a
infração e a sanção, o que se verifica pelo brocardo “olho por olho, dente por
dente”. A origem da palavra está no vocábulo talio, que significa mesma
medida, assim o castigo devia ser imposto na mesma medida do mal praticado pelo
agente.
Não se pode precisar exatamente o período em que
surgiu a lei de talião, mas se pode afirmar que foi importante para trazer a
idéia da necessária proporcionalidade entre o mal praticado e a retribuição a
quem o praticou por meio. Segundo Álvaro Mayrink, a origem do talião nasceu
provavelmente no período neolítico (da pedra polida).[45]
Acerca da lei de talião, boa é a síntese de César
Dario Mariano:
Como o revide [da vingança privada] não guardava
proporção com a ofensa, surgiam guerras entre os grupos, que podiam chegar ao
aniquilamento. Surgiu, daí, a ideia do talião, como primeira conquista no
âmbito do Direito Penal. Por meio do talião, delimitava-se o castigo, e a
vingança teria uma ideia de proporcionalidade.[46]
Segundo a lei de talião, vindo Tício a matar o
filho de Caio, este tem o direito de matar o filho daquele não ele. Tal
perspectiva, segundo a visão hodierna que temos de justiça, é equivocada, mas
temos que reconhecer, para o período em que surgiu, momento em que predominava
a desproporcionalidade, representou grande avanço.
Tratarei da teoria da pena, deixando claro
que existe uma corrente que agrupa várias teorias da pena, denominadas
absolutas, que desencadeiam na ideia de que a pena é a retribuição do mal ao
infrator da lei, uma vez que a infração constitui um mal. Referidas teorias,
com motivações distintas, concluem que a maior expressão de justiça está na lei
de talião, eis que respeitada a proporcionalidade.
A pena de morte encontra apoio, principalmente,
entre pessoas menos cultas. Nem mesmo a lei de talião a justifica e a
possibilidade de erro do Estado, sem a possibilidade de reparação de tal erro,
dentre outros aspectos, está a recomendar a rejeição da sua previsão legal.
Não direi que a vida é bem jurídico (bem do
Direito, objeto do Direito, objeto jurídico: aquilo que o Direito protege)
absoluto porque não se concebem mais direitos absolutos, pois até mesmos os
direitos fundamentais da Constituição Federal precisam ser ponderados.[47]
Porém, a pena de morte, passível de aplicação, no Brasil, àqueles que
praticarem crimes militares em tempo de guerra (ainda que o julgamento se dê em
tempo de paz), não se justificará – à luz da lei de talião – nem mesmo para os
delitos mais graves.
Imaginemos algumas hipóteses para imposição de
pena de morte: 1) Tício matou Caio e ocultou o cadáver para assegurar a
impunidade. Descobriu-se que Tício agiu por motivo pouco relevante porque foi
ofendido durante discussão banal de trânsito. Ele desferiu um tiro contra a
vítima, matando-a instantaneamente; 2) Mévio matou vinte crianças e retalhou os
corpos das vítimas, preparando-os para o consumo. Após devorar metade da carne,
foi localizado e descobriu-se que ele era um religioso fanático que pregava a
purificação da espécie humana por meio do consumo de carne proveniente de
pessoas puras; 4) Semprônio, planejando roubar um banco, nele adentrou e matou
seis vigilantes. Foi preso dois anos depois, momento em que morava em suntuosa
casa, adquirida com o produto do crime.
Segundo a lei de talião, em nenhum dos casos,
haveria justiça porque Tício será morto mediante tortura mental, haja vista que
suportará o processo e aguardará execução premeditada, maior, portanto, que o
mal por ele praticado. Em outros casos, a pena seria desproporcional por ser
menor que o mal praticado pelo infrator da lei.
Não haveria proporção na morte de Mévio porque
ele poderia ser um doente e, assim, ao contrário de pena, mereceria tratamento.
Também, caso fosse Mévio efetivamente o monstro que se imagina, ante tão cruel
hipótese, sua pena deveria ocorrer por várias vezes, mas isso apenas nos
reduziria ao período bárbaro, já experimentado e sem sucesso no combate à
criminalidade.
No caso de Semprônio, estar o agente se
usufruindo do produto do crime não torna as mortes das vítimas mais dolorosas,
não havendo a menor condição de se afirmar que há proporcionalidade entre a
conduta de Semprônio e a pena de morte que lhe foi imposta e executada.
Minha indagação, neste momento, reside no tocante
à proporcionalidade. Não havendo proporcionalidade, não se pode falar em pena
justa. Também, não me parece razoável a posição simplista exposta no sentido de
que “foi pouco”. Ora, se é “pouco”, é desproporcional, portanto, a pena é
injusta, ou seja, a pena de morte, ao contrário de justificar a lei de talião e
as teorias absolutas, deixa-a desmascarada.
2.5.2.4 Composição
Para conter a desproporcionalidade da fase da
vingança, emergiu a composição, que era a expiação da pena pelo
pagamento em pecúnia, mercadorias, reses, etc. A origem da composição é tão
remota quanto a da lei de talião, com o diferenciador de que a composição
representou avanço significativamente maior. Considero inadequado deixar de
mencionar tal fase, como fez César Roberto Bitencourt.[48]
A composição merece ser incentivada nos dias de
hoje estendendo sua aplicação a vários delitos, mormente aos patrimoniais e
praticados com fim de lucro em geral – v.g., peculato, corrupção etc. -,
no entanto, só tem sido admitida com efeitos criminais relevantes nos crimes de
menor potencial ofensivo (Leis n. 9.099/1995 e 10.259/2001), uma vez que a
conciliação civil é causa extintiva da punibilidade em certos crimes (Lei n.
9.099/1995, art. 74, parágrafo único). Nos demais crimes, a composição pode até
intervir na punibilidade dos crimes de ação de iniciativa exclusivamente
privada e pública condicionada à representação, mas se a iniciativa da ação for
pública incondicionada, ela apenas interferirá na dosimetria da pena, sendo
levada em consideração no momento de se verificar as consequências do delito.
2.5.2.5 Códigos escritos
Os primeiros códigos escritos foram: (a)
de Hamurabi, instituído na Babilônia, aproximadamente 1.700 a.C.; (b) Lei das XII Tábuas, dos Romanos,
instituída entre 453 a.C e 451 a.C.; (c)
Bíblia, cujos cinco primeiros livros, a Torá
– Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio – foram escritos em torno do
ano 450 a.C. (mas retrata um perído que, literalmente, remonta 4.000 a.C. e 450
a.d.C.); e (d) de Manu, instituído
na Índia em data incerta (entre 200 a.C. e 200 d.C) consagravam idéias das
instituições criminais mencionadas, sem se preocupar em ser fiéis a qualquer
delas.
Outros escritos com matéria criminal foram
encontrados, possivelmente anteriores aos dois últimos. Álvaro Mayrink faz
referência aos escritos assírios que se referem à composição, datados de
aproximadamente séculos XV e XIV a.C.[49]
Observe-se, no entanto, que os quatro mencionados são os que mais encontramos
na literatura criminal pátria.
Prova de que as fases mencionadas (vingança
privada, vingança divina, vingança pública, lei de talião e composição)
antecederam as primeiras leis escritas, está no fato de os primeiros códigos
antigos, sem exceção, terem consagrado, em maior ou menor escala, um pouco de
todas elas.
Ao longo do tempo, as ideias criminais que se
transformaram em efetivas instituições,[50]
contribuíram para o desenvolvimento do DCrim, trazendo maior humanização à
pena, bem como a laicização do Direito. Para melhor análise, observe-se o DCrim
consolidado em algumas civilizações antigas.
2.5.2.6 Povos antigos
Por povos antigos, consideramos o período em que
o homem já conhecia a escrita (4000 a.C. a 3.500 a.C.) e o estenderemos no
tempo até a queda de Roma (476 d.C), reforçando
uma religião, o cristianismo, que começou a surgir no fim do Século I.
A. Gregos
Os gregos muito se desenvolveram na Filosofia,
mas eles pouco contribuíram para a evolução do Direito.[51]
Dividiram os crimes em públicos e privados, sendo que estes eram resolvidos
segundo a vingança, enquanto que aqueles iam aos Conselhos de Cidadãos, mas
poucos eram cidadãos. Na verdade, não conseguiram fazer uma adequada distinção
entre crimes públicos e privados e não desenvolveram grandes técnicas para a
análise de fatos tidos como graves violações à ordem grega. De qualquer forma,
pelo avanço filosófico, trouxe uma contribuição importante, que é a laicização
do Direito.
O grande problema dos gregos estava em sua
cultura. Seu Direito, assim como o Romano, calcou suas bases na religião. No
entanto, a xenofobia do grego foi significativamente mais acentuada que a do
romano, por isso este povo evoluiu mais significativamente.
Por não ver a mulher, nem o estrangeiro, como
pessoas, o grego gerou uma situação inaceitável. Apenas o homem era gente,
portanto, só ele era suscetível de amor, o que generalizou o homossexualismo.
Também, generalizou o tratamento de pessoas como se fossem coisas. Vejo como
sectária a cultura grega, concluindo que é daí que decorre sua pequena
evolução, embora reconhecendo sua importância na filosofia.
Os gregos contribuindo significativamente para a
laicização do Direito, mas não conseguiram se afastar do transcendentalismo.
Aristóteles, por exemplo, via a justiça como sendo metafísica, eis que,
conforme expõe Paulo Cássio M. Fonseca, no tocante à justiça, sempre tentou
conjugar os conceitos de beleza e bondade.[52]
Não obstante isso, até mesmo em Aristóteles podemos encontrar as raízes da imputação
objetiva (moderna teoria do crime) haja vista que ele ensinava:
O justo total é a observância do que é regra
social de caráter vinculativo. O hábito humano de conformar ações ao conteúdo
da lei é a própria realização da justiça nesta acepção do termo. Esse tipo de
prática causa efeitos altruístas, de acordo com a virtude total.[53]
Os três maiores nomes da Filosofia grega antiga
talvez tenham sido Sócrates (470 ou 469 a.C. a 399 a.C.), Platão (428 ou 427
a.C. a 348 ou 347 a.C), e Aristóteles (384 a.C. a 322 a.C.). O primeiro não
deixou registros, tendo advindo todo conhecimento de seu pensamento por meio de
Platão, que ovacionou aquele e diz-se que ele fez os melhores registros de sua
história.[54]
Não estou convencido da existência de Sócrates,
parecendo que foi “Platão quem criou o Sócrates de nossa imaginação, e até hoje
é impossível determinar até que ponto essa imagem corresponde ao Sócrates
histórico e até que ponto é produto do gênio criativo de Platão”.[55]
Não se olvide, no entanto, que há um grande número de autores que tratam do
registro físico de Sócrates, o qual teria atuado como soldado em 3 batalhas.[56]
O ponto central da discussão de Platão está em
Sócrates. O idealismo platônico evidenciou especial preocupação com o papel que
a retórica pode desempenhar na ética e na educação, o que tem merecido destaque
na jusfilosofia moderna, sendo a base de todo DCrim, que tende às teorias do
discurso.[57]
A preocupação com a linguagem não foi exclusiva
de Platão. Aristóteles fez pesquisas sobre as palavras, procurando evitar
equívocos que resultariam da designação de coisas diferentes através do mesmo
nome (homônimo) ou da mesma coisa por meio de palavras diferentes (sinônimo).[58]
E, a filosofia aristotélica foi além, uma vez que defendeu o consenso e o
acordo baseadas primordialmente na persuasão e na convicção,[59] o
que é compatível com as modernas teorias jusfilosóficas, desenvolvidas no
sentido de que Direito é comunicação e esta só é possível na sociedade
complexa.
O exposto está a evidenciar que os gregos
contribuíram significativamente para a laicização do Direito, inclusive,
trazendo bases teóricas para muitas doutrinas contemporâneas.
B. Hebreus
A história do povo hebreu está contada na Bíblia,
o que demonstra a adoção da vingança divina como regra. Eles foram regidos pelo
pentateuco, ou Torá (cinco primeiros livros da Bíblia – Gênesis, Êxodo,
Levíticos, Números e Deuteronômio -, cuja autoria é atribuída a deus por
intermédio de Moisés).
Embora o pentateuco seja rigoroso, os hebreus
contribuíram para a humanização do DCrim, reduzindo significativamente os casos
em que a pena seria a de morte. Aliás, a esse respeito, é oportuno o alerta de
Thomas More, no sentido de que “a própria lei de Moisés, lei dura e vingativa,
feita para escravos, gente obstinada e embrutecida, apenas punia o roubo com
uma indenização e nunca uma morte”.[60]
Para os hebreus, a justiça podia ser encontrada
na religião. O pentateuco, primeiros cinco livros da Bíblia, traduz o que
pensavam os hebreus, ou seja, a justiça provém de Deus. Esse pensamento
religioso dos hebreus é de extrema importância para o Direito, inclusive na
atualidade. Kant, por exemplo, negou Deus em sua Crítica da razão pura,
O aceitou em sua Crítica da razão prática e O encontrou na Crítica do
Juízo.[61]
É certo que Kant se dedicou à filosofia, não à teologia. Por isso sua concepção
não é propriamente teológica, mas é certo que, embora não concebido
propriamente um pensamento religioso tradicional, ele nos remete à investigação
sobre Deus e à crítica (indagação) da metafísica.
C. Romanos
Os romanos se caracterizaram como militares e
conquistadores. A origem lendária de Roma data de aproximadamente 753 a.C.
Diz-se que eles evoluíram mais no DC, tendo pequeno destaque no DCrim. Na prática,
perderam para os gregos na fundamentação filosófica da pena, mas ganharam em
aplicação prática. O Direito era pragmático, dado por homens prudentes (daí
a palavra jurisprudência) que, ante cada caso concretizados, emitiam leis
particularizadas, aplicáveis aos casos especificados. Sem dúvida alguma, pelo
seu longo período histórico, constituiu o povo que mais contribuiu para a
evolução do DCrim, haja vista o enfoque prático de seu Direito.
Inicialmente, tanto em Roma como na Grécia, o
Direito se baseou na religião. Era uma religião doméstica em que cada pater
familia transmitia o seu poder ao filho primogênito, em face da sucessão mortis
causa, a qual não podia ser transmitida a mais de uma família porque cada
família só podia ter um deus. Essa realidade, com o tempo, se modificou em Roma
e a plebe, que antes não podia estar perante qualquer sistema de justiça,
ganhou espaço, inclusive, instituiu-se tribunos da plebe.[62]
Os romanos dividiam os crimes em públicos e
privados, sendo os primeiros resolvidos pelo Estado, por meio de seus tribunos
(até as plebes podiam escolher os tribunos das plebes), mas os segundos
pelo próprio ofendido, só que este não podia exagerar na reprimenda, a ponto de
cometer um crime público senão sofreria a intervenção estatal.
O que é interessante é perceber que, na verdade,
gregos e romanos não se instituíram de forma muito diferente. A base de ambos
estava na religião, mormente uma determinada religião doméstica, pela qual cada
família tinha um deus para si. De qualquer modo, foi o menor rigor romano quem
conduziu à maior evolução desse Direito, isso em relação ao grego.[63]
D. Germânicos
Os germânicos constituíam um povo de origem
étnica diversificada, pouco existindo sobre ele antes das invasões do Século V
a.D. Aliás, ele não registrou sua história arcaica por meio de escritos.[64]
Seu direito era consuetudinário e baseado na vingança, mas consagrou outras
instituições penais antigas. Os germânicos, com as ordálias (Juízos de Deus)
utilizaram largamente as provas de ferro e fogo, os duelos e a tortura com
ferro quente. A pessoa seria considerada inocente se não confessasse e não
morresse, mas seria culpada se confessasse ou morresse.
Antes de Cristo não existia um povo denominado
germânico. Os denominados bárbaros é que vieram a constituir o povo tudesco,
mas isso já em nossa era. Assim, antes de cristo, não poderiam contribuir para
a evolução do Direito, até porque não existiam. Outrossim, não conheciam a
escrita, sendo, conforme o próprio nome (bárbaro) indica um povo rude e, portanto,
de Direito rudimentar. Só mais tarde eles muito passaram contribuir
expressivamente para o DCrim, eis que sistematizaram os Pandectas (conjunto de
leis romanas, reunidas por determinação de Justiniano).[65]
2.5.2.6 Direito da Igreja
Em uma visão restrita, a expressão Direito
Canônico se refere àquele que rege a Igreja Católica Apostólica Romana, é
Formado pelo Corpus Iuris Canonici, constante do Decretum Gratiani (1.140),
dos Pontífices Romanos (séc. XII), de Gregório IX (1.234), de Bonifácio VIII
(1.298), de Clemente V (1.313) e de João Paulo II (25.1.1983).[66] Prefiro não falar unicamente do Direito que nos
foi dado pelos canons da Igreja Católica, preferindo falar em Direito da
Igreja como sendo todo aquele que adveio por influência do Cristianismo,
consagrado como religião única em Roma por ato do Imperador Teodósio I (379
d.C.).
O direito da igreja, exprime um período
de trevas, não trouxe muitos avanços ao DCrim, sem embargo das opiniões em
sentido contrário. Com efeito, a igreja consagra, basicamente, a vingança
divina, em que tudo constitui heresia. Foi um período de um machismo extremo em
que se procurou diminuir as liberdades que as mulheres haviam conquistado e
impossibilitar novos avanços do sexo feminino.[67] Ela não condenava à morte, tinha então um
discurso falacioso, pois classificava o homem como herege e a consequência
natural era a expiação no fogo. Mais tarde, com o iluminismo,[68] o
enfraquecimento da igreja permitiu o surgimento de pensamentos humanitários, o
que, efetivamente, trouxe evolução ao DCrim.
Na idade média,[69]
outra não era a concepção,[70]
tanto é que se ampliou a participação da igreja na sociedade, emergindo,
inclusive, a “santa” inquisição,[71]
que era comandada pelo poder religioso da época. A prisão como pena, a ser
cumprida em uma penitenciária, surgiu nesse período, a qual tornou imperioso o
surgimento da individualização da pena, talvez a maior contribuição dessa
instituição para o DCrim.
O conhecimento filosófico pouco evoluiu na idade
média, esta foi seguida do renascimento, repleto de nomes importantes para o
desenvolvimento da Filosofia. Desse período, é importante destacar o método
cartesiano, de René Descartes (1596-1650), visto que, mais tarde,
influenciou Kant.
2.5.2.7 Período humanitário
O DCrim sempre se desenvolveu de forma seletiva,
sendo que os escravos e os pobres sempre foram os que sofreram as penas mais
graves. No entanto, na segunda metade do século XVIII, começaram a se
desenvolver os sentimentos humanitários dos burgueses, sendo que um jovem
marquês escreveu uma célebre obra, Dos delitos e das penas, criticando
todo o sistema punitivo da época. O Marquês de Beccaria, de quem falávamos, um
dos maiores nomes do período humanitário, trouxe os mais nobres ensinamentos
sobre a humanidade da pena.
O período humanitário é marcado pela influência
das profundas transformações havidas na Filosofia. Descartes entendia que era
necessário se colocar em dúvida, a fim de obter o conhecimento. Assim,
rechaçava todas as verdades que lhe eram transmitidas, sempre duvidando delas.
Mas para que isso acontecesse, tinha se colocar diante de uma certeza, por ele
conhecida.
Então, estabeleceu uma verdade para si mesmo – penso
logo existo –, que se tornou o primeiro princípio da Filosofia que buscava.[72] Rosseau, já na metade do Século XVIII, sofreu
influência da postura metafísica dos seus antecessores, conforme se vê no Contrato
Social, publicado em 1757, visto que deixou claro que as leis sábias e
justas só poderiam ser redigidas por verdadeiros deuses.[73]
No entanto, ele se afasta um pouco das ideias transcendentais, quando entende
que se a vontade de Deus só nos chegar por homens escolhidos, a verdade se
apresenta deturpada. Assim, é melhor que os homens procurem conhecer a justiça
pelos seus próprios sentimentos, pela razão. Com efeito, na obra nupercitada,
consta a proposta de uma religião civil, que é formada pela vontade humana,
afastando-se das questões meramente sentimentais.[74]72
O momento era propício para a evolução do pensamento filosófico. Muito havia
sido descoberto na Física e na Astronomia, criando ambiente propício para o
surgimento de uma nova Filosofia, o positivismo.
Immanuel Kant (1.724 a 1.804) inaugurou uma
grande transformação no pensamento filosófico, dedicando-se, também, aos
estudos jusfilosóficos voltados à matéria criminal. Ele, por exemplo, analisou
a pena de morte, instalando-se uma polêmica entre ele e Beccaria, uma vez que
este refutava a possibilidade de aplicá-la, por violação ao contrato social, já
que este teria que ser geral. De outro modo, Kant entendia que a confluência de
todas as vontades para o contrato, formando uma única e geral, não era real.
Para Kant, posição de Beccaria, “não passa de sofisma e falsa concepção do
Direito”.[75]
Observe-se, no entanto, Beccaria e Kant
concordavam no ponto em que afirmavam que as normas deveriam se inspirar no
“princípio de que o homem deve ser sempre tratado como pessoa e nunca como
coisa, isto é, sempre como fim e não como meio”.[76]
É, assim, oportuno o estudo da Filosofia de Kant, até porque, mesmo que ele não
se ocupasse especificamente do direito de punir, o Direito se dirige a homens,
que só existirão enquanto pensantes, sendo a Filosofia importante caminho para
a compreensão dos fins e da legitimação da ciência jurídica. Também, o que se
espera hoje, com pouca chance de se alcançar, é a cultura judicial de que o
homem é sujeito do DCrim não objeto deste.
Em geral, o acadêmico durante o curso de
graduação não tem a noção do quanto é importante o estudo da Filosofia do
Direito. Depois de graduado, o profissional poderá desenvolver suas atividades
como um “operador do Direito”, ou seja, um técnico preso aos dogmas e às
doutrinas trazidas por “autoridades” na matéria, ou poderá procurar conhecer um
pouco mais da ciência do Direito, tornando-se, então, imperiosa a necessidade
de se estudar Filosofia, mais especificamente, jusfilosofia. Ora, como se pôde
ver, as fases ou instituições criminais consolidadas até o séc. XVIII da nossa
era estavam impregnadas das visões filosóficas de cada período.
2.5.2.8 Período criminológico
No final do século XIX emergiram alguns
pensadores, sendo que um médico legista, Cesare Lombroso (1835-1909), atribuiu
a causa do crime a anomalias biológicas do agente, tendo instituído a biologia
criminal. Dos seus estudos nasceu uma ciência, a Criminologia.
Enrico Ferri (1856-1929), outro grande nome da
época, se insurgiu contra a ideia de que havia um delinquente natural
(criminoso nato). Para Ferri, o homem é produto do meio, sendo que a anomalia
do agente seria sociológica, não biológica.
Finalmente, emergiu Raffaele Garofalo
(1851-1934), que atribuiu a causa do crime a uma anomalia moral do agente, a
qual poderia decorrer de problemas antropológicos ou sociológicos, tendo
defendido a pena de morte porque, segundo ele, algumas pessoas têm o caráter
tão deturpado que não mais podem ser recuperadas. Dessa forma, a pena passou a
ser um meio de defesa social e de cura do delinquente.
Essa visão reducionista do DCrim decorre da
evolução de concepções positivistas da Filosofia. Afirmei que conhecer o
pensamento de Kant é fundamental, isso porque só depois que ele conseguiu
desenvolver um conhecimento fundado na razão, e conseguiu afastar as concepções
de espaço e tempo de concepções transcendentais é que houve grande evolução na
Filosofia.[77]
Hegel (1770-1831), com seu subjetivismo foi um neokantiano, assim como foram
praticamente todos os outros jusfilósofos da modernidade.
A influência do pensamento Kantiano, conforme
ensina Cláudio de Cicco, na apresentação do livro Doutrina do Direito,
foi decisiva para se adotar as máximas do Direito Romano no mundo moderno, com
o surgimento das Escolas Histórica e das Pandectas no século XIX para rever e
sistematizar o Direito Romano Clássico e Justiniano.[78]
Kant chama de Direito o conjunto de leis
suscetível de uma legislação anterior.[79]
Seu pensamento, baseado na crítica, é fenomelista, no sentido de reduzir o
conhecimento científico àquilo que se pode apreender dos fenômenos. Não
obstante, o conhecimento se dá pela crítica, sendo, dessa forma, parecido com
René Descartes, visto que este se colocava em uma posição de dúvida e Kant
procurava estabelecer uma postura crítica. Por oportuno, não é demais lembrar
que a palavra crítica, para Kant, significava indagar, inquirir,
perscrutar, ou seja, a busca pelo conhecimento.
A discussão, desde Kant gira em torno de dois
mundos – o do ser e o do dever ser –, havendo séria discussão sobre o assunto.
A partir de Kant, procura-se saber à qual deles pertence a Ciência do Direito.
Ainda mais ferrenha é a discussão sobre a possibilidade de se incluir valores
na concepção do Direito. De um lado, se diz que o Direito é uma ciência
valorativa e de outro se nega a presença de valores no Direito. Essa discussão,
que a priori parece não trazer significativos reflexos práticos, tem
demonstrado, ao longo dos anos, o quanto é importante, mormente diante da
oscilação dos pensamentos. Finalmente, convém lembrar que Kant procurou
conciliar empiria e razão, mas de uma forma estática.
Embora tenha afirmado que conhecer o pensamento
kantiano é fundamental, reconheço a grande dificuldade em apresentá-lo, visto
que é extremamente complexo. Com efeito, Kelsen chega a afirmar
peremptoriamente que a filosofia de Kant é essencialmente jusnaturalista,[80]
sendo que a análise de suas afirmações nos leva à conclusão de que há relativa
razão em sua afirmação, tendo em vista que o próprio Kant afirma que o ponto de
vista meramente transcendental é o da natureza da razão pura.[81]
Não obstante a complexidade de seu pensamento,
apresento uma ideia simplista a respeito do que ele traduz:
Immanuel Kant classificou os juízos em: a
priori [anterior à experiência]; a posteriori [depende da
experiência sensorial]; e sintético [o predicado não está contido no
sujeito]. Valorizou o juízo sintético a priori por ser universal e
necessário, além de ampliar o conhecimento. Defendeu a impossibilidade de
conhecermos as coisas em si mesmas, mas apenas tal como as percebemos [o ser
para nós]. Tentou formular a síntese entre sujeito e objeto: ao conhecermos a
realidade, construímos mentalmente o mundo.[82]
Para Kant, o direito de punir situa-se dentre
aqueles que nos é dado. A justiça se manifesta na lei de talião e, em casos em
que seja impossível alcançar a proporcionalidade objetiva, deve-se buscar o
equilíbrio entre a ofensa ao objeto jurídico objetivamente considerado e a
honra que se busca resgatar, que é subjetiva.[83]
Para não deturpar seu pensamento, transcrevo sua conclusão a respeito:
“O imperativo categórico da justiça criminal (a
morte injusta de outro deve ser punida com a morte) conserva sua força; todavia
o erro da própria legislação (por conseguinte da constituição civil), como
bárbara e grosseira, é que os motivos da honra no povo (subjetivamente) não
querem pôr-se de acordo com as regras que são (objetivamente) conformes a seu
objeto; tanto que a justiça pública que parte do Estado se converte em
injustiça, com relação à justiça que parte do povo”.[84]
Na Fundamentação da metafísica dos costumes,
Kant, conforme ele próprio declarou, procurava fazer a transição da Crítica
da razão pura para a Crítica da razão prática.
Na Crítica da razão pura procurou
demonstrar que a realidade é não corresponde aos nossos sentidos, não podendo ser
apreendidas por eles. Assim, a imortalidade e Deus não poderiam ser conhecidos
porque estão além do nosso alcance e só são apreendidos pelos sentimentos
humanos.
Na Fundamentação da metafísica dos costumes tentou
construir teoricamente a fundamentação dos costumes. Concluiu que a boa-vontade
(determinação) é imperiosa para a formação dos costumes, concluindo que a razão
prática como sendo a liberdade. Essa liberdade permitiu a construção da Crítica
da razão prática, em que procurou conhecer a Deus, mas calcava a liberdade
na moral.
A influência de Kant é inegável, sendo que Hegel
foi um neokantiano idealista, distinguindo-se de Kant porque “coloca o
conhecimento em forma dinâmica, em uma síntese de processus ou de
desenvolvimento”.[85]
Hegel construiu um idealismo racional. Dizia que
tudo que é o que é racional é real e o que é real é racional, o que não
corresponde a dizer que todo o real é racional, o que ele pretendia demonstrar
era que a razão ordena o real, de modo que esse real se fizesse racional.[86] A
realidade não existe sem idealização.
Cesare Bonesana (o Marquês de Beccaria) partiu do
contrato social para justificar o direito de punir, mediante penas
proporcionais, e para repudiar a pena de morte, uma vez que a vida não poderia
ser objeto do contrato, eis que constitui bem jurídico indisponível.
Contrapondo-se a essa posição, Hegel sustenta que o Estado, de um modo geral
não é um contrato, sua essência substancial não é a proteção e a segurança da
vida e da propriedade dos indivíduos isolados. O Estado é uma realidade
superior que exige sejam a vida e a propriedade sacrificadas.[87]
Ele constitui “a ideia moral exteriorizada na vontade humana e liberdade
desta”.[88]
Hegel entendia que a pena dignifica o delinquente
como ser racional porque este ao atuar entende o conceito de crime, ou, pelo
menos, há racionalidade formal em sua conduta, manifestada pelo querer do
indivíduo. Essa racionalidade torna imperiosa a fixação do conceito e da
extensão da pena segundo a natureza do ato criminoso.[89]
Kant e Hegel, segundo Habermas, caíram no
descrédito, expondo:
Os mestres-pensadores caíram no descrédito. Para
Hegel isso é verdade há muito tempo, Popper desmascarou-o na década dos
Quarenta como inimigo da sociedade aberta. O mesmo vale, uma vez mais, para Marx.
Os últimos a abjurá-lo como um falso profeta na década dos Setenta foram os
Novos Filósofos. Hoje, até mesmo Kant vê-se colhido por essa fatalidade. Se
vejo as coisas corretamente, é a primeira vez que ele se vê tratado como
mestre-pensador, isto é, como mago de um paradigma falso, de cujo domínio
intelectual temos que nos desvencilhar. É possível que, aqui, a maioria esteja
com o número daqueles para quem Kant ainda é Kant. Mas basta lançar um olhar
por cima do muro para ver que a reputação de Kant está ficando mais pálida – e,
passa, uma vez mais, para Nietzshe.[90]
É inegável a importância de Kant e Hegel. Essa
importância é verificada nos livros de Habermas que a eles reservou espaço em
suas obras.[91]
Negar o positivismo importa em esquecer a importância da pretensão de se obter
o conhecimento pela razão humana.
É certo que fazer com que o conhecimento
filosófico tenda ao conhecimento científico, como o fez Auguste Comte, não é
salutar, mas não se pode dizer que seu positivismo não tenha valor. Aliás, vincula-se,
normalmente, a palavra positivismo a Auguste Comte porque ele trouxe essa
perspectiva científica para a filosofia.
Auguste Comte (1798-1857) foi um dos maiores
nomes do positivismo, preocupando-se com a demonstração do conhecimento. Ele se
voltou à Sociologia, publicando, inclusive, um Tratado de Sociologia. Em
síntese, pelo que se vê, o empirismo de Auguste Comte é diferente do idealismo
de Hegel, bem como do criticismo kantiano, o que demonstra que não houve um
único positivismo, mas vários.
Comte foi um fenomelista na medida em que
sustentava que só poderia ser tido como científico o conhecimento que pudesse
ser demonstrado, tendo sido um dos teorizadores do positivismo social.[92]
Ele classificou o conhecimento em três classes, a saber: teológico (provém de
Deus); metafísico (transcendental); e positivo (provém da razão humana).[93] O
sistema comtiano pode ser, em apertadíssima síntese, assim exposto:
O sistema comtiano estruturou-se em torno de três
temas básicos. Em primeiro lugar, uma filosofia da história com o objetivo de
mostrar as razões pelas quais uma certa maneira de pensar (chamada por ele
filosofia positiva ou pensamento positivo) deve imperar entre os homens. Em
segundo lugar, uma fundamentação e classificação das ciências baseadas na
filosofia positiva. Finalmente, uma sociologia que, determinando a estrutura e
os processos de modificação da sociedade, permitisse a reforma prática das
instituições. A esse sistema deve-se acrescentar a forma religiosa assumida
pelo plano de renovação social, proposto por Comte nos seus últimos anos de
vida.[94]
Comte representou, antes de assumir a forma
religiosa de renovação social, efetivo representante da perspectiva
reducionista da filosofia, mormente porque tendeu ao conhecimento apodíctico.[95] O
grande problema do positivismo filosófico foi o trazer bases fragmentárias às
pesquisas do fenômeno criminal.
Comte já apresentava uma Filosofia mais voltada
àquilo que pode ser demonstrado, eis que preocupado com os fatos sociais. Sua
concepção era positivista, pela qual a legitimação do Direito era dada pela
razão, de forma empírica.
A análise juspositivista se acentuou com Kelsen,
visto que toda a legitimação do Direito estava em uma norma fundamental, a qual
não restou bem explicada por ele. No entanto, deve-se notar que o positivismo,
por sua relevância, passou a ter muitos adeptos e, por consequência, se
desenvolveu segundo concepções diversas, que constituíram verdadeiras correntes
filosóficas.
2.5.3 Escolas Criminais
A gnosiologia
é o estudo do conhecimento. O
conhecimento desenvolvido segundo critérios seguros, sem dogmatizar os
resultados da pesquisa, é algo razoavelmente recente. Por isso afirmamos que as
escolas criminais também são recentes, visto que só consideramos as fases em que
verificamos métodos científicos de estudos.
2.5.3.1 Escola Clássica
A história exposta se refere ao período anterior
à Ciência do Direito Criminal. Esta só nasceu mais tarde, com o período
humanitário. No entanto, foi com o período criminológico (o de
Lombroso, Ferri e Garofalo) que nasceu a Escola Positiva do Direito
Criminal. Os autores dessa Escola se referiram aos do período anterior, o
humanitário, pejorativamente, dizendo que eles construíram a Escola Clássica,
a qual não adotava critérios científicos.
A Escola Clássica não se autodenominou uma escola
criminal, mas como os autores da época se valeram de critérios científicos,
é inegável que a mesma se situou na fase científica do DCrim, sendo uma efetiva
escola.
Diz-se que Paul Johann Anselm von Feuerbach
(1775-1833) foi o fundador do DCrim moderno. No entanto, segundo Basileu
Garcia, não se pode deixar de atribuir a Giovanni Carmignani (1768-847) o
lançamento da pedra fundamental da Escola Clássica. Este é tido como o mais
direto antecessor de Francesco Carrara (1805-1888), que foi a figura máxima da
Escola Clássica.[96]
A Escola Clássica preconizava que o crime
decorria de uma escolha do homem, que era detentor do livre arbítrio, podendo
optar entre o certo e o errado. A pena, com caráter transcendental, era
essencialmente retributiva e de cunho individualista.
Os maiores nomes dos pensadores da Escola
Positiva são de pessoas do período criminológico. Assim, o crime era um fator
que decorria de uma anomalia (biológica, social ou moral) e a pena era um
tratamento dispensado ao delinquente, sem se olvidar da profilaxia social.
2.5.3.2 Escola Positiva
A Escola Criminal Positiva surgiu na Itália, de
1876 a 1880, pronunciando a Itália a pátria do DCrim.[97] O
maior nome da Escola Positiva foi Enrico Ferri (1856-1929), sendo que a grande
diferença da Escola Clássica para a Escola Positiva, segundo ele próprio:
... está portanto principalmente no Método:
dedutivo, de lógica abstrata, para a escola clássica, - indutivo e de
observação dos fatos para a escola positiva; aquela tendo por objeto o crime como entidade jurídica, esta ao
contrário, o delinquente como pessoa,
revelando-se mais ou menos socialmente perigosa pelo delito praticado.[98]
Nesse embate, destacava-se o fato dos clássicos
dizerem irracionais os positivistas, haja vista que para estes o fator
determinante do crime não era o livre arbítrio, mas fatores outros pessoais ou
externos. Ora, diziam os clássicos, em sendo estranha ao infrator da norma a
causa do crime, a ele não se podia atribuir responsabilidade pelo fato.
Entretanto, Garofalo rebatia dizendo que o demérito (ou o mérito) da conduta humana
não depende necessariamente da vontade, mas da vinculação às ações que dependem
do caráter do homem, v.g., covardia e coragem não dependem da vontade do
homem, mas indicam o mérito (ou demérito) da conduta porque vinculadas ao
caráter.[99]
Comte ainda vivia quando nasceu Friedrich Wilhelm
Nietzsche (1844-1900), que foi o precursor do existencialismo. Para os
existencialistas, a reflexão filosófica restringe-se aos limites do próprio
homem e exaure-se dentro de suas fronteiras. Ocorre que Nietzsche foi pessoa
imoral (ele próprio fez afirmação nesse sentido[100])
e, ainda, sua posição foge do que se consolida em matéria criminal nos dias
atuais.
Heidegger (1889-1976) demonstrou-nos a
importância da linguagem, embora não tenha concluído sua obra Ser e Tempo.[101]
Sua visão ontológica não pode ser olvidada. Mais ainda, não devemos cair em
conceitos estéreis, o que é fundamental para o DCrim da atualidade. Também, é
importante perceber que o próprio Heidegger se insurgiu contra o fato de tê-lo
classificado como existencialista.
Para marcar a existência, a pessoa não precisa
viver contra a moral, nem dependerá de crimes que importem em anomia. O que não
se pode esperar é que a pessoa seja santa e se martirize por cada pequeno erro
seu. Outrossim, não se pode criar uma moral tão repressora em que todas
pequenas violações a ela sejam considerados crimes graves. É a sociedade,
mediante prudente análise daquilo que pode lhe ser bom, quem deve estabelecer
seus valores, mas isso deve ocorrer sem os maniqueísmos da religião e dos setores
economicamente dominantes.
É necessário que se tenha uma linguagem clara,
mormente em matéria criminal, o que torna essencial esclarecer que, para o
presente curso, a moral constitui mero costume, sendo avalorativa. Ou a pessoa
age de acordo com os costumes (conduta moral) ou contra eles (conduta imoral).
Uma conduta só poderá ser amoral se não tiver qualquer relação com os costumes
sociais.
Negar a importância de dada moralidade em um
curso de DCrim conduzirá à impossibilidade de explicação de muitas normas
jurídicas calcadas na experiência social, tendo em vista que o próprio CP cuida
de crimes contra os costumes (PE, Título VI). Daí o fato de não adentrarmos
profundamente no existencialismo.
Tal filosofia marca a transição do positivismo
para o funcionalismo criminal. O problema é que, nem mesmo Kant conseguiu
explicar a fundamentação da crítica dos costumes. Aliás, David Hume (1711-1776)
já negava a existência de uma razão
prática e a possibilidade de uma fundamentação racional da ética.[102]
Ora, sendo o Direito uma ciência cultural, se considerado como derivado
exclusivamente dos costumes sociais, não pode ser explicado racionalmente.
Ao lado do desenvolvimento do existencialismo,
cresceram alguns positivistas. Hans Kelsen (1881-1973), por exemplo, propôs a teoria
pura do Direito. Assim, este não poderia se contaminar pela inserção de
considerações valorativas. Consequentemente, a justiça proposta por ele era
avalorativa.[103]
Para Kelsen, a justiça e a legitimação deste seriam anteriores a ele, o que não
importa em esquecimento do assunto. Para ele, a justiça foi seu maior objeto de
preocupação e, portanto, de estudos.
Kelsen propôs o Direito como um sistema dinâmico
de normas.[104]
Assim, uma norma só pode ser criada se encontrar suas bases em outra norma que
lhe é superior.[105]
Porém, seu estudo conduz a certo transcendentalismo, visto que ele escreveu:
Se perguntarmos por que a constituição é válida,
talvez cheguemos a uma constituição mais velha. Por fim, alcançaremos alguma
constituição que é historicamente a primeira e que foi estabelecida por um
usurpador individual ou por algum tipo de assembleia. A validade dessa primeira
constituição é a pressuposição última, o postulado final, do qual depende a
validade de todas as normas de nossa ordem jurídica.[106]
Ora, se a norma fundamental é pressuposta,
confundindo-se a legalidade com a validade, não interessa como
ela foi instituída. Ela será válida por si mesma. Não obstante isso, Kelsen
amenizou esse entendimento, dizendo que se um poder revolucionário instituir
uma nova norma fundamental e se a nova ordem que tentar impor restar ineficaz,
não haverá norma fundamental, tendo em vista que a revolução será interpretada
“não como um ato criador de Direito, como ato lícito, não como o
estabelecimento de uma constituição, mas como um ato ilícito, como crime de
traição, e isso segundo a velha constituição monárquica e sua norma fundamental
específica”.[107]
Pelo que se vê o critério hipotético da norma fundamental de Kelsen está em uma
certa eficácia mínima, nunca esclarecida adequadamente por ele.
No final da sua vida, Kelsen disse que não
conseguiu alcançar um conceito geral de justiça. Em seu livro A ilusão da
justiça, Kelsen se voltou à Filosofia grega antiga, manifestando opção
jusnaturalista. Conforme ensina Mário G. Losano, ele declarou que a justiça é
relativa, expondo:
Abri este ensaio com a pergunta “o que a justiça?”.
Agora, chegando ao fim, percebo nitidamente que não respondi. Minha única
desculpa é que, nesse aspecto, estou em ótima companhia: teria sido muita
pretensão levar o leitor a crer que eu poderia ter êxito onde falharam os
pensadores mais ilustres. Por conseguinte, não sei, nem posso dizer o que é
justiça, a justiça absoluta que a humanidade está buscando. Devo contentar-me
com uma justiça relativa e só posso dizer que é a justiça para mim. Uma vez que
a ciência é minha profissão e, portanto, a coisa mais importante da minha vida,
a justiça, para mim, é a ordenação social sob cuja proteção pode prosperar a
busca da verdade. A minha justiça,
portanto, é a justiça da liberdade, a justiça da democracia: em suma, a justiça
da tolerância.[108]
Ressalte-se que Kelsen mudou seu pensamento e a
sua teoria pura do direito, de 1933-1934, já não se revestia mais do
mesmo sentido, visto que saiu da Áustria, meio cultural de língua alemã,
passando a viver nos Estados Unidos da América, onde conviveu com um Direito
banhado na experiência social, dando maior relevo à eficácia.[109]
Reduzir o Direito a normas, ou aos fatos, importa
em reduzir muito seu âmbito de abrangência.[110]
Daí Miguel Reale ter proposto uma teoria tridimensional, envolvendo fato, valor
e norma.[111]
No entanto, entendo que há razão parcial no jusfilósofo pátrio. Embora os
valores devam ser excluídos, pode-se dizer que o Direito é norma e fatos,
emergindo destes últimos.
Conforme exposto anteriormente, Kelsen alterou
sua posição depois que morou por certo tempo nos Estados Unidos da América,
passando a atribuir valor ao costume, in verbis:
Dessuetude é o efeito negativo do costume. Uma
norma pode ser anulada pelo costume, ou seja, por um costume contrário à norma,
assim como pode ser criada pelo costume... Deve-se admitir que qualquer norma
jurídica, mesmo uma norma estatutária, pode perder sua validade por dessuetude.[112]
Nesse diapasão, uma observação deve ser feita,
Kelsen não entende que os conceitos de validade e de eficácia se confundem,
para ele são fenômenos diversos, expondo que “a norma anulada por dessuetude
foi válida durante um espaço de tempo considerável sem ser eficaz. É apenas uma
carência continuada de eficácia que põe fim a validade”.[113]
Não se olvide que muito antes da proposta Kelsiana,
no sentido de que o Direito é um sistema dinâmico de normas e de que ele não
pode prescindir dos costumes, outras construções se desenvolveram em torno da
Sociologia e da Economia, passando a legitimar o sistema jurídico, ora de
acordo com o sistema econômico, ora pelo sistema social. Aliás, conforme
veremos a seguir, os Estados Unidos da América muito se desenvolveram em
Sociologia, mantendo um forte vínculo entre tais sistemas.
2.5.3.3 Funcionalismo
O funcionalismo apresenta uma perspectiva
sistêmica do DCrim aproximando-o da Política Criminal. As noções positivas do
DCrim levaram aos conceitos estéreis dos elementos do crime, visto que a
fragmentariedade do conhecimento científico exigiu a delimitação dos objetos de
estudos, como, por exemplo, levou ao isolamento da relação de causalidade e à
sua vazia conceituação. É com vista à construção de um DCrim mais atento às
necessidades sociais e à sua análise complexa que se desenvolveu o
funcionalismo.
Por transcender aos limites do homem, enquanto
ser, Heidegger repudiou sua classificação como existencialista, mas jamais
abandonou o enfoque ontológico, com marcante penetração no universo da
linguagem.[114]
É nesse ponto que a filosofia heideggeriana se aproxima deste curso de DCrim,
haja vista que o enfoque moderno de delito tem maior preocupação prática e,
mais ainda, é necessária a incursão no discurso para se entender aquilo que se
propõe como norma jurídico-criminal e como delito.
Um dos nomes frequentemente citados na doutrina
criminalista pátria é o de Claus Roxin, pessoa que buscou suas bases em Jürgen
Habermas. Este, por sua vez, deu especial destaque a Nietzsche e Heidegger,[115]
o que permite concluir que o mínimo de atenção às posições de referidos
filósofos é necessária.
Surgiram algumas escolas ecléticas (Terceira
Escola Alemã, Terceira Escola Italiana e Escola de Defesa social –
França) que, obviamente, conjugaram os ensinamentos das duas escolas
anteriores. Daí, a pena ser admitida como retribuição (castigo) e como
utilidade (instrumento para reintegração social do criminoso e de defesa
social). Não obstante a terza escola ter sido duramente criticada por
Ferri, por entender que se operou “uma mistura de conclusões entre várias
contraditórias, esquecendo-se que a divergência entre as duas grandes escolas
não é tanto nas conclusões particulares e propostas como no método de indagação
científica”.[116]
De qualquer modo, conforme informa Álvaro Mayrink, também, “o positivismo
criminológico está sepultado definitivamente”.[117]
Hoje, fala-se em Direito Criminal Mínimo, para o
qual as condutas menos graves não devem estar inseridas nas leis criminais.
Outros autores pugnam pela extinção da pena, com a criação de medidas
substitutivas, essenciais para a defesa social (Escola da Nova Defesa Social).
De outro modo, há quem propõe a criação de medidas curativas extras-criminais, crendo
que o DCrim deve ser abolido (teorias abolicionistas). Essas posições
hodiernas são compatíveis com a evolução jusfilosófica. De qualquer modo, como
as teorias jusfilosóficas da atualidade são demasiadamente abertas, dão ensejo,
também, ao oposto, como é o caso do Direito Penal do Inimigo.
A crença é algo humano, foi o homem quem a
inventou, mas percebe-se que ela é vista como sendo sobrenatural. Fustel de
Coulanges deixou claro que não há a mínima razão na pretensão de transformar a
crença em transcendental,[118]
até porque nasceu no homem. É por isso que se deve tomar cuidado com a
criatura, a fim de não se tornar escravo da própria criação.
Todas as perspectivas filosóficas calcadas na
teoria do conhecimento esbarraram no existencialismo, que teve como expoente o
– já citado – Martin Heidegger, centrado na pessoa humana. O existencialismo
entende que o Direito reúne conceito que envelhecem nas mãos dos juristas,
constituindo-se em odiosa justiça porque abstrata e impessoal. Este pensamento
é razoável porque, baseando-se o existencialismo no homem, serve para aproximar
o Direito de seu fim último que é o próprio homem enquanto ser social.[119]
Pretendendo superar o problema decorrente do
reducionismo das correntes filosóficas positivistas que se consolidaram, o
funcionalismo emergiu visando a levar em consideração todos os setores da
sociedade complexa, o que faz emergir os novos rumos do DCrim.
Houve um positivismo sociológico, chegando-se,
mais tarde, a uma fase em que o Direito passou a se confundir com a própria
Sociologia. A legitimação do Direito passou a ser vista, então, na sociedade.
Leon Duguit, por exemplo, propõe uma sociedade ditada unicamente pelas normas
sociais.
Foi esse sociologismo criminal, duramente
criticado por Kelsen, porque ele entendia que
o pensamento de León Duguit, publicado em 1901, é jusnaturalista, tendo em
vista que fundamentado no espírito social, este seria superior, metafísico, que
daria sustentação à sociedade,[120]
aliado aos outros enfoques de que tratamos, quem deu ensejo ao surgimento da
Filosofia de sistemas que será estudada adiante.
Além da concepção transcendental, houve correntes
sistêmicas diferentes que procuraram explicar a legitimação do Direito, quais
sejam: normativa política, econômica e sociológica.
Inicialmente devemos recordar a postura
metafísica, para a qual a legitimação do Direito se localiza em fontes
supra-humanas. Outrossim, é importante lembrar que a legitimação transcendental
do Direito pode se dar por duas concepções. Por uma, é um poder Divino que dá
as bases para a coercibilidade do Direito, bem como para a existência de normas
asseguratórias de direitos naturais. Pela segunda, a legitimação do Direito não
está em Deus, mas em uma outra força superior, metafísica. Em tais
perspectivas, podemos verificar certa análise sistêmica, mas segundo as leis da
natureza, que tudo regem.
O povo grego, embora sua formação antiga também
estivesse calcada na religião,[121]
contribuiu para a laicização do Direito, mas não conseguiu se afastar
completamente dos ideais metafísicos, que foram as bases de todo pensamento
jusnaturalista que perdurou até Kant, isso já foi dito. Pretende-se afastar
tais posturas jusnaturalistas na análise da imputação objetiva (moderna teoria
do delito, com reflexos na teoria da pena), tendo em vista que esta se vincula
aos diversos sistemas (setores) da sociedade complexa, como base da atual
concepção funcionalista, ou seja, restam abandonadas as construções elaboradas
no sentido de que todo universo é regulado por leis matemáticas da natureza,
ocupando agora lugar de destaque a análise multidisciplinar dos fatos.
A afirmação de Kelsen, em sua Teoria geral do
Direito e do Estado, no sentido de que a norma fundamental encontrará
fundamento de validade em outra que lhe anterior, não preenche todas as lacunas
deixadas em torno da dúvida sobre a fonte legitimadora da própria norma
fundamental. Hoje suas lições cedem lugar para a análise multidisciplinar das
normas jurídicas, cerne do funcionalismo. Com isso, sobrevêm novas teorias
jurídicas, v.g., imputação objetiva.
Sustenta-se que a Constituição, segundo Carl
Schmitt (1888-1985), “encontra seu fundamento de validade, extrai seu ser, de
uma decisão política que a antecede. Não da norma jurídica”.[122]
Aliás, não podemos nos olvidar da famosa discussão travada entre Hans Kelsen e
Carl Schmitt, em 1929, sendo que este não admitia o controle da
constitucionalidade das normas por parte do Poder Judiciário, visto que seu controle
é eminentemente político, devendo, portanto, ser feita por órgãos políticos,
não jurídicos. Essa discussão demonstrou muito claramente a opção de Carl
Schmitt pela fonte de produção do Direito como sendo o poder político.
Aqui, convém destacar que Claus Roxin, apontado
como um dos maiores teóricos do funcionalismo criminal no início do Séc. XXI
procura demonstrar que a relevância dos fatos para o Direito Criminal decorre
de política criminal, que não é dada por governantes ou poderes constituídos, mas
pelos diversos setores do sistema social,[123]
ou seja, o sistema político de Carl Schmitt distancia-se daquele que dá bases à
teoria da imputação objetiva.
Um dos estudos mais interessantes na atualidade é
o do garantismo criminal, consolidado segundo as tradições políticas de certo
povo. Porém, esse garantismo não se confunde com a proposta de Carl Schmitt,
tendo em vista que este não exigia consolidação pela tradição, mas apenas a
legitimação política do momento da produção legislativa.
É muito comum se ouvir a expressão de que o
Direito é feito pela classe dominante, em prol dela mesma. Assim, o ele se
apresenta como meio de dominação. Esta se dá em função do poder econômico, ou
seja, mantêm-se no poder somente aqueles economicamente fortes. No entanto,
inicialmente, ao aviso de Parsons, é importante destacar que o fator econômico
não é o único que contribui para o desenvolvimento social.[124]
De qualquer modo, é importante destacar o sistema
econômico. Superada a fase jusnaturalista – em que as palavras dos soberanos se
confundiam, na maioria das vezes, com a própria noção da palavra de Deus -, com
o advento da burguesia, nasceu o ideal capitalista, que deu maior destaque ao
poder econômico, com a valorização da livre iniciativa e do fim de lucro.
Poderia aqui ficar citando o pensamento
sociológico que vai de Pareto a Parsons para provar que este último influenciou
Luhmann e Habermas, pois foi professor de ambos e a sua doutrina está
marcadamente presente nos funcionalismos sistêmicos de ambos. Todavia, não me
delongarei muito porque o interessante é notar que o funcionalismo luhmanniano
é extremamente aberto e avalorativo. Este preocupa porque dá bases àquilo que
Ghünther Jakobs veio a chamar de Direito Penal do Inimigo. Por outro
lado, a filosofia calcada em uma suposta ação comunicação, a qual só poderia
possível em uma democracia ideal, de Jürgen Habermas, também é claudicante,
mormente em face da sua extrema abstração.
Nos anos 2001-2002 pessoas economicamente
influentes foram vítimas de crimes, o que trouxe à tona novamente toda
discussão em torno da utilidade do sistema criminal. Porém, não se pode
estabelecer uma política criminal segura unicamente porque um prefeito de uma
importante cidade e um Promotor de Justiça de outra foram mortos.[125]
Aliás, fatos recentes provam que leis criminais mais severas, como as que foram
instituídas nos anos 1990-2009, não resolvem o problema da criminalidade.
Resta evidente que temos sofrido as consequências
do desenvolvimento da crise social, o que é fácil de se perceber pela ousadia
dos delinquentes. Estes chegaram ao ponto de atacar a tiros de pistola e
metralhadora, no mês de junho do ano de 2002, por mero exibicionismo, a
prefeitura do município do Rio de Janeiro. Também, a cidade de São Paulo viveu
uma verdadeira guerra em Mai/2006, dizendo-se que a articulação da mesma estava
no Partido do Comando da Capital (PCC), notória facção criminosa e de ideais
políticos que nasceu nos presídios de São Paulo. Iniciamos o ano de 2017 com
várias mortes em presídios e não se pensa seriamente na solução, mas em
construir mais prisões. Nesse passo, a criminalidade só avança à galope. Desse
modo, não podemos pretender resolver o problema da criminalidade nos valendo unicamente
de leis criminais.
Uma análise sistêmica, nos termos propostos pelos
jusfilósofos que deram as bases teóricas ao funcionalismo, deve considerar
todos os setores de uma sociedade, não apenas o econômico ou o jurídico. Muitos
outros fatores (educacionais, políticos, religiosos etc.) devem ser
considerados, visto que o simples alarde causado pela ocorrência de alguns
fatos graves não é parâmetro seguro para a visão sistêmica.
Durkheim trabalhou o conceito de anomia, mormente
em sua obra, O Suicídio. Também, propôs um funcionalismo em que o crime
é essencial à evolução social. Mais tarde, até Ralf Dahrendorf, partidário de
ideia contrária – portanto defensora do rigor próprio dos movimentos de lei
e ordem veio a conceituar anomia, mas emprestando solução diversa daquela
ofertada por Durkheim.[126]
Todo funcionalismo hodierno encontra suas bases
em Durkheim, para quem o crime é normal. Para ele, para que não houvesse crimes
seria necessário um nivelamento das consciências individuais, que não é possível
nem desejável.[127]126
A visão funcionalista de Durkheim é, então, aquela que não vê o delinquente
como um ser radicalmente antissocial, como uma espécie de elemento parasitário,
de corpo estranho e inadmissível introduzido no seio da sociedade, mas,
principalmente, como um agente regulador da vida social.[128]
O ambiente doméstico de Weber lhe trouxe uma
característica híbrida. Ele oscilava entre a autodisciplina protestante de sua
mãe e a política de seu pai. O estilo de Max Weber era eminentemente crítico,
“sempre escreve contra alguém ou alguma coisa de seu tempo”.[129]
Essa postura é notadamente interessante, uma vez que neste curso procurar-se-á,
assim como fez Weber, evitar palavras duras, sendo que, assim como ele não
resistiu e criticou o governo alemão no período da primeira grande guerra,
perdendo um pouco o seu cavalheirismo.
Neste curso algumas críticas mais duras serão
necessárias, isso para evitar deixar o leitor em uma situação em que a opção
será clara. O discurso que aqui se utilizará não será dúbio e repleto de
facetas, mas tendentes a ver as normas criminais de forma crítica, tratando das
suas utilidades e/ou inocuidades.
Parsons classificava a sociedade como sistema,
mas entendia que existem subsistemas, que lhe são distintos, tais quais o
Direito, a Economia e a Política, havendo um intercâmbio em relação às demais
partes da sociedade de inputs e outputs. Assim, devem existir
mecanismos jurídicos, essenciais, para adaptar o sistema às mudanças na
estrutura da sociedade.
O fundamento da ideia de poder no sistema social.
Por outro lado, o sistema jurídico é um sistema fechado e a sua legitimação se
dá pelo procedimento, ou seja, por si mesmo, mas mediante a comunicação. Nesse
sentido, preleciona Juarez Tavares:
“Uma vez que a análise do sistema jurídico é
independente do sistema social, aquele deve ser visto como um sistema fechado e
dinâmico, no qual as noções de justo e de injusto se produzem e reproduzem,
primeiramente, por força da realidade jurídica, formada da acumulação de
informações acerca dos fatos perturbadores (input), depois, pela
necessidade de decisão fundamentada através da dogmática jurídica, como forma
de garantir a estabilidade do processo e, finalmente, pela necessidade
interpretativa que nasce da doutrina de base derivada da norma”.[130]
Esse sistema precedeu o auto-organizativo (autopoiético).
É um sistema muito parecido com o sistema cibernético, desenvolvido na
Europa e depois estudado por Canotilho. Este entende que “o paradigma dos
sistemas autopoiéticos (auto-organizativos) não é facilmente inteligível se o
não relacionarmos com a geração sistêmica que o precedeu: o sistemismo
artificialista cibernético”.[131]
Sobre tal sistema, Canotilho expôs:
As máquinas de inputs/outputs são o
símbolo de um sistemismo preocupado com o processo de conversão de
demandas políticas exógenas que entravam no interior de uma caixa negra da
política e do político, cujo mecanismo interior permanecia na penumbra, só
dando sinal através das respostas tornadas possíveis pelos circuitos de informação
e de retroacção. Os sistemas de „feed-backs‟, ou, como em
termos tendencialmente caricaturais, também se designaram – os „sistemas
retroactas‟ –, não ousavam entrar no interior mesmo do próprio sistema.
Contentavam-se com as influências recíprocas sistema/ambiente.[132]
Essa teoria geral de sistemas como paradigma que
permite ver a realidade social com a caixa negra (quando não se conhece o
conteúdo, mas para o especialista que conhece o conteúdo é uma caixa
translúcida) em interconexão com o entorno por meio dos inputs (complexas
entradas) e os outputs (complexas saídas). Dentro da caixa do sistema se
encontram entidades (subsistemas, como o subsistema Direito). Este
sistema social, por sua vez, forma parte de um sistema maior, o macrosistema. O
sistema existe em um status espacial e uma dimensão temporal, rodeado
por um entorno.[133]
O sistema fechado, como o sistema jurídico de
Kelsen, não tem conexão com o ambiente (entorno). Também, é teórico,
correspondendo à teoria de Newton da Máquina, daí sua conotação mecanicista: a
causa e o efeito estão relacionados por uma conjuntura (período curto de
tempo). Aqui, é importante perceber que a lógica sistêmica estuda as caixas
como processos de longo prazo, não como fatos. O fato tem validade conjuntural,
mas o sistema prefere uma visão teleológica, ou seja, de longo prazo. Desse
modo, a teoria de sistemas complementa a lógica ortodoxa, mas não a substitui.[134]
Tais posturas sistêmicas influenciaram
significativamente Luhmann, que, na década do ano 1960, trabalhava com sistema
reflexivo, entendendo que é necessário que os sistemas sejam diferentes e,
assim, que o sistema jurídico esteja fora do sistema social, para que seja
possível a reflexividade. O Direito, segundo Luhmann, não pode ser valorativo.
No entanto, seu fundamento de validade não pode emergir unicamente da norma,
como pensava Kelsen. Para ele, no período mencionado, havia certa reflexividade
entre os sistemas social e jurídico, sendo que “a instauração de mecanismos
reflexivos torna necessário um certo isolamento contra a interferência de
processos diferentes”.[135]
Mais adiante arremata: “Nessa medida, a reflexividade correlaciona-se com a
diferenciação funcional: por causa da diferenciação ela torna-se necessária,
mas é a diferenciação que a possibilita”.[136]
Para Luhmann, o sistema jurídico-criminal teria
um discurso diferente dos demais sistemas pertencentes à sociedade complexa,
sendo que sua própria linguagem e os institutos jurídico-criminais (crime e
pena), decorreriam da interação dos diversos sistemas da sociedade global [que
é repleta de pequenos (sub)sistemas].
A grande mudança no pensamento de Luhmann se deve
aos estudos de Humberto Maturana e Francisco Varela, que desenvolveram a
chamada teoria autopoiética para dar solução a tal mistério. Para eles, a autopoiese
no espaço físico constitui a condição última necessária e suficiente da
própria vida. Somente no início da década de 1980 que a ideia dos sistemas
autopoiéticos da biologia chegou às ciências sociais. Os grandes precursores da
teoria da autopoiese são Humberto Maturana e seu aluno Francisco Varela.
Humberto Maturana concluiu doutorado em Harvard,
em 1958, retornando ao Chile em 1960, onde passou a lecionar na Universidade do
Chile. Afirma que uma pergunta de um aluno sobre como ele poderia ter certeza
sobre a origem da vida o levou a meditar sobre o assunto. Nessas reflexões pôde
concluir que o vivo é “somente o resultado de uma dinâmica não-proposital”.
Concluiu ainda que “tudo que acontece em e com os seres vivos tem lugar neles
como se operassem como estes autorreferidos, e que minha tarefa era falar
deles, descrevendo a Francisco Varela iniciou doutorado na Universidade de
Harvard em 1967 e retornou para o Chile em 1970. Ele se transformou em
pesquisador independente e passou a discutir com Humberto Maturana. Dessas
pesquisas resultou o livro.[137]
Humberto Maturana precisava de uma palavra para
enunciar a organização do vivo de forma melhor que a expressão “organização
circular” utilizada por ele desde 1965. Surgiu, então, a palavra autopoiese.
Inicialmente, pensou que poderia utilizar a palavra autopoiese exclusivamente
para se referir aos seres vivos, mas logo percebeu que ela poderia se referir a
muitos domínios diferentes e a muitas classes de sistemas nos quais a autopoiesis
é incidental e não definitória como no caso dos seres vivos.[138]
Tais pesquisadores chilenos, em meados da década
de 1970, desenvolveram uma concepção biológica tentando explicar o fenômeno da
vida, o mistério da força vital. Explicou-se que o fenômeno da vida se dá
através da autonomia e de relações dadas entre os diversos elementos de um
sistema, no caso específico, biológico. O corpo sistêmico em que essas relações
são desenvolvidas é dotada de uma organização formada da estrutura de
seus elementos. E esse sistema é fechado, realizado em um meio próprio (espécie
de ambiente), donde se realiza o processo de (re)produção de seus elementos,
mantendo-se toda a organização, mesmo que a estrutura não seja a
mesma.[139]
Esse fechamento do sistema ao meio e produção de seus próprios elementos
constituintes é visto, pelos chilenos, como uma autoprodução (autós -
por si próprio; poiesis - criação, produção).[140]
Luhmann dizia que direito é comunicação e que
esta só é possível na sociedade. O Direito, na sua visão, passou a ser um
sistema fechado, autopoiético, que se encontrava em si mesmo. Propunha, que o
“Direito é normativamente fechado” e “cognitivamente aberto”, ou seja, para sua
auto(re)produção é necessária a comunicação entre os sistemas diferentes.[141]
Com efeito, ele dá especial destaque à comunicação, dizendo que ela só é possível
na sociedade, ensinando:
Os meios de comunicação simbolicamente
generalizados possuem, no que também são comparáveis à linguagem, uma
referência sistêmica: a sociedade. Eles se referem a problemas de relevância
para a totalidade da sociedade, regulam constelações possíveis a todo momento e
em toda parte da sociedade.[142]
Luhmann reconheceu que a sociedade é composta por
sistemas, sendo que o todo está repleto de conflitos potenciais,[143]
mas todos os meios de comunicação, na medida que se diferenciam, nada mais são
que instituições da sociedade global.[144]
Qualquer sistema é um microcosmo autônomo (econômico, religioso, político,
jurídico etc.), mas a diferença existente entre os sistemas não é de conteúdo,
mas de perspectivas.[145]
Dessa nova concepção funcionalista, é possível
ver o sistema jurídico como parte do social, pois ficou superado seu
entendimento de outrora, no sentido de que “a estrutura encadeada dessa forma é
sensível a interferências, necessitando por isso certo isolamento do
mecanismo”.[146]
No entanto, mantém-se o entendimento de que a diferenciação e autonomização
funcional do direito legislado são alcançadas e mantidas por longas cadeias
decisórias.[147]
Luhmann é, na visão de Tércio Sampaio, um dos
mais interessantes autores da Sociologia Jurídica da década de 1980.[148]
Mesmo com a morte de Luhmann, seu pensamento tem forte influência no meio
jurídico-criminal, o que é feito por intermédio de Günther Jakobs.
As visões apresentadas, bem como a de Habermas,
tem em vista a comunicação dentro da sociedade, oferecendo as bases teóricas
para a imputação objetiva, tendendo ao exame global do injusto, considerando
não apenas os critérios metodológicos do positivismo, mas os diversos sistemas
que influenciam na análise valorativa dos fatos.
Nenhum subsistema interfere diretamente no outro,
mas suas interferências ocorrerão enquanto observadas do meio do sistema
social. É nesse sistema, de primeiro grau, que se pode pensar em “interferência
subsistêmica”, não de forma direta, mas de forma eficaz; apontando uma possível
solução para a ideia lógica de que o direito necessita de um fim social, justo
e humanista. Pode-se pensar, então, em ideais democráticos (auto)produzidos no
subsistema político em conjunto com uma visão autopoiética do direito. Essa
visão é, segundo a proposta de Luhmann, importante para resguardar, por meio do
procedimento, os direitos das minorias, ou seja, elas não serão exterminadas ou
alijadas do sistema social apenas porque a maioria pretende estabelecer sua
ditadura.
Essa postura conduz o intérprete a considerar os
fatos de forma diversa, não se concebendo como jurídicas as pressões
transitórias de um único sistema, visto que as informações só se transformarão
em jurídicas após o procedimento. Antes dele, elas não poderão influenciar nas
decisões, visto que é ele quem dá segurança e permanência duradoura às normas
jurídicas. Corolário seria, segundo tal concepção, a apreciação mais segura e
garantista das normas criminais.
O acoplamento estrutural viabiliza a abertura
cognitiva do sistema jurídico, mantendo-o permeável, sensível às influências de
novas perspectivas religiosas ou morais, por exemplo, e, também,
influenciando-as, como ocorreu no Brasil em relação à proteção à concubina e
aos vínculos homossexuais. Mas essa permeabilidade precisa efetivar-se segundo
critérios e procedimentos controlados pelas próprias regras intra-sistêmicas do
sistema jurídico, tornando necessária a internalização das novas perspectivas
morais, para ficar no exemplo, através de vias dogmáticas como a edição de
novas leis ou concretizações jurisprudenciais, configurando o fechamento
normativo.[149]
149
Alopoiético, na visão de Maturana e Varela, é o
sistema que não se autoproduz, sendo controlado ou guiado por outro sistema.
Ele exemplifica os sistemas autopoiéticos por meio dos carros que são criados e
controlados por terceiros. Em um sistema autopoiético isso não ocorre, visto
que a produção o desenvolvimento se dá dentro do próprio sistema.[150]
Com efeito, alo significa “de outro”, enquanto poiese,
“produção”.
Deve-se observar que a posição de Luhmann não
corresponde exatamente à autopoiese proposta pelos criadores da teoria. Eles
entendem que a teoria só é aplicável aos seres vivos, sendo possível autopoiese
nos diversos sistemas culturais, mas ela será diferente da autopoiese dos seres
vivos. Nesse sentido, observe-se o que sustenta Humberto Maturana:
Ou, ainda de outra maneira, percebi que o ser
vivo não é um conjunto de moléculas, mas uma dinâmica molecular, Um processo
que acontece como unidade separada e singular como resultado de operar, das
diferentes classes de moléculas que a compõem, em um interjogo de interações e
relações de proximidades que o especificam e realizam como uma rede fechada de
câmbios e sínteses moleculares que produzem as mesmas classes de moléculas que
a constituem, configurando uma dinâmica que ao mesmo tempo especifica em cada
instante seus limites e extensão. É a esta rede de produções de componentes,
que resulta fechada em si mesma, porque os componentes que produz a constituem
ao gerar as próprias dinâmicas de produções que a produziu e ao determinar sua
extensão como um ente circunscrito, através do qual existe um contínuo fluxo de
elementos que se fazem e deixam de ser componentes segundo participam ou deixam
de participar nessa rede, o que neste livro denominamos autopoiese. E,
finalmente, o que dizemos neste livro é que um ser vivo é de fato um sistema
autopoiético molecular, e que a condição molecular é parte de sua definição,
porque determina o domínio de vinculação em que existe como Unidade composta.
Sistemas autopoíeticos não-moleculares, isto é, que existem como unidades
compostas em um âmbito ou domínio não-molecular, porque possuem outro tipo de
componentes, são sistemas autopoiéticos de outra classe, que compartilham com
os seres vivos o que têm a ver com a autopoiese, que, porém, que ao existirem
em outro domínio possuem outras características que os torna completamente
diferentes. Assim, por exemplo, é possível que uma cultura seja um sistema
autopoiético que existe em um espaço de conversações, porém é uma cultura, não
um ser vivo. Tenho insistido nisto, não por um simples afã repetitivo, mas
porque acredito que o mais difícil de compreender e aceitar, no que se refere
aos seres vivos, é: a) que o ser vivo é, como ente, uma dinâmica molecular, não
um conjunto de moléculas; b) que o viver é a realização, sem interrupção, dessa
dinâmica em uma configuração de relações que se conserva em contínuo fluxo
molecular; e c) que enquanto o viver é e existe como uma dinâmica molecular,
não é que o ser vivo utilize essa dinâmica para ser, produzir-se ou
regenerar-se a si mesmo, mas é que é essa dinâmica o que de fato o constitui
como ente vivo na autonomia de seu viver”.[151]
Não obstante o prestígio de Luhmann, deve-se
concordar com Luigi Ferrajoli (nascido em 6.8.1940), eis que “não importa se
otimista ou pessimista, que o mundo não pode ser de outro modo... É
assim que o cientificismo sociológico se converte em uma nova filosofia da
história e uma nova metafísica determinista”.[152]
Em oposição ao que se expôs, poder-se-ia afirmar
que Luhmann partiu de uma posição da biologia para explicar de forma discursiva
e abstrata a auto-organização dos (sub)sistemas sociais. Depois, ele utilizou o
argumento de que seus opositores utilizaram conceitos vagos para rechaçar as
objeções que foram feitas à sua teoria da autopoiesis, expondo: “Meu problema
é que o conceito foi utilizado algumas vezes de maneira imprecisa, o que levou
a ser subestimado. Ele tem uma função específica; não se pode sob qualquer
circunstância „abater‟ a autopoiesis”.[153]
Ao exame acurado da teoria sociológica de
Luhmann, todavia, percebe-se que assiste razão a Luigi Ferrajoli, tendo em
vista que se o sistema se auto(re)organiza como as células que se
auto(re)produzem para solução de alguma alopoiese no sistema, chega-se à
conclusão que a organização da sociedade se dá por ela mesma, cuja explicação
é, antes de tudo, decorrente de um causalismo que remonta o determinismo
metafísico.
A proposta de Luhmann pretende resolver o
problema da fundamentação da “norma hipotética fundamental” de Kelsen, exposta
em sua teoria pura do direito,[154]
mas entendemos que não consegue. A legitimação do Direito, para ambos, é
problema anterior, não afeto ao estudo da ciência em si.
Luhmann não classificou hierarquicamente os
elementos do sistema jurídico, como o fez Kelsen, já que as relações que se dão
entre as normas não seriam relações imperativas ou hierárquicas. Para a autopoiese,
essas relações são circulares e fechadas, fazendo-se desse ciclo uma
auto(re)produção dos elementos devido à sua organização, autonomia e
auto-referencialidade. Essa posição pode até conter alguma plausividade do
ponto de vista filosófico, que é mais abstrato e genérico que o científico, mas
seria desconstruir toda ontologia necessária à subsistência de Estados,
entender que, internamente, as normas não podem ser hierarquizadas. O caráter
pragmático do conhecimento científico não pode ser olvidado, razão pela qual as
construções teóricas estéreis devem ser repudiadas.
A visão do Direito como autopoiético procura
resolver o problema de se conseguir manter uma teoria da justiça como anterior
ao Direito, por apresentá-lo não apenas no sistema jurídico, mas principalmente
no sistema social. Tal posição não encontra maiores obstáculos porque a
(auto)produção do (sub)sistema jurídico, enquanto parte do sistema social geral
e maior, também é uma produção desse próprio sistema social,[155]
conduzindo à conclusão de que os fatos criminais, feitas com fulcro no
funcionalismo, não abandonam a observação dos diversos sistemas da sociedade
global.
2.5.3.4 Formação multidisciplinar do direito e o
funcionalismo criminal: teorias do discurso
Assim como a imputação objetiva se apresenta
segundo diferentes vertentes, do mesmo modo encontramos diferentes
funcionalismos criminais, sendo que Claus Roxin, um dos mais expressivos nomes
acerca da imputação objetiva, se apresenta seguidor do funcionalismo de
Habermas, que têm perspectiva diversa da de Luhmann.
É complexo o pensamento habermasiano,
consideração unânime em quem faz referência ao autor, fator que se caracteriza
pela sua interdisciplinariedade, da qual resulta uma imbricação de conceitos e
teorias.[156]
Desse modo, pelo que se pode apreender das suas obras, sua posição é diferente
da apresentada por Luhmann, mas com pontos muito próximos, eis que ambos
valorizam significativamente a comunicação na sociedade complexa, sendo a
posição de Habermas mais ampla, eis que insere conhecimentos da Psicologia em
sua Filosofia, enquanto que Luhmann entende que o (sub)sistema científico da
Psicologia se comunica com o (sub)sistema jurídico, mas este não se deixa
contaminar por aquele, como o faz Habermas.
O cerne da Filosofia habermasiana está em Talcott
Parsons (1902-1979), sociólogo estadunidense que desenvolveu a teoria de ação a
partir de sistemas sociais, em sua obra mais expressiva, editada pela primeira
vez na década de 1930.[157]
Por isso, Habermas, em uma das suas mais expressivas obras, Teoria da Ação
Comunicativa, reproduz basicamente a bibliografia da obra de Parsons,[158] eis
que aquele foi aluno deste.
Habermas estende a sua bibliografia – isso em
relação a Parsons – se socorrendo de filósofos germânicos da linguagem. Porém,
discurso, nada mais que discurso, é o que vamos encontrar ao longo da história
do Direito Criminal. Michel Foucault nos ensinou que a modificação da pena ao
longo dos tempos se deu apenas por força do discurso.[159]
Isso foi percebido por Habermas, que, referindo-se a Foucault, sustentou que “o
discurso associa primeiro as condições técnicas, econômicas, sociais e
políticas à rede funcional de práticas, que servem, em seguida, à sua
reprodução”.[160]
Michel Foucault, em Vigiar e Punir, nos mostrou
como a pena atroz foi largamente utilizada, sendo que a execução tinha caráter
teatral. A respeito de referida obra ele declarou:
Em Vigiar e punir o que eu quis demonstrar foi
que a partir dos séculos XVII e XVIII, houve verdadeiramente um desbloqueio
tecnológico da produtividade do poder. As monarquias da Época Clássica não só
desenvolveram grandes aparelhos de Estado – exército, polícia, administração
local – mas instauraram o que se poderia chamar uma nova "economia"
do poder, isto é, procedimentos que permitem fazer circular os efeitos de poder
de forma ao mesmo tempo contínua, ininterrupta, adaptada e "individualizada"
em todo corpo social. Estas novas técnicas são ao mesmo tempo mais eficazes e
muito menos dispendiosas (menos caras economicamente, menos aleatórias ou de
resistências) do que as técnicas até então usadas e que repousavam sobre uma
mistura de tolerâncias mais ou menos forçadas (desde o privilégio reconhecido
até a criminalidade endêmica) e de cara ostentação (intervenções espetaculares
e descontínuas do poder cuja forma mais violenta era o castigo "exemplar",
pelo fato de ser excepcional).[161]
A análise do referido livro e do texto transcrito
leva à conclusão de que efetivamente há razão em se sustentar que a forma de
manifestação do poder se modifica por meios de discursos, ora manifestados por
trágicas execuções teatrais de penas cruéis e ora evidenciados por supostas
tolerâncias, tudo para se fazer crer em uma falácia denominada pena.
A preocupação com o DCrim como produto da
linguagem, isso a partir da descrição do fato considerado como criminoso, já
foi objeto da análise de Chaves Camargo, que verificou a crise do Direito,
especialmente, do Direito Criminal.[162]161
Nesse ponto, chamo a atenção para a lição de Juarez Tavares que trata de duas
correntes das teorias do discurso, uma tendendo ao consenso (Habermas) e outra
que vê “uma diferença entre discurso teórico ou argumentativo e o discurso
prático ou discurso de aplicação” (Robert Alexy).[163]
A prática dos tribunais brasileiros, na primeira
década do Século XXI, evidenciam a preferência pela tópica, inaugurada na era
contemporânea por Karl Larenz (1903-1993), o funcionalismo é exageradamente
aberto e tenho proposto a sua conciliação com o garantismo de Luigi Ferrajoli,
a fim de estabelecer maior segurança ao sistema jurídico-criminal.
É interessante notar que até o reacionário
Niestzsche sofreu influência da cultura grega antiga (embora tendo reagido a
toda Filosofia que o antecedeu), tendo estudado os filósofos gregos[164]
e, fundamentalmente, sua formação acadêmica foi em filologia, o que demonstra,
mais uma vez, a importância da linguagem em todo avanço do conhecimento
filosófico, o que tem influenciado fortemente o sistema jurídico-criminal.
Nietzsche tem valor nas obras de Habermas e foi
extremamente importante para a filosofia de Heidegger. Tudo demonstrando que há
uma abertura cognitiva que modifica todo sistema jurídico-criminal, havendo uma
tendência de ultrapassar o positivismo para uma tópica a ser assimilada em
perspectiva funcionalista.
As leis criminais são elaboradas em meio a um
discurso calcado em aleivosias que tendem a apresentar o DCrim como a panaceia
de todos os males. São necessários subterfúgios judiciais para “salvar” leis
mal escritas, de conteúdos vagos e obscuros. Assim, de pequenos textos legais
decorrem vários livros e teses, tendentes a explicá-los. Porém, parece que o
rigor jurídico-criminal tende a incrementar a criminalidade, conforme se pode
constatar no Brasil, isso em relação a muitos crimes que tiveram tratamentos
mais severos a partir do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n.
8.069, de 12.7.1990) e da Lei dos Crimes Hediondos (Lei n. 8.072, de
25.7.1990), eis que a incidência dos crimes constantes delas aumentou diante de
tais rigores.[165]
Todo Direito sofreu influência de pensamentos
estranhos ao que se pode chamar de jurídico em sentido estrito. Depois que
houve certa laicização do Direito, isso graças ao desenvolvimento dos estudos
filosóficos, toda teoria se desenvolveu segundo o jusnaturalismo. Mais tarde
sobreveio o positivismo, na busca de uma razão lógica que legitimasse a
existência das normas jurídicas. Finalmente surgiu a intervenção dos
pensamentos sociológicos, que muito contribuíram para o desenvolvimento da
Filosofia sistêmica, desenvolvida segundo a racionalização dirigida aos fins
e a racionalização social. Todavia, entendo, que a racionalização
lógica dos fenômenos, segundo modelos seguros não pode ceder lugar à tópica,
mormente em face da insegurança desta.
Os adeptos ao Sociologismo Jurídico,
dentre os quais podemos mencionar Léon Duguit (1859-1928), entendem “a ciência
jurídica como pura observação dos fatos sociais normativos”.[166]
No mesmo sentido, Eugin Ehrlich: “Também nos dias de hoje, como em qualquer
outra época, o centro de gravidade do desenvolvimento do direito não se
encontra na legislação, nem na ciência jurídica, nem na jurisprudência, mas na
própria sociedade”.[167]
No entanto, a utopia de ter uma ordem
exclusivamente ditada pela sociedade organizada parece muito distante e,
enquanto não chega este mundo quimérico, a revolução do proletariado terá que
conviver com um normativismo político-estatal forte, necessário para
materializar os interesses da própria sociedade, ou, quem sabe, do Estado.
Nesse sentido, oportuna é a lição de Campilongo, que ensina que o “fatualismo”
representa um grosseiro reducionismo da experiência jurídica.[168]
O exposto não exclui a importância mútua do
Direito e da sociedade. Aliás, conforme ensina Adeodato, é o Direito um dos
fatores fundamentais para transformação de um mero agrupamento de seres humanos
em uma sociedade, ou seja, no sentido que o termo expressa, traduz uma forma de
comunicação social que organiza minimamente os contornos indispensáveis à
constituição de uma sociedade, daí ubi societas ibi jus.[169]
Nesse sentido, já publiquei um artigo em que discorri sobre um julgamento
tribal paquistanês, criticando a tentativa de abandonar o modelo normativo
formal e reduzir o Direito aos fatos.[170]
Ao meu sentir, o Direito tem por objeto de
estudo normas e fatos, os quais devem ser analisados inicialmente segundo o
método dedutivo, mas com abertura para empregar silogismos (inferências
mediatas) próprios do método indutivo. Esse conceito é aplicável ao DCrim,
pois este é uma parte da ciência do Direito.
De outro modo, muito embora vários autores
afirmem a possibilidade de sociedade sem direito, como dito, não parece haver
ninguém que defenda a existência de direito em isolamento; para aqueles que
veem algum sentido na palavra Direito, certamente a sociabilidade
humana, levando ao agrupamento dos seres humanos em comunidades, parece ser uma
conditio sine qua non para o aparecimento de relações jurídicas, pois
direito é interação. Portanto, mesmo havendo a defesa da existência de
sociedade sem direito, posição marcadamente minoritária entre os juristas, não
se afirma a possibilidade de Direito sem sociedade.[171]
Habermas entende que há uma crise de legitimação
do Direito, dizendo que a teoria funcionalista proposta por Luhmann é
insuficiente, expondo na conclusão de seu livro, “A crise de legitimação no
capitalismo tardio”, que a estabilização de um sistema social pode conduzir à
ofensa da dignidade humana.[172]
De fato, é preocupante, visto que o pensamento de Luhmann traduz uma
seletividade sistêmica que se dá no interior do próprio sistema,
independentemente de qualquer outra contribuição.[173]
Sendo, na visão de Luhmann, o (sub)sistema
jurídico fechado, sofre influências mediatas do meio social porque com ele se
comunica, mas poderá ocorrer de outros (sub)sistemas virem a manter o sistema
inalterado além do tempo desejado, visto que às vezes o procedimento poderá ser
lento. Desse modo, é oportuno o aviso de Adeodato, no sentido de que as novas
perspectivas só encontrarão lugar em democracias ideais,[174] as
quais não existem e, talvez, jamais existirão.
O funcionalismo criminal, antes de tudo, é
um estudo filosófico. Este intervém diretamente no estudo da teoria do crime,
viabilizando o nascimento da denominada imputação objetiva, que ao nosso
sentir, ante seu cunho sistêmico, retira a segurança jurídica necessária à
análise dos casos criminais, mormente quando há clamor público.
Uma sociedade só estará potencialmente apta a
dogmatizar seu Direito se houver uma relativa emancipação do sistema jurídico
em relação às demais ordens normativas e aos demais subsistemas sociais, tais
como a técnica, a religião, a moral, a etiqueta e os usos sociais, a magia, a
posse de bens e riquezas, a amizade. Tal faceta de sociedades modernas tem sido
descrita como um tipo especial de autonomia do sistema jurídico ou autopoiese (autopoiesis).[175]
Uma sociedade será tanto mais moderna quanto mais
diferenciada funcionalmente, eis que a reflexibilidade só será possível se
existirem diferenças entre os sistemas. Corolário é que, quanto mais complexa a
sociedade, mais apta estará a dogmatizar seu direito.[176]
É importante ainda notar que “para os que crêem,
narcisicamente, na onipotência da ciência jurídica, vale o aviso: há espaços no
mundo ocupados prioritariamente por outras ciências”,[177]
sendo oportuno perceber que os estudos sistêmicos constituem a regra do
momento.
Utilizando as palavras de Paulo Queiroz, posso
dizer:
O funcionalismo que, com marcada preocupação
pragmática, e como reação à excessiva abstração do finalismo, em especial ao
seu ontologismo (estruturas lógico-reais ou materiais da ação, isto é, prévias
do direito) pretende orientar a dogmática penal segundo as funções
político-criminais cometidas ao direito penal, funcionalizando-a.[178]
O funcionalismo faz a aproximação entre o Direito
Criminal, enquanto ciência, da política criminal e, com isso, permitir sua
aplicação de forma coerente e atenta aos diversos (sub)sistemas da sociedade
global, a fim de evitar sua estigmatização, esta fomentada por conceitos e
estudos estéreis, uma vez alheios à sociedade, à qual se destina.
2.5.4 DCrim no Brasil
2.5.4.1 Das Ordenações do Reino ao Código Penal
vigente
Não existe um DCrim genuinamente brasileiro. Os
silvícolas que aqui viviam ainda aplicavam a pena com base na vingança. Ao
chegar, os colonizadores desprezaram os usos e costumes dos silvícolas, impondo
suas próprias regras. Ao que consta, os portugueses visitaram o Brasil antes do
ano 1500, mas eles só vieram a se instalar aqui depois da expedição de Pedro
Álvares Cabral.[179]
No início de nossa história, vigoravam no Brasil
as Ordenações do Reino. De 1500 a 1521, vigoraram as Ordenações Afonsinas, ou
seja, não foram aplicadas aos delitos aqui concretizados. Depois, vieram as
Ordenações Manuelinas, que vigoraram de 1521 a 1603; e, finalmente, as
Ordenações Filipinas emergiram em 1603 e perduraram por muitos anos.[180]
Em matéria criminal, as ordenações foram substituídas pelo Código Criminal do
Império (1830).
Em 1890, com a república, sentiu-se a necessidade
de se criar um novo código, o qual foi denominado de Código Penal. Desde o CP
de 1890, não mais mudamos a denominação. O referido código continha uma série
de impropriedades, o que fez que fossem elaboradas muitas leis criminais,
emergindo um aparente conflito entre elas e a necessidade de se elaborar uma
consolidação das leis criminais de então, o que se deu em 1932. Tal
consolidação não vigorou muitos anos, visto que, ante o denominado Estado Novo,
com a Constituição outorgada de 1937, foi publicado o CP vigente (Decreto-lei
n. 2.848, de 7.12.1940).
O Código Penal vigente sofreu grandes alterações,
desde a sua publicação, ocorrida em 31.12.1940, visto que seus 120 primeiros
artigos (toda Parte Geral-PG) tem redação dada pela Lei n. 7.209, de 11.7.1984,
sendo que sua Parte Especial (PE) também sofreu alterações. Aliás, a própria PG
já foi significativamente modificada por leis posteriores à de n. 7.209/1984.
Foram feitas diversas tentativas de criar um novo
CP, mas, ainda, sem sucesso. Com as Constituições outorgadas em 1967 e 1969
(esta última foi denominada de Emenda à Constituição Federal n. 1), dependiamos
de um novo CP, tendo sido editado o Decreto-Lei n. 1.004, de 21.10.1969. Ele
entraria em vigor em 1.1.1970 (art. 407). Porém, a Lei n. 5.573, de 1.12.1969,
previu o dia 1.8.1970. A vacatio legis
foi ampliada pela Lei n. 5.597, de 31.7.1970, definindo o dia 1.1.1972 para
entrada em vigor. A Lei n. 5.749, de 1.12.1971, novamente ampliou o prazo de
vacância do CP, designando o dia 1.1.1973 para a sua entrada em vigor. Não
obstante, a Lei n. 5857, de 7.12.1972, designou o dia 1.1.1974 para a entrada
em vigor. Mantendo esta última data, a Lei n. 6.016, de 31.12.1973, renumerou o
art. 407 para o 402 e alterou substancialmente o CP, que existia, mas não
entrava em vigor.
Havia uma pretensão de criar um novo Código de
Processo Penal (o que está em vigor adveio do Decreto-lei n. 3.689, de
3.10.1941). Então, foi editada a Lei n. 6.063, de 27.6.1974, que dispôs: “Art. 1º O Código Penal instituído
pelo Decreto-lei n. 1.004, de 21 de outubro
de 1969, com as alterações posteriores, bem como os artigos 3º, 4º e 5º da Lei n. 6.016, de 31 de dezembro
de 1973, entrarão em vigor juntamente com
o novo Código de Processo Penal”.
Parece brincadeira, mas o CP,
existente à época, passou a ter data indeterminada para entrar em vigor. 8
anos, 11 meses e 20 dias depois da primeira publicação, o CP/1969 foi revogado,
sem nunca ter entrado em vigor, isso pela Lei n. 6.578, de 11.10.1978. Isso se
deu porque os militares já estavam se preparando para a transição, visto que
decidiram que abandonariam o poder, ou seja, o devolveria aos civis. Assim,
certamente, seria estabelecida uma nova ordem jurídica.
Miguel Reale Júnior sintetiza a história
legislativa criminal, a partir das formulações legislativas de Alcântara
Machado e de Virgílio de Sá Pereira, voltadas à punição para fins preventivos e
ao tecnicismo criminal. Ele passa pelo anteprojeto elaborado por Nelson
Hungria, em 1963, com pequenas alterações, em relação ao Código Penal de 1940,
chegando ao Código Penal de 1969, ainda baseado no critério de periculosidade.
Ao passar pelas Lis n. 6.016/1973 e 6.416/1977, ele acentua a manutenção do
critério da periculosidade, o qual é considerado precário pelo doutrinador.[181]
O Presidente da República João Baptista
Figueiredo (1918-1999) governou de 15.3.1979 a 15.3.1985, cumprindo sua
promessa do discurso de posse, no sentido de devolver o governo do Brasil aos
civis. Assim, em 5.10.1988, foi promulgada a Constituição Federal vigente, o
que tornou imprescindível um novo CP e um novo CPP.
Tem-se tentado, mas está
complicado. Na parte processual, foram criados vários projetos de lei. Veja-se:
Tentativas restaram frustradas ao longo do tempo para elaboração
de um novo CPP. Entretanto, com o intuito de modernizar a legislação processual
penal, o então Ministro da Justiça, José Carlos Dias, constituiu, por meio da
Portaria n. 61/2000, uma comissão para o trabalho de reforma... Referida
Comissão apresentou, em dezembro de 2000, sete anteprojetos que, por sua vez,
originaram os Projetos de Lei n. 4.203/2001 (júri), 4.204/2001 (interrogatório),
4.205/2001 (provas), 4.206/2001 (recursos e ações de impugnação), 4.207/2001
(procedimentos), 4.208/2001 (prisão e medidas cautelares) e 4.209/2001,
investigação criminal).[182]
Os Projetos de Lei n. 4.206/2001
e 4.209/2001 não se transformaram em leis, mas os demais sim, o que deu nova
cara ao CPP, mas ainda existem complicadores. Há o Projeto de Lei n. 8.045/2010
em tramitação,[183] mas não creio que ele venha a
ser aprovado.
Em 1998, uma comissão de alto
nível elaborou um anteprojeto que alterava a Parte Especial do Código Penal,
apresentado em 1999, mas retirado pelo então Ministro da Justiça José Carlos
Dias (Jul/1999 – Abr/2000).
Significativas alterações foram
feitas no CP, tendo sido aumentadas muitas penas, em 1990, introduzindo-se a
delação premiada para a extorsão mediante sequestro (Lei n. 8.072); em 1996,
foram alterados os crimes contra o patrimônio (Lei n. 9.426); em 1998, as penas
restritivas de direito (especialmente os arts. 43-44, em face da Lei n. 9.714),
bem como os crimes contra a saúde pública (Lei n. 9.677); em 2003, as penas dos
crimes contra a administração pública (Lei n. 10.763); em 2005, os crimes
contra a liberdade sexual (Lei n. 11.106); em 2009, os crimes contra os
costumes se transformaram em crimes contra a dignidade sexual, com
significativas alterações (Lei n. 12.015); dentre outras.
Em 2012, por intermédio do
Projeto de Lei do Senado n. 236, apresentou-se um novo Código Penal, com 542
artigos.[184] As diversas emendas havidas
levaram á Emenda n. 1, consolidada em 2015.-, com 530 artigos.[185]
2.5.4.2 Lei das Contravenções Penais e distinção
entre crime e contravenção
O Decreto-Lei n. 3.688, de 3.10.1941, constitui a
Lei das Contravenções Penais. O Código Penal trata de crimes e a Lei das
Contravenções Penais trata das contravenções. No entanto, não há
qualquer distinção ontológica ou doutrinária entre crime e contravenção, embora
nossa legislação tenha optado por uma distinção bipartida. O CP francês
de 1810 adotou a classificação tripartida, pela qual os crimes são
julgados pelo júri, os delitos pelos tribunais correcionais e as contravenções
pelos tribunais de polícia.[186]
A lei brasileira distingue crime de contravenção,
ex vi do DL n. 3.914, de 9.12.1941 (Lei de introdução ao CP e à LCP):
Art. 1º Considera-se crime a infração penal a que
a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer
alternativa ou cumulativamente com a pena de multa; contravenção, a infração
penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou
ambas, alternativa ou cumulativamente.
Pelo que se vê a “infração penal” (denominação
imprópria, uma vez que se é gênero de crime, deveria ser denominada infração
criminal), se divide em crime e contravenção segundo a pena
cominada. No entanto, essa é uma distinção vazia de conteúdo, tendo em vista
que ontologicamente não distinção prática entre reclusão, detenção e
prisão simples, já tendo, inclusive, sido proposta a redução das três
espécies a uma única, que é a prisão (Projeto de Lei n. 3.473/2000[187]).
Esta que é gênero, atualmente, daquelas, passaria a ser a única espécie de pena
privativa de liberdade. O projeto de lei foi elaborado por uma comissão de alto
nível, composta por grandes criminalistas,[188]
mas parou no Congresso Nacional porque foi tido como benevolente demais.
A distinção feita pelo DL n. 3.914/1941, expondo
que o crime será apenado com detenção ou reclusão, enquanto a contravenção será
apenada com prisão simples, ratifico, é inócua porque, na prática. Embora a
legislação criminal procure apresentar distinções, na prática, toda distinção
estará no regime de cumprimento da pena (fechado, semiaberto ou aberto).
O CP é aplicável à LCP naquilo em que ela não
dispuser de maneira diversa (LCP, art. 1º). A LCP por ser mais antiga, eis que
a PG/CP foi modificada integralmente em 1984, contém algumas disposições
dissonantes da doutrina moderna, apresentando aparente contradição com o CP,
mas esse entendimento é equivocado. Não é razoável pensar, por exemplo, que a
conduta jurídico-penal relevante para caracterização da contravenção prescinde
de dolo ou negligência (LCP, art. 3º), pois as contravenções constituem nani
crimini (crimes anões) e como tais estão sujeitas à teoria do crime,
fazendo-se mister atualizar in bonam partem os dispositivos
ultrapassados da LCP.Entendemos que o transcrito art. 3º da LCP decorre do
momento da edição da norma e que não se pode falar, hoje, em delito sem
negligência (nullum crimen sine culpa). Destarte, a contravenção, tem os
mesmos elementos do crime.
No contexto de equívocos legislativos, considero
completamente equivocada a afirmação de César Dario, construída no sentido de a
Lei n. 8.0872, de 25.7.1990, decorreu de uma extrema liberalidade da Lei n.
7.209/1984.[189]
Para mim, a lei decorreu de um retrocesso no pensamento jurídico-criminal pátrio,
conforme expus anteriormente e voltarei a tratar neste livro. Erradas são as
novas leis que, calcadas nos movimentos de lei e ordem, procuram solucionar o
problema da criminalidade por meio do agravamento das sanções criminais.
De qualquer modo, abandonar a velha distinção
entre crime, delito e contravenção (classificação tripartida das infrações
criminais), bem como a classificação bipartida (as infrações se dividem em
crimes ou delitos e contravenções), não traz qualquer inconveniente, eis que as
espécies integram o mesmo gênero e a gravidade da sanção, por suas espécies,
não apresenta critério seguro, o que esvazia qualquer argumento em favor da
distinção.
Basileu Garcia já nos alertava para a falta de
coerência na tripartição das infrações penais, dizendo que na França os crimes
são julgados pelo Júri, os delitos pelos tribunais correcionais e as
contravenções pelos tribunais de polícia, dizendo que “contraditoriamente, os
delitos, apesar de menos graves, são apreciados com maior rigor, sem as
incertezas comuns na Justiça popular. Daí o uso, pela magistratura, do expediente oficioso da correcionalização, ou
seja, a desclassificação de crimes.[190]
Isso demonstra duas coisas: a) pensar que o DCrim deve ser repressor é um
fenômeno presente na magistratura mundial; b) por ser carente de técnica, a
distinção se transforma em frágil, sem qualquer razão para subsistir. Nesse
sentido, expunha Ferri:
Juridicamente, crime e contravenções são
substancialmente de idêntica natureza enquanto são atos contrários às leis
penais, perigosos ou prejudiciais às condições de existência social. Por isso,
em vão alguns criminalistas lhes investigaram caracteres de substancial
separação sob o ponto de vista jurídico.[191]
Nos dias atuais, em face do princípio da ofensividade,
pelo qual a norma criminal só deve descrever condutas graves e que atingem ou
coloquem em risco bens jurídicos sérios, a contravenção deveria pertencer ao
campo do Direito Administrativo, conforme já previa Ferri.186 Aliás, tal
realidade já se dá no âmbito militar, eis que o CPM prevê a desclassificação da
lesão corporal levíssima para infração administrativas (art. 209, § 6º) e o
Regulamento Disciplinar para a Marinha especifica “contravenções disciplinares”
em seu título III (Dec. nº 88.545, de 26.7.1983, arts. 6º/7º).
2.6 SANÇÃO CRIMINAL E OUTRAS SANÇÕES
A autonomia relativa dos ramos do Direito
autoriza impor, em decorrência do mesmo fato, cumulativamente, pena, sanção
civil e sanção administrativa. Desse modo, aquele que praticar um delito, além
da pena, decorrente de condenação, deverá reparar civilmente o dano e poderá
ser punido administrativamente.
A reparação do dano tem natureza civil, enquanto
a perda do cargo tem natureza administrativa e a pena decorre do DCrim, mas
todas as sanções podem decorrer de um único crime. Não haverá bis in idem em
tal hipótese, assim como a pessoa absolvida criminalmente, em decorrência de
insuficiência de provas, pode ser sancionada administrativamente ou condenada à
reparação do dano.
A decisão que não comportar recurso por decorreu
do prazo para a interposição deste (transitada em julgado), produzirá a coisa
julgada formal (o fato não poderá ser novamente discutido no mesmo processo) e
desta poderá decorrer a coisa julgada material (produzirá efeitos erga omnis,
ou seja, o fato não poderá ser discutido no processo ou fora dele).
Em face da especialidade de cada ramo do Direito,
a decisão de um Juiz Criminal pode fazer coisa julgada perante a Administração
(por exemplo, o Juiz criminal vir a absolver por estar provado que o acusado
não é o autor do delito). Porém, em princípio, as decisões poderão ser
diferentes.
Um serventuário do TJDFT saiu com uma prostituta
infantil e foi preso após ela o masturbar. Ele, em sua defesa, dizia que não
houve crime porque, em se tratando de prostituta infantil, não havia objeto
jurídico (liberdade sexual) a tutelar. Eu era o presidente da Comissão
Permanente de Processo Disciplinar e propus a punição do serventuário porque,
mesmo que fosse a esposa dele, o fato atingiu gravemente a Administração. Ele
estava em um carro preto, com logotipo do TJDFT e placa oficial, em um
estacionamento do parque da cidade, satisfazendo a libido em horário de
trabalho. Assim, não interessava se o fato se referia a uma vítima ou não, mas a
uma conduta administrativamente inaceitável. A autonomia relativa dos ramos do
Direito permitia a imposição de sanção administrativa, independentemente de ser
o fato crime.
É sabido que, ante a autonomia relativa dos ramos
do Direito, a punição pode ser imposta mais de uma vez, uma vez que a
responsabilização pelo fato deve ser civil, criminal e administrativa. Assim, o
servidor público que pratica crime contra a Administração, provocando dano ao
erário, deve ser condenado a reparar o dano, à perda do cargo, e à pena.
Sou partidário da tese que propõe serem as
contravenções delitos administrativos, devendo ocupar apenas o campo
administrativo, com sanções próprias do DAdm, v.g., multa, restrição de
direitos etc. Essa proposta não é inovadora, sendo que a própria legislação
pátria menciona a “contravenção disciplinar”. Mais ainda, o Dec. n. 88.545, de
26.7.1983 (Regulamento Disciplinar para a Marinha), estabelece em seu art. 9º:
“No concurso de crime militar e contravenção disciplinar, ambos de idêntica natureza,
será aplicada somente a penalidade relativa ao crime”.
A condenação criminal, nem sempre levará à
punição administrativa. Porém, impedir a imposição de sanção administrativa (de
DAdm), em face da pena (de DCrim), importa em dizer que um exclui o outro, ou
seja, diante do transcrito art. 9º, em se tratando de crime, responsabiliza-se
criminalmente, afastando a hipótese de cumulação de sanções, o que é
incoerente.
A minha proposta decorre do atual estágio de
civilização em que nos encontramos, o que justifica a extinção das
contravenções, devendo as mesmas serem consideradas delitos estritamente
administrativos. Com efeito, a prisão é uma das sanções administrativas mais severas
que se pode impor ao militar, mas o licenciamento e a exclusão das fileiras da
corporação são mais severas.
Como o militar é norteado pela disciplina e a
hierarquia, não é razoável que uma das sanções administrativas mais graves
possa ser absorvida pela pena do crime, quando o servidor civil teria cumulação
das sanções (criminal e civil), o que constitui absurdo. Outrossim, nada mais
justifica a participação do Poder Judiciário para solucionar fatos definidos
como contravenção.
2.7 FONTES DO DIREITO CRIMINAL
2.7.1 Fontes materiais
Fala-se em fonte material (ou de produção) do Direito
Criminal, que seria unicamente o Estado. No caso, seria a União, tendo em vista
que compete privativamente a ela legislar sobre Direito Criminal (CF, art. 22,
inciso I). Não obstante isso, a própria Constituição Federal cria a
possibilidade de ser produzida norma criminal por Unidade da Federativa –
Estados-Membros e Distrito Federal –, desde que autorizada por lei complementar
(CF, art. 22, parágrafo único). Note-se que até o presente momento, nenhuma lei
complementar autorizou qualquer unidade federativa a legislar sobre o DCrim.
Ressalte-se que a CF em seu art. 22, parágrafo
único, só faz referência aos Estados. Não obstante isso, a própria CF dispõe:
“Ao Distrito Federal são atribuídas as competências legislativas reservadas aos
Estados e Municípios” (art. 32, § 1º), não sendo desarrazoada a sua inclusão
dentre as fontes de produção de DCrim.
É equivocada a inserção do município do rol de
entes federativos, não obstante o contido no art. 1º da CF.[192]
Aliás, são tantas as limitações às autonomias das unidades federativas, a ponto
de permitir afirmar ser o Brasil um Estado unitário ou, pelo menos, não ser
federação propriamente dita.
O exposto autoriza concluir que é justificável a
vedação ao município da competência legislativa em matéria criminal. Ele não
produz DCrim. Também, é fácil perceber a mitigação do poder legiferante, em
matéria criminal, dos Estados-Membros e do Distrito Federal, haja vista que só
poderá legislar mediante autorização expressa, contida em lei complementar, e
apenas acerca de assuntos específicos.
A autorização dada por lei complementar deverá se
restringir a alguma matéria específica, que pode ser, por exemplo, regulação de
trânsito, tributária, ou de execução criminal, sendo mais fácil perceber a
aplicação prática do art. 22, parágrafo único, da CF, no tocante às matérias em
que a competência legislativa seja concorrente (tanto a União quanto a unidade
federativa podem legislar sobre a matéria).
A interpretação sistemática da Constituição
Federal induz ao sentimento de que a autorização, em princípio, não pode versar
sobre matérias em que a competência legislativa seja privativa da união, v.g.,
instituir crimes sobre Direito de Família, eis que este se situa dentro do
Direito Civil, e este só pode ser legislado pela União (CF, art. 22, inc. I).
Não obstante se for deferido ao Estado legislar sobre Direito de Família, nada
obsta a autorização para que ele legisle sobre Direito Criminal relativo à mesma
matéria. Caso o crime não venha a afetar a natureza civil dos institutos do
Direito de Família, a autorização para legislar criminalmente sobre tal matéria
independerá de autorização para legislar sobre a matéria anterior ao Direito
Criminal.
Afirma-se que o Estado “é a única fonte de
produção do Direito Penal. Contudo, para que possa exteriorizar sua vontade,
deve valer-se de algum instrumento, o qual, in casu, é a lei”.[193]
No entando, referida posição constitui reducionismo grosseiro, portanto, inadmissível.
Hoje, diante da teoria de sistemas trazida para o
Direito pela jusfilosofia de Luhmann, bem como da Filosofia da ação
comunicativa de Habermas, chegamos ao Direito Criminal funcionalista, para o
qual as normas sociais são relevantes. Ademais, há um princípio da adequação
social, cuja proposta atual é a de inseri-lo na descrição do crime, como um
elemento normativo. Dessa forma, admitindo a novel concepção, a sociedade é
fonte de DCrim, sendo importante no momento de elaboração das leis criminais, tanto
para tipificação de algumas condutas outrora tidas como lícitas, como para
exclusão de algumas condutas que o desuetudo (costume de não usar a lei)
já as retirou do âmbito do DCrim.
Diante do princípio da legalidade, a
sociedade, por si só, não pode ser considerada fonte de Direito Criminal, tendo
em vista que ela não pode criar crimes sem a intervenção do Poder Legislativo.
Também, em princípio, o desuetudo não revoga a norma, pois uma lei só
pode ser revogada por outra. Não obstante isso, é inegável que a sociedade, no
momento legislativo, influencia na produção da norma. Finalmente, é inegável
que a sociedade, no atual estágio do DCrim, ao menos indiretamente, é sua fonte
material.
É comum verificarmos em manuais de DCrim a
afirmação de que o Estado produz a norma atendendo ao espírito social ou à
consciência do povo em dado momento do seu desenvolvimento histórico.[194]
Ocorre que não há nada mais jusnaturalista e transcendental que pretender
encontrar o espírito ou a consciência de um povo.
Erasmo de Roterdam já nos alertava para o fato de
que o núcleo social, a família, está repleto de mentiras e traições e assim os
casais são felizes. Caso dissessem a verdade em todo tempo, teriam mais
conflitos e seriam mais frequentes as separações.[195]
Ora, como dentro dos lares grassam a mentira e a hipocrisia, sendo impossível
conhecer verdadeiramente os maridos e as mulheres, será mais difícil encontrar
o espírito da sociedade.
É a sociedade complexa quem constitui fonte
material do DCrim, isso ao lado dos entes federativos. Explicarei que no
contexto moderno, em que a sociedade é complexa, o Direito é comunicação e esta
só é possível no meio social. A sociedade, portanto, é fonte material do
Direito Criminal, não seu espírito ou a consciência do povo.
2.7.2 Fontes formais
2.7.2.1 Imediatas
Diz-se que a única fonte direta, imediata, do
Direito Criminal é a lei. Adotando tal postura, ela seria a “única fonte de
cognição ou de conhecimento” do DCrim.[196]
A lei deve ser vista em sentido estrito, ou seja, aquela emitida pelo Poder
Legislativo, mediante processo legislativo regular.Assim, não são fontes do
DCrim: o decreto, a portaria e a medida provisória (embora esta tenha força de
lei, não é lei).
A medida provisória, tecnicamente, não pode ser
fonte de DCrim, nem mesmo quando é descriminalizadora, ou despenalizadora. Não
obstante a vedação constitucional, o Supremo Tribunal Federal firmou
entendimento no sentido que a medida provisória que beneficia o réu,
extinguindo crime ou pena, ou ainda, criando obstáculos à punição, a partir do
momento que é convertida em lei, pode ser aplicada, pois a conversão supriria o
vício de origem, até porque a lei penal que beneficia o réu é aplicável
retroativamente.
É equivocado pensar que a medida provisória pode
ser fonte de DCrim porque a matéria criminal deve ser regulada por quem tem
efetivo poder legiferante, ou seja, o Poder Legislativo. Sendo o DCrim um ramo
mais sério, em face dos seus objetos jurídicos e das sanções que comina, suas
normas devem ser melhor discutidas, o que é incompatível a medida provisória.
Devemos lembrar que a própria CF expõe
expressamente que os direitos e garantias fundamentais nela previstos não
excluem outros decorrentes de tratados e convenções de direito internacional
(art. 5o, parágrafo 2º). A inserção de uma norma de direito internacional no
âmbito interno é feita por meio de decreto legislativo, ato do Congresso
Nacional, que tem competência privativa para tratar da matéria (CF, art. 49,
inciso I). O tratado aprovado por decreto legislativo e ratificado pelo
Presidente da República não se confunde com a lei, mas pode ser fonte de DCrim,
mormente no que concerne à aplicação da lei no espaço e com relação às pessoas,
o que será estudado no próximo capítulo deste curso.
Disse anteriormente que a sociedade é fonte
material, isso diante das novas concepções filosóficas, com importantes
reflexos no Direito Criminal. Dessa forma, se a admitirmos como fonte de produção,
o costume emergirá como fonte formal imediata, uma vez que será por meio dele
que se poderá alcançar o inteiro conteúdo da norma. Com efeito, se a adequação
social é elemento normativo do tipo, ela o complementa, integrando-o, o que
transforma o costume fonte formal imediata de DCrim.
Rogério Greco, tratando da discussão acerca da
força revogadora de leis atribuída aos costumes, expõe:
Em que pesem algumas posições contrárias, o
pensamento que prevalece, tanto na doutrina quanto em nossos tribunais, é no
sentido da impossibilidade de se atribuir essa força aos costumes. Isso porque
o art. 2º, caput, da Lei de Introdução ao Código Civil, de forma clara e
precisa, preconiza: “Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor
até que outra a modifique ou revogue”.[197]
Desde Savigny que se discute a importância do
costume, sendo que se optou por tê-lo ao lado da lei (praeter lege),
complementando o seu sentido.[198]
Em regra, o costume foi aceito como meio complementar de interpretação, mas,
ratificamos, diante da força que ele tem no DCrim moderno, não é equivocada a
sua inclusão dentre as fontes formais imediatas. Ocorre, no entanto, que a
posição de Rogério Greco é a mais adequada aos concursos públicos e aos
tribunais brasileiros.
2.7.2.2 Mediatas
A Lei de
Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Dec.-Lei n. 4.657, de 4.9.1942)
estabelece: “Art. 4º Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo
com a analogia, os costumes e os princípios gerais do direito”.
Quanto ao costume, já o dissemos, na área
criminal, toda norma deve ser analisada com um complemento, que é a adequação
social da conduta. Uma conduta socialmente adequada não pode ser crime, v.g.,
a mãe que fura a orelha da filha recém-nascida não pratica o crime de lesão
corporal, visto que sua conduta é socialmente adequada. Dessa forma, sendo a
adequação social parte integrante da norma, será fonte imediata (direta) do
DCrim, não apenas fonte mediata (indireta). Observe-se, no entanto, que a Lei
de Introdução ao Código Civil é de 1942, tendo ocorrido muitas mudanças desde
aquele ano, o que permite interpretação diversa da norma transcrita, nesse
ponto. Aliás, por oportuno, é conveniente lembrar que até o CC daquela época
foi revogado, cedendo lugar ao de 2002.
Muitos autores afirmam que o costume emerge como
fonte mediata do DCrim, mormente os autores especializados em matérias
dirigidas aos concursos públicos, que, na sua maioria, não deveriam ser
chamados de doutrinadores, mas de compiladores das idéias dominantes. De qualquer
forma, o costume também se apresenta como fonte mediata de DCrim, eis que
influencia fortemente na interpretação das normas escritas, ou seja, serve de
elemento para interpretação do contido na lei.
Não podemos deixar de ver o Direito como um sistema
integrante do sistema global, que é o social. O Direito só existe no meio
social, e, para que uma norma integre o mundo do Direito precisa passar por uma
fase de maturação. Com efeito, há uma intensa comunicação no sistema social
que, após filtradas, integram o sistema jurídico. Dessa forma, não basta a
criação de uma lei para a existência de uma norma jurídica, é necessário que
haja uma maturação para sua aceitação, caso contrário, a norma será ineficaz.
Desse modo, é inegável a importância do costume para o Direito.
Analogia é
a aplicação de uma lei a caso que ela não prevê, mas semelhante ao previsto. Em
22.12.1919 foram editados os princípios básicos do direito soviético, que
admitiu a analogia e a periculosidade social da ação e do seu autor, o que o
caracterizou até 1958.[199]
Em nosso país, a analogia só é admitida em favor do réu (in bonam partem).
Hodiernamente, em matéria criminal, a analogia in
malam partem (em prejuízo do réu) não é admitida, mas ela é admitida in
bonam partem (em benefício do réu).[200]
Com efeito, diante do princípio da legalidade, a pessoa só pode ser
acusada de crime previamente previsto em lei, não se admitindo a analogia.
A título de exemplo, examinemos o art. 235 do CP,
que estabelece o crime de bigamia: “Contrair alguém, sendo casado, novo
casamento”. Do preceito pode-se extrair: 1º) só o casamento (ato civil solene)
pode caracterizar o delito; 2º) embora a família possa ser constituída pela
união estável, não haverá bigamia se, tendo união estável, a pessoa vier a
casar.
De modo diverso, para beneficiar o agente, tem-se
admitido a analogia in bonam partem. Um exemplo corrente que se pode
apresentar é o relativo ao prazo prescricional, que se admite a detração do
prazo da prisão provisória para efeitos de cálculo da prescrição da pretensão
executória, assunto que constará do próximo volume deste curso e do qual tratei
alhures.
No próximo capítulo tratarei da interpretação.
Ali seria o local adequado para tratar da analogia intra lege, mas, por
opção didática, o farei aqui, haja vista que, embora se tratando de
interpretação, muitos a confundem com a analogia que é forma de integração da
norma (forma de preencher lacunas da lei). A interpretação analógica sequer
constitui interpretação extensiva, visto que a lei criminal ao estabelecê-la,
cria parâmetros que, ao contrário de estenderem o sentido da norma, o
restringe. O CP, no art. 121, § 2º, inciso IV, por exemplo, esclarece que
qualifica o crime de homicídio seu cometimento “à traição, de emboscada, ou
mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a
defesa do ofendido”.
O “outro recurso” mencionado no inciso parece
estender o sentido do dispositivo, eis que, além das hipóteses previstas,
admite outras. Ao contrário, o dispositivo restringe o alcance da lei, tendo em
vista que não é qualquer meio que dificulta ou torna impossível a defesa do
ofendido que constituirá qualificadora, mas somente aqueles que se equivalerem
à traição e à emboscada, v.g., surpresa.
Por princípios gerais do Direito são compreendidos
aqueles critérios norteadores da coexistência social que se estabeleceram ao
longo dos tempos. Os princípios gerais do direito têm valor integrador
(preenchedor de lacunas) da norma. É certo que eles não possibilitam reconhecer
como criminosa a conduta que não está prevista na lei, mas podem ser aplicados
em favor do réu como efetivas fontes de Direito.
A palavra princípio exprime origem, início ou começo. Todavia, em Direito a palavra princípio tem
sido empregada no sentido de critério norteador ou orientador para a
aplicação do Direito. Princípio geral do Direito seria, portanto, aquele
critério norteador do DCrim. Desse modo são exemplos de princípios gerais do
Direito norteadores do DCrim: (a) princípio de equidade: busca de se minimizar
o rigor da lei, dando-lhe interpretação mais humana; (b) princípio de isonomia:
as pessoas devem ser tratadas igualmente perante as normas, segundo as suas
igualdades. Se diferentes, devem ser tratadas desigualmente.
Outras fontes são apresentadas, quais sejam: a doutrina
e a jurisprudência. Todavia elas não são fontes, mas formas de
interpretação das normas. Não podem criar normas incriminadoras ou possibilitar
a restrição de direitos, embora a prática seja diversa. Com efeito, muitas
vezes, verificamos a doutrina e a jurisprudência criando normas incriminadoras,
inclusive contra lege.
É comum no foro ser invocado o argumento de
autoridade, ou seja, a tese de algum jurista importante, sendo oportuna a
lição de Carlos Maximiliano:
“Sempre se usou nas lides judiciárias, com
excessiva frequência, bombardear o adversário com as letras de arestos e nomes
de autores, como se foram argumentos.
O Direito é ciência de raciocínio; curvando-se
ante a razão, não perante o prestígio profissional de quem quer que seja. O
dever do jurisconsulto é submeter a exame os conceitos de qualquer autoridade,
tanto a dos grandes nomes que ilustram a ciência, como a das altas corporações
judiciárias. Estas e aqueles mudam frequentemente de parecer, e alguns têm a
nobre coragem de o confessar; logo seria insânia acompanhá-los sem inquirir dos
fundamentos dos seus assertos, como se eles foram infalíveis. Nullius
addictus jurare in verba magistri: ninguém está obrigado a jurar nas
palavras de mestre algum.[201]
Doutrinador é aquele de notório saber jurídico.
Não obstante isso, ele pode estar equivocado e induzir Juízes a adotar sua
posição. Daí ser possível concluir que a doutrina não deveria ser fonte do
Direito.
A jurisprudência é o costume dos
tribunais. Expressa a interpretação judicial consolidada. Assim, uma decisão
isolada, bem como o precedente temerário não constitui jurisprudência, mas mero
precedente de tribunal.
A jurisprudência, depois de alguma prática no
foro em geral, ao nosso sentir é contrária ao seu sentido literal, eis que
significa “direito de prudência”, ou mais, “direito de homens prudentes”. Com
efeito, ela tem se apresentado “pouco prudente”, mas é a expressão da norma
viva, ou seja da norma interpretada, sendo ela a que efetivamente vale.
A jurisprudência não poderia ser fonte criadora
de gravames ao réu, mas tem sido efetiva fonte (ao menos na prática) de Direito
Criminal. Com efeito, o STF declarou a constitucionalidade da Lei n. 11.340, de
7.8.2006 (Lei Maria da Penha) e estabeleceu a iniciativa pública
incondicionada, isso contra a literalidade da norma.[202]
2.8 POSIÇÃO ENCICLOPÉDICA
Aqui o objetivo será demonstrar a posição do
Direito Criminal na enciclopédia jurídica. Então, diremos que o ramo que
estamos cuidando é de Direito Público interno, eis que não nos ocuparemos das
normas aplicáveis pela Corte Internacional Criminal (CIC), ou seja, não
trataremos de Direito Internacional Público.
Existem divergências em torno de algumas
classificações, razão pela qual optamos pela que é dominante. Só a título de
exemplo das divergências, o Direito do Trabalho, será por nós classificado
dentro do Direito Privado, mas pequena parte da doutrina o considera integrante
do Direito Público (porque regido por normas que não podem ser alteradas e porque
o Estado tem interesse no pleno emprego), outra o considera privado (porque os
particulares podem contratar livremente, desde que atendam às normas de ordem
pública) e, finalmente, outra corrente o considera em uma zona intermediária,
entre o público e o privado (porque seria um direito social, regulado pelo
Estado, mas com normas de direito privado).[203]
O CP trata de legislação especial (art. 12), que
seria toda lei criminal não incluída nele. Assim, a lei da tortura (Lei
n. 9.455/1997) é uma lei especial, tendo em vista que referido
crime não consta do CP. Entendemos não ser necessária a distinção entre legislação
criminal especial (é aquela aplicada pela justiça especializada ou
especial) e legislação criminal extravagante (aquela não contida no
CP). No entanto, a parca cultura dos concursos públicos valoriza a distinção.
O CP faz referência expressa à lei especial como
sendo aquela que não está contida nele (art. 12), permitindo concluir que não
há, para ele, distinção entre lei extravagante e lei especial.
Porém, devo alertar para o risco de algum examinador, em concurso público,
cobrar essa inócua distinção.
É Direito público aquele que atinge mais
profundidade a sociedade, enquanto é privado aquele que interessa mais
aos particulares. Daí distinguir-se o Direito Público do Direito Privado, segundo
o interesse preponderante.
Há uma corrente doutrinária que informa que todo
Direito Internacional é público, embora se fale em Direito Internacional
privado. A denominação não transforma referido ramo do Direito em efetivamente
privado, eis que prevalecerá, ainda o interesse de Estados soberanos. Com
efeito, tal ramo do Direito trata das relações entre pessoas em seus interesses
privados, mas em relações que envolvem fronteiras distintas, v.g.,
aquisição de nacionalidade estrangeira, contratos comerciais à distância etc.,
merecendo especial atenção dos Estados para equilibrar a situação de seus
respectivos povos.[204]
O Direito Criminal externo, conforme exposto é
público. Outrossim, o Direito Criminal interno é público porque o ius
puniendi (direito de punir) é exclusivo do Estado, decorrendo do ius
imperii (direito de exercer a soberania), o que demonstra seu maior interesse
na matéria. Neste livro, nossa preocupação será com o DCrim interno, embora a
construção teórica do delito que aqui será apresentada serve de base para se
entender o que há em matéria criminal internacional.
2.9 OUTRAS CLASSIFICAÇÕES
As classificações que se seguem são apenas
algumas, talvez as que mais são encontradas nos manuais de DCrim, visando a
permitir ao leitor ler outras obras e entendê-las sem maiores problemas. São
elas:
Ø DCrim adjetivo e DCrim substantivo – classificação que toma por base a espécie de
norma que é estudada, se material (definição de crimes e penas) ou formal (diz
como se aplica a lei material) tendo perdido sentido, visto que o primeiro se
refere à forma de aplicação do DCrim substantivo, que é o material, o relativo
às normas que descrevem crimes e penas. O DCrim adjetivo ganhou autonomia,
sendo o Direito Processual (Criminal).[205]
Ø DCrim objetivo e DCrim subjetivo – esta é uma classificação também ruim, mas
largamente utilizada nos manuais, tendo em vista que se refere ao Direito
Criminal que impõe condutas (norma agendi) e ao que permite a punição de
quem viola a norma agendi. O primeiro, tendo sido concebido, também,
como o Direito Criminal escrito (objetivo) e o direito de punir (subjetivo),
decorreria daquele. É ruim porque nem todo DCrim subjetivo decorre do DCrim
objetivo. Às vezes, o direito de punir depende de outras regras, conforme já
dissemos anteriormente e melhor explicaremos nos dois capítulos que se
seguirão.
Aliás, sendo o conceito de norma jurídica é
zetético, o DCrim objetivo não pode ser considerado como aquele que ser refere
unicamente à letra da lei, haja vista que a norma viva é aquela que é
interpretada. Na interpretação, muitos aspectos estranhos à literalidade da
norma estarão inseridos, permitindo dizer que não é correto chamar de DCrim
objetivo aquele representado unicamente pela norma escrita. Outrossim, não há
correspondência entre direito objetivo e direito subjetivo, tendo em vista que
o poder subjetivo de punir (ius puniendi) não decorrerá de uma única
norma escrita, mas de um conjunto. É um sistema dinâmico de normas que
atribuirá o ius puniendi estatal, não correspondendo portanto, em
proporção igualitária, o direito objetivo com o direito subjetivo.
Ø DCrim comum e DCrim especial – classificação que leva em consideração o órgão
judicante do delito, portanto, é comum o que é julgado pela Justiça
comum. É especial, o que é julgado pela Justiça especializada.
É necessário, para a compreensão da presente classificação, conhecermos a
estrutura do Poder Judiciário no Brasil. Mas, em apertada síntese, posso
afirmar que o Direito Criminal Militar e o Eleitoral são os
denominados especiais.
A classificação não tem muito rigor técnico,
obedecendo a critérios puramente processuais, ou seja, define-se segundo a
competência. Confusão comum se dá em relação à Justiça Federal, vista pelos
leigos como Justiça especial. Assim, o crime julgado por um Juiz Federal
pertenceria ao denominado DCrim especial, o que é equivocado, haja vista que a
Justiça Federal é comum.
Reafirmando algumas classificações, alerto para a
necessidade de evitar a confusão entre conceitos distintos, a saber: a) legislação
criminal extravagante e especial – a extravagante é a comum que está fora
do CP, enquanto a especial se refere ao Direito Criminal especial (militar e
eleitoral); b) Direito Criminal especial – é o julgado pela Justiça
Criminal especializada (militar ou eleitoral); c) crime especial – tal
denominação não é utilizada correntemente nos manuais de DCrim. Não obstante,
fala-se em crime comum, que é aquele que pode ser praticado por qualquer
pessoa. De outro modo, existem os crimes próprios e os crimes de mão
própria, os primeiros só podem ser praticados por determinadas pessoas (v.g.,
mãe, pai, médico etc.) e os segundos serão praticados por cada pessoa pessoalmente
(v.g., falso testemunho), sendo, portanto, correto dizer que todo crime
que não é comum é especial, ou seja, é crime especial o crime próprio.
O crime de mão própria não é crime
especial porque embora exija a presença física do autor, pode ser praticado por
qualquer pessoa. Dessa forma, é crime comum.
2.10 CARACTERES DO DCrim
São características do DCrim:
Ø sancionador – tem por objeto jurídico aquilo que é protegido por outro
ramo do Direito, ou seja, seu objeto jurídico é, antes de ser tutelado por ele,
um objeto jurídico de outro ramo do Direito. No entanto, essa predominância
(ser sancionador), não exclui sua eventual característica de ser um ramo do
Direito com caráter constitutivo, ou seja, que tem objeto jurídico
próprio.
O DCrim é sancionador, por exemplo, quando tutela
a família, objeto jurídico originariamente do Direito Civil. De outro modo, é
constitutivo quando tutela a vida, a liberdade e a integridade física, bens
jurídicos que não provêm de outro ramo do Direito.
Toda pessoa humana, ao nascer, traz consigo
determinados direitos, os quais são denominados direitos subjetivos (v.g.,
vida, liberdade, integridade física). Com o tempo, ao longo da vida, outros
direitos subjetivos vão se acrescendo àqueles, sendo que muitos deles serão
protegidos pelo Direito. Daí falar-se em objeto jurídico, ou bem jurídico, que
nada mais é que o direito subjetivo tutelado por determinada norma jurídica.
Nem todos os fatos, embora existindo determinadas
normas que as regulem, são juridicamente relevantes, v.g., regras de boa
educação. As regras sociais, por si só, não chegam a pertencer ao mundo
jurídico. Dessa forma, uma norma social se apresenta insuficiente para que um
fato possa ser juridicamente relevante. Aqui, bem jurídico é aquele tutelado
pela lei criminal. Normalmente, esses bens já são tutelados em outros ramos do
Direito, daí dizer-se que o Direito Criminal é predominantemente sancionador,
ou seja, apenas comina sanções para bens jurídicos tutelados por outros ramos
do Direito. Não obstante, mormente entre os crimes contra a pessoa,
encontraremos bens jurídicos que são tutelados originariamente pelo Direito
Criminal (a vida, a liberdade e a honra). Assim, afirma-se, com razão, que o
DCrim é essencialmente sancionador, mas é também constitutivo,
mesmo que excepcionalmente.[206]
Ø futuro –
como regra geral, rege o futuro, ou seja, a partir da sua vigência, deixando de
lado o passado;
Ø geral –
dirige-se a todos que se encontrarem na mesma situação. Isso não impede a
criação de normas que atinja especificamente determinadas classes de pessoas,
pois o que é proibido é a criação de normas que discriminem pessoas na mesma
situação;
Ø coercitivo – o DCrim impõe condutas, ameaçando o infrator de suas normas
por meio da cominação de penas;
Ø subsidiário – só deve intervir onde os outros ramos do Direito se
mostrarem impotentes para a tutela dos seus objetos jurídicos. Aliás, não será
rara a referência nesse livro ao princípio da intervenção mínima ou da
subsidiariedade, pelo qual o DCrim não deve intervir em demasia na vida do
indivíduo.
O DCrim deve ser considerado a ultima ratio,
isto é a última cartada do sistema legislativo, quando se entende que outra
solução não pode haver senão a criação de lei criminal, impondo sanção ao
infrator. Caso o bem jurídico possa ser protegido de outro modo, deve-se abrir mão
dessa opção legislativa.[207]
Um alerta importante deve ser feito: o fato de se
procurar evitar a aplicação do DCrim não importa dizer que ele é menos
importante que os outros ramos do Direito. É, na verdade, um Direito de
última instância. Nesse sentido, esclarecedor é o exemplo de Enrique G.
Ordeig, no sentido de que os médicos, em regra, procuram solucionar os
problemas de saúde por meio de tratamentos menos gravosos que a cirurgia, mas
se eles não derem certo será feita intervenção cirúrgica. Ela é alternativa
última, mas não pode ser considerada menos importante que os outros
tratamentos. O mesmo se dará com o DCrim.[208]
2.11 DCrim, PENALOGIA, POLÍTICA CRIMINAL,
VITIMOLOGIA E CRIMINOLOGIA
2.11.1 Objeto de estudo de cada ciência
O DCrim tem por objeto de estudo normas jurídicas
que tratam do crime e das penas. O delito, sob o ponto de vista jurídico-criminal,
é estudado segundo a perspectiva normativa, cujos conceitos serão: formal,
material e analítico.
O estudo da pena em si, não é feito pelo DCrim. É
a Penalogia quem aborda o estabelecimento ou a fixação das penas.[209]
Ocorre que não se trata de um estudo isolado. Tal estudo deita suas raízes na
Política Criminal, que representa atividade do Estado e uma atividade
científica. A primeira atividade referida estabelece os fins do Estado para
neutralizar os comportamentos desviados do fenômeno delitivo e determina os
meios para a consecução desses fins.
A Política Criminal, enquanto atividade
científica, estuda todo complexo que conduz à determinação dos fins que devam
ser alcançados, como empregar o DCrim e em que medida a Política Criminal deve
atender aos princípios limitadores da intervenção.[210]
Há muito que a Criminologia é vista como ciência
auxiliar. Desde Lombroso que ela é concebida a partir do DCrim, haja vista que
estudo a causa do crime, verificando-o como fenômeno antropológico, sociológico
ou científico, mas sempre a partir da violação da norma criminal, ou seja, seu
objeto de estudo decorria de “um ato do poder político”.[211]
Zaffaroni reconhece que se tem indagado, inclusive, o seu aspecto científico,
havendo quem tenha afirmado que não se trata de ciência, mas considera
irrelevante determinar com clareza tal aspecto por a discussão teria, segundo
ele caráter especulativo e sem relevância prática.[212]
Em uma visão conservadora, a Criminologia é a
ciência que estuda o “homem criminoso e a criminalidade”.[213]
Tem-se argumentado que esse conceito se encontra superado, mas o argumento não
nos convence. Na verdade, o que se pode demonstrar é uma mudança de perspectiva
do objeto de estudo, não se podendo conceber uma ciência que não tenha objeto
de estudo.
Tal ciência tem sua autonomia científica
reconhecida, sendo que me proponho a criticá-la, não sob o aspecto pejorativo,
mas indagando sobre sua cientificidade e colocando em relevo as principais
dúvidas que devem preocupar àquele que se preocupa com o fenômeno criminal.
Já acreditei que o problema da criminalidade
poderia ser minimizado por meio da atuação preventiva da polícia. Hoje, concluo
que é imaturidade acreditar que o fenômeno criminal tem qualquer relação com o
aparelho policial isoladamente considerado.
Tenho verificado que os cientistas estão
descontentes com a fragmentariedade do conhecimento científico, tendendo às
teorias filosóficas sistêmicas. A análise do crime e da criminalidade não tem
restado isenta a isso. Ela sofre as inúmeras influências das perspectivas
sistêmicas, com especial preocupação com a filosofia do discurso.
Estou voltado ao academicismo criminológico desde
o período em que ingressei na academia de polícia, em fevereiro de 1.987, mas
meu pensamento modificou muito, sendo que estou me tornando um pessimista ante
o meu objeto de estudo. Hoje, creio na possibilidade de construir um mundo
melhor por meio da educação, da esperança, da fé em um mundo moral em que a
tradição tenha se estabelecido de forma humana.
Este estudo é aquele em que poderei apresentar
todas as minhas utopias, desejando acreditar em um homem interesseiro, mas com
hábitos limitados por uma moralidade viabilizadora de um mundo melhor. Sei que
em um país como o nosso, influenciado por uma realidade econômica globalizada,
há uma dificuldade enorme para se acreditar em sonhos utópicos, mas é
necessário acreditar na possibilidade de ver maior preocupação com os direitos
fundamentais da pessoa humana, com o respeito à dignidade e todos os outros bens
jurídicos essenciais à coexistência harmônica dos homens. É com esse enfoque
que o estudo se desenvolveu.
A proximidade da criminologia com outras ciências
é grande, a ponto de se poder afirmar ser impossível iniciar um estudo sem
demonstrar a proximidade de certos conhecimentos científicos, a ponto de eu vir
a defender a idéia da manutenção da criminologia como ciência auxiliar, cuja
construção teórica só é possível por meio da observação de vários seguimentos
do conhecimento (várias ciências). Afirmo que, assim como a estatística, a
criminologia é importante, mas extremamente falha.
Não consigo afastar um estudo teórico de sua
construção histórica. Ele deve ser feito com todo o cuidado que o estudo exige,
uma vez que a história a ser apresentada deve estar correlacionada com o objeto
da pesquisa. Também, deve-se perceber que a perspectiva é a da análise do
fenômeno criminológico, muito próxima dos fins da pena e do Direito Criminal.
Não adoto algumas correntes criminológicas que considero
reducionistas – não gosto de falar em escolas da criminologia porque reservo a
palavra “escola” para determinada corrente científica, sendo que não reconheço
a cientificidade da criminologia -, criando ambiente para tratar das diversas
correntes da criminologia crítica, todas funcionalistas, que se localizam
em um campo do conhecimento tão amplo, que prefiro dizer integrarem a
filosofia.
2.11.2 Conceituando a criminologia
Conceituar a criminologia é mais fácil do que a
definir, haja vista que podemos apresentar aspectos gerais da mesma, mas é
difícil estabelecer, inclusive a sua cientificidade.
É fácil perceber que os cientistas das mais
diversas áreas procuram explicar o fenômeno criminal tratando-o sob as
perspectivas de suas ciências. O médico psiquiatra o observa sob a perspectiva
antropológica, enquanto o jurista tem especial preocupação sob o aspecto
normativo etc. Isso torna adequado afirmar que “qualquer observação conceitual
sobre a criminologia esbarra nas diferentes perspectivas existentes nas
ciências humanas”.[214]
Na minha visão, os Criminólogos estão concebendo
a criminologia como a parte do conhecimento que se ocupa do fenômeno
criminal, investigando-o a partir de seu autor, da vítima, do ambiente em que
ele se concretiza, bem como do aparelho repressivo.
Embora se fale em sua cientificidade, prefiro
dizer que não constitui propriamente uma ciência, até porque seu objeto de
estudo é muito amplo, invadindo o campo de suas ciências. Pretender conjugar
todos os conhecimentos parciais das várias ciências que se ocupam do crime, do
criminoso e da vítima, tornando a criminologia de fusão, é uma proposta
possível, defendida pela criminologia integrada, mas de difícil
implementação, de autonomia ainda discutível, uma vez que tende a transformar o
criminólogo em relator das diversas conclusões decorrentes das várias ciências.
De qualquer modo, João Faria Júnior defende a cientificidade da criminologia,
dizendo que ela “não é, de modo algum, uma simples mistura síntese ou
constelação [de outras ciências], mas ciência autônoma porque, não obstante
valendo-se dos conhecimentos e meios de pesquisas dessas disciplinas, ela tem
finalidade, objeto e método próprios”.[215]
2.11.3 Autonomia da criminologia
O povo tende a se mobilizar em prol de uma idéia
porque manipulado, sendo essa uma das críticas que leva à defesa da democracia
e da oligarquia, em detrimento da monarquia. A política criminal de um país não
pode ser feita sem uma análise séria do fenômeno criminal.
Um povo mobilizado por argumentos falaciosos
tende às soluções meramente aparentes, sendo necessário o comedimento na
apreciação de umas informações que emergem acerca da criminalidade e do
criminoso. Nesse sentido, veja-se o que expus sobre a evolução da legislação
criminal acerca do “sequestro relâmpago” no Brasil e o incremento da
criminalidade a partir do rigor jurídico-criminal.[216]
Como a pretensão do criminólogo é ampla, sua
cientificidade é discutível. Estudar o preceito transcrito é ocupação do
jurista, o que não será feito no momento. De outro modo, analisar a
criminalidade a partir do delinquente, estarei fazendo análise médica,
psicológica etc., o que constituirá Psiquiatria Criminal, Psicologia Forense
etc. e não criminologia.
A perspectiva sociológica da criminalidade induz
à Sociologia Criminal e às Ciências da Educação, esvaziando a criminologia.
Reunir todos os conhecimentos voltados ao estudo do fenômeno criminal na pessoa
do criminólogo levará ao estudo de outras ciências, transformando o criminólogo
em filósofo, uma vez que não se preocupará em conhecer a essência do objeto de
estudo, mas uma generalidade de conhecimentos parciais que permitem a formação
de uma adequada política criminal.
O criminólogo, hoje, não se contenta em tratar do
crime pelo estudo da criminalidade e seu autor. Ele pretende ir além e estudar
a vítima – mas há quem defenda a existência de uma ciência autônoma para tratar
desta, a Vitimologia.[217]
Também, coloca em discussão do aparelho punitivo estatal, desnaturando a pesquisa
científica.
O conhecimento teológico é aquele dado pela fé.
Esta é uma coisa humana: o homem a inventou e depende dela para se perpetuar.
Por medo ou por qualquer outro motivo, ela não é questionada, esquecemos que a
“crença é obra do nosso espírito, mas não encontramos neste liberdade para
modificá-la a seu gosto. A crença é de nossa criação, mas a ignoramos. É
humana, e a julgamos sobrenatural”.[218]
Nós precisamos confiar sempre em alguma coisa,
sendo que toda política criminal se estabelece com base na crença que o caminho
escolhido é o melhor. A criminologia é, portanto, um instrumento para a
adequada fixação de determinada política criminal, propiciando uma fé nos
caminhos escolhidos para uma sociedade mais pacífica.
Teologia (ciência dos deuses) significa
estudo da divindade (seus atributos e suas relações com os homens), bem como os
estudos das escrituras concebidas como sagradas. É, sem dúvida, um estudo
permeado pela fé. É inegável, ao longo dos tempos, a interferência das crenças
no fenômeno criminal. Ocorre que certas sociedades vêem certos crimes graves
como instrumento para a formação de uma sociedade mais justa e crimes contra a
humanidade são concebidos como desejos de Deus. Por isso, espera-se a crença a
ser estabelecida pela criminologia, manifestada pela Política Criminal
decorrente, deve ser lúcida e calcada em critérios científicos.
Uma análise filosófica do fenômeno criminal,
envolvendo todos subsistemas correlatos a ele, é conveniente. Porém, não é sob
o manto de estar percebendo o todo, em face dos maléficos efeitos do delito,
que podemos estar construindo uma sociedade retrógrada e repetir práticas já
experimentadas, sem sucesso, aqui e alhures.
Já ouvi várias asneiras inadmissíveis acerca da
criminalidade. No Dia dos Professores, 15.12.2004, a imprensa veiculou uma
declaração pública do Presidente da República de então, no sentido de que a
falta de estudo e a pobreza não geram criminalidade. A declaração foi
desastrosa porque, além de fomentar o desleixo e o descaso para com os estudos,
evidencia que a sabedoria popular tende ao pior, ao contrário de trazer a
evolução social.
Está provado que certas espécies de crime ocorrem
com maior frequência em determinados meios, por exemplo: a) o delito
patrimonial não ocorre em alta escala na Índia porque ali a sociedade acredita
na estrutura social formada por castas imutáveis; b) os crimes patrimoniais
violentos são raros nos meios sociais mais cultos, pois seus integrantes podem
obter maiores vantagens sem precisar da violência; c) a pobreza leva ao desespero
e este ao delito.
Nem todo homem inculto praticará crimes violentos
contra pessoas, bem como nem todo capitalista ambicionará ascensão social
ilícita. Finalmente, nem todo pobre se desesperará. O óbvio é que o ex-Presidente
da República estava errado em suas conclusões, visto que não conseguia perceber
as relações de certos fatores com a criminalidade. Porém, seu nível intelectual
não permitia conclusões diversas daquela estapafúrdia aqui criticada, eis que
se vangloriava de ser um ex-metalúrgico, sem tentar crescer intelectualmente.
2.11.4 Método de estudo da criminologia
A preocupação com o criminoso e o fenômeno
criminal se confunde com o início da história da humanidade, sendo que, na
antiguidade, a perspectiva era religiosa. Todo delito constituía pecado, sendo
que seu combate se dava pela punição do pecador. Essa concepção, ao lado de
outras perspectivas retributivas (imposição um castigo como retribuição do mal
a quem praticou mal correspondente) permaneceu até o momento em que se
desenvolveu o positivismo, um estágio da humanidade de muitas descobertas
acerca das leis físicas.
Conhecimento positivo significa ser ele
científico, sendo que o positivismo filosófico foi assim denominado, devido à
perspectiva reducionista (fragmentária) dos filósofos do período. Foi nele que
foi inaugurada a criminologia, momento em que emergiu a Escola Positiva do
Direito Criminal, isso nos anos 1876-1880.
O período científico do Direito Criminal se
aproxima daquele em que ocorreu o nascimento do positivismo filosófico. No
entanto, a primeira escola criminal foi considerada clássica pelos criadores da
Escola Positiva do Direito Criminal, os quais inauguraram a criminologia, quais
sejam: Lombroso, com sua antropologia criminal; Ferri, que desenvolveu a
sociologia criminal; e Garófalo, instituidor da criminologia científica. Ferri,
acerca das Escolas Criminais, afirmou que o método da Clássica era o dedutivo,
enquanto que o da Positiva era o indutivo.[219]
O método da criminologia, por sua vez, é o
empírico, mas como ocorre com todas ciências humanas, “a investigação
criminológica não obedece a um único princípio nem se atém a métodos que possam
ser enclausurados em uma única perspectiva”.[220]
Dizer que a abordagem da criminologia é empírica “significa que seu objeto
(delito, delinqüente, vítima e controle social) se insere no mundo real, do
verificável, do mensurável, e não no mundo axiológico (como o saber normativo)”.[221]
Concordo com o exposto, no sentido de que a investigação criminológica é
empírica. Porém, ela leva à conclusão de que o jurista se vale apenas da norma
como objeto de estudo, tanto é que o Shecaira chega a afirmar que na
“criminologia, ao contrário do que ocorre com o Direito, ter-se-ão a
interdisciplinariedade e a visão indutiva da realidade”.[222]
2.11.5 Criminologia clássica (ou positiva?)
O período denominado de criminologia clássica corresponde
ao do nascimento da Escola Positiva do Direito Criminal, bem como da Filosofia
Positivista. Por isso, não gosto de dizer se trata de um período clássico,
anterior à sua perspectiva científica. Ao meu sentir, a investigação era
científica, racional, e, portanto, científica. Desse modo, considero
pejorativa, excludente e inadmissível a denominação Criminologia Clássica.
A antropologia criminal foi inaugurada pelo
austríaco Johan Franz Gall, no início do século XIX. Ainda no início desse
século, outros estudiosos tiveram especial preocupação com as causas biológicas
dos delitos, o que inspirou o médico legista italiano Cesare Lombroso, o qual,
após examinar, segundo ele, 617 crânios de criminosos que morreram nos
presídios em que trabalhou, lançou seu célebre livro, O Homem Delinquente, em
1.876.[223]
O livro de Lombroso apresenta, inicialmente, os
“crimes” entre os animais. Ele diz que os animais se matam, furtam, adulteram e
praticam muitos atos que, transportando para o mundo humano, constituem crimes,
constatando que o vício provoca certa tendência ao crime e afirmando que os
“animais mais inteligentes mostram maior tendência que os outros para o vício e
tornam-se como os homens, mais propensos aos atos criminosos”.[224]
É interessante notar que Lombroso procura
demonstrar que a pena produz efeitos diferentes nos animais irracionais, sendo
curiosa a reação do cavalo à punição. Ele informa que mesmo com os cavalos mais
malvados, a doçura faz mais que a severidade.[225]
Demonstrados os “crimes” praticados entre os
animais irracionais, até mesmo entre os insetos, Lombroso passa a dizer que,
desde a antigüidade, os crimes contra a vida são aceitos em certos meios, quais
sejam: aborto,[226]
homicídio de velhos, mulheres e crianças (inclui-se, portanto, o infanticídio).[227]
É importante notar que assiste razão a Lombroso
ao afirmar que o homicídio e o canibalismo inspirados pela vingança constituem
o embrião do direito social de repressão.[228]
Aqui, não posso deixar de chamar a atenção, verifico certa semelhança entre o
homem atual e o homem primitivo, uma vez que no Brasil e no estrangeiro ainda
se defende a pena de morte. Porém, deve-se destacar que referida pena encontra
maior apoio nos meios sociais menos cultos.
Ainda no cap. 2 da 1ª parte, Lombroso passa a
tratar do roubo e do furto, demonstrando que o roubo foi bem aceito em várias
civilizações (considerado profissão no Egito), incentivado entre os germanos e
glorificado entre os gregos.[229]
Também, demonstrou que o rol de crimes aumentou à medida que cresceram os
poderes dos déspotas.[230]
Isso evidencia o acerto, mesmo que parcial, daqueles que afirmam ser o sistema
punitivo estatal fruto da pretensão de domínio.
Do ponto de vista criminológico, considero
extremamente adequada a proposição de Lombroso acerca dos crimes contra os
costumes. Ele relata uma coisa evidente mais tarde: o homem é preguiçoso e não
aceita modificações abrutas nos costumes consolidados.
Lombroso percebeu aquilo que insisto em tentar
esclarecer sobre a estranha pretensão de estabelecer penas duras. Elas não
levam a nada.[231]
Os crimes contra os costumes representam, então,
aquilo que não deveriam significar, ou seja, mera dominação. Uma tentativa de
padronização cultural vazia de conteúdo lógico. É porque não se pode tentar
inovar, que os crimes se estabelecem como meio de dominação, eis que o “costume
antigo é a principal lei que se ergue da tradição revelada; em consequência,
quem quer que deseje o bem de sua alma deve sempre se conformar a ele”.[232]
Como a violação a direito subjetivo individual
não era concebido como crime, em sentido técnico, a pena representava, na sua
origem, tão-somente vingança. Então, Lombroso, a partir da vingança, passa a
apresentar as fases da pena, quais sejam: vingança privada; vingança divina;
vingança pública; duelos e ordálias (juízos de Deus); a multa, que tem suas bases
na fase da composição; penas rudimentares, como foi a antropofagia
jurídica, aplicada na ilha de Bow – Polinésia.[233]
Especial preocupação ficou evidente, isso com
respeito à loucura moral. Lombroso denomina o louco moral de delinquente
nato, que seria a pessoa privada do senso moral.[234]
A loucura moral, na visão de Lombroso, se manifesta pela cólera, eis que ela
constitui “sentimento inato ao homem: deve-se orientar o sentimento, mas não se
pode esperar fazê-lo desaparecer”.[235]
A vingança contou com relatos que levam a reações
agressivas.[236]
O mesmo pode ser dito do ciúme.[237]
Também, desmascara a máxima: “criança não mente”.[238]
Essa especial preocupação fica manifesta porque demonstra que falta senso moral
à criança.[239]
Ele continua tratando da criança, demonstrando reações reprováveis sérias,
dizendo que as tendências ao crime têm começo na primeira infância e, pior,
assim como os criminosos, as crianças não têm qualquer previsão. Suas condutas
só têm em vista o hoje, sem qualquer preocupação com o amanhã.[240]
Isso me leva a pensar no quanto é semelhante a vingança pública dos dias de
hoje com aquelas do tempo de Lombroso.
A seção 3 do mesmo cap. 3 apresenta a
“estatística antropométrica”, sendo que os tradutores do texto escreveram:
A identificação de indivíduos através de dados
antropométricos costumava ser uma operação aleatória da polícia em tempos
passados. Os passaportes de assinalamento, os indícios para a captura de
criminosos fugitivos eram irrisórios. Observava-se a estatura, a corpulência a
idade, a cor dos olhos, cabelos, barba e as disposições fisionômicas, tudo
através de adjetivação imprecisa: alto baixo, magro, gordo, velho, moço etc. O
escritor Camilo Castelo Branco riu-se desse vezo, definindo um dos seus personagens
como tendo feições regulares como as de um passaporte. Lacasagne cita um
mandado de prisão expedido pela polícia de Budapeste contra o chamado
Weltner, ou Papa de 36 anos, estatura média, certa corpulência, rosto oval, tez
colorida, cabelos castanhos escuros, nariz regular, olhos e pestanas sombrios,
bigodes médios, caídos. Sinal particular: semelhança pronunciada com Milão,
ex-rei da Sérvia. Quanta gente podia ir à cadeia?[241]
A crítica transcrita, ao meu sentir, é adequada.
Com efeito Lombroso fez um grande esforço para encontrar características
comuns, analisando 79 crianças internadas em uma casa de correição. Ao final
ele conclui encontramos “somente sete 8,9% que nada tinham de anormal em sua
constituição”. Ocorre que ele considerou anormal: com orelhas de abano,
mandíbula proeminente; fronte coberta; olhos pequenos e vidrados; olhar
oblíquo; estrabismo; cabelos muito espessos; fisionomia senil; ferimentos na
cabeça; boca deformada; queixo recuado; olhar sombrio; defeito cardíaco; dentes
superpostos etc.[242]
Na tentativa de demonstrar o atavismo, Lombroso
se volta à análise da ascendência dos observados. Nesse ponto devo concordar
com ele, uma vez que ele considera “refinada hipocrisia, encoberta pela máscara
da virtude”, não constatar os marcos trazidos pela anomalia moral dos
ascendentes.[243]
Lombroso se preocupa com os “castigos e meios
preventivos do crime entre as crianças”. Ele diz que eles podem influenciar
perante aqueles que são naturalmente bons, mas são ineficazes perante criminosos
natos.[244]
Não posso concordar com Lombroso, haja vista a radicalidade de sua posição. Não
podemos reduzir o fenômeno criminal à antropologia, pois muitos fatores
concorrem para o delito.
Lombroso tem razão ao dizer que, nem sempre, as
penas duras, os castigos, trazem bons resultados e, curiosamente, as casas de
correção produzem resultados diversos dos desejados.[245]
Durkheim nos ensinou que o suicídio anômico
decorre de muitas causas, a maioria vinculada aos problemas familiares. Uma
pessoa adaptada sem regras, sem limites, se frustrará ao ser lançada à
responsabilidade e aos limites trazidos pela sociedade, podendo decorrer daí o
suicídio.[246]
Tal estudo deixa evidente a necessidade de impormos limites aos nossos filhos, educando-os
para uma vida em que terão a se submeter às mais variadas regras.
A maioria dos autores diz que Lombroso analisou
383 crânios. Ele informa ter analisado 617. A segunda parte do livro de
Lombroso está baseada na análise de 383 crânios, o que não significa que ele só
tenha examinado tal quantidade. De qualquer modo, Lombroso chegou à conclusão
de que a pesquisa não atendeu suas expectativas, uma vez que ele mediu
diâmetros do cérebro, mas as anomalias não eram constantes.[247]
A pesquisa feita por Lombroso parece ter
alcançado um resultado marcante, uma vez que os criminosos não apresentam
traços comuns. De qualquer modo, ele se prendeu à fosseta occipital, que seria
hipertrofiada entre os criminosos e os loucos.[248]
Outra conclusão foi a de que os criminosos apresentam maiores problemas
hepáticos e no cérebro, isso em decorrência do alcoolismo.[249]
O apanhado de resultados de pesquisas feitas por
outras pessoas em 5.907 criminosos, pouco permitiu concluir. Talvez, o único
traço marcante seja o de ter o criminoso crânio menor que o homem normal. A
estatura, média de 1,64 m entre os soldados italianos, era a mesma do
criminoso. Os presos mais violentos eram os fisicamente mais avantajados.[250]
A imagem do criminoso, ao meu sentir, é normal.
São tantas as fisionomias apresentadas por Lombroso que pouco se pode concluir,
mas ele faz algumas conclusões absurdas, quais sejam: a) os criminosos em geral
têm aparência barbarativa e assustadora; b) quem pratica crimes contra os costumes,
senão cretino, tem fisionomia delicada, parecendo mulher; c) o homicida
habitual tem o olhar vidrado, frio, imóvel, maxilares robustos, orelhas longas,
frequentemente a barba é escassa e dentes caninos desenvolvidos, nistagmo
(tremor nas pálpebras e movimentos oscilatórios do globo ocular em relação a um
de seus eixos) e contrações do lado do rosto, mostrando os dentes caninos como
sinal de ameaça, além de orelhas de abano. Em todos o atavismo é marcante.[251]
As conclusões de Lombroso são passíveis de críticas que ele mesmo aceitou como
“justas objeções”.[252]
A análise de fotografias não autoriza conclusões
muito fecundas, mas Lombroso considera importantes algumas coincidências
verificadas, dizendo que os criminosos não atávicos apresentam distúrbios que
provam ser eles doentes crônicos.[253]
Enrico Ferri foi, inicialmente, discípulo de
Lombroso. Porém, dele discordou, não tendo aceitado a pena de morte a ser
imposta ao criminoso-nato. Aliás, sua classificação antropológica inspirou
Lombroso, uma vez que este não fez nenhuma classificação formal, quem a fez foi
Ferri, que assim expôs:
As categorias antropológicas de delinquentes são
as seguintes: I. Delinquente nato ou inativo ou por tendência congênita; II.
Delinquente louco; III. Delinquente habitual; IV. Delinquente ocasional; V.
Delinquente passional.[254]
No prefácio da segunda edição do livro de
Lombroso, ele informou que propunha a pena de detenção perpétua a ser imposta
ao criminoso nato. Outrossim, informou a importância dos estudos de Ferri para
o desenvolvimento da antropologia criminal, mormente por meio da publicação de
sua obra O Homicida.
A repulsão ao delito, não uma particular simpatia
a ele, determina o modo pessoal de reagir aos estímulos dos ambientes nas
relações pessoais, o que é denominado pelo autor de “senso social”.[255]
O delinquente louco é levado ao crime não
somente pela doença mental, mas também pela atrofia do senso moral, senão todos
doentes deveriam cometer crimes, quando, na verdade, a maioria se abstém.[256]
Inicialmente, Ferri Confundiu o delinquente
habitual com o nato, em face de ambos terem em comum a obstinada recidiva.
Tal espécie de delinquente tem grave periculosidade e a fraca readaptabilidade
social. No Projeto de Código Penal italiano apresentado por Ferri, em seu Tít.
II, Cap. IV, distinguia as seguintes espécies de delinquentes habituais: a) por
tendência congênita aos crimes de sangue e de violência ou contra a
propriedade; b) aquele que comete crime contra o patrimônio, normalmente pouco
grave, por uma congênita repugnância ao trabalho metódico; c) o delinquente por
hábito adquirido, que é aquele que – de infância abandonada – é preso por
pequenos períodos enquanto criança e vai piorando ao longo dos anos; d) o
delinquente profissional. Para Ferri, as espécies das alíneas “a” e “d”
apresentam maior grau de periculosidade e de incorrigibilidade.[257]
Delinqüente ocasional é aquele de menor periculosidade e maior
readaptabilidade social, uma vez que comete crimes, não tanto por atrofia
moral, mas por irreflexão, por imprevidência e fraqueza de vontade. De outro
modo, representa a grande maioria, chegando à metade do total dos criminosos.[258]
Ferri procura demonstrar que o delinqüente
passional é, antes de tudo, aquele movido por uma paixão social. Ele informa
que o delinqüente nato que assassina por alguma paixão não se transforma em
passional. Para assim caracterizado, é necessário que tenha estrutura para não
praticar crimes, só os cometendo diante de aberrações extraordinárias.[259]
2.11.6 Vertentes hodiernas
2.11.6.1 Contextualizando a criminologia e dentre
os movimentos que tendem ao combate da criminalidade
A criminologia partiu para uma análise tão ampla,
colocando em discussão todo sistema punitivo estatal. Passou a se confundir com
a própria Filosofia. Por isso, defendo a ideia que os pensadores hodiernos da
criminologia sepultaram-na. Aliás, o que faço, também, não é uma investigação
propriamente do Direito Criminal, eis que não consigo me prender aos conceitos
estéreis do pensamento positivo. Essa tendência vem trazendo uma postura
diferente em todas as áreas, emergindo a necessidade de restar atento ao
pensamento complexo.
No século XX, ao lado dos Movimentos de Lei e
Ordem, cresceram outros movimentos criminológicos, dentre os quais a Novíssima
Criminologia (que entende ser a criminalidade, basicamente, resultado da
omissão estatal) e a Nova Defesa Social (que entende ser o sistema
punitivo estatal, mormente o prisional, fomentador da criminalidade, razão pela
qual a pena deve ser reduzida a casos extremos).
Enquanto os movimentos e lei e ordem tendem
ao extremo, em face do excesso de rigor, a novíssima criminologia segue
rumo a outro extremo, eis que o criminoso dificilmente será atingido, uma vez
que os verdadeiros responsáveis pela criminalidade são aqueles que devem
suportar a pena (seriam atingidos, antes dos criminosos: os pais por não
educarem adequadamente os filhos; o Estado porque o sistema punitivo e a
carência de implementação de políticas sociais e educacionais adequadas
fomentam a criminalidade).
A Criminologia Clínica considera o homem,
não as instituições, a medida de todas as coisas. Porém, ao longo do século XX
passou-se a construir a tese de que o conhecimento científico só pode ser
auspicioso se o homem e a sociedade forem considerados em um contexto, daí
falar-se em Criminologia de Passagem ao Ato.[260]
Porém, ratificamos o que, citando Roberto Lyra e João Marcelo de Araújo Júnior,
expusemos alhures, no sentido de que a Nova defesa Social é adequada para a
tentativa de superação de antigas estruturas e tradições obsoletas.[261]
2.11.3.2 As denominadas escolas criminológicas
Já refutei a tendência de considerar “escola”
alguma corrente da criminologia. No entanto, os criminólogos apontam a ecologia
criminal como sendo a escola de Chicago. Como Chicago foi uma cidade
que cresceu desordenadamente e com grande pluralidade de pessoas, forneceu
ambiente propício ao desenvolvimento da tese ecológica do fenômeno criminal.
A teoria ecológica é funcionalista, uma vez que
percebe a mobilidade da cidade, sendo que nenhuma organização ecológica pode
estar estagnada. Ela está em constante processo de mudança, cujo ritmo depende
do progresso cultural.[262]
A teoria parte da ideia da desorganização social e busca fundamentação em Freud
para dizer que os indivíduos de uma massa tendem a incorporar uma determinada
“alma coletiva”.[263]
Outra importante concepção da teoria ecológica é
a relativa às áreas de delinquência obedientes à gradient tendency. O
cerne da teoria está na proposta de que a cidade é construída por círculos
concêntricos, formando anéis a partir do centro. O centro (loop) se
caracteriza pela desorganização, sendo rodeado pela zona de transição (2º
anel) que concentra o comércio e o liga às zonas residenciais (3º anel)
dotadas de pessoas de menor poder aquisitivo, moradoras – em grande parte – em
cortiços, e dispostas a fugirem para locais mais adequados. Os habitantes dessa
3ª zona têm que conviver com guetos e pensões baratas, mas o fazem por terem
que ocupar lugar de fácil acesso aos primeiros anéis.
A quarta zona é ocupada por blocos residenciais
ocupados pela classe média, onde há apenas uma família por residência.
Finalmente, a quinta zona, ocupada pelos extratos mais altos da sociedade, que
se dispõem a se deslocar por aproximadamente 60 minutos para chegar ao
trabalho.
Nas primeiras zonas, onde existem maiores
conflitos e desorganização social, não há condição de se estabelecer a
solidariedade e promoção de valores tradicionais da comunidade. Assim, os
valores da urbe tendem a estabelecer comportamentos padrões, considerando delitos
comportamentos que não podem ser controlados pela tradição ou valores morais.
A perspectiva funcionalista da “escola de
Chicago” conduz às perspectivas funcionalistas da atualidade. Ela propõe a
formação de uma política criminal menos interventora.
Já se propôs como “escola” criminológica
denominada “escola da etiquetagem”. Uma teoria frágil que rotula as pessoas,
marcando-as com a pecha de marginais. Aliás, a fim de minimizar os efeitos de
seu radicalismo, utiliza a palavra deviance, um eufemismo para dizer que
a pessoa é autora de conduta desviante.[264]
A teoria da anomia, cujos estudos foram iniciados
por Durkheim e desenvolvidos pelo sociólogo estadunidense Robert Merton, propõe
a formação de uma política criminal calcada na ideia de um Direito cooperativo,
ao contrário de repressor.
A teoria do labelling approach surgiu nos
Estados Unidos da América no início da década de 1960. Por essa teoria, o
delinquente que pratica uma conduta delituosa (criminalidade primária) tem uma
resposta ritualizada e estigmatizada que o distancia da sociedade e diminui as
oportunidades, surgindo uma subcultura do delinquente com reflexo na
autoimagem, que o rotula como criminoso e propicia a carreira no crime, sendo a
causa da delinquência secundária (fruto do aparelho repressor estatal).
2.11.3.3 Criminologia crítica e abolicionismo,
minimalismo e maximização do DCrim
É fácil perceber que, assim como o DCrim vem
sofrendo inúmeras transformações, realidade que vem se tornando a regra nas
diversas áreas do conhecimento, também está sendo modificada, com grande
celeridade, a Criminologia. É nesse cenário que se encontra o desenvolvimento
da Criminologia Crítica, que apresenta várias vertentes, conforme
sintetiza Edmundo de Oliveira.[265]
Alguns autores propõem a extinção do DCrim,[266]
o que encontra fulcro na insuficiência do sistema criminal,[267]
isso porque, hoje, o DCrim é visto como sendo um instrumento para a criação de
uma sociabilidade terrorista.[268]
Com efeito, ele se apresenta como um meio para a violação de direitos humanos
fundamentais, sob o manto de uma pretensa segurança social, ameaçando a todos
de que a concretização de um suposto mal (a conduta tida como criminosa),
trará, certamente, miséria, tratamento desumano e dor. Tudo isso, com a tutela
do aparelho estatal.
Em face do caos estabelecido pelo sistema
punitivo estatal, Hulsmann propõe a mudança de linguagem, a fim de tornar
possível a abolição do sistema criminal repressivo.[269]
Porém, incumbe ressaltar que o autor não quer afastar toda medida coercitiva do
Estado, mas pretende que haja uma bilateralidade (concordância das duas
partes), no processo de aplicação da sanção, pois só assim a pena é legítima.[270]
Tal proposição, em relação à perspectiva habermasiana, é funcionalista, na
medida em que faz referência ao consenso, necessário, dos participantes da
sociedade complexa.
Deve-se concordar com Luigi Ferrajoli, que
critica duramente o atual abolicionismo criminal, por constituir um moralismo
utópico e nostalgia regressiva por modelos arcaicos e “tradicionais”
comunidades sem Direito, sendo, portanto, pouco original em relação à tradição
anárquica e holística.[271]
Sobre o minimalismo, devo aqui chamar a atenção
para uma distinção que merece ser feita, conforme chama a atenção Paulo de
Souza Queiroz, que é a existência de um minimalismo comedido ponderado,
favorável à intervenção criminal mínima, como o de Luigi Ferrajoli, e outro
radical, tendente ao abolicionismo, como o proposto por Alessandro Baratta.[272]
Estudando a proposta de Alessandro Baratta
conclui-se que ele tende a uma visão sistêmica compatível com parte da
Filosofia moderna e, principalmente, ao colocar todo sistema de defesa criminal
estatal em discussão, permitindo a constatação que sua análise é do aparato
criminal (ou de defesa criminal) estatal. Ele defende a ideia de que a criminologia
crítica, por fazer a análise crítica do sistema punitivo estatal e, também,
por propor a reconstrução dos problemas sociais, é tão importante (ou mais
importante) que a medidas que estão sendo empregadas imediatamente.[273]
Aliás, antes de tudo, deve-se observar e colocar em discussão o próprio sistema
social.
Alessandro Baratta propõe a “passagem do
paradigma etiológico para o paradigma da reação social”.[274]
Ele estuda ciências, uma vez que analisa todo mecanismo de controle social
exercido pelo Estado, constituindo estudo mais genérico, portanto filosófico,
sendo, aqui, oportuna a afirmação de Busato e Huapaya:
Mas o próprio Baratta diz então que a
criminologia morreu, vítima de sua própria crítica, pois adotar os postulados
da Criminologia Crítica significa reconhecer que o Direito Penal não serve
senão como um instrumento de desigualdade social, e, como tal, deve ser
abandonado.[275]
Neste curso, mesmo sabendo que outrem pode
entender a posição ultrapassada, por rigor terminológico, não se estenderá
tanto o objeto de estudo da criminologia, que é não vista como ciência, mas
como o instrumento de estudo do delinquente e a criminalidade no contexto da
sociedade complexa. As conclusões de tal estudo informam a Política Criminal,
que visará alcançar meios de repressão e cooperação criminais e extracriminais,
a serem utilizados pelo legislador no momento de criar leis tendentes a
solucionar conflitos sérios dos grupos e pessoas integrantes da sociedade. As
informações da criminologia e da Política Criminal, enquanto estudos distintos,
serão fundamentais no momento de se criar leis criminais e, depois, nos
momentos de suas aplicações e execuções.
Os movimentos de lei e ordem constituem
corrente que tende à maximização do DCrim. Entretanto, aumentar penas e
instituir novos crimes já foi a saída encontrada aqui e alhures. No entanto,
elas se mostraram insuficientes e produziram efeitos completamente contrários
aos quais se propunham.
[1]
HEIDEGGER, Martin. Ser e tempo. 12. ed. (Parte I) e 10. ed. (Parte II).
Petrópolis: Vozes, 2.002. passim.
[2]
Idem. Que é isto – a filosofia? STEIN, Ernildo. Os pensadores: Heidegger.
São Paulo: Nova Cultural, 1996. p. 24.
[3]
Conf. CHAUÍ, Marilena de Souza. Vida e obra. HEIDEGGER, Martin. Os
pensadores: Heidegger. São Paulo: Nova Cultural, 1.995. p. 8.
[4]
WEBER, Max. Ensaios sobre as teorias das ciências sociais. São Paulo:
Moraes, 1.991. p. 75-132.
[5] NIETZSCHE,
Friedrich. Ecce Homo. São Paulo: Martin Claret, 2.003. p. 31.
[6]
BITTAR, Eduardo C. B, ALMEIDA, Guilherme Assis de. Curso de filosofia do
direito. São Paulo: Atlas, 2001. p. 44-45.
[7]
NADER, Paulo. Filosofia do direito. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense,
1994. p. 4-5.
[8]
Ibidem. p. 5.
[9]
Ibidem. p. 6.
[10]
BITTAR, Eduardo Carlos Bianca; ALMEIDA, Guilherme Asis de. Curso de
filosofia do direito. São Paulo: Atlas, 2001. p. 27.
[11]
REALE, Miguel. Lições preliminares do direito. 16. ed. São Paulo:
Saraiva, 1988. p. 14.
[12]
NADER, Paulo. Filosofia do direito. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense,
1994. p. 9.
[13]
REALE, Miguel. Filosofia do direito. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 1978. v.
1, p. 45-49.
[14]
HEIDEGGER, Martin. A essência do fundamento. Lisboa: Edições 70, 1988. passim.
[15]
HABERMAS, Jürgen. Consciência moral e agir comunicativo. Rio de Janeiro:
Tempo Brasileiro, 1989. p. 18.
[16]
ADEODATO, João Maurício. Filosofia do direito: Uma crítica à verdade na
ética e na ciência. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 15.
[17]
REALE, Miguel. Filosofia do direito. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 1978. v.
2, p. 285.
[18]
KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 6. ed. São Paulo: Martins Fontes,
1998. p. 1.
[19]
RADBRUCH, Gustav. Filosofia do direito. 6. ed. Coimbra: Armenio Amado,
1979. p. 86.
[20]
REALE, Miguel. Lições preliminares do direito. 16. ed. São Paulo:
Saraiva, 1988. p. 15.
[21]
RADBRUCH, Gustav. Filosofia do direito. 6. ed. Coimbra: Armênio Amado,
1979. p. 47.
[22]
Ibidem.
[23] HABERMAS,
Jürgen. Direito e democracia. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997. v.
1, p. 9. Pode-se imaginar que há alguma inverdade contida na afirmação, visto
que grandes filósofos não se dedicaram ao estudo dos institutos do DCrim, v.g.,
Savigny, Ihering e, no Brasil, Miguel Reale e Tércio Sampaio. Desse modo,
parece que seria mais adequado afirmar: os autores de DCrim tendem à Filosofia.
Concordamos com essa proposição, mas ela não anula a primeira, daí termos
mantido a nossa afirmação. Com efeito, o livro – citado nesta obra – “A moderna
teoria do fato punível” é uma tese de pós-doutorado em Filosofia do Direito.
Daí a nossa concordância com Habermas, no sentido de que os jusfilósofos tendem
aos institutos do DCrim.
[24]
GARCIA, Basileu. Instituições de direito penal. São Paulo: Max Limonad,
1956. v. 1, t. 1, p. 11.
[25] MAGGIORI,
Giuseppe. Principî di diritto penale – parte generale. 2. ed. Bolonha: Nicola Zanichelli, 1937. vol.
1. p. 48/49.
[26] FERRAZ
JÚNIOR, Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do direito. 2. ed. São
Paulo: Atlas, 1994. p. 102.
[27]
A palavra Zetética é assim explicada por Aurélio Buarque de Holanda Ferreira:
“[Do grego zetetiké (subtende-se techne) a arte de procurar] 1.
Método de investigação, ou conjunto de preceitos, para a resolução de um
problema filosófico ou matemático. 2. Filosofia. A doutrina de
Pirro em sua posição metodológica inicial, que consiste no incentivo à busca
incessante de novos conhecimentos.” (in Novo dicionário Aurélio. 4. tir. Rio de
Janeiro: Nova Fonteira, 1975. p. 1501).
[28]
SANTOS, Juarez Cirino dos. Direito Penal: parte geral. Curitiba: ICPC; Lumen Juris, 2006. p. 3.
[29] SOUZA,
Daniel Coelho de. Introdução à ciência do direito. São Paulo: Saraiva,
1988. p. 286.
[30]
REALE, Miguel. Lições preliminares do direito. 4. ed. São Paulo:
Saraiva, 1977. p. 2.
[31]
ADEODATO, João Maurício. Ética e retórica: para uma teoria da dogmática
jurídica. São Paulo: Saraiva, 2.002. p. 287.
[32]
COSTA, Álvaro Mayrink da. Direito penal. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense,
1998. v. 1, t. 1, p. 95-114.
[33]
WEBER, Max. Ensaios sobre a teoria das ciências sociais. São Paulo:
Moraes, 1991. p. 1-74.
[34]
RUSSELL, Bertrand. Meu desenvolvimento filosófico. Rio de Janeiro:
Zahar, 1.980. p. 12.
[35]
SAGAN, Carl. O mundo assombrado pelos demônios: a ciência vista como uma
vela no escuro. São Paulo: Companhia de Letras, 1.996. p. 38.
[36]
Paulo José da Costa Júnior, tratando das características do Direito Criminal,
afirma: “O Direito Penal se inclui entre os ramos do direito público. Sua
atuação independe da vontade do ofendido, constituindo função e dever do
Estado. Pública igualmente a imposição e aplicação de sanção, que não pode ser
confiada a quem sofreu a ofensa, mas ao magistrado estatal. Sendo público o
direito penal, porque os valores que tutela interessam toda a coletividade, é
indisponível. O ofendido não poderá dele dispor, desistindo da ação penal
proposta, ou perdoando o autor do delito” (Curso de direito penal. São
Paulo: Saraiva, 1991. p.3). No texto, há efetiva mistura de topois concretamente
distintos, uma vez dizer que o Direito Criminal é público, refere-se a uma
espécie relativa à divisão da Ciência Jurídica e à autonomia relativa de seus
ramos. De outro modo, a atuação do magistrado é afeta ao Direito Processual,
por meio da ação, que será estudada no final deste volume. Também, a possibilidade
de disposição da ação é matéria que precisa ser estudada no momento próprio.
[37]
SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. 20. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2.002. p. 554.
[38]
FERRI, Enrico. Princípios do direito criminal. 2. ed. Campinas: Bookseller, l.998. p. 141.
[39]
ORDEIG, Enrique Gimbernat. Conceito e método da ciência do direito penal.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 20.
[40]
GARCIA, Basileu. Instituições de direito penal. 3. ed. São Paulo: Max
Limonad, 1956. v. 1, t. 1, p. 7.
[41]
MIRABETE, Julio Fabbrini; FABBRINI, Renato Nascimento. Manual de direito
penal. 29 ed. São Paulo: Atlas, 2013. v. 1, p. 22.
[42]
No início, as normas eram dadas segundo os costumes (consuetudinárias).
Denominadas normas éticas, porque a ética é a “ciência dos costumes”.
[43]
COULANGES, Fustel de. Acidade antiga. 4. ed. 2. tir. São Paulo: Martins
Fontes, 2.000. p. 36.
[44]
O Direito Alternativo ganhou grande espaço no Brasil, mormente em sua Região
Sul. Talvez seja por isso que João José Leal, jurista catarinense, chegou a
afirmar que é equivocado pensar na vingança privada como sendo a primeira, eis
que a vingança pública a teria precedido, já que o Direito se manifesta como
instrumento de dominação (in Direito penal geral. São Paulo: Atlas,
1.998. p.59).
[45]
COSTA, Álvaro Mayrink da. Direito penal. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense,
1998. v. 1. t. 1, p. 101.
[46]
SILVA, César Dario Mariano da. Manual de direito penal. 4. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2.006. v. 1, p. 2.
[47]
SILVA, Virgílio Afonso da. Direitos fundamentais: conteúdo essencial,
restrições e eficácia. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2.010. p. 254.
[48]
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal. 10. ed. São Paulo:
Saraiva, 2006. v. 1, p. 35-38.
[49]
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal. 10. ed. São Paulo:
Saraiva, 2006. v. 1, p. 103.
[50]
A palavra instituição decorre do latim institutio, que significa: “I –
Sentido próprio: 1) Disposição, plano, arranjo. II – Sentido figurado: 2)
Instrução, ensino, educação, formação. Por extensão: 3) Método, sistema,
doutrina, escola, seita”. Observe-se que de referida palavra decorre institutum,
que significa: “I – Sentido próprio: 1) Plano estabelecido, fim, objeto,
desígnio. II – Daí: 2) Hábito, modo de viver, maneira de proceder. No plural:
3) Princípios estabelecidos, instituições, usos, costumes. 4) Idéias
pré-estabelecidas, ensinamentos, disciplina” (conf. AMENDOLA, João. Dicionário
italiano-português. 2. ed. São Paulo: Hemus, 1.976. p. 491).
[51]
GILISSEN, John. Introdução histórica ao Direito. 3. ed. Lisboa: Calouste
Gulbenkian, 2001. p. 73.
[52]
FONSECA, Paulo Cássio M. Fonseca. Apresentação. ARISTÓTELES. A ética.
Bauru: Edipro, 1995. p. 15.
[53]
Cf. BITTAR, Eduardo C. B; ALMEIDA, Guilherme Assis de. Curso de filosofia do
direito. São Paulo: Atlas, 2001. p. 91.
[54]
PESSANHA, José Américo Motta. Sócrates. 4. ed. São Paulo: Nova Cultural, Os
pensadores, 1987: em um único livro, reuniu-se trechos das seguintes obras
de Platão: Defesa de Sócrates; Xenofonte; Ditos e feitos memoráveis de
Sócrates; Apologia de Sócrates; Aristófanes; e As nuvens. Todas elas versam
sobre Sócrates.
[55]
STONE, I. F. O julgamento de Sócrates. São Paulo: Companhia das Letras,
1988. p. 21.
[56]
MUÑOZ, Alberto Afonso. O paradigma platônico. In MACEDOR JR., Ronaldo Porto
(Coord.). Curso de filosofia jurídica. São Paulo: Atlas, 2008. p. 92.
[57]
TAVARES, Juarez. Teoria do injusto penal. Belo Horizonte: Del Rey,
2.000. p. 79-86.
[58]
GRÁFICA CÍRCULO. Aristóteles. São Paulo: Nova Cultural, Os pensadores,
1.996. p. 14.
[59]
MORRAL, John B. Aristóteles. Brasília: UnB, 2.000. p. 8.
[60]
MORE, Thomas. A utopia. São Paulo: Martin Claret, 2000. p. 33.
[61]
THOMAS, Henry. Perfil biográfico. In KANT, Immanuel. Fundamentação da
metafísica dos costumes e outros escritos. São Paulo: Martin Claret, 2.003.
p. 137.
[62]
COULANGES, Fustel de. Acidade antiga. 4. ed. 2. tir. São Paulo: Martins
Fontes, 2.000. passim.
[63]
Ibidem.
[64]
GILISSEN, John. Introdução histórica ao Direito. 3. ed. Lisboa: Calouste
Gulbenkian, 2001. p. 162/163.
[65] É
interessante notar que Franz von Liszt sustenta que os atrasados foram os
romanos, prestigiando, sem razão, o Direito germânico (LISZT, Franz von.
Tratado de direito penal. Campinas: Russel, 2.003. p. 84-91). Note-se, no
entanto, que ele é germânico e que, na esteira do que se expõe neste curso, o
ser humano age principalmente por interesse, o que evidencia o porquê da sua
postura.
[66]
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal. 10. ed. São Paulo:
Saraiva, 2006. v. 1, p. 43.
[67]
KRAMER, Heinrich; SPRINGER, J. O martelo
das Feiticeiras. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 1.991.
[68]
Movimento do Século XVIII, marcado pela centralidade da ciência e da
racionalidade. Na filosofia, há uma crítica à redução do conhecimento ao
científico, mas marcou o Século das Luzes, com grandes descobertas, desde seu momento
originário (anos 1650-1700), com Baruch Spinoza (1632-1677), John Locke
(1632-1704), Pierre Bayle (1647-1706) e Isaac Neewton (1643-1727).
[69] Os grandes
nomes da Filosofia do Direito da Igreja são: Santo Agostinho (Aurélio
Agostinho), que viveu de 354-430; e São Tomás de Aquino, que viveu de
1225-1272. Este último viveu quando nascia o renascimento. Não se olvide, no
entanto, que predomina o entendimento de que o período da renascença se deu do
fim do Século XIV ao fim do Século XVI.
[70] A Filosofia
do Direito, na idade média, foi dominada pelo pensamento religioso dos
cristãos, só se afastando dele no início do século XVII, quando “Hugo Grócio proclamou
a existência de um Direito Natural independente de Deus” (NADER, Paulo. Op. cit. p. 118).
[71]
Os tribunais inquisidores perduraram do início do Século XII ao início do
Século XVIII.
[72] DESCARTES,
René. O discurso do método. 2. ed. 2. tir. São Paulo: Martins Fontes,
1999. p. 38.
[73]
ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social. São Paulo: Martins Claret,
2000. p. 50.
[74] Ibidem. p.
117-125.
[75]
KANT, Immanuel. Doutrina do direito. 2. ed. São Paulo: Ícone, 1993. p.
181.
[76]
MONDOLFO, Rodolfo. Cesare Beccaria y sua obra. Buenos Aires: Depalma, 1956. p.
46-47; apud CAMPA. Ricardo. Prefacio. BONESANA, Cesare (Marquês de Beccaria). Dos
delitos e das penas. São Paulo: Marins Fontes, 1991. p. 20-23.
[77] RUSSEL,
Bertrand. História da filosofia ocidental. São Paulo: Editora Nacional,
1967. p. 255-261.
[78]
CICCO, Cláudio. Apresentação. KANT, Emmanuel. Doutrina do direito. 2.
ed. São Paulo: Ícone, 1993. p. 11.
[79]
KANT, Emmanuel. Doutrina do direito. 2. ed. São Paulo: Ícone, 1993. p.
44.
[80] KELSEN, Hans.
Teoria geral do direito e do estado. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes,
1998. p.
[81]
KANT, Immanuel. Doutrina do direito. 2. ed. São Paulo: Ícone, 1993. p.
596.
[82]
COTRIM, Gilberto. Elementos da Filosofia – ser, saber e fazer. 12. ed.
São Paulo: Saraiva, 1996. p. 174.
[83]
KANT, Immanuel. Doutrina do direito. 2. ed. São Paulo: Ícone, 1993. p.
175-183.
[84]
Ibisdem. p. 183.
[85]
REALE, Miguel. Filosofia do Direito. 8. Ed. São Paulo: Saraiva, 1978.
vol. 1, p. 112.
[86] BITTAR,
Eduardo Carlos Bianca, ALMEIDA, Guilherme Assis de. Curso de filosofia do
direito. São Paulo: Atlas, 2001. p. 276.
[87]
HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich. Princípios da filosofia do direito.
Lisboa: Guimarães, 1990. p. 104.
[88]
Idem. Filosofia da história. 2. ed. Brasília: UnB, 1.999. p. 45.
[89]
HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich. Princípios... Op. cit. p. 104.
[90] HABERMAS,
Jürgen. Consciência moral e agir comunicativo. Rio de Janeiro: Tempo
Brasileiro, 1989. p. 17.
[91]
HABERMAS, Jürgen. O discurso filosófico da modernidade. São Paulo:
Martins Fontes, 2000. passim; Idem. Consciência moral e agir
comunicativo. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1989. passim.
[92]
NADER, Paulo. Filosofia do direito. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense,
1994. p. 174.
[93]
Ibidem
[94] GIANOTTI,
José Arthur. Vida e obra. São Paulo: Nova Cultural, Os pensadores: Auguste
Comte, 1.996. p. 8.
[95]
Diz-se que apodictico é o conhecimento que é demonstrável ou evidente.
Essa não foi a única posição positivista, mas é o critério de positivismo mais
seguro que se pode conhecer.
[96]
GARCIA, Basileu. Instituições de direito
penal. 3. ed. São Paulo: Max Limonad, 1956. v. 1, t. 1, p. 76.
[97]
FERRI, Enrico. Princípios de direito criminal: o criminoso e o crime. 2.
ed. Campinas: Bookseller, 1999. p. 62.
[98]
Ibidem. P. 63.
[99]
GARCIA, Basileu. Instituições de direito penal. 3. ed. São Paulo: Max
Limonad, 1956. v. 1, t. 1, p. 81.
[100]
NIETZSCHE, Friedrich. Ecce homo. São Paulo: Martin Claret, 2.003. p. 93.
[101] Edição
nacional de referida obra foi publicada: HEIDEGGER, Martin. Ser e tempo:
Partes I. 12. ed. Petrópolis: Vozes, 2002; Idem. Ser e tempo: Partes II.
12. ed. Petrópolis: Vozes, 2002.
[102]
MESQUITA, André Campos. Apresentação. In HUME, David. Investigação
sobre o entendimento humano. São Paulo: Escala, 2003. p. 11.
[103]
KELSEN, Hans. O problema da justiça. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes,
1996. passim.
[104]
Idem. Teoria geral do direito e do estado. 3. ed. São Paulo: Martins
Fontes, 1998. p. 165.
[105]
Ibidem. p. 173.
[106]
Ibidem. p. 168.
[107]
Ibidem. P. 173.
[108]
LOSANO, Mario G. Apresentação. In KELSEN, Hans. O problema da justiça.
2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1996. p. XXXI.
[109]
Ibidem. p. 61.
[110]
REALE, Miguel. Filosofia do direito. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 1978. v.
2, p. 406-490.
[111]
Ibidem. p. 493-614.
[112]
KELSEN, Hans. Teoria geral do direito e do estado. 3. ed. São Paulo:
Martins Fontes, 1998. p. 174-175.
[113]
Ibidem. p. 175.
[114]
CHAUÍ, Marilena de Souza. Vida e obra. São Paulo: Nova Cultural, Os
pensadores: Heidegger, 1996. p. 10.
[115] Observe-se a
propriedade do que se afirma em: HABERMAS, Jürgen. O discurso filosófico da
modernidade. São Paulo: Martins Fontes, 2000. passim.
[116]
FERRI, Enrico. Princípios de direito criminal: o criminoso e o crime. 2.
ed. Campinas: Bookseller, 1999. p. 78.
[117]
COSTA, Álvaro Mayrink da. Direito penal. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense,
1998. v. 1, t. 1, p. 187.
[118] COULANGES,
Fustel de. A cidade antiga. 4. ed. 2. tir. São Paulo: Martins Fontes:
2.000. passim.
[119]
NADER, Paulo. Filosofia... op. cit. p. 236.
[120]
KELSEN, Hans. Teoria geral do direito e do estado. 3. ed. São Paulo:
Martins Fontes, 1998. p. 160.
[121]
COULANGES, Fustel de. A cidade antiga. 4. ed. 2. tir. São Paulo: Martins
Fontes: 2.000. passim.
[122]
TEMER, Michel. Elementos de direito constitucional. 7. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1990. p. 20.
[123]
ROXIN, Claus. Política criminal e sistema jurídico-penal. Rio de
Janeiro: Renovar, 2000. passim.
[124]
PARSONS, Talcott. Sociedades: perspectivas evolutivas e comparativas.
São Paulo: Pioneira, 1969. p. 175.
[125] Os 2 fatos,
em face da notoriedade, prescindem de provas. Com efeito, nos referimos ao
Prefeito de Campinas–SP (sobre esse crime não desvendado, vide: http://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2011/09/10/dez-anos-apos-assassinato-familia-de-toninho-do-pt-vai-a-oea-denunciar-omissao-do-estado.htm),
e ao Promotor de Justiça de Minas Gerais que foi assassinado no interior do seu
carro na cidade de Belo Horizonte, capital do Estado (vide: http://www.mp.mg.gov.br/portal/public/noticia/
index/id/ 31826).
[126]
DAHRENDORF, Ralf. A lei e a ordem. Brasília: Trancredo Neves, 1987. p.
31.
[127]
DURKHEIM, Émile. As regras do método sociológico. 2. ed. São Paulo:
Martins Fontes, 1.999. p. XII.
[128]
DURKHEIM, Émile Apud BARATTA, Alessandro. Criminologia crítica e crítica do
direito penal. 2. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1999, p. 61.
[129]
COHN, Gabriel. Apresentação. FERNANDES, Florestan. Max Weber. 7. ed. São
Paulo: Ática, 2.003. p. 12.
[130]
TAVARES, Juarez. Teoria do injusto penal. Belo Horizonte: Del Rey, 2000, p. 65.
[131]
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da
constituição. 4. ed. Coimbra: Almedina, 2000. p. 1331. É importante
destacar que, conforme informa Canotilho, o sistema cibernético não é
criação sua. No entanto, o assunto, embora sucintamente, foi muito bem exposto
por ele.
[132]
Ibidem.
[133] BOZA, Roxana
Sánchez, COIN, M.Sc. Otto Calvo. Derecho cooperativo (Trabajo basado en
Ernesto Grün – 1998. Una visión sistémicay cibernética do derecho). Disponível em: www.iij.ucr.ac.cr.
Acesso em: 8.7.02, 13h.
[134] BOZA, Roxana Sánchez, COIN; CALVO, Otto.
Derecho cooperativo (Trabajo basado en Ernesto Grün – 1998. Una
visión sistémica y cibernética do derecho). Disponível em: <http://baidc.revistas.deusto.es/article/view/909/1040>.
Acesso em: 21.4.2017, 12h30.
[135]
LUHMANN, Niklas. Sociologia do direito II. Rio de Janeiro: Tempo
Brasileiro, 1985. p. 17.
[136]
Ibidem. p. 18.
[137]
ROMESÍN, Humberto Maturana. Prefácio à segunda edição. ROMESÍN, Humberto
Maturana. GARCIA, Francisco J. Varela. De máquinas e seres vivos. 3. ed.
Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
[138]
Ibidem. p. 17-21.
[139]
GUERRA FILHO, Willis S. O direito como sistema autopoiético. São Paulo: Revista
Brasileira de Filosofia, 1991, n. 163. p. 185-196.
[140]
Ibidem. p. 185.
[141]
Cf. CAMPILONGO, Celso Fernandes. Direito e democracia. 2. ed. São Paulo:
Max Limonad, 2000, p. 75.
[142]
LUHMANN, Niklas. Poder. Brasília: Universidade de Brasília, 1985. p. 75.
[143]
Ibidem. p. 6.
[144]
Ibidem. p. 75.
[145]
LOMONACO, Amedeo. Le due teorie sociologiche di Parsons e Luhmann. Disponível
em: www.globalizzazine2000.it. Acesso em: 9.7.02, 12h.
[146]
LUHMANN, Niklas. Poder. Brasília: Universidade de Brasília, 1985. p. 75.
[147]
Ibidem. p. 18-19.
[148]
FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Prefácio. LUHMANN, Niklas. Legitimação pelo
procedimento. Brasília: UnB, 1980, p. 1 (Observe-se que a tradução provém
de um original impresso em 1969 e a afirmação citada é de 1980 e acresça-se a
informação de que Luhmann morreu em 6.11.1998).
[149] LUHMANN, Niklas. The unity of the legal
sistem. In TEUBNER, Gunther (ed.) Autopoeisis law: a new approach to law and
society. Berlin-New York: Walter de Gruyter, 1988. p.
12-35. Apud ADEODATO, João Maurício: Ética e retórica: para uma teoria da dogmática jurídica.
São Paulo: Saraiva, 2002. p. 306.
[150]
ROMESÍN, Humberto Maturana. Prefácio à segunda edição. ROMESÍN, Humberto
Maturana. GARCIA, Francisco J. Varela. De máquinas e seres vivos. 3. ed.
Porto Alegre: Artes Médicas, 1997. p. 60-67.
[151]
ROMESÍN, Humberto Maturana. Prefácio à segunda edição. ROMESÍN, Humberto
Maturana. GARCIA, Francisco J. Varela. De máquinas e seres vivos. 3. ed.
Porto Alegre: Artes Médicas, 1997. p. 17.
[152]
FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 719.
[153]
GUIBENTIF, Pierre. Entrevista com Niklas Luhmann. In ARNAUD, André-Jean; LOPES JR., Dalmir (org.). Niklas
Luhmann: do sistema social à Sociologia Jurídica. Rio
de Janeiro: Lumen Juris, 2004. p. 281.
[154]
KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 3. ed. 3. tir. São Paulo: Martins
Fontes, 1999. p. 221-245.
[155]
TAVARES, Juarez. Teoria do injusto penal. Belo Horizonte: Del Rey, 2000, p. 68.
[156] Nesse
sentido: ENCARNAÇÃO, João Bosco da. Filosofia do direito em Habermas: a hermenêutica.
3. ed. Lorena: Stiliano, 1999, p. 6.
[157] PARSONS, Talcott. The structure of social action.
2. ed. Nova York: Free Press of Glencoe, 1961.
[158] HABERMAS, Jürgen. Teoria de la acción comunicativa. Madrid:
Trotta, 2010. t. I e II.
[159]
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir:.
nascimento da prisão. 25. ed. Petrópolis: Vozes, 1987. passim.
[160]
HABERMAS, Jürgen. O discurso filosófico da modernidade. São Paulo:
Martins Fontes, 2000. p. 375.
[161] FOUCAULT,
Michel. Microfísica do poder. 18. ed. São Paulo: Graal, 2003. p. 8.
[162]
CARMARGO, Antônio Luiz Chaves. Tipo penal e linguagem. Rio de Janeiro:
Forense, 1982.
[163]
TAVARES, Juarez. Teoria do injusto penal. Belo Horizonte: Del Rey,
2.000. p. 79.
[164] Exemplo do
que se diz é o fato de Nietzsche ter se voltado aos “destemidos olhos de Édipo”
(NIETZSCHE, Friedrich. Para além do bem e do mal: prelúdio a uma
filosofia do futuro. São Paulo: Martin Claret, 2.003. p. 151).
[165] JÚNIOR,
Sidio Rosa de Mesquita. Cresce o número de sequestros relâmpagos e não há
solução legislativa razoável. Juiz de Fora: Universo Jurídico, ano XI,
14.2.2012. Disponível em: <http://uj.novaprolink.com.br/doutrina/8102/cresce_o_numero_de_
sequestros_relampagos_e_nao_ha_solucao_legislativa_razoavel>. Acesso em:
23.2.2012, às 12h.
[166] MENDES,
Antônio Celso. Direito: ciência – ideologia – política. Curitiba: HDV,
1984, p. 84.
[167]
EHRLICH, Eugin Apud CAMPILONGO, Celso Fernandes. Direito e democracia.
2. ed. São Paulo: Max Limonad, 2000. p. 14.
[168]
CAMPILONGO, Celso Fernandes. Direito e democracia. 2. ed. São Paulo: Max
Limonad, 2000. p. 16.
[169]
ADEODATO, João Maurício: Ética e retórica: para uma teoria da dogmática
jurídica. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 287.
[170] MESQUITA
JÚNIOR, Sidio Rosa de. O fatualismo constitui reducionismo grosseiro da
experiência jurídica. Teresina: Jus Navigandi, ano 14, n. 2125, 26.4.2009.
Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/12685>. Acesso em:
22.2.2012, às 14h.
[171] ADEODATO,
João Maurício: Ética e retórica: para uma teoria da dogmática jurídica.
São Paulo: Saraiva, 2002. p. 287.
[172]
HABERMAS, Jürgen. A crise de legitimação no capitalismo tardio. 3. ed.
Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1999. p. 179.
[173]
Cf. CAMPILONGO, Celso Fernandes. O direito na sociedade complexa. São
Paulo: Max Limonad, 2000. p. 193.
[174]
ADEODATO, João Maurício: Ética e retórica: para uma teoria da dogmática
jurídica. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 303-306.
[175]
Ibidem. p. 304.
[176] ADEODATO,
João Maurício: Ética e retórica: para uma teoria da dogmática jurídica.
São Paulo: Saraiva, 2002. p. 306.
[177]
BARROSO, Luís Roberto. Temas de direito constitucional. 2. ed. Rio de
Janeiro: Renovar, 2.002. p. 76.
[178]
QUEIROZ, Paulo. Direito penal: parte geral. 3. ed. São Paulo: Saraiva,
2.006. p. 137.
[179]
Diz-se que, já em 1325, circulavam lendas e mapas em Portugal sobre terra
assinalada no além-mar como Hy-Brazil. Viagens sigilosas dos Portugueses foram
feitas em 1493 e 1498, respectivamente, por João Coelho da Porta Cruz e Duarte
Pacheco. Outrossim, os espanhóis e primos Vicente Yáñez Pinzon e Diego de Lepe,
chegaram ao Brasil, respectivamente, em Jan/1500 e Mar/1500. De qualquer modo,
a história oficial de que o Brasil seria de Portugal, estaria confirmada pelo
Tratado de Tordesilhas, assinado em 7.6.1494. E, prevalece a ilusória e
acidental descoberta de Pedro Álvares Cabral, de 22.4.1500, o qual iria às
Índias (a palavra “índio” decorreria do fato de Colombo, quando chegou nas
américas, em 12.10.1492, ter acreditado que estava nas Índias).
[180] As
Ordenações Manuelinas e Filipinas tomaram por base as Ordenações Afonsinas.
Elas tratavam das matérias cíveis e criminais (o Livro V era o criminal), sendo
que a sua parte cível perdurou até 1917, ano em que o Código Civil de 1916,
entrou em vigor.
[181] REALE JÚNIOR,
Miguel. Periculosidade e culpabilidade no sistema de penas. REALE JÚNIOR,
Miguel; MOURA, Maria Thereza de Assis (Coord.). Coleção 80 anos do código
penal: vol. 1: parte geral. São Paulo: Thomson Reuters. 2020. p.
33.43.
[182]
MENDONÇA, Andrey Borges. Nova reforma do
código de processo penal: comentada artigo por artigo. São Paulo: Método,
2.008. p. X.
[183]
BRASIL. Câmara dos Deputados. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/
fichadetramitacao?idProposicao=490263>. Acesso em: 5.3.2017, às 11h30.
[184]
BRASIL. Senado Federal. Disponível em: <https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/106404>.
Acesso em: 5.3.2017, às 15h48.
[185]
BRASIL. Senado Federal. Disponível em: <http://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/106404>.
Aceso em: 5.3.2017, às 16h56.
[186]
GARCIA, Basileu. Instituições de direito penal. 3. ed. São Paulo: Max
Limonad, 1956. v. 1, t. 1, p. 198.
[187]
Publicado no Diário da Câmara dos Deputados, em 24.8.2000. p. 44.962.
Disponível em: <http://imagem.camara.gov.br/dc_20.asp?selCodColecaoCsv=D&Datain=24/08/
2000&txpagina=44962&altura=650&largura=800>. Acesso em:
23.2.2012, às 12h28.
[188]
Exemplificando o elevado nível de conhecimento jurídico dos componentes da
comissão, seu presidente foi Alberto Silva Franco.
[189]
SILVA, Cesár Dario Mariano da. Manual de direito penal. 4. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2006. p. 14.
[190] FERRI,
Enrico. Princípios de direito criminal. 2. ed. Campinas: Bookseller, 1999. p. 133.
[191] Ibidem. p. 133.
[192] SILVA, José
Afonso da. Curso de direito criminal positivo. 18. ed. São Paulo:
Malheiros, 2000. p. 476-477.
[193] GRECO,
Rogério. Curso de direito penal: parte geral. 2. ed. Rio de Janeiro: Impetus,
2003. p. 15.
[194]
MIRABETE, Júlio Fabbrini; FABBRINI, Renato Nascimento. Manual de direito
penal. 26. ed. São Paulo: Atlas, 2010. v. 1, p. 29; JESUS, Damásio
Evangelista de. Direito Penal: Parte Geral. 20. ed. São Paulo: Saraiva,
1997. v. 1, p. 11. Observe-se que os dois autores fazem referência a Aníbal
Bruno, criminalista que se notabilizou no Brasil nos meados do século XX.
[195]
ROTTERDAM, Erasmo de. Elogio da loucura. São Paulo: Martin Claret, 2003.
p. 32.
[196]
GRECO, Rogério. Curso de direito penal: parte geral. 2. ed. Rio de
Janeiro: Impetus, 2003. p. 15.
[197]
GRECO, Rogério. Curso de direito penal: parte geral. 2. ed. Rio de
Janeiro: Impetus, 2003. p. 16.
[198]
PERELMAN, Chaim. Lógica jurídica: nova retórica. São Paulo: Martins
Fontes, 1998. p. 70-71.
[199]
REALE JÚNIOR, Miguel. Teoria do delito. 2. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2.000. p. 28-29.
[200] Segundo João
José Leal, a Dinamarca é um dos poucos países ocidentais que admite a analogia in
malam partem (Direito penal geral. São Paulo: Atlas, 1998. p.
116/117).
[201]
MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. 9. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 1979. p. 272.
[202] STF. Pleno. ADC 4424. Rel. Marco Aurélio. Disponível
em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=199853>.
Acesso em 10.2.2011, às 7h30.
[203]
MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 8. ed. São Paulo: Atlas,
1999. p. 50-52.
[204]
NADER, Paulo. Introdução ao estudo do direito. 32. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2010. p. 355-356.
[205]
É importante destacar que a Constituição Federal não faz a distinção entre
Direito Processual Criminal e Direito Processual Civil (art. 22, inciso I), mas
mais adiante os distingue (art. 62, § 1º, alínea “b”).
[206]
ZAFFARONI, Eugenio Raúl, PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal
brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p. 102.
[207]
NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 2. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2002. p. 34.
[208] ORDEIG,
Enrique Gimbernat. Conceito e método da ciência do direito penal. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 25.
[209]
FERNANDES, Newton; FERNANDES, Valter. Criminologia integrada. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1.995. p. 531.
[210]
BUSATO, Paulo César; HAUPAYA, Sandro Montes. Introdução ao direito penal.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2.003. p. 17-19.
[211]
ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal
brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1.997. p. 159.
[212]
Ibidem. p. 158.
[213]
FARIAS JÚNIOR, João. Manual de criminologia. 2. ed. Curitiba: Juruá,
1.993. p. 21.
[214]
SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2.004. p. 32.
[215]
FARIA JÚNIOR, João. Manual de criminologia. 2. ed. Curitiba: Juruá,
1.993. p. 22.
[216]
JÚNIOR, Sidio Rosa de Mesquita. Cresce o Número de Sequestros Relâmpagos e
não há Solução Legislativa Razoável. Juiz de Fora: Universo Jurídico, ano
XI, 14.2.2012. Disponivel em: <http://uj.novaprolink.com.br/doutrina/8102/cresce_o_numero_de_sequestros_relampagos_e_nao_ha_solucao_legislativa_razoavel>.
Acesso em: 23.2.2012, às 10h.
[217]
OLIVEIRA, Edmundo. Vitimologia e direito penal. Rio de Janeiro: Forense,
1.999 (O autor não chega a dizer que há autonomia da Vitimologia. Porém, ele
cria a distinção entre vitimólogos e penalistas, fazendo crer que
a Vitimologia e o Direito Criminal são ciências autônomas).
[218]
COULANGES, Fustel de. A cidade antiga. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes,
2.000. p. 139.
[219]
FERRI, Enrico. Princípios de direito criminal: o criminoso e o crime. 2. ed. Campinas: Bookseller, 1999. p.
63.
[220]
SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2.004. p. 62.
[221]
Ibidem. p. 63.
[222]
Ibidem. p. 62.
[223]
LOMBROSO, Cesare. O homem delinquente. Porto Alegre: Ricardo Lenz,
2.001. p. 30.
[224]
Ibidem. p. 63.
[225]
Ibidem. p. 73.
[226]
Ibidem. p. 79-80.
[227]
Ibidem. p. 83-84.
[228]
Ibidem. p. 99.
[229]
Ibidem. p. 30.
[230]
Ibidem. p. 103.
[231]
Ibidem. p. 105.
[232]
Ibidem. p. 106.
[233]
Ibidem. p. 109-123.
[234]
Ibidem. p. 125.
[235]
Ibidem. p. 126.
[236]
Ibidem. p. 127.
[237]
Ibidem. p. 127-128
[238]
Ibidem. p. 128-129.
[239]
Ibidem. p. 130-131.
[240]
Ibidem. p. 131-136.
[241]
Ibidem. p. 138.
[242]
Ibidem. p. 147-149.
[243]
Ibidem. p. 153.
[244]
Ibidem. p. 157-158.
[245]
Ibidem. p. 158.
[246]
DURKHEIM, Émile. O suicídio: estudo de sociologia. São Paulo: Martins
Fontes, 2.000. p. 303-353.
[247]
LOMBROSO, Cesare. O homem... op. cit. p. 159-177.
[248]
Ibidem. p. 179-211.
[249]
Ibidem. p. 213-221.
[250]
Ibidem. p. 223-246.
[251]
Ibidem. p. 247-274.
[252]
Ibidem. p. 266.
[253]
Ibidem. p. 281-289.
[254]
FERRI, Enrico. Princípios de direito criminal: o criminoso e o crime. 2.
ed. Campinas: Bookseller, 1999. p. 255.
[255]
Ibidem. p. 256.
[256]
Ibidem. p. 257.
[257]
Ibidem. p. 258-259.
[258]
Ibidem. p. 259-260.
[259]
Ibidem. p. 260-262.
[260]
ALBERGARIA, Jason. Criminologia. Rio de Janeiro: Aide, 1988.
[261]
MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Prescrição penal. 3. ed. São Paulo:
Atlas, 2003. p. 218.
[262]
SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2004. p. 156.
[263]
Ibidem. p. 159.
[264]
FERNANDES, Newton; FERNANDES, Valter. Criminologia integrada. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1995. p. 332-333.
[265]
OLIVEIRA, Edmundo. As vertentes da criminologia crítica. www.google.com.br,
11.5.2004, 12h15.
[266]
PASSETI, Edson et al. Conversações abolucionistas. São Paulo:
IBCCrim, 1997 (toda a obra está beseada em uma palestra em que vários juristas
discorreram sobre a inutilidade do Direito Criminal).
[267] HULSMAN, Louk e CELIS, Jacqueline
Bernat. Penas perdidas.
2. ed. Niterói: Luam. 1997: em toda a obra Hulsman procura demonstrar que a
pena é meramente simbólica, sem grandes reflexos utilitários. Aliás, ao
contrário, ela é um mal desnecessário.
[268]
SOLAZZI, José Luís. A “politização da normalidade”: um diagnóstico do sistema
penal de suspeição. PASSETI, Edson, SILVA, Roberto Baptista Dias da (org.). Conversações
abolicionistas. São Paulo: IBCCrim, 1997. p. 65.
[269]
HULSMAN, Louk. Temas e conceitos numa abordagem abolucionista da justiça
criminal. Idem. p. 210.
[270]
HULSMAN, Louk, CELIS, Jackeline Bernat. Penas perdidas – o sistema penal em questão. 2. ed.
Niterói: Luam, 1997. p. 86-88.
[271] FERRAJOLI,
Luigi. Direito e razão: teoria
do garantismo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 202.
[272]
QUEIROZ, Paulo de Souza. Funções do direito penal: legitimação “versus”
deslegitimação do sistema penal. Rio de Janeiro: Del Rey, 2001. p. 90.
[273]
BARATTA, Alessandro. Criminologia crítica e crítica do direito penal. 2.
ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1999. p. 216.
[274]
Ibidem. 217.
[275]
BUSATO, Paulo César; HAUPAYA, Sandro Montes. Introdução ao direito penal.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003. p. 15.
[276]
FERNANDES, Newton; FERNANDES, Valter. Criminologia integrada. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1.995. p. 602.
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