sexta-feira, 8 de novembro de 2024

Não tenho tempo

Perdoe-me aquele que deseja que eu tenha tempo para estar aqui a todo tempo. Não posso porque não é assim. O deus do tempo (Cronos) é severo. Não nos dá muito lugar para fazermos só o que desejamos.

Não é razoável pensar que todas as pessoas poderão ser influenciers porque senão inexistirão pessoas a serem influenciadas. Um pouco de trabalho, amor e anonimato é importante para podermos viver bem sem desejar sucesso desmedido e injustificável, isso de forma tão rápida que Cronos sequer perceba.

Não tenho tempo para ser famoso. Prefiro ter tempo para estudar.

Desculpem-me.

terça-feira, 8 de outubro de 2024

A felicidade em um modelo simples

1. FINALIDADE

Tratarei rapidamente sobre os modelos de felicidade que nos são apresentados, especialmente em face de um texto publicado por um “filósofo boteco”, como ele próprio se intitula. Um bom texto que me levou à presente reflexão.[1]

O texto me foi enviado pelo Google, um daqueles textos impulsionados por inteligência artificial, dentre muitos selecionados pelos algoritmos como aqueles que potencialmente me interessam. Acertaram em cheio porque a leitura me levou a escrever o presente texto.

2. ESTRANGEIRISMOS PARA DEMONSTRAR APARENTE ELEVADA CULTURA

Digo inicialmente que a nossa língua portuguesa vem sendo abandonada pelos brasileiros mais jovens. Há um crescente estrangeirismo na linguagem corrente, nas gírias, em um suposto empoderamento das pessoas por evidenciarem estarem incluídos no mundo civilizado.

Uma pessoa treinadora de outrem é denominada coach. Uma mentalidade vencedora é denominada “’mindset’ vencedor”. Isso me faz rememorar o que escrevi anteriormente:

...tive dificuldades ao conhecimento de outros idiomas, sendo oportuna a crítica de Erasmo de Rotterdam ao excesso de estrangeirismos dos discursos superficiais que usam diversas palavras gregas e de outras línguas para lançar poeira aos olhos do leitor e aqueles que entendem quatro ou cinco vocábulos estrangeiros se orgulharão do próprio saber e os que não entendem os admirarão na proporção da própria ignorância.[2][3]

É lógico que não pretendo que esqueçamos que muitos conhecimentos são expressos em línguas nacionais dos pesquisadores estrangeiros, sendo que “Mindset” como a Psicologia do sucesso tem a forte influência da estadunidense Carol S. Dweck.[4] De todo modo, devemos valorizar o nosso idioma oficial (Constituição Federal, art. 13, caput).

3. O TEXTO DE RENATO DE FARIA COM ALGUMAS CONSIDERAÇÕES QUE FAREI

A introdução é uma provocação ao leitor, in litteris:

Já cansou de ouvir que o sucesso está a apenas uma mudança de mindset de distância? Que tudo que falta na sua vida é acordar às 5h da manhã, fazer yoga e recitar mantras de gratidão enquanto toma seu chá de kombucha? Pois bem, meus parabéns! Você finalmente percebeu que está sendo gentilmente enganado. Bem-vindo ao maravilhoso mundo dos fracassados conscientes, onde o sarcasmo é nosso melhor coach, e a filosofia, nosso manual de sobrevivência.[5]

O texto passa por Kant para lembrar que “viver é enfrentar dilemas morais e que nem sempre o bem-estar virá em pacotes prontinhos, como um curso de 12 semanas que promete transformar a sua vida”.[6] O fato é que Alain de Botton procura demonstrar que a Filosofia é prática e pode ser utilizada em nosso favor.[7]

É interessante verificar que “tem gente ‘coaxando’ o mantra de ‘você é único, incrível e nasceu para brilhar’”, trazendo o pessimismo de Schopenhauer para alertar que a vida não é tão simples assim. A felicidade está em aceitar o fracasso inevitável.

Com propriedade, Renato de Faria afirma que O desejo incessante de ser ‘melhor’ ou de ‘ter sucesso’ só aumenta nossa angústia”.[8] E passa por Nietzsche para dizer “o que você realmente é... é uma bagunça, sem fim”. E gosto quando ele afirma “...a filosofia não oferece um ‘mindset vencedor’. Ela oferece o pensamento crítico. E pensar criticamente é, muitas vezes, desconfortável.”.[9] Com efeito, nem tudo tem solução e devemos aceitar, não raramente, as nossas limitações.

Devemos parar de “coaxar mantras” e acordar às 5h da manhã não é imprescindível ao sucesso.[10] Veja-se que o texto foi publicado às 4h, induzindo a ideia de que o autor seja notívago. Cada um tem o seu jeito de ser.

4. CONCLUSÃO

Vale a pena ler o texto de Renato de Faria, a fim de refletir sobre as soluções simplistas do “coachs”, as quais podem te induzir a problemas ainda maiores e, ao final, à sensação de não passar de mais um fracassado.



[1] FARIA, Renato de. Filósofos contra coaches: diferentemente do que dizem os gurus do desenvolvimento pessoal, a filosofia não merece um “mindset vencedor”. Ela oferece um pensamento crítico. Estado de Minas, Filosofía Explicadinha, 7.10.2024, às 4h. Disponível em: <https://www.em.com.br/colunistas/filosofia-explicadinha/2024/10/6959053-filosofos-contra-coaches.html>. Acesso em: 8.10.2024, às 9h.

[2] ROTTERDAM, Erasmo. Elogio da loucura. São Paulo: Martin Claret, 2000. p. 18.

[3] MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Machismo puro sangue: a minha percepção da obra elogio da loucura, de Erasmo de Rotterdam, nos anos de 2017 a 2020. E a felicidade? Pode ser conquistada? Estudos jurídicos de filosóficos, 19.9.2021. Disponível em: <https://sidiojunior.blogspot.com/2021/09/machismo-puro-sangue-minha-percepcao-da_7.html>. Acesso em: 8.10.2024, às 9h25.

[4] DWECK, Carol S. Mindset: A nova psicologia do Sucesso. Rio de Janeiro: Companhia das Letras, 2016. Disponível em: <chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://editoracaminhar.com.br/wp-content/uploads/2020/06/Mindset-A-Nova-Psicologia-do-Sucesso-Carol-Dweck1.pdf.pdf>. Acesso em: 8.10.2024, às 9h20.

[5] FARIA, Renato de. Filósofos contra coaches: diferentemente do que dizem os gurus do desenvolvimento pessoal, a filosofia não merece um “mindset vencedor”. Ela oferece um pensamento crítico. Estado de Minas, Filosofía Explicadinha, 7.10.2024, às 4h. Disponível em: <https://www.em.com.br/colunistas/filosofia-explicadinha/2024/10/6959053-filosofos-contra-coaches.html>. Acesso em: 8.10.2024, às 9h.

[6] Ibidem.

[7] BOTTON, Alain de. As consolações da filosofia. Porto Alegre: L&PM, 2014.

[8] FARIA, Renato de. Filósofos contra coaches: diferentemente do que dizem os gurus do desenvolvimento pessoal, a filosofia não merece um “mindset vencedor”. Ela oferece um pensamento crítico. Estado de Minas, Filosofía Explicadinha, 7.10.2024, às 4h. Disponível em: <https://www.em.com.br/colunistas/filosofia-explicadinha/2024/10/6959053-filosofos-contra-coaches.html>. Acesso em: 8.10.2024, às 9h.

[9] Ibidem.

[10] Ibidem.

terça-feira, 24 de setembro de 2024

Razões para as autonomias administrativa e de gestão financeira e patrimonial da Advocacia-Geral da União

1. FINALIDADE

O presente texto visa a demonstrar que a Advocacia-Geral da União-AGU tem tratamento constitucional diferenciado, isso porque para cumprir o seu múnus constitucional ela precisa gozar de autonomia. Seus membros devem estar vinculados aos constitucionais princípios da legalidade e da supremacia do interesse público sobre o particular[1] e gozarem de garantias que impeçam a indevida ingerência na atuação proba e dotada de moralidade pública, isso a fim de atenderem aos anseios sociais.

O que viso a demonstrar tem íntima relação com um artigo que publiquei, há quase 20 anos que o fiz, razão de o citar algumas vezes no presente texto, visto que estará em discussão a advocacia, a qual, em sentido amplo, é “...todo ato que é praticado na defesa de interesse de outrem. Todavia, do ponto de vista [r]estrito, a advocacia é uma profissão regulada por lei, sendo que a Constituição Federal estabelece diferentes espécies de advocacia”.[2]

É necessário haver uma mudança de paradigmas, a fim de que as duas procuraturas,[3] a de defesa do cidadão (Ministério Público-MP) e a de defesa do Estado (AGU e Procuradorias dos Estados e do Distrito Federal) percebam que integram uma unidade – constitucionalmente individualizadas – para a defesa do interesse público.

2. PROCURATURAS NA ORDEM CONSTITUCIONAL DE 1967 E 1969

Na CF/1967, o Ministério Público-MP estava no Título I, “Da organização nacional”, Capítulo VIII, “Poder Judiciário”, Seção IX, “Do Ministério Público”, com a atribuição de defender a União e outras atribuições remetidas à legislação infraconstitucional. Também, autorizava a lei estadual a criar os seus MP’s e a lei federal transferir atribuições de causas federais do interior aos MP’s locais.[4] Estava respeitada a forma federativa do Estado, uma vez que remetia à Unidade Federativa a instituição e regulação dos seus MP’s.

A Ordem dos Advogados do Brasil estava referida uma única vez, isso no mesmo capítulo nupercitado, Seção VIII, “Da justiça dos estados” (art. 138, inciso I). A palavra “Advogados” constava 8 vezes, quando organizava os tribunais e previa o denominado “quinto” constitucional e os extintos Juízes “vogais” da Justiça do Trabalho.

Com isso, vê-se que não havia previsão de uma AGU e de Procuradorias dos Estados naquela ordem constitucional. Também, município não era ente federativo, somente os Estados, o Distrito Federal e os Territórios o eram (art. 1º).[5] Assim, não havia referência às procuradorias municipais.

Em 4.11.2010, no 4º Encontro Nacional dos Advogados Públicos Federais, realizado no Hotel Crowne Plaza, em Salvador-PA, o então Deputado Federal Aldo Rebelo, criticou duramente a estrutura constitucional atual (com duas procuraturas) por entender ser impossível dissociar a defesa do Estado da defesa do cidadão. Há propriedade nisso, uma vez que ao se defender o cidadão, mediatamente, defende-se o Estado Democrático de Direito e vice-versa.

Um sistema criminal acusatório exige que uma parte acuse, outra defenda e pessoa diversa decida. Aliás, a Teoria Geral do Processo informa que o processo é uma relação triangular, em que uma parte pede, outra contesta e o Estado-Juiz decide.

A CF vigente valorizou a advocacia, destacando-a, desde a redação original, sob o título “Órgãos essenciais à administração da justiça”, conforme veremos a seguir.

3. FUNÇÕES ESSENCIAIS À JUSTIÇA

Na CF, estão previstos no “Capítulo IV – Das funções essenciais à justiça” do “Título IV – Da organização dos Poderes”. Na redação originária, de 1988, esse Capítulo IV era econômico em disposições, salvo quanto ao MP, visto que, conforme mencionei anteriormente, seu lobby[6] foi intenso perante o legislador constituinte.

O Capítulo IV em questão, originalmente, era dividido em 3 seções, a saber: (I) Do Ministério Público; (II) Da Advocacia-Geral da União; (III) Da Advocacia e da Defensoria Pública. A Emenda Constitucional-EC n. 19, de 4.6.1998, renomeou a Seção II do Título IV para: (II) Da Advocacia Pública. Mas, poucas alterações foram feitas neste capítulo.

O Lobby dos Defensores Públicos da União e do Distrito Federal trouxe nova modificação ao Capítulo IV. A Seção III foi renomeada para “Da Advocacia”. Também, criou-se a “Seção IV – Da Defensoria Pública”, o que se deu por intermédio da EC n. 80, de 4.6.2014. Ressalte-se que originalmente a denominada norma constitucional de eficácia limitada institucional previa que a Defensoria Pública do Distrito Federal-DPDF seria organizada e mantida pela União (art. 134, parágrafo único).

3.1 Ministério Público

O Ministério Público foi analisado por mim alhures, afirmando que a sua natureza jurídica é executiva,[7] daí José Afonso da Silva afirmar ser uma instituição vinculada ao Poder Executivo.[8] Essa posição – a de que o MP está vinculado ao Poder Executivo – não encontra lugar na ordem jurídica constitucional.

Não é desarrazoada a inclusão do MP ao lado da advocacia, uma vez que o Membro do MP, assim como qualquer Advogado, conforme ensinava Pontes de Miranda, “promove, postula, pede, impetra, litiga. Nenhum ato dele é de ordenação. É de promoção. A atividade, a que se possa aludir, é sua, e consiste em promover”.[9]

Não posso especular, como o fez Alexandre de Moraes, para afirmar que Montesquieu, se tivesse atualizado o seu Espírito das Leis, teria apresentado mais poderes no Estado. Assim, o MP seria um quarto Poder.[10] Não posso compactuar com isso, porque a CF só admite três Poderes (art. 2º).

Não concordo, também, com a posição de que o MP seja parte Poder de Justiça. Nessa concepção, haveria um Poder de Jurisdicional, que seria exclusivo do Poder Judiciário, e um Poder de Justiça, zelando pelo fiel cumprimento e observância das leis, formado por Advogados, Polícia Judiciária e Ministério Público.[11]

Do mesmo modo, não compactuo com a corrente que informa que o MP é tão somente parte no processo.[12] O alargamento das atribuições do MP, não permite vê-lo exclusivamente como parte, até porque, conforme destaquei alhures, ele será substituto processual ao falar – em nome próprio – na defesa da coletividade, do Estado ou de indivíduos.[13][14]

Concordo com Hugo Mazzilli, no sentido de que o MP tem especial destaque na Constituição Federal, o que evidencia a sua relevante importância para a defesa dos direitos fundamentais individuais dos cidadãos, sendo um órgão do Estado, não do governo, nem do Poder Executivo.[15]

Disciplinado nos arts. 129-130-A da CF, o MP tem por princípios institucionais “a unidade, a indivisibilidade[16] e a independência institucional” (art. 127, § 1º). O mesmo artigo prevê as autonomias funcional e administrativa do MP (§ 2º).

O art. 128 da CF traz a estrutura do MP, as garantias e as vedações dos seus Membros. O art. 129, por sua vez, disciplina suas atribuições, enquanto o art. 130 trata dos Membros do MP junto aos Tribunais de Conta. Por fim, o art. 130-A, incluído pela EC n. 45, de 30.12.2004, disciplina o Conselho Nacional do Ministério Público-CNMP.

Há 25 anos que venho publicando textos nos quais afirmo que o Membro do MP, assim como o Advogado, pede, postula ou promove a proteção de direitos subjetivos de terceiros.[17]

3.2 Defensoria Pública

Constitucionalmente, a instituição Defensoria Pública é expressão e instrumento do regime democrático, cabendo-lhe a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados (CF, art. 134, caput).[18]

Mesmo com a redação dada pela EC n. 80/2014, a literalidade do art. 134 da CF, parece manter a DPDF atrelada à União, o que não é correto. Com efeito, a EC n. 69, de 29.12.2012, alterou: (a) o art. 21, inciso XIII da CF para retirar da União a competência para organizar e manter a DPDF; (b) o art. 22, inciso XVII, da CF, para retirar a competência privativa da União para a organização da DPDF; e (c) art. 48, inciso IX da CF, para retirar do Congresso Nacional a atribuição de regular a DPDF.

O Membros da Defensoria Pública da União e dos Territórios-DPUT, da DPDF e dos Estados têm a garantia de inamovibilidade (CF, art. 134, § 1º). Todas elas têm autonomia funcional e administrativa e a iniciativa de sua proposta orçamentária (CF, art. 134, §º 2º-3º).

A Defensoria Pública, com a EC n. 80/2014, ao exemplo do MP, passou a ser orientada pelos princípios da unidade, indivisibilidade e autonomia institucional, bem como – no que couber – lhe foram asseguradas as constitucionais garantias dos Membros do Poder Judiciário, bem como sua organização administrativa (CF, art. 134, § 4º).

O Defensor Público advoga em prol de necessitados, isso não é diferente do que faz o Membro do MP. Em matéria criminal inverte-se apenas os lados, o Membro do MP acusa o réu e o Membro da DP o defende.

O Membro do MP não pode se inscrever na Ordem dos Advogados do Brasil-OAB e o Advogado que for investido no cargo de Membro do MP terá sua inscrição cancelada, isso em face da incompatibilidade com o exercício da advocacia privada (Lei n. 8.906, de 4.7.1994, art. 28, inciso II).[19] Não tendo essa previsão legal em favor da categoria, os Defensores Públicos tiveram que litigar com a OAB, sendo que o STF firmou a seguinte tese para o seu Tema 1.074:

É inconstitucional a exigência de inscrição do Defensor Público nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil.[20]

A litigiosidade não cessou por aí. A Lei Complementar n. 80, de 12.1.1994, organiza a Defensoria Pública da União, do Distrito Federal e dos Territórios, sendo que o Conselho Federal da OAB impugnou alguns dos seus dispositivos, aduzindo serem inconstitucionais. Então, o STF decidiu:

EMENTA: Ação direta de inconstitucionalidade. 2. Art. 4º, inciso V, expressão “e jurídicas” e § 6º, da Lei Complementar n. 80/1994, com a redação dada pelo art. 1º da Lei Complementar n. 132/2009. 3. Atendimento de pessoas jurídicas pela Defensoria Pública. Possibilidade. 4. Capacidade postulatória do Defensor Público em razão de nomeação e posse no cargo. Constitucionalidade. 5. Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente.[21]

O acórdão esclarece:

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, sob a presidência do Senhor Ministro Luiz Fux, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, julgar improcedente a ação direta e conferiu, ainda, interpretação conforme à Constituição ao art. 3º, § 1º, da Lei n. 8.906/1994, declarando-se inconstitucional qualquer interpretação que resulte no condicionamento da capacidade postulatória dos membros da Defensoria Pública à inscrição dos Defensores Públicos na Ordem dos Advogados do Brasil, nos termos do voto do Relator. ação direta e conferiu, ainda, interpretação conforme à Constituição ao art. 3º, § 1º, da Lei n. 8.906/1994, declarando-se inconstitucional qualquer interpretação que resulte no condicionamento da capacidade postulatória dos membros da Defensoria Pública à inscrição dos Defensores Públicos na Ordem dos Advogados do Brasil, nos termos do voto do Relator.[22]

Vê-se que o lobby da Defensoria Pública foi relevante para tornar constitucional a sua autonomia e independência, o que não está presente na CF em favor advocacia pública, especialmente, da federal. Ressalte-se que esse fortalecimento da Defensoria Pública tem constrangido parlamentares, visto que, tendo garantias constitucionais, Defensores Públicos podem litigar contra os atos dos três Poderes da República, movendo ações civis públicas para defesa dos necessitados, sem o risco de indevidas represálias.

3.3 Advocacia-Geral da União

Já fui radical quanto à distinção entre as advocacias pública e privada, dizendo haver incompatibilidade entre elas.[23] Ocorre que a AGU publicou a Orientação Normativa n. 27, de 9.4.2009, autorizando a advocacia em causa própria e a pro bono. Corroborou a Portaria n. 758, de 9.6.2009, que regulamentou a advocacia pro bono por Membros da AGU.

O Direito, para o Ministério da Educação, constitui ciência social aplicada. Como lecionei em Instituições de Ensino Superior-IES, de 1995 a 2020, entendia ser fundamental a prática para o adequado magistério jurídico. Daí, em 2013, ter reativado a minha inscrição na OAB-DF e atuado criminalmente, sempre vinculando a minha advocacia aos Núcleos de Práticas Jurídicas das IES em que trabalhava e, no plenário do tribunal do júri, sempre me fazia acompanhar de estudantes de Direito. Com isso mantive a minha prática jurídico-criminal.

A obrigatoriedade da inscrição do Membro da AGU na OAB sempre me pareceu esdrúxula. A Lei n. 13.327, de 29.7.2016, instituiu o Conselho Curador dos Honorários Advocatícios-CCHA devidos aos Advogados Públicos Federais. Então, como solução administrativa, neste ano de 2024, os Advogados Públicos pagam as anuidades da OAB e a CCHA restitui os valores, isso com os recursos que são dos próprios Advogados Públicos. Assim, o problema da obrigatoriedade da inscrição na OAB não foi legalmente resolvido.

Provavelmente a questão da inscrição na OAB será resolvida pelo STF no julgamento do RE 609.517-RO, cujo julgamento virtual foi pautado para o período de 29.3.2024 a 8.4.2024, ocorre que – após o voto do relator – o Ministro Edson Fachin requereu destaque (para sessão presencial a ser designada). O relator propôs a seguinte tese para o Tema 936 da repercussão Geral:

(I) É inconstitucional a exigência de inscrição do Advogado Público nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil, para o exercício das atividades inerentes ao cargo público; (II) A inscrição de advogados públicos nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil poderá ocorrer de forma voluntária, individualizadamente, ou mediante ato administrativo a ser firmado entre o órgão de representação estatal e a Ordem dos Advogados do Brasil.[24]

Concordo com a tese apresentada pelo relator, abandonando o radicalismo de outrora acerca do assunto e, em postura moderada, adoto a integra do voto do Ministro Cristiano Zanin.[25] Caso seja para haver convênio entre a OAB e a União, que as despesas sejam orçamentárias, não com os recursos que são dos Advogados Públicos Federais, geridos pela CCHA, visto que isso – da forma que se consolidou - constitui engodo para manter a obrigatoriedade da inscrição na OAB, isso sem ônus para o Estado.

Quanto às autonomias administrativa e de gestão financeira e patrimonial da AGU, a experiência de uma Defensoria Pública forte tem assustado parlamentares, ficando complicada a inserção no texto constitucional na presente legislatura. Ocorre que já existem elementos jurídicos suficientes, ao menos para que os Membros da AGU deixem de ser subservientes ao Poder Executivo e se posicionem com a altivez que o exercício das suas atribuições exige.

A própria AGU informa não estar vinculada a nenhum dos três Poderes da República Federativa do Brasil, in verbis:

A AGU é uma Instituição prevista pela Constituição Federal, e tem natureza de Função Essencial à Justiça, não se vinculando, por isso, a nenhum dos três Poderes que representa.[26]

Lamentavelmente, contrariando a CF, o Advogado-Geral da União se autoproclama Ministro de Estado. Em sentido contrário a essa posição, a CF dispõe:

Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:

(...)

VI - dispor, mediante decreto, sobre:

a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos;

b) extinção de funções ou cargos públicos, quando vagos;

(...)

XII - conceder indulto e comutar penas, com audiência, se necessário, dos órgãos instituídos em lei;

(...)

XXV - prover e extinguir os cargos públicos federais, na forma da lei;

(...)

Parágrafo único. O Presidente da República poderá delegar as atribuições mencionadas nos incisos VI, XII e XXV, primeira parte, aos Ministros de Estado, ao Procurador-Geral da República ou ao Advogado-Geral da União, que observarão os limites traçados nas respectivas delegações.

Veja-se a redação do parágrafo único, no qual há nítida distinção entre Ministro de Estado, Procurador-Geral da República-PGR e Advogado-Geral da União. Os dois últimos se equiparam a Ministro de Estado, mas não o são. Ora, o que a Constituição Federal distingue, é vedado ao intérprete igualar. Nesse sentido, temos vasta doutrina, por exemplo:

Por essa razão a Constituição Federal, então, elencou as funções essenciais à Justiça em capítulo apartado, de todos os Poderes, colocando, então, além da advocacia pública, o Ministério Público e a Defensoria Pública nesse tratamento diferenciado.[27]

A disciplina constitucional dos Ministros de Estado está na Seção IV do Capítulo II do Título IV da CF, ou seja, dentro do Poder Executivo, isso porque são auxiliares diretos do Presidente da República. Diversamente, as “funções essenciais à Justiça” serão exercidas por órgãos de Estado, não de governo.

A Lei n. 13.327/2016, estabelece que são carreiras jurídicas da União: (I) Advogado da União; (II) Procurador da Fazenda Nacional; (III) Procurador Federal; (IV) Procurador do Banco Central do Brasil; e (V) quadros suplementares em extinção previstos no art. 46 da Medida Provisória n. 2.229-43, de 6 de setembro de 2001 (art. 27). O art. 38 da lei enumera algumas garantias dos ocupantes de tais carreiras, dentre elas:

VII - ter o mesmo tratamento protocolar reservado aos magistrados e aos demais titulares dos cargos das funções essenciais à justiça;

Quando digo que o integrante de qualquer dessas carreiras jurídicas precisa reconhecer que, embora não tenha autonomia institucional garantida na constituição ou norma infraconstitucional, é necessário que utilize aquilo que já dispõe em seu favor e, respeitando aos princípios da legalidade e da supremacia do interesse público sobre o particular, aja em defesa do Estado, ainda que venha a contrariar governos. A AGU deve buscar as suas independência e autonomia, visto que são essenciais ao atendimento do seu múnus.

O STF, no julgamento da ADI 5262-RR, citou diversos precedentes que reconhecem as distinções entre os artigos 131 e 132 da CF, visto que a União pode ter diversas carreiras jurídicas, enquanto aos Estados e ao Distrito Federal foi adotada a regra da unicidade de representação jurídica.[28]

Ratifico que a AGU representa a União, não somente o Poder Executivo. Por isso, defende, também, atos dos Poderes Legislativo e Judiciário. Isso não gera qualquer conflito porque a AGU não integra qualquer um deles. Nesse sentido:

A Advocacia-Geral da União é, portanto, órgão autônomo, não se vinculando a nenhum dos Poderes, apesar de representar a todos em juízo. No que tange à atividade consultiva, seu objetivo parece ser claro: enfatizar seu dever constitucional de, com impessoalidade e sensibilidade social, olhar de fora os atos administrativos praticados pelos órgãos e entidades do Poder Executivo e sobre eles exercer o controle da legalidade.[29]

Há quem defenda que o Advogado Público terá o poder-dever de promover até mesmo ação de improbidade administrativa quando tomar conhecimento do ato de improbidade.[30] No entanto, integrantes das carreiras jurídicas vinculadas à AGU que chamam o seu titular de Ministro jamais serão capazes de fazer prevalecer a legalidade e a supremacia do interesse sobre o particular em desconformidade com a vontade do governante, isso porque acostumados à subserviência, o que evidencia a imperiosa necessidade de atribuir constitucionalmente à AGU as garantias asseguradas à Defensoria Pública e aos seus membros.

Esses apáticos integrantes da AGU serão incapazes de lutar pela autonomia administrativa e de gestão financeira e patrimonial do órgão, o que é essencial, visto que – assim como o Ministério Público e a Defensoria Pública – a Advocacia pública precisa de independência institucional para bem defender o Estado. Outrossim, é fundamental que tenha autonomia administrativa e de gestão financeira e patrimonial, a fim de bem atuar em prol do Estado.

4. CONCLUSÃO

A atuação da Advocacia-Geral da União é essencialmente administrativa, assim como são as atividades do Ministério Público e da Defensoria Pública. Essas duas últimas instituições têm assegurada constitucionalmente a autonomia institucional.

Embora inexista tal garantia constitucional em favor da Advocacia-Geral da União, seus Membros têm que pensar mais no bem da instituição e do Estado – menos em si mesmos -, a fim de efetivarem algumas outras conquistas essenciais à sua autonomia. Talvez, a primeira e mais urgente providência é a modificação de cultura, afastando a ideia de que o Advogado-Geral da União seja Ministro de Estado e repudiar qualquer proposta de ser ou tornar a instituição integrante do Poder Executivo.



[1] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 63. Para não deturpar o seu pensamento, transcrevo a sua lição:

Os dois princípios fundamentais e que decorrem da assinalada bipolaridade do Direito Administrativo – liberdade do indivíduo e autoridade da Administração – são os princípios da legalidade e da supremacia do interesse público sobre o particular, que não são específicos do Direito Administrativo porque informam todos os ramos do Direito Público; no entanto, são essenciais, porque, a partir deles, constroem-se todos os demais.

[2] MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. A advocacia pública é incompatível com a inscrição do profissional na Ordem dos Advogados do Brasil. TERESINA: Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862. ANO 12, N. 1599, 17.11.2007, Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/10671/a-advocacia-publica-e-incompativel-com-a-inscricao-do-profissional-na-ordem-dos-advogados-do-brasil>. Acesso em: 22.9.2024, às 13h03.

[3] Procuratura. Do latim procurãtu (<ocupado>+ura=partilhar), significa procuradoria ou procuratoria, ou ainda, ofício, cargo, repartição ou emolumentos do procurador.

A palavra “procuratura” é, portanto, uma palavra que tem lugar em uma abordagem jurídica do assunto.

Em meus tempos de graduação tive um Professor de Direito Processual Civil que recomendava a leitura de um texto de sua autoria que propunha uma linguagem simples, acessível às pessoas comuns (REIS, Novély Vilanova da Silva. O que não deve ser dito. Brasília: TRF/1, 1994. O texto está disponível em: <https://www.osoriobarbosa.com.br/index.php/artigos/contos-escritos-de-amigos/item/852-o-que-nao-deve-ser-dito-notas-de-linguagem-forense-e-algumas-observacoes-praticas-novely-vilanova-da-silva-reis>. Acesso em: 22.9.2024, às 8h). O Direito Alternativo tinha proposta semelhante. Roberto Lyra Filho, na Universidade de Brasília, desenvolveu um curso de extensão denominado Direito Achado na Rua, ainda valorizado na UnB, sendo um módulo do Programa de Pós-Graduação em Direitos Humanos e Cidadania (Disponível em: <chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://ppgdh.unb.br/images/Oferta_1_2022/Ementas/O_Direito_Achado_na_Rua.pdf>. Acesso em: 22.9.2024, às 18h22), de cunho socialista e evidentemente fatualista – o fatualismo é um determinismo que propõe que os fatos ocorrerão independentemente da vontade humana - sobre o qual já me manifestei contra (MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. O fatualismo constitui reducionismo grosseiro da experiência jurídica. São Paulo: Âmbito Jurídico, Direito Penal, Revista 64, 1.5.2009. Disponível em: <https://ambitojuridico.com.br/o-fatualismo-constitui-reducionismo-grosseiro-da-experiencia-juridica/>. Acesso em 22.9.2024, às 18h31). O fiz porque, conforme consta do texto citado, “...a ciência do Direito deve ser discutida por cientistas, mediante linguagem e método de estudo próprios”.

Hoje, a AGU impõe aos seus membros o uso de linguagem simples (Portaria Normativa PGF/AGU n. 60, de 6.7.2024, art. 5º, inciso VI). Porém, esse comando é relativo, devendo prevalecer a técnica e o formalismo próprios da liturgia forense, não sendo adequado o excesso de estrangeiros próprios das gírias atuais, unicamente porque comuns na sociedade.

[4] Dispunha a CF/1967:

Art. 137 - A lei organizará o Ministério Público da União junto aos Juízes e Tribunais Federais.

Art. 138 - O Ministério Público Federal tem por Chefe o Procurador-Geral da República, o qual será nomeado pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pelo Senado Federal, dentre cidadãos com os requisitos Indicados no art. 113, § 1º.

§ 1º - Os membros do Ministério Público da União, do Distrito Federal e dos Territórios ingressarão nos cargos iniciais de carreira, mediante concurso público de provas e títulos. Após dois anos de exercício, não poderão ser demitidos senão por sentença judiciária, ou em virtude de processo administrativo em que se lhes faculte ampla defesa; nem removidos, a não ser mediante representação do Procurador-Geral, com fundamento em conveniência do serviço.

§ 2º - A União será representada em Juízo pelos Procuradores da República, podendo a lei cometer esse encargo, nas Comarcas do interior, ao Ministério Público local.

Art. 139 - O Ministério Público dos Estados será organizado em carreira, por lei estadual, observado o disposto no parágrafo primeiro do artigo anterior.

Parágrafo único - Aplica-se aos membros do Ministério Público o disposto no art. 108, § 1º, e art. 136, § 4º.

[5] Tratar o município como ente federativo é uma excrecência jurídica a ser corrigida. Nesse sentido: SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 25. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 474-475.

[6] A versão mais aceita é a de que o termo lobby começou a ser utilizado no início do Século XIX. Em 1835, os termos lobby e lobista começaram a ser utilizados, embora de forma pejorativa, no Congresso dos EUA (In BARBOSA, Marco Antônio Lemgruber. O que é lobby? Brasília: Escola da Câmara, Abr2022. Disponível em: <chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://evc.camara.leg.br/site/wp-content/uploads/2022/04/o_que_e_lobby.pdf>. Acesso em: 19.8.2024, às 20h33). No Brasil, essa visão pejorativa predomina, razão de até quem trabalha com lobby se autodenominar “mediador de interesse”, assessor para assuntos parlamentares”, profissional de relações governamentais” etc.

Lobby é a comunicação oral ou escrita com uma autoridade para influenciar decisões políticas, administrativas e, principalmente, legislativas.

Precisamos evoluir e regular essa profissão, a qual existe na prática e não precisa estar necessariamente vinculada aos interesses espúrios (In MACHADO, Gisele. O lobby é injustiçado no Brasil? Termo é evitado até pelas empresas que realizam, mas prática faz parte da democracia. São Paulo: Câmara Municipal, Revista Apartes, n. 1, Jan-Jun2013. Disponível em: <https://www.saopaulo.sp.leg.br/apartes-anteriores/revista-apartes/numero-1-janeiro-junho2013/no01-o-lobby-e-injusticado-no-brasil/>. Acesso em: 19.8.2024, às 22h10).

[7] MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Execução criminal: teoria e prática. 7. Ed. São Paulo: Atlas, 2014, in litteris:

Sua natureza é administrativa, portanto, executiva, razão pela qual o MP deveria estar vinculado ao Poder Executivo, mas sem perder a sua autonomia institucional. (p. 216)

[8] SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 18. Ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 585.

[9] Apud ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário jurídico brasileiro Acquaviva. 9. ed. São Paulo: Jurídica Brasileira, 1998. p. 848.

[10] MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 5. Ed. São Paulo: Atlas, 1999. p. 447.

[11] CRETELLA JÚNIOR, José. Comentários à Constituição Brasileira de 1988. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1989. v. 6, p. 3294.

[12] ROSA, Antônio José Miguel. Curso de direito constitucional. Rio de Janeiro: EDC, 1990. p. 206.

[13] MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Execução... Op. cit. p. 216.

[14] Não entrarei aqui na discussão sobre a distinção entre representação, própria de quem fala em nome de outrem, e presentação, a qual significa o órgão se fazer presente pelo Membro da AGU. No processo criminal, por se fazer presente por intermédio do MP, o Estado não teria um substituto processual. Ao contrário, estaria presentado por intermédio do seu órgão.

[15] MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime jurídico do ministério público. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 40.

[16] Na prática forense, é corrente verificamos o litisconsórcio ativo de Ministérios Públicos, o que é tecnicamente falho, visto que só há um MP, inclusive para os Tribunais de Conta. Observe-se, por exemplo, na hipótese de um processo criminal em que um Membro do MP estadual venha a apelar e seu recurso venha a ser julgado improcedente, no caso de RE ou de REsp, quem falará perante o STF e STJ será o Ministério Público Federal.

[17] MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Manual de execução penal: teoria e prática. São Paulo: Atlas, 1999. p. 124. Devo destacar que, para quem gosta da dicotomia representação-presentação, o Estado falaria em nome próprio por intermédio do MP, que o torna presente no processo. O Estado não seria representado, mas presentado (tornado presente), pelo MP.

[18] Constituição Federal:

Art. 134. A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, na forma do inciso LXXIV do art. 5º desta Constituição Federal.

§ 1º Lei complementar organizará a Defensoria Pública da União e do Distrito Federal e dos Territórios e prescreverá normas gerais para sua organização nos Estados, em cargos de carreira, providos, na classe inicial, mediante concurso público de provas e títulos, assegurada a seus integrantes a garantia da inamovibilidade e vedado o exercício da advocacia fora das atribuições institucionais.

§ 2º Às Defensorias Públicas Estaduais são asseguradas autonomia funcional e administrativa e a iniciativa de sua proposta orçamentária dentro dos limites estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias e subordinação ao disposto no art. 99, § 2º.

§ 3º Aplica-se o disposto no § 2º às Defensorias Públicas da União e do Distrito Federal.

§ 4º São princípios institucionais da Defensoria Pública a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional, aplicando-se também, no que couber, o disposto no art. 93 e no inciso II do art. 96 desta Constituição Federal.

 

[19] Ainda existem Membros do MP que estão em atividade e exercem advocacia privada, isso porque as suas investiduras no cargo são anteriores a 5.10.1988 e o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias dispõe:

Art. 29. Enquanto não aprovadas as leis complementares relativas ao Ministério Público e à Advocacia-Geral da União, o Ministério Público Federal, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, as Consultorias Jurídicas dos Ministérios, as Procuradorias e Departamentos Jurídicos de autarquias federais com representação própria e os membros das Procuradorias das Universidades fundacionais públicas continuarão a exercer suas atividades na área das respectivas atribuições.

(...)

§ 3º Poderá optar pelo regime anterior, no que respeita às garantias e vantagens, o membro do Ministério Público admitido antes da promulgação da Constituição, observando-se, quanto às vedações, a situação jurídica na data desta.

[20] STF. Plenário. RE n. 1.240.999-SP. Min. Alexandre de Moraes. Julgamento: 4.11.2021. Disponível em: <chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=758757699>. Acesso em: 22.9.2024, às 21h59. O aresto ficou assim ementado:

EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. DEFENSOR PÚBLICO. CAPACIDADE POSTULATÓRIA. INSCRIÇÃO NA ORDEM DOS ADVOGADOS INCONSTITUCIONALIDADE. DESPROVIMENTO. DO BRASIL.

1. O artigo 134, § 1º, da CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ao outorgar à lei complementar a organização da Defensoria Pública da União, do Distrito Federal e dos Territórios, e a edição de normas gerais organizacionais para as Defensorias Públicas dos Estados, vedou expressamente “o exercício da advocacia fora das atribuições institucionais”.

2. A exigência prevista na Lei Complementar 80/1994, de que o candidato ao cargo de defensor público deve comprovar sua inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, não conduz à inarredável conclusão de que o Defensor Público deve estar inscrito nos registros da entidade.

3. O artigo 4º, § 6º, da Lei Complementar 80/1994, na redação dada pela Lei Complementar 132/2009, dispõe que a capacidade postulatória do defensor decorre exclusivamente de sua nomeação e posse no cargo público, para se dedicar unicamente à nobre missão institucional de proporcionar o acesso dos assistidos à ordem jurídica justa.

3. O artigo 4º, § 6º, da Lei Complementar 80/1994, na redação dada pela Lei Complementar 132/2009, dispõe que a capacidade postulatória do defensor decorre exclusivamente de sua nomeação e posse no cargo público, para se dedicar unicamente à nobre missão institucional de proporcionar o acesso dos assistidos à ordem jurídica justa.

4. Logo, o Defensor Público submete-se somente ao regime próprio da Defensoria Pública, sendo inconstitucional a sua sujeição também ao Estatuto da OAB.

4. Logo, o Defensor Público submete-se somente ao regime próprio da Defensoria Pública, sendo inconstitucional a sua sujeição também ao Estatuto da OAB.

5. Recurso extraordinário desprovido. Tese para fins da sistemática da Repercussão geral: É inconstitucional a exigência de inscrição do Defensor Público nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil.

5. Recurso extraordinário desprovido.

[21] STF. Plenário. ADI n. 4.636-DF. Min. Gilmar Mendes. Julgamento: 23.10.2021 a 3.11.2021. Disponível em: <chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=759108412>. Acesso em: 22.9.2024, às 22h24.

[22] Ibidem.

[23] MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. A advocacia pública é incompatível... Op. cit.

[24] STF. Plenário. RE n. 609.517-RO. Ministro Cristiano Zanin. Disponível em: <https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=3845192>. Acesso em: 23.9.2024, às 0h46.

[25] CONJUR. RE n. 609.517-RO. Ministro Cristiano Zanin. Minuta de voto, de 29.3.2024, à 0h. Disponível em: <chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://www.conjur.com.br/wp-content/uploads/2024/03/voto-Zanin-exigencia-inscricao-advogado-publico-OAB.pdf>. Acesso em: 23.9.2024, às 0h51.

[26] AGU. Institucional. Sobre. 9.7.2020, às 16h28. Disponível em: <https://www.gov.br/agu/pt-br/acesso-a-informacao/institucional/sobre>. Acesso em: 23.9.2024, às 1h19.

[27] COUTO, Juliano Costa; MENDES FILHO, Marcelino Rodrigues. AGU não pode ser integrada a um ministério do Poder Executivo. Consultor Jurídico, 1.11.2018. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2018-nov-01/opiniao-agu-nao-integrada-ministerio-executivo/>. Acesso em: 23.9.2024, às 20h38.

[28] STF. Plenário. ADI 5262-RR. Ministra Carmén Lúcia. Julgamento: 28.3.2019. Disponível em: <chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=750565615>. Acesso em: 23.9.2024, às 22h03.

[29] TOFFOLI, José Antônio Dias. AGU, 30 anos, é instituição fundamental para a Justiça e essencial para o cidadão. Consultor Jurídico, 14.2.2023, às 10h01. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2023-fev-14/dias-toffoli-agu-essencial-cidadao2/>. Acesso em: 23.9.2024, às 23h37.

[30] REIS JÚNIOR, Antônio José dos. A obrigatoriedade do procurador do ente público propor ação de improbidade administrativa. TRF4, Revista de Doutrina, edição 13, 21.7.2006. Disponível em: <https://revistadoutrina.trf4.jus.br/index.htm?https://revistadoutrina.trf4.jus.br/artigos/edicao013/Antonio_Junior.htm>. Acesso em: 23.9.2024, às 22h52.