1. Introdução
Tratarei aqui
especialmente da Ação Criminal n. 1060, na qual Aécio Lúcio Costa Pereira, em
13 e 14.9.2023, foi condenado pelo STF. Desde já, lamento não apresentar a
literalidade dos votos dos Ministros do STF, o que se dá porque eles não
constam do processo eletrônico.
No dia 13.9.2023
certificou-se:
CERTIFICO que o PLENÁRIO, ao apreciar o processo em
epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão: Decisão:
Após o início do voto do Ministro Alexandre de Moraes
(Relator), o julgamento e a sessão foram suspensos para continuidade na sessão
vespertina. Falaram: pelo autor, o Dr. Carlos Frederico Santos,
Subprocurador-Geral da República; e, pelo réu, os Drs. Sebastião Coelho da
Silva e Juliana Sousa Nascimento Medeiros. Presidência da Ministra Rosa Weber.
Plenário, 13.9.2023 (Sessões Extraordinária e Ordinária).[1]
O julgamento prosseguiu
no dia seguinte, sendo que houve nova certidão:
CERTIFICO que o PLENÁRIO,
ao apreciar o processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a
seguinte decisão:
Decisão:
Após o início do voto do Ministro Alexandre de Moraes (Relator), o julgamento e
a sessão foram suspensos para continuidade na sessão vespertina. Falaram: pelo
autor, o Dr. Carlos Frederico Santos, Subprocurador-Geral da República; e, pelo
réu, os Drs. Sebastião Coelho da Silva e Juliana Sousa Nascimento Medeiros.
Presidência da Ministra Rosa Weber. Plenário, 13.9.2023 (Sessões Extraordinária
e Ordinária).
Decisão:
Após o voto do Ministro Alexandre de Moraes (Relator), que rejeitava as
preliminares e julgava procedente a ação penal para condenar o réu AECIO LUCIO
COSTA PEREIRA à pena de 17 (dezessete) anos, sendo 15 (quinze) anos e 6 (seis)
meses de reclusão e 1 (um) ano e 6 (seis) meses de detenção e 100 (cem)
dias-multa, cada dia-multa no valor de 1/3 (um terço) do salário mínimo, pois
incurso nos artigos: 359-L (abolição violenta do Estado Democrático de
Direito), do Código Penal, à pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de
reclusão; 359-M (Golpe de Estado) do Código Penal à pena de 6 (seis) anos e 6
(seis) meses de reclusão; 163, parágrafo único, I, II, III e IV (dano
qualificado), todos do Código Penal à pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de
detenção e 50 (cinquenta) dias-multa, fixando cada dia-multa em 1/3 do salário
mínimo; 62, I, (deterioração do Patrimônio tombado) da Lei 9.605/1998 à pena de
1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão e 50 (cinquenta) dias-multa, fixando
cada dia-multa em 1/3 do salário mínimo; 288, parágrafo único, (Associação
Criminosa Armada) do Código Penal à pena de 2 (dois) anos de reclusão, fixando
o regime fechado para o início do cumprimento da pena de 15 anos e 6 meses de
reclusão, nos termos do art. 33, §§ 2º, a, e 3º, do Código Penal, e, no caso da
pena de 1 ano e 6 meses de detenção, fixando o regime aberto como o regime
inicial de cumprimento da pena, nos termos do art. 33, § 2º, c, do Código
Penal. No tocante aos danos morais coletivos, fixava o valor mínimo indenizatório
de R$ 30.000.000,00 (trinta milhões de reais), a ser adimplido de forma
solidária pelos condenados em favor do fundo a que alude o art. 13 da Lei
7.347/85, soma a ser corrigida monetariamente a contar do dia da proclamação do
resultado do julgamento colegiado, incidindo juros de mora legais a partir do
trânsito em julgado deste acórdão; e do voto do Ministro Nunes Marques
(Revisor), que divergia em parte do Relator, acolhendo a preliminar de
incompetência do Supremo Tribunal Federal, e rejeitando as demais, e julgando
procedente em parte a ação penal, para: 1) absolver o acusado dos crimes
previstos nos arts. 288 (com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo
Penal), 359-L e 359-M do Código Penal (esses com fundamento no art. 386, II, do
Código de Processo Penal); 2) condenar o acusado como incurso nas penas do art.
163, parágrafo único, incisos I, II, III e IV, do Código Penal, e do art. 62,
I, da Lei 9.605/1998, fixando a pena do crime de dano em 1 ano e 3 meses de
detenção e 30 dias-multa no valor unitário mínimo, e a pena do crime do art.
62, I, da Lei 9.605/1998, em 1 ano e 3 meses de reclusão e 30 dias-multa no
valor unitário mínimo, que, somadas, em razão do concurso material,
correspondem a 2 anos e 6 meses de reclusão, em regime inicial aberto, além de
60 dias multa, fixando o dia-multa no valor mínimo legal para os delitos do
art. 163, parágrafo único, I, II, III e IV, do Código Penal, e do art. 62, I,
da Lei 9.605/1998, o julgamento foi suspenso. Presidência da Ministra Rosa
Weber. Plenário, 13.9.2023 (Sessões Extraordinária e Ordinária). Decisão: O
Tribunal, por maioria, rejeitou as preliminares e julgou procedente a ação
penal para condenar o réu AECIO LUCIO COSTA PEREIRA à pena de 17 (dezessete)
anos, sendo 15 (quinze) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 1 (um) ano e 6
(seis) meses de detenção e 100 (cem) dias-multa, cada dia-multa no valor de 1/3
(um terço) do salário mínimo, pois incurso nos artigos: 359-L (abolição
violenta do Estado Democrático de Direito), do Código Penal, à pena de 5 (cinco)
anos e 6 (seis) meses de reclusão; 359-M (Golpe de Estado) do Código Penal à
pena de 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de reclusão; 163, parágrafo único, I,
II, III e IV (dano qualificado), todos do Código Penal à pena de 1 (um) ano e 6
(seis) meses de detenção e 50 (cinquenta) dias-multa, fixando cada dia-multa em
1/3 do salário mínimo; 62, I, (deterioração do Patrimônio tombado) da Lei
9.605/1998 à pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão e 50 (cinquenta)
dias-multa, fixando cada dia-multa em 1/3 do salário mínimo; 288, parágrafo
único, (Associação Criminosa Armada) do Código Penal à pena de 2 (dois) anos de
reclusão, fixando o regime fechado para o início do cumprimento da pena de 15
anos e 6 meses de reclusão, nos termos do art. 33, §§ 2º, a, e 3º, do Código
Penal, e, no caso da pena de Código Penal. No tocante aos danos morais
coletivos, fixava o valor mínimo indenizatório de R$ 30.000.000,00 (trinta
milhões de reais), a ser adimplido de forma solidária pelos condenados em favor
do fundo a que alude o art. 13 da Lei 7.347/85, soma a ser corrigida
monetariamente a contar do dia da proclamação do resultado do julgamento
colegiado, incidindo juros de mora legais a partir do trânsito em julgado deste
acórdão; e do voto do Ministro Nunes Marques (Revisor), que divergia em parte
do Relator, acolhendo a preliminar de incompetência do Supremo Tribunal
Federal, e rejeitando as demais, e julgando procedente em parte a ação penal,
para: 1) absolver o acusado dos crimes previstos nos arts. 288 (com fundamento
no art. 386, VII, do Código de Processo Penal), 359-L e 359-M do Código Penal
(esses com fundamento no art. 386, II, do Código de Processo Penal); 2)
condenar o acusado como incurso nas penas do art. 163, parágrafo único, incisos
I, II, III e IV, do Código Penal, e do art. 62, I, da Lei 9.605/1998, fixando a
pena do crime de dano em 1 ano e 3 meses de detenção e 30 dias-multa no valor
unitário mínimo, e a pena do crime do art. 62, I, da Lei 9.605/1998, em 1 ano e
3 meses de reclusão e 30 dias-multa no valor unitário mínimo, que, somadas, em
razão do concurso material, correspondem a 2 anos e 6 meses de reclusão, em
regime inicial aberto, além de 60 dias multa, fixando o dia-multa no valor
mínimo legal para os delitos do art. 163, parágrafo único, I, II, III e IV, do
Código Penal, e do art. 62, I, da Lei 9.605/1998, o julgamento foi suspenso.
Presidência da Ministra Rosa Weber. Plenário, 13.9.2023 (Sessões Extraordinária
e Ordinária). Decisão: O Tribunal, por maioria, rejeitou as preliminares e
julgou procedente a ação penal para condenar o réu AECIO LUCIO COSTA PEREIRA à
pena de 17 (dezessete) anos, sendo 15 (quinze) anos e 6 (seis) meses de
reclusão e 1 (um) ano e 6 (seis) meses de detenção e 100 (cem) dias-multa, cada
dia-multa no valor de 1/3 (um terço) do salário mínimo, pois incurso nos
artigos: 359-L (abolição violenta do Estado Democrático de Direito), do Código
Penal, à pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de reclusão; 359-M (Golpe de
Estado) do Código Penal à pena de 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de reclusão;
163, parágrafo único, I, II, III e IV (dano qualificado), todos do Código Penal
à pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de detenção e 50 (cinquenta) dias-multa,
fixando cada dia-multa em 1/3 do salário mínimo; 62, I, (deterioração do Patrimônio
tombado) da Lei 9.605/1998 à pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão e
50 (cinquenta) dias-multa, fixando cada dia-multa em 1/3 do salário mínimo;
288, parágrafo único, (Associação Criminosa Armada) do Código Penal à pena de 2
(dois) anos de reclusão, fixando o regime fechado para o início do cumprimento
da pena de 15 anos e 6 meses de reclusão, nos termos do art. 33, §§ 2º, a, e
3º, do Código Penal, e, no caso da pena de 1 ano e 6 meses de detenção, fixando
o regime aberto como o regime inicial de cumprimento da pena, nos termos do
art. 33, § 2º, c, do Código Penal. Por fim, condenou o réu AECIO LUCIO COSTA
PEREIRA no pagamento do valor mínimo indenizatório a título de danos morais
coletivos de R$ 30.000.000,00 (trinta milhões de reais), a ser adimplido de
forma solidária pelos demais condenados, em favor do fundo a que alude o art.
13 da Lei 7.347/1985, soma a ser corrigida monetariamente a contar do dia da
proclamação do resultado do julgamento colegiado, incidindo juros de mora
legais a partir do trânsito em julgado deste acórdão. Tudo nos termos do voto
do Ministro Alexandre de Moraes (Relator), vencidos, quanto à preliminar de
incompetência do Supremo Tribunal Federal, os Ministros Nunes Marques (Revisor)
e André Mendonça, e, vencidos parcialmente quanto ao mérito: (a) o Ministro
Nunes Marques, que absolvia o réu das imputações quanto aos arts. 359-L
(abolição violenta do Estado Democrático de Direito), 359-M (Golpe de Estado) e
288, parágrafo único (Associação Criminosa Armada), todos do Código Penal, com
fixação de dosimetria, nos termos de seu voto; (b) o Ministro Cristiano Zanin,
que divergia, parcialmente, do Relator apenas no tocante à dosimetria da pena,
nos termos de seu voto; (c) o Ministro André Mendonça, que absolvia o réu da
imputação quanto ao art. 359-M (Golpe de Estado), com fixação de dosimetria,
nos termos de seu voto; e (d) o Ministro Roberto Barroso, que absolvia o réu da
imputação quanto ao art. 359-L (abolição violenta do Estado Democrático de
Direito), com fixação de dosimetria, nos termos de seu voto. Presidência da
Ministra Rosa Weber. Plenário, 14.9.2023.
Presidência
da Senhora Ministra Rosa Weber. Presentes à sessão os Senhores Ministros Gilmar
Mendes, Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Luiz Fux, Roberto Barroso, Edson Fachin,
Alexandre de Moraes, Nunes Marques, André Mendonça e Cristiano Zanin.
Subprocurador-Geral
da República, Dr. Carlos Frederico Santos.[2]
Vi atentamente o
julgamento, via TV Justiça, e existem aspectos que merecem considerações.
Tratarei rapidamente sobre alguns aspectos. Para tanto, apresento o informativo
do STF sobre o julgamento:
O ministro Alexandre de Moraes,
do Supremo Tribunal Federal, votou nesta quarta-feira (13) pela condenação de
Aécio Lúcio Costa Pereira, réu da primeira ação penal (AP 1060) julgada pela
Corte envolvendo os atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023. Ele propôs a
pena inicial de 17 anos pela prática dos crimes de associação criminosa armada,
abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de
Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça com substância
inflamável contra o patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado.
O julgamento prosseguirá nessa
quinta-feira (14), a partir das 9h30.
Primeiro
réu
De acordo com o relator, Aécio
Pereira, morador de Diadema (SP), veio a Brasília de ônibus para participar da
manifestação convocada para aquela data e foi preso dentro do Plenário do
Senado Federal. Ele foi empregado por mais de 20 anos da Companhia de Saneamento
Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), mas atualmente está desempregado.
O ministro disse que, no
interrogatório, Aécio afirmou que já frequentava o Comando Militar do Sudeste,
em São Paulo, com um grupo denominado “Patriotas”, que pedia intervenção
militar e organizou a vinda para Brasília em janeiro.
Ainda segundo o relator, o réu
confessou ter acampado na frente do Quartel-General do Exército, em Brasília, e
doado R$ 380 ao grupo. Também admitiu ter entrado no Plenário do Senado Federal
e ter vindo à capital pedir intervenção militar e derrubar o governo eleito em
2022.
Vídeos
Em seu voto, o ministro
Alexandre de Moraes observou que o réu produziu e divulgou nas redes sociais
vídeos em que trajava camiseta com a inscrição “intervenção militar federal” e
comemorava a invasão da Praça dos Três Poderes e do Senado Federal. Nas publicações,
ele incentivava atos golpistas, depredações e vandalismo, insinuando, por
exemplo, que defecaria no Plenário do Senado e nadaria no espelho d ́água do
Congresso Nacional.
Pena
Para o relator, está comprovado
que Aécio Pereira integrava grupo criminoso antidemocrático. O ministro propôs
fixação da pena inicial em 17 anos (15 anos e seis meses de reclusão em regime
fechado e um ano e seis meses de detenção em regime aberto) e a 100 dias-multa,
cada um no valor de 1/3 do salário mínimo.
A título de ressarcimento de
danos morais e materiais coletivos, o ministro também condenou Aécio ao
pagamento de R$ 30 milhões de forma solidária entre todos os condenados.
Conclusões
comuns a todas as APs
O ministro Alexandre Moraes
apresentou conclusões comuns a todas as ações penais. A seu ver, está muito
clara a intenção do grupo de derrubar o governo democraticamente eleito em
2022, ao pedir intervenção militar.
Segundo o relator, os invasores
não tinham armamento pesado, “mas estavam numericamente agigantados e
violentos”. Na sua avaliação, a ideia era que, a partir da destruição e da
tomada dos prédios, houvesse a necessidade de uma operação de Garantia da Lei e
da Ordem (GLO). Eles também pediam que as forças militares, principalmente o
Exército, aderissem a um golpe de Estado.
Crime
de multidão
Para o relator, a execução dos
crimes é multitudinária, ou seja, de autoria coletiva, em que todos
contribuíram para o resultado a partir de uma ação conjunta direcionada para o
mesmo fim. Assim, concluiu que cada réu agiu com dolo (intencionalmente) ao fazer
parte da multidão.
Golpe
de Estado
Ainda de acordo com o ministro
Alexandre de Moraes, as testemunhas relataram que os invasores utilizaram de
violência contra as forças policiais, arremessando paus, pedras, extintores de
incêndio e bolas de gude. Isso foi feito de maneira orquestrada, com
organização e divisão de tarefas e até material gráfico com instruções.
“Eles não estavam aqui a
passeio, mas com uma finalidade golpista. A tentativa de morte da democracia
não é pacífica. O que ocorreu no dia 8 foi um ato violentíssimo contra o Estado
democrático de direito”, concluiu.
Divergência
Revisor do processo, o ministro
Nunes Marques votou pela condenação de Aécio à pena de dois anos e seis meses
de reclusão, quanto aos crimes de deterioração de patrimônio tombado e dano
qualificado pela violência e grave ameaça. A seu ver, os vídeos publicados nas
redes sociais e os depoimentos de testemunhas evidenciam a prática dos delitos.
No entanto, em relação aos
crimes de golpe de Estado, abolição violenta do estado democrático de direito e
associação criminosa armada, entendeu que não há elementos para a condenação.
Para Marques, não ficou demonstrado emprego de violência ou grave ameaça contra
representantes dos Poderes da República, uma vez que as invasões ocorreram num
domingo, durante o recesso parlamentar e judiciário, quando não havia atividade
nesses locais.
Sobre o crime de associação
criminosa armada, também considerou que a acusação não reuniu provas de
associação estável com o fim específico de realizar crimes. A seu ver, não se
pode presumir que todas as pessoas presas nos prédios invadidos tivessem esse
vínculo associativo.
Por fim, quanto ao delito de
golpe de Estado, o ministro observou que os atos de vandalismo não seriam
eficazes para alcançar o objetivo dos manifestantes, que era desencadear uma
intervenção militar, uma vez que as Forças Armadas não sinalizaram nenhuma
adesão ao movimento. Para ele, os expedientes utilizados caracterizam a
hipótese de crime impossível, em razão da ineficácia dos meios utilizados para
depor o governo.[3]
As decisões foram
publicadas sem que exista, ainda publicação do acórdão. Quando este for
publicado, iniciará o prazo para a interposição de embargos infringentes, visto
que a decisão condenatória não foi unânime (RISTF, art. 333, inciso I).[4]
Não há como analisar tudo
porque ainda não temos os votos escritos. O que podemos fazer é resgatar da
memória e assistir a sessão de julgamento, disponível em vídeos na rede mundial
de computadores.[5]
2. Competência do STF
Dizer que a Constituição
Federal, em face do princípio da legalidade, exige lei sentido estrito da União
para regular o processo (art. 22, inc. I), havendo competência concorrente da
União, Distrito Federal e Estados para legislarem sobre procedimentos em
matéria processual (art. 24, inc. XI). Também, os regimentos internos dos
tribunais poderiam apenas disciplinar procedimentos.[6]
Essa preliminar já havia
sido afastada pelo STF e no julgamento do réu em questão a decisão foi
confirmada, mantendo-se a competência do STF para julgar os atentados
praticados contra si, ex vi do art. 43 do STF e seguintes.
3. Condenações
concretizadas
Não me canso de citar
Ferri, o qual já nos alertava para a constante utilização do sistema punitivo
estatal em uma aversão moral pelo delinquente, fazendo nascer um sentimento
atávico de vingança ede comiseração pela vítima.[7]
Isso piora quando se vê que o STF não tem Ministro especializado em matéria
criminal.
3.1 Dano qualificado
O dano é, em princípio,
uma infração criminal de ação de iniciativa exclusivamente privada. No entanto,
passemos a verificar o que dispõe o Código Penal:
Dano
Art. 163 - Destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia:
Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.
Dano qualificado
Parágrafo único - Se o crime é cometido:
I - com violência à pessoa ou grave ameaça;
II - com emprego de substância inflamável ou explosiva, se o fato
não constitui crime mais grave
III - contra o patrimônio da União, de Estado, do
Distrito Federal, de Município ou de autarquia, fundação pública, empresa
pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviços
públicos;
IV - por motivo egoístico ou com prejuízo considerável para a
vítima:
Pena - detenção, de
seis meses a três anos, e multa, além da pena correspondente à violência.
Dano em coisa de valor
artístico, arqueológico ou histórico
Art. 165 - Destruir,
inutilizar ou deteriorar coisa tombada pela autoridade competente em virtude de
valor artístico, arqueológico ou histórico:
Pena - detenção, de
seis meses a dois anos, e multa.
Ação penal
Art. 167 - Nos casos
do art. 163, do inciso IV do seu parágrafo e do art. 164, somente se procede
mediante queixa.
A ação se iniciou
mediante denúncia, inexistindo querelante. Assim, é incabível a condenação pelo
crime do art. 163, parágrafo único, inciso IV (motivo egoístico e prejuízo
considerável à vítima). Erro crasso consolidado.
Quanto à pena,
respeitando a jurisprudência de outrora, em que cada circunstância judicial
teria o valor, para exasperação, variando aproximadamente entre 4 meses (1/8
para não subvalorizar) e 5 meses e 15 dias (1/6 para não supervalorizar),
parece estranha a pena privativa de liberdade fixada (1 ano e 6 meses de detenção).
A fixação do regime
inicial aberto demonstra certa ignorância do sistema dinâmico de normas. Com
efeito, os regimes devem ser unificados (Lei n. 7.210, de 11.7.1984 – Lei de
Execução Penal – art. 111). Como é inconciliável o regime inicial fechado com o
aberto, todas as penas, inicialmente, deverão ser cumpridas no regime inicial
fechado.
A pena de multa é
nitidamente exagerada, desrespeitando ao disposto no art. 60, caput, do
Código Penal, o qual determina que “Na fixação da pena de multa o juiz deve atender,
principalmente, à situação econômica do réu”. É notório que o sentenciado está
desempregado (foi demitido por justa causa da SABESP, onde trabalhava). Assim,
sua pena de multa razoável seria o mínimo legal (10 dias-multa, na razão de
1/30 do salário mínimo, ex vi do art. 49 do Código Penal).
O relator afirma que a
contribuição financeira do autor para a organização dos crimes foi de R$
380,00, representando cerca de 30% do salário mínimo, o que evidencia não ter
condições financeiras que permitam suportar a elevada pena de multa fixada (50
dias-multa, a razão de 1/3 do salário mínimo para cada dia).
3.2 Deterioração do
patrimônio tombado
O art. 165 do Código
Penal, transcrito no item anterior está tacitamente revogado. Daí a condenação
pelo seguinte crime da Lei n. 9.605, de 12.2.1998:
Art. 62. Destruir, inutilizar ou deteriorar:
I - bem especialmente protegido por lei, ato
administrativo ou decisão judicial;
II – (omissis)
Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.
Vê-se aí um concurso
formal imperfeito (Código Penal, art. 70, caput, parte final), em que a
conduta do dano levou à cumulação da pena com a do art. 62, inc. I transcrito.
Ao mesmo tempo que a turba quebrava vidraças, cadeiras etc. destruiu bens
históricos e culturais.
A pena privativa de
liberdade fixada (1 anos e 6 meses de reclusão), considerando as penas mínimas
e máximas cominadas, cada exasperação por circunstância judicial desfavorável,
oscilaria de 3 meses (1/8) a 4 meses (1/6), o que só torna a pena aplicada
razoável se apenas 2 circunstâncias judiciais foram consideradas desfavoráveis
e não houver agravante genérica.
A pena de multa,
novamente, é exagerada (50 dias-multa, importando em 1/3 de salário mínimo cada
dia-multa). Pelas razões já expostas, o razoável seria a fixação da pena no
mínimo legal.
3.3 Associação
criminosa
Foi fixada a pena do
crime de associação criminosa (Código Penal, art. 288), com a causa especial de
aumento de pena prevista no parágrafo único, em face de estarem os agentes
armados, conforme preceitua o Código Penal:
Associação Criminosa
Art. 288. Associarem-se
3 (três) ou mais pessoas, para o fim específico de cometer crimes:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 3
(três) anos.
Parágrafo único. A pena
aumenta-se até a metade se a associação é armada ou se houver a participação de
criança ou adolescente.
Parece-me provada a
permanência tendente à prática dos crimes concretizados, razão de discordar
daqueles Ministros que não vislumbraram a tipificação de tal delito. Com
efeito, o relator demonstrou que o sentenciado confessou que acampou em frente
ao quartel do Exército localizado na sua cidade de origem e veio para Brasília um
dia antes para participar dos atos antidemocráticos criminosos concretizados,
tendo acampado no Setor Militar Urbano desta capital.
A pena privativa de
liberdade fixada (2 anos de reclusão), em princípio, está razoável, eis que
cada exasperação da pena base poderia variar, aproximadamente, de 3 meses (1/8)
a 4 meses (1/6). Com o aumento de metade (causa especial de aumento da pena),
não parece exagerada a dosimetria empreendida.
3.4 Golpe de Estado
Ao meu sentir, todos os
movimentos, toda prova apresentada acerca das pessoas que desejavam – antes a
manutenção -, no momento dos fatos, o retorno do Presidente da República vencido
nas urnas, caracteriza o crime de golpe de Estado, visto que o Código Penal
preceitua:
Golpe de Estado
Art. 359-M. Tentar depor, por meio de violência ou
grave ameaça, o governo legitimamente constituído:
Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 12 (doze) anos,
além da pena correspondente à violência.
Veja-se que o crime se completa
pela tentativa de deposição de governo legitimamente constituído. Não podemos
dizer que os agentes apenas exerciam as liberdades de expressão e de reunião
(Constituição Federal, art. 5º, incisos IV e XVI) visto que tais liberdades não
podem constituir crimes.
A pena privativa de
liberdade fixada (6 anos e 6 meses de reclusão), considerando que cada
circunstância judicial poderia levar à exasperação da pena base de,
aproximadamente, 1 ano (1/8) a 1 ano e 6 meses (1/6), em princípio, não parece
estar equivocada a pena aplicada.
3.5 Abolição violenta
do Estado Democrático de Direito
Concordo com a
divergência inaugurada pelo Min. Nunes Marques, no sentido de que é, em tese,
impossível combinar as penas dos crimes do art. 359-M e 359-L, especialmente no
caso vertente porque a tentativa de golpe de Estado não foi bem sucedida, eis
que esse último está assim estabelecido:
Abolição violenta do Estado
Democrático de Direito
Art. 359-L. Tentar, com emprego
de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo
ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais:
Pena - reclusão, de 4 (quatro) a
8 (oito) anos, além da pena correspondente à violência.
O crime impossível
(Código Penal, art. 17) merece análise ex post. Não posso concordar que,
quanto ao crime do art. 359-M do Código Penal, houve crime impossível, visto
que potencialmente o golpe de Estado poderia se concretizar. Porém, inexistem
elementos para dizer que se pretendia “abolir” o Estado Democrático de Direito.
Os Ministros André
Mendonça e Luís Roberto Barroso entenderam ser o caso de aplicar o princípio da
consunção. Entendo diversamente, ao meu sentir, o princípio da especialidade
resolve a questão, a fim de evitar bis in idem.
Ao meu sentir, é
impossível tentar abolir o Estado Democrático de Direito quando a tentativa de
golpe de Estado restar fracassada. Sendo a tentativa de golpe fracassada, a
abolição do Estado Democrático de Direito esbarrará e meio absolutamente ineficaz
para tal, cuja análise deve ser a posteriori, não ex ante.
4. A esperança que nos
resta
Havendo quatro votos pela
absolvição, serão cabíveis os embargos infringentes. Espero que eles ocorram
para que haja maior maturidade da discussão e o Min. Celso de Mello sustentou:
Na realidade, a resposta do poder público ao fenômeno
criminoso, resposta essa que não pode manifestar-se de modo cego e instintivo,
há de ser uma reação pautada por regras que viabilizem a instauração, perante
juízes isentos, imparciais e independentes, de um processo que neutralize as
paixões exacerbadas das multidões, em ordem a que prevaleça, no âmbito de
qualquer persecução penal movida pelo Estado, aquela velha (e clássica)
definição aristotélica de que o Direito há de ser compreendido em sua dimensão
racional, da razão desprovida de paixão![8]
Com o tempo, talvez, a paixão de cada Ministro
do STF permita decidir mais serenamente e corrigir os equívocos evidentes,
como, por exemplo, foi o de condenar o réu em ação de iniciativa pública por
crime de ação de iniciativa exclusivamente privada.
[1] STF. Tribunal Pleno. AP n. 1060. Carmem Lilian
Oliveira de Sousa, Assessora-Chefe do Plenário. Certidão. Disponível em: <chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://peticionamento.stf.jus.br/api/peca/recuperarpdf/15360996455>.
Acesso em: 16.11.2023, às 13h59, às 13h59.
[2] STF. Tribunal Pleno. AP n. 1060. Carmem Lilian
Oliveira de Sousa, Assessora-Chefe do Plenário. Certidão. Disponível em: <chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://peticionamento.stf.jus.br/api/peca/recuperarpdf/15361013814>.
Acesso em: 16.11.2023, às 13h59, às 14h15.
[3] STF. Notícias. Relator propõe pena de 17 anos para
primeiro réu dos atos antidemocráticos de 8/1: o Plenário começou hoje a julgar a primeira ação penal
do caso, tendo como réu Aécio Lúcio Costa Pereira. Julgamento continua amanhã,
às 9h30. Publicado em 13.9.2023. Disponível em: <https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=514007&ori=1>.
Acesso em: 16.11.203, às 14h32.
[4] Há quem diga que o STF pretende afastar os Ministros
Nunes Marques e André Mendonça dos julgamentos das ações decorrentes de
8.1.2023. O Ministro Barroso, em 29.9.2023, já manifestou o interesse de voltar
o julgamento das ações criminais para as turmas (GRILLO, Brenno. Barroso quer
devolver às turmas do STF competência sobre ações penais. Consultor Jurídico,
29.9.2023. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2023-set-29/barroso-devolver-turmas-competencia-acoes-penais/>.
Acesso em: 16.11.2023, às 15h05. Diz-se que isso seria uma articulação porque o
relator continuaria sendo o Min. Alexandre de Moraes, que é da 1ª Turma,
afastando os dissidentes, que são da 2ª Turma. Mais ainda, o Min. Dias Toffoli
poderia retornar à 1ª Turma, reforçando a vontade condenatória pelos atos
golpistas. Isso evitaria embargos infringentes e tiraria a publicidade dos
discursos de Advogados bolsonaristas em sessões transmitidas ao vivo pela TV
Justiça.
[5] STF. Pleno. Bloco 1 – Julgamento da 1ª ação penal de
réu acusado de participar dos atos de 8/1, 13.9.2023. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=ItyLAux7WQQ&list=PLippyY19Z47vFgErj_z1KpDr8Q3YP41Wj>.
Acesso em: 16.11.2023, às 21h34; STF. Pleno. Bloco 1 – STF condena três réus
nas primeiras ações penais sobre atos de 8/1, 14.9.2023. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=-dReKZYKYtc&list=PLippyY19Z47vVk3X06e_Hf6efzKeuowES>.
Acesso em: 16.11.2023, às 21h36.
[6]
Sobre isso já comentamos aqui (MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Normas
processuais e normas procedimentais, distinção difícil. Brasília: Estudos
Jurídicos e Filosóficos, 29.1.2010. Disponível em: <https://sidiojunior.blogspot.com/2010/01/normas-processuais-e-normas.html>.
Acesso em: 16.11.2023, às 15h47). Mais detalhado é o voto do Min. Celso de
Mello no agravo regimental interposto para gerar o conhecimento aos embargos
infringentes na Ação Criminal n. 470, sobre a qual tratamos, também, aqui:
(MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Análise/resenha do voto do Ministro Celso de
Mello, proferido nos autos do AgrRegEmbInf Interpostos contra acórdão da Ação
Criminal n. 470. Brasília: Estudos Jurídicos e Filosóficos, 17.9.2023.
Disponível em: <https://sidiojunior.blogspot.com/2023/09/naliseresenha-do-voto-do-ministro-celso.html>.
Acesso em: 16.11.2023, às 15h55).
[7] FERRI, Enrico. Princípios de direito criminal:
o criminoso e o crime. 2. ed. Campinas: Bookseller, 1999. p. 28.
[8]
STF. Tribunal Pleno. 26º AgrReg na Ação Penal 470-MG. Voto do Min. Celso de
Mello. p. 242/277. Disponível em: <chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=5276407>.
Acesso em: 17.11.2023, às 1h10.
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