segunda-feira, 24 de outubro de 2011

O falso poder

Texto escrito por:
José Aluízio Sampaio Dias Ferreira

Hoje estamos em uma luta contra um falso poder, não constituído, mas forçoso, que teima em se impor, criando mitos, somente para depois desmistificá-los em nova manchete.

Um falso poder que explora uma tragédia, não com o intuito de informar, mas fingindo esta vontade, fica massificando a notícia, repetindo-se, não colando nada de novo, não mostrando novos ângulos, fazendo perguntas as vítimas frente as câmeras, simplesmente para provocar lágrimas e sofrimento.

Um falso poder que põe e dispõe sobre as pessoas e suas vidas.  Um poder que é capaz de gritar uma mentira, e quando pego em erro sussurra a verdade, dá uma manchete em primeira página em letras garrafais e faz uma errata em um canto de página, no meio de um caderno.

A todos nós é imposto um poder regulatório, que ordena nossas atitudes, punindo aquelas que são classificadas como contrárias a sociedade e seu bem viver.

Todos os poderes legalmente constituídos são obrigados pela verdade, pela forma escrita, para se perpetuar, e principalmente pela publicidade de cada ato, e neste momento este maléfico poder se aproveita, agindo como um câncer que observa uma fresta, entra e se ramifica, dominando todo o tecido que tem contato e muitas vezes destruindo-o.

Sob a manta constitucional da liberdade de imprensa esse falso poder asqueroso, recusa sob todas as formas em receber um controle, hoje não falamos de censura, mas sim de punições cíveis e penais mais severas e rápidas, e que realmente sejam equivalentes aos danos que provocam. Temos como exemplo a escola em São Paulo, e tantos outros.

Seu poder maléfico é maior do que noticiado por eles mesmos, pois se hoje aproveitam dos fatos, barbarizando com o nome de pessoas sob suspeita de fatos, não medem suas atitudes, apenas na busca de seu “furo”, mesmo sabendo que as pessoas que influenciam hoje, forçando uma opinião pronta goela a baixo, poderá ser a que mais tarde vai julgar o fato atrás ou atrósmente narrado e conduzido. Muitas vezes vemos que existe uma preferência em abandonar o fato e seguir uma tendência na veiculação da notícia de modo a angariar mais simpatia ao relato e ganhar em audiência.

E para seguir seu mister maléfico, utilizam-se de expedientes que teoricamente combatem como o corrompimento do agente público, para buscar as informações privilegiadas, ou querem que acreditemos que recebem as notícias mais frescas e os documentos secretos por terem belos olhos???

Escondem-se sob uma pretensa ética onde alegam que tem a obrigação de preservar a fonte, porém o que querem é evitar a confissão de crime, pela forma com que conseguem tais informações e documentos.

Tal por questão óbvia, deveria ser hoje uma excessão a regra, porém a impunidade com que tais atos estão e são cometidos acaba por torná-los a regra do jogo, e vai ficando como exemplo para os que ainda virão.

Urge o fato de necessária regulamentação mais enérgica, não censurando, mas sim obrigando a revelar fontes quando os documentos não deveriam ou poderiam ter vazado, por se encontrarem na guarda de entes públicos, punição para que se tais fatos e documentos se encontrem sob segredo decretado e vazarem, mas punição não apenas para quem vazou, mas também para quem deu publicidade e quem veiculou, independente da alegação que não sabia do segredo decretado.

Muito brando tem sido o tratamento reparativo, decretado pelo judiciário frente às barbáries perpetradas por este falso poder, efetua uma condenação pecuniária, que normalmente fica em segredo, enquanto que o fato danoso ocorreu com grande alarde. Necessário uma mudança na tratativa tanto dos Srs. Operadores do Direito quando de seus pedidos, que exijam seja dada uma publicidade duas vezes maior com o desmentido do fato, quanto publicidade igual ao fato a condenação imposta, provocando no falso poder dano equivalente ao que causa. Lembrar que a uma mentira em horário nobre pode gerar uma audiência fantástica, e o preço da inserção publicitária sobe astronomicamente, e fica muitas vezes maior que a indenização paga pela mentira veiculada, portanto no presente modelo ERRAR DÁ LUCRO, PRESISTIR ERRANDO AUMENTA MAIS AINDA O LUCRO.

Ouvi uma frase de um jornalista, e realmente não me lembro seu nome ou sua nacionalidade, mas que hoje frente a forma de atuação deste falso poder, demonstra sua atualidade:

“Não acredite em nada do que ouvir e somente na metade do que ver !!!”

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Intolerência... discriminação... Devemos parar com isso!


Recebi uma mensagem eletrônica de uma jovem ex-aluna que expunha uma resposta aos "ataques terroristas de 11 de Setembro". Diz a mensagem que houve uma pergunta sobre o porquê de Deus ter permitido os ataques terroristas de 11 Setembro e a resposta sábia teria informado que todo erro está em pedir a Deus que não interfira na nossa vida. Em síntese, devemos ser religiosos e proclamarmos a palavra de um deus que pensamos conhecer.

Não é porque não sou cristão, islâmico, judeu, budista, ou de qualquer outra religião que se invente, que devo ser intolerante (discriminações em razão do sexo - como a que agora emerge para proteção da mulher, da idade e outras, são tão maléficas quanto as religiosas). Daí eu ter respondido a mensagem da seguinte maneira:

"O país com maior IDH do mundo (2001-2010), Noruega, tem maioria atéia. Não sou ateu, mas não vejo a intolerância com quem não crê em Deus como um absurdo pior do que o racismo. Equivale-se à discriminação social, que é a pior das discriminações".

O que nos separou dos símios foi a nossa capacidade de dividir atribuições, de cooperar para alcançar objetivos etc. Caso pretendamos continuar "rachando" a humanidade, faremos com que nossa estada na terra seja muito difícil.

A humanidade sempre buscou conhecer a origem primeira das coisas, chegando à metafísica. Muitos optam pelo transcendentalismo teológico. Prefiro dizer que um ser infinitamente sábio não se mostraria plenamente ao homem como pretende fazer ver a Bíblia (lembre-se do pecado original, momento em que Lúcifer quis ser deus porque, conhecendo deus, sabia que deus era maior do que ele e, portanto, poderia ser um deus). Não sou ateu, mas posso afirmar que a Bíblia não expressa a palavra de um deus e não gostaria de ser discriminado por isso.

Não discriminemos pessoas por qualquer que seja o motivo. Sejamos tolerantes. O fundamentalismo, o absoluto, tudo que nos impede de ver e gostar do outro lado deve ser criticado por nós mesmos para alcançarmos uma evolução mínima. Talvez, a única regra absoluta que possamos ter (até ela pode ser relativa) é a de que tudo é relativo.


quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Feto autor de ação?


Interessou-me a matéria jornalística publicada, na qual se informa que o feto de Wanessa Camargo foi arrolado como autor da ação civil para reparação de danos morais, decorrente do infeliz comentário do "humorista" Rafinha, em que ele teria afirmado que "comeria" ela e o feto.[1]
A ação tem natureza jurídica controvertida até o presente momento, preponderando a tese de que ela é o direito autônomo e abstrato ao exercício da jurisdição ou o poder de invocar a tutela jurisdicional. Destarte, enquanto direito autônomo e abstrato, estando ela promovida, é um direito subjetivo. No entanto, enquanto poder de invocar a tutela jurisdicional, a ação não é direito subjetivo e o Juiz pode indeferir a petição inicial por faltar alguma das suas condições.
São condições de toda ação: (a) possibilidade do pedido – a ser apreciada juridicamente; (b) interesse de agir – o interesse se desdobra em três: necesssidade, utilidade e adequação; (c) legitimidade (mais conhecida como legitimatio ad causam) – esta deve ser analisada sob dois enfoques: a legitimidade ativa (que diz quem pode agir) e a passiva (esta informa quem pode ser demandado).
Posso afirmar que o feto não detém personalidade jurídica. Destarte, não é capaz de ser titular de direitos e obrigações. No âmbito patrimonial, sua excepcional legitimação para estar em juízo como parte se dará na tutela de direitos futuros, condicionados ao nascimento com vida. Outrossim, ele tem os direitos fundamentais à vida e a saúde, as quais são protegidas desde a concepção. Porém, estender o âmbito de proteção à honra, data venia, será pretender elastecer exageradamente o mesmo.
As pessoas passam a deter personalidade jurídica (serem capazes de adquirir direitos e obrigações) com o nascimento com vida. Seria estranho, caso a mãe viesse abortar e os ascedentes ou colaterais pudessem herdar do nascituro como se ele fosse titular de direitos patrimoniais (quando o nascituro figura em uma sucessão mortis causa, protege-se expectativa de direito - caso não nasça com vida, não haverá direito sucessório, mas sobrepartilha).
Ao meu sentir, os causídicos estão construindo uma tese que esbarra na impossibilidade jurídica do pedido, sendo razoável o juízo civil indeferir a petição inicial. O que não se poderá admitir de forma alguma é a eventual sentença condenatória à reparação por danos morais incluir o nascituro como titular de tal direito subjetivo.
Existem "pessoas processuais", as quais, mesmo não detendo personalidade jurídica, tem legitimidade para estar em juízo para defesa de direitos, v.g., espólio, massa falida etc. Estas, como regra, defendem direitos subjetivos de terceiros, eis que incapazes de adquirir direitos e obrigações.
O Código Penal tem crimes relativos às ofensas contra os mortos, mas estes não serão sujeitos passivos. Como o direito protege tão-somente pessoas – o feto, em sentido jurídico, não é uma pessoa -, o sujeito passivo nos crimes relativos aos mortos serão pessoas (portanto, vivas), em face do sentimento religioso que elas tem perante os mortos.
No tocante o direito fundamental vida (não se pode falar em liberdade do feto porque é absolutamente impossível do ponto de vista prático) a proteção jurídico-criminal tem em vista esse bem jurídico fundamental, sendo que a proteção à saúde é consectário lógico da necessidade de se assegurar a vida extra-uterina de quem está por nascer. Todavia, no âmbito criminal, ter-se-á em vista também a gestante, sendo agravante genérica e, às vezes, causa de aumento de pena, o crime perpetrado contra a mulher grávida.
Não se pode admitir que pessoa morta (ou quem não nasceu) tenha honra a tutelar porque este é um bem jurídico de pessoa, coisa que o nascituro não o é. Ele até pode ter expectativa de um direito subjetivo, mas que não pode ser titular do direito ter à honra. Por isso, a reparação do dano não poderá ter como fato gerador a ofensa à honra de quem não é pessoa.
Honra subjetiva é o valor que uma pessoa tem em relação a si mesma (beleza, honestidade, intelectualidade etc.), enquanto que a honra objetiva é aquela que se tem perante a coletividade. Todavia, não se olvide, dignidade e honra são bens jurídicos de pessoas.
A palavra honra, segundo o Vocabulário Jurídico de Plácido e Silva, decorre de honor, que “indica a dignidade de uma pessoa”. Assim, como o Direito só tutela pessoas (quando se protege animais e o meio ambiente se tem em vista a proteção - da vida, da saúde, da dignidade etc. - de pessoas), não há como falar em defesa da honra de quem não é pessoa natural ou pessoa jurídica.
Pergunto (espero que não ocorra a hipótese, mas ela é possível): caso uma sentença venha a ser proferida e haja o seu trânsito em julgado antes do nascimento de nascituro que teve reconhecido em seu favor o direito subjetivo ao recebimento de valores para reparação de danos morais. Vindo ele a morrer juntamente com os seus genitores, em acidente que precede o parto, gerará direitos sucessórios?
O exposto me leva a concluir que o pedido é absurdo, devendo ser indeferido inicialmente pelo juízo civil. No entanto, caso a notoriedade dos fatos constranjam inicialmente o juízo, deverá ao final, no mérito, julgar improcedente o pedido, eis que não há honra objetiva ou subjetiva a tutelar.


[1] VASCONCELOS, Frederico. Feto de Wanessa é autor de processo contra Rafinha Bastos. São Paulo: Folha.com, 19.10.2011, 17h39. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/993322-feto-de-wanessa-e-autor-de-processo-contra-rafinha-bastos.shtml>. Acesso em: 20.10.2011, às 8h04.


terça-feira, 18 de outubro de 2011

Teses absurdas e as decisões judiciais

Recebi uma mensagem eletrônica que me trouxe uma piada. Considerei-a genial, razão de estar reproduzindo aqui:

O final cético da piada é um tanto pessimista. No entanto, na minha experiência forense vi muitas decisões judiciais dissociadas da prova colacionada aos autos. Então, o que poderia fazer?

A resposta à pergunta é simples: poderia recorrer. O problema maior reside no acórdão unânime proferido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o que poderia se dar em grau de recurso ou ação originária.

Alguns dirão que a proposição está equivocada porque o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o STF não se imiscuem no exame dos fatos, visto que o simples reexame da prova não enseja recurso especial (REsp) ou recurso extraordinário (RE), bem como a decisão criminal originária será proferida pela turma e não pelo plenário. Esta última afirmação não encontraria suporte no Regimento Interno do STF que estabelece a competência do Plenário para julgar a ação criminal originária (art. 5º, inc. I).

O STF não nos engana tanto quanto pretende nos fazer ver a piada desta postagem, mas vejo que buscamos o "discurso" como fundamento para um "consenso pressuposto" que só pode encontrar residência na mentalidade utópica ou mal intencionada de uma elite dominante.

Sei que o STF tem pessoas bem intencionadas e, portanto, não posso compactuar com exposições radicais que não encontram sustentação em uma racionalidade mínima. Até porque os Ministros do STF sabem que a liberdade para a apreciação da prova não se dá por convicção íntima (até mesmo o tribunal do júri - que não precisa motivar suas decisões - não pode decidir contrariamente à prova dos autos), eis que o livre convencimento do juiz é admitido, mas dentro da racionalidade. Daí se falar em "princípio da persuasão racional".

Na época em que o Ministro Celso de Mello tomou posse no STF foi tão criticado quanto o Ministro Dias Toffoli porque muitos o consideraram muito novo para o cargo. Não se olvide no entanto, que ele abriu para este último (e para os demais magistrados que o sucederam - e sucederão - naquele tribunal), a perspectiva de que se pode desempenhar com probidade o importantíssimo múnus de Ministro do STF.

Diz-se que os fatos são decididos em instâncias inferiores, e que as cortes superiores e o STF só apreciam - em sede de REsp e RE - a legalidade das demais decisões, portanto, se restringem ao exame do direito aplicável ao caso. Devo discordar porque a lide pressupõe controvérsia que afete direito subjetivo e, como o direito emerge de fatos, os dois são indissociáveis.

Ao meu sentir, o Ministro Dias Toffoli tem se abeberado do manancial de racionalidade e probidade que outros Ministros do STF podem lhe proporcionar e, por isso, não creio que aquele tribunal embarque em teses factuais tão absurdas como aquela da piada que motivou esta postagem.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

O necessário controle à liberdade de expressão: texto construído a partir da notícia criminal que envolve magistrado paulista

O texto que se segue está, em sua integra, publicado em http://www.sidio.pro.br/. Ali acesse o link "Direito Criminal" e clique sobre "9. Liberdade de expressão e dignidade da pessoa humana". Seguem algumas partes:

Em 13.10.2011, recebi por correio eletrônico uma matéria que expõe gravemente a imagem de um Juiz de Direito, a qual tem por título “Juiz briga na frente de distrito policial”.[1] Então, resolvi divulgar a notícia sob outra perspectiva, a que vem me preocupando em relação à exposição exagerada de fatos e pessoas acusadas de tê-los praticado. Tal preocupação pode ser vislumbrada nas últimas publicações que venho fazendo.[2]
Da matéria em comento se extrai:
“Um juiz de 57 anos é averiguado pela polícia por suspeita de desacato, desobediência e ameaça e por dirigir sem carteira de habilitação e embriagado em São Bernardo do Campo, no ABC paulista. Na noite de anteontem, o magistrado (...), da Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, se envolveu em uma briga de trânsito na Avenida Armando Italo Setti, na frente do 1.º Distrito Policial. Segundo os investigadores, o juiz estava aos berros, parecia agressivo e esmurrava o vidro de um carro. Ele negou todas as acusações.
Policiais que estavam de plantão no DP ouviram buzinas por volta das 22 horas. Foram até a rua e teriam visto o juiz alterado e o motorista acuado dentro do carro. Todos foram para a delegacia, após ordem do delegado.
Nesse momento, segundo policiais, o juiz respondeu: 'Você não grita assim comigo, não!'. Em outro momento, teria dito: 'Eu sou juiz! Isso não vai ficar assim, não!'. As declarações estão no boletim de ocorrência registrado por desacato, desobediência, ameaça, dirigir sem habilitação, embriaguez ao volante, difamação e também injúria”.
(...)
A notícia transcrita induz a acreditar que se trata de um Desembargador de Justiça, eis que se refere à lotação do magistrado como sendo a Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, órgão próprio de 2ª instância. Embora ela apresente uma resposta do magistrado, expõe seu nome completo, idade etc. e, ao contrário, apenas insere os comentários dos policiais, sem identificá-los, induzindo ao excesso exclusivo do Magistrado.
(...)
Tenho dúvidas sobre a legalidade da atuação policial. Existem elementos na matéria jornalística publicada que levam a crer que a intervenção policial era necessária, mas não sei em que nível de serenidade ela foi conduzida, apenas podendo dizer que a exposição pública da vida privada de uma autoridade judicial pode ser uma ofensa mais grave do que o delito que se pretende noticiar.
Temos o direito fundamental à dignidade, sendo que a aldeia global de comunicação em que o mundo se transformou tende a fragilizar a nossa personalidade jurídica, ante a possibilidade de desgastarem nossa imagem (maculando a nossa dignidade) por meio da exposição excessiva de fatos. Alguns desses fatos expostos são até verdadeiros, mas a exposição é desproporcionalmente ofensora da dignidade alheia.
Para Ferrajoli, não se deve incriminar a opinião. Todavia, “as liberdades são destinadas por suas naturezas à convivência, e toda vez que uma liberdade atenta contra outra alheia, quer dizer que essa liberdade se converteu em poder”.[3] Por isso, tenho por necessária a limitação legal da liberdade de expressão, senão a dignidade poderá deixar de ser um direito fundamental material e passar a ser apenas letra morta na Constituição Federal.


[1] HADDAD, Camilla. Juiz briga na frente de distrito policial. São Paulo: Estadão, Jornal da Tarde, 12.10.2011. Disponível em <http://estadao.br.msn.com/ultimas-noticias/juiz-briga-na-frente-de-distrito-policial>. Acesso em: 13.10.2011, às 9h20.
[2] Um exemplo: MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. O excesso na repressão ao delito de porte de psicotrópico pode ser mais grave que o delito que se “reprime”. Disponível em: <http://sidiojunior.blogspot.com/2011/10/o-excesso-na-repressao-ao-delito-porte.html>. Aces-so em: 13.10.2011, às 10h22.
[3] FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2.002. p. 746.

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

O excesso na repressão ao delito porte de psicotrópico pode ser mais grave que o delito que se "reprime"

O Professor Marcelo Hermes publicou uma matéria no seu “blog” sob o seguinte título: “PM prende 4 machonheiros na Colina da UnB (3 eram menores). Isso foi HOJE. Viva a universidade do esgoto, que se chama UnB”.[1] Observe-se que o afã de fazer uma crítica pejorativa não permitiu uma releitura do texto, o qual contém erro material, eis que, evidentemente, ele pretendia falar em “maconheiros”.
O texto é lastimável e evidencia alguns problemas maiores, a saber: (a) o porte de psicotrópicos para consumo próprio não autoriza a autuação em flagrante, ex vi do art. 48, § 2º, da Lei n. 11.343, de 23.8.2006; (b) criança e adolescente não praticam crime, mas ato infracional (Lei n. 8.069, de 13.7.1990, art. 103); (c) foi postada uma foto dos 4 abordados, deitados no chão durante a ação policial, e não se pode expor a imagem de uma criança ou de um adolescente a uma situação vexatória, tendo violado o dever de velar pela dignidade dos menores de 18 anos (Lei n. 8.069/1990, arts. 17-18).
Sem fazer qualquer apologia ao consumo de psicotrópico, seja ele lícito ou ilícito, devo esclarecer que o consumo de bebida alcoólica leva às dependências física e psicológica, enquanto o da maconha só provoca dependência psicológica. Ademais, há muito tempo que a Criminologia vem buscando afastar rótulos como o de “maconheiro”, “bandido” etc., estando – cientificamente – completamente superada a fase do etiquetamento.
O excesso é tão ruim (ou até mais grave) do que o porte de psicotrópico ilícito para consumo próprio, razão de estar publicando o presente texto visando a dizer que, em tempos em que se discute a descriminalização do porte de psicotrópicos para consumo próprio, não é razoável verificar posturas como as de alguns comentários aos da infeliz publicação do docente (sendo que ele deveria fazer uma triagem mínima, pois é o responsável pelas publicações ali contidas).
Aqui reitero tudo que expus nos Meus comentários à lei antidrogas,[2] no sentido de que é necessária a mudança de paradigmas nas diversas ciências, a fim de evitar excessos como os que se podem verificar em publicações, como exemplo posso citar aquela que ora comento.
Embora a Lei n. 11.343/2006 não tenha buscado amparo técnico para a dicotomia prevenção do uso indevido e repressão ao porte, aquele que porta psicotrópico para consumo próprio não merecerá pena de prisão (vide o art. 28 da Lei n. 11.343/2006). Enquanto isso, o abuso de autoridade e a injúria (o simples chamar de “maconheira” uma pessoa que usa tal psicotrópico poderá constituir injúria) tem penas privativas de liberdade aplicáveis a quem os particar.
Por ultimo, a divulgação da imagem dos adolescentes constitui violação administrativa, ex vi da Lei n. 8.069/1990, in verbis:
Art. 247. Divulgar, total ou parcialmente, sem autorização devida, por qualquer meio de comunicação, nome, ato ou documento de procedimento policial, administrativo ou judicial relativo a criança ou adolescente a que se atribua ato infracional:
Pena - multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência.
§ 1º Incorre na mesma pena quem exibe, total ou parcialmente, fotografia de criança ou adolescente envolvido em ato infracional, ou qualquer ilustração que lhe diga respeito ou se refira a atos que lhe sejam atribuídos, de forma a permitir sua identificação, direta ou indiretamente.
§ 2º Se o fato for praticado por órgão de imprensa ou emissora de rádio ou televisão, além da pena prevista neste artigo, a autoridade judiciária poderá determinar a apreensão da publicação.
Considero o presente texto oportuno porque pretendo que a sociedade tenha noção da importância do conhecimento desenvolvido pela ciência do Direito (embora todas as ciências se voltem à defesa de pessoas humanas, é necessário o aprofundamento para se alcançar o conhecimento científico), a fim de que manifestem suas opiniões sem violar a lei e sem praticar delitos. Ademais, há difamação quando se atribui à Universidade de Brasília à qualidade de "esgoto", mormente quando vinculada a fatos, em total descompasso com a elevação da sua posição no ranking das grandes universidades do país.


[1] LIMA, Marcelo Hermes. PM prende 4 maconheiros na Colina da UnB (3 eram menores). Isso foi HOJE. Viva a universidade do esgoto, que se chama UnB.  Disponível em: <http://cienciabrasil.blogspot.com/2011/10/pm-prende-4-machoreiros-da-colina-da.html>. Acesso em 10.10.2011, às 15h30.
[2] MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Comentários à lei antidrogas: Lei n. 11.343, de 23.8.2006. São Paulo: Atlas, 2007. passim.


sábado, 8 de outubro de 2011

Casar com viúvas pode ser um grande negócio!

Maomé, menino órfão que mudou de tutela por algumas vezes, casou pela primeira vez com uma viúva 15 anos mais velha do que ele e rica. Isso mudou significativamente a sua vida, dando-lhe oportunidade de trabalhar como mercador junto aos mongóis. Depois que ela morreu, ele casou várias vezes com viúvas de idade avançada (apenas uma das suas mulheres lhe foi prometida quando criança e casou com ele quando era adolescente), tudo visando ao dinheiro, novos contatos e ampliação de poderes políticos. Hoje Maomé é concebido como profeta e de repercussão internacional.

Será que a visão financeira de Maomé, baseada - dentre outros aspectos - no casamento com viúvas mais velhas do que ele (desde que tenhamos uma razoável compreensão do sagrado) poderá nos propiciar projeção mundial?

Tal opção teve, certamente, um custo para Maomé. Não sei o quantum disso, nem pretendo investigar, mas sei que a busca do belo (de Platão), do justo (de Aristóteles), da felicidade (de Freud) etc. transcendem a essa opção de vida.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Bandidos usando toga?

Pretendo aqui fazer uma exposição serena sobre o que se deve pensar sobre a frase da Ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e Corregedora do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Eliana Calmon, acerca da tentativa de cercear a atuação do CNJ sob os "auspícios" do Supremo Tribunal Federal (STF), quando, então, ela afirmou que existem bandidos usando toga.

Sou cadastrado em um "blog" que é assinado por George Marmelstein, Juiz Federal, o qual tem por propósito tratar de Direitos Fundamentais. Como a dignidade da pessoa humana engloba uma complexidade muito ampla de valores e direitos, considero pertinente a matéria que ali foi postada sob o título Subsídio, Teto, Reajuste Anual, Escalonamento, Simetria e Outros Mitos.

A discussão virtual que travávamos acerca do texto postado (em http://direitosfundamentais.net/2011/09/21/subsidio-teto-reajuste-anual-escalonamento-simetria-e-outros-mitos/) começou a ganhar contornos inadmissíveis, até que uma pessoa anônima, às 22h48, de 28.9.2011, entendeu conveniente publicar o seguinte comentário:

O Desembargador Ruy Coppola, do TJSP, leu na abertura da sessão de hoje, 28, do Órgão Especial, a seguinte mensagem: “A Toga – Uso toga, mas não sou bandido. Uso toga, mas não sou ladrão. Uso toga pela profissão que amo e abracei. Uso toga para honrar minha família e meus amigos. Uso toga tendo consciência de minha missão, nesses mais de 34 anos de carreira. Uso toga como meus colegas de profissão, dignos e trabalhadores, nunca refratários a qualquer tentativa de melhoria do Poder Judiciário. Usamos toga com muito orgulho e só vamos dobrá-la quando tivermos certeza do dever cumprido, ao final da missão. Não venha alguém, que não respeita a toga, dizer como devemos proceder. Não venha alguém, que não respeita sua própria instituição, dizer como devemos agir. É melhor que esse alguém atue, como sua profissão exige. Ou então, ainda melhor, que abandone a toga, pois não estava apto a usá-la” (http://www.tjsp.jus.br/Noticias/Noticia.aspx?Id=11789).

O infeliz comentário transcrito foi objeto da seguinte crítica da minha autoria, publicada às 15h20, de 29.9.2011:

Considero a Ministra e Conselheira Eliana Calmon uma magistrada de primeira linha. Está e até o momento sempre esteve apta a honrar a toga.

Verificar o erro de alguns magistrados não a torna pior. Ao contrário, evidencia uma luta por transparência e melhoria necessárias ao relevantíssimo múnus do magistrado.

Os comentários prosseguiram, sendo que um deles me chamou a atenção. Trata-se de um texto publicado por pessoa anônima, escrito por Maria Cristina Fernandes e postado em 30.9.2011, às 15h31 (no dia 3.10.2011, não consegui acessá-lo, mas às 11h30 do dia seguinte sim, podendo ser encontrado em http://www.valor.com.br/politica/1027916/loba-que-come-lobo), o qual merece divulgação:

A loba que come lobo
Por Maria Cristina Fernandes

Sabatinada para o Superior Tribunal de Justiça, na condição de primeira mulher a ascender à cúpula da magistratura, a então desembargadora da justiça baiana, Eliana Calmon, foi indagada se teria padrinhos políticos. “Se não tivesse não estaria aqui”. Quiseram saber quem eram seus padrinhos. A futura ministra do STJ respondeu na lata: “Edison Lobão, Jader Barbalho e Antonio Carlos Magalhães”.

Corria o ano de 1999. Os senadores eram os pilares da aliança que havia reeleito o governo Fernando Henrique Cardoso. A futura ministra contou ao repórter Rodrigo Haidar as reações: “Meu irmão disse que pulou da cadeira e nem teve coragem de assistir ao restante da sabatina. Houve quem dissesse que passei um atestado de imbecilidade”.

Estava ali a sina da ministra que, doze anos depois, enfrentaria o corporativismo da magistratura. “Naquele momento, declarei totalmente minha independência. Eles não poderiam me pedir nada porque eu não poderia atuar em nenhum processo nos quais eles estivessem. Então, paguei a dívida e assumi o cargo sem pecado original.”

Eliana Calmon nunca escondeu seus padrinhos

De lá pra cá, Eliana Calmon tem sido de uma franqueza desconcertante sobre os males do Brasil. Muita toga, pouca justiça são.

Num tempo em que muito se fala da judicialização da política, Eliana não perde tempo em discutir a politização do judiciário. É claro que a justiça é política. A questão, levantada pela ministra em seu discurso de posse no CNJ, é saber se está a serviço da cidadania.

A “rebelde que fala”, como se denominou numa entrevista, chegou à conclusão de que a melhor maneira de evitar o loteamento de sua toga seria colocando a boca no trombone.

Aos 65 anos, 32 de magistratura, Eliana Calmon já falou sobre quase tudo.

- Filhos de ministros que advogam nos tribunais superiores: “Dizem que têm trânsito na Corte e exibem isso a seus clientes. Não há lei que resolva isso. É falta de caráter” (Veja, 28/09/2010).

- Corrupção na magistratura: “Começa embaixo. Não é incomum um desembargador corrupto usar um juiz de primeira instância como escudo para suas ações. Ele telefona para o juiz e lhe pede uma liminar, um habeas-corpus ou uma sentença. Os que se sujeitam são candidatos naturais a futuras promoções”. (Idem)

- Morosidade: “Um órgão esfacelado do ponto de vista administrativo, de funcionalidade e eficiência é campo fértil à corrupção. Começa-se a vender facilidades em função das dificuldades. E quem não tem um amigo para fazer um bilhetinho para um juiz?” (O Estado de S. Paulo, 30/09/2010).

Era, portanto, previsível que não enfrentasse calada a reação do Supremo Tribunal Federal à sua dedicação em tempo integral a desencavar o rabo preso da magistratura.

Primeiro mostrou que não devia satisfações aos padrinhos. Recrutou no primeiro escalão da política maranhense alguns dos 40 indiciados da Operação Navalha; determinou o afastamento de um desembargador paraense; e fechou um instituto que, por mais de 20 anos, administrou as finanças da justiça baiana.

No embate mais recente, a ministra foi acusada pelo presidente da Corte, Cezar Peluso, de desacreditar a justiça por ter dito à Associação Paulista de Jornais que havia bandidos escondidos atrás da toga. Na réplica, Eliana Calmon disse que, na verdade, tentava proteger a instituição de uma minoria de bandidos.

Ao postergar o julgamento da ação dos magistrados contra o CNJ, o Supremo pareceu ter-se dado conta de que a ministra, por mais encurralada que esteja por seus pares, não é minoritária na opinião pública.

A última edição da pesquisa nacional que a Fundação Getúlio Vargas divulga periodicamente sobre a confiança na Justiça tira a ministra do isolamento a que Peluso tentou confiná-la com a nota, assinada por 12 dos 15 integrantes do CNJ, que condenou suas declarações.

Na lista das instituições em que a população diz, espontaneamente, mais confiar, o Judiciário está em penúltimo lugar (ver tabela abaixo). Entre aqueles que já usaram a Justiça a confiança é ainda menor.

A mesma pesquisa indica que os entrevistados duvidam da honestidade do Judiciário (64%), o consideram parcial (59%) e incompetente (53%).

O que mais surpreende no índice de confiança da FGV é que o Judiciário tenha ficado abaixo do Congresso, cujo descrédito tem tido a decisiva participação da Corte Suprema – tanto por assumir a função de legislar temas em que julga haver omissão parlamentar, quanto no julgamento de ações de condenação moral do Congresso, como a Lei da Ficha Limpa.

A base governista está tão desconectada do que importa que foi preciso um senador de partido de fogo morto, Demóstenes Torres (DEM-TO), para propor uma Emenda Constitucional que regulamenta os poderes do CNJ e o coloca a salvo do corporativismo dos togados de plantão. “Só deputado e senador têm que ter ficha limpa?”, indagou o senador.

Ao contrário do Judiciário, os ficha suja do Congresso precisam renovar seus salvo-conduto junto ao eleitorado a cada quatro anos.

O embate Peluso-Calmon reedita no Judiciário o embate que tem marcado a modernização das instituições. Peluso tenta proteger as corregedorias regionais do poder do CNJ.

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Nem sempre o que é federal é mais moderno. O voto, universal e em todas as instâncias, está aí para contrabalancear. Mas no Judiciário, o contrapeso é o corporativismo. E em nada ajuda ao equilíbrio. Em seis anos de existência, o CNJ já puniu 49 magistrados. A gestão Eliana Calmon acelerou os processos. Vinte casos aguardam julgamento este mês.

Aliomar Baleeiro, jurista baiano que a ministra gosta de citar, dizia que a Justiça não tem jeito porque “lobo não come lobo”. A loba que apareceu no pedaço viu que dificilmente daria conta da matilha sozinha, aí decidiu uivar alto.

  • Maria Cristina Fernandes é editora de Política. Escreve às sextas-feiras


  • A Revista Veja publicou matéria extremamente dura na semana passada, quando tratou de promiscuidade entre magistrados, advogados e jurisdicionados, comprometedora da credibilidade dos julgamentos proferidos no STF e tribunais superiores de Brasília. Embora não queiramos acreditar que todo o exposto ocorreu, devemos ser racionais e verificar a possibilidade de tudo que foi narrado (uma podridão) se concretizou, o que lança dúvida sobre muitas autoridades e sobre a estrutura de poder em Brasília.

    Recebi hoje uma mensagem eletrônica que me foi enviada pelo ex-Presidente da OAB/MA Carlos Nina, da qual colho um parágrafo:

    Com a ascensão de novo comando, pareceu ter havido uma freada nos abusos e o CNJ estava viajando em céu de brigadeiro, até ser trazido à planície por uma declaração óbvia da Ministra. Tão óbvia que a Ministra Ellen Gracie Northfleet também disse, recentemente, em entrevista à Veja, sem que houvesse tão inusitada indignação, que o Judiciário é o menos corrupto dos Poderes. A Ministra Ellen Gracie não generalizou. Totalizou, pois disse que o Judiciário é corrupto. Menos que os outros, mas corrupto. É como se a corrupção tivesse uma gradação. Tese desposada por um parlamentar que teria dito, como vantagem, que seu governo foi 90% honesto!

    A Ministra aposentada Ellen Gracie não fez nada de direferente da Ministra Eliana Calmon. Ela disse que existem pessoas corruptas, pois "menos corrupto", "16% por cento" são corruptos e "90%  honesto" não altera em nada o resultado de que muitos magistrados se prestam à corrupção.

    Neste "blog" já postei matéria contrária à postura do Presidente do STF e do CNJ Peluso, pois ele utilizou argumento falacioso para arquivar uma representação séria contra uma magistrada paraense, o que causa profunda tristeza (vide: Conselho Nacional de Justiça roferiu decisão que enoja. Disponível em: http://sidiojunior.blogspot.com/2011/04/conselho-nacional-de-justica-proferiu.html). Agora novamente ele aparece em uma atitude corporativista inaceitável.

    Não gosto de etiquetamentos, rótulos depreciativos ou quaisquer outras afirmações que levam a uma segregação de pessoas. Daí não gostar da palavra bandido. Porém, como a língua é uma convenção, aqueles que praticam crimes podem ser chamados efetivamente de bandidos, razão de não podermos aceitar o discurso manipulador e tendente a desmerecer a Min. Eliana Calmon.